quinta-feira, 15 de junho de 2017

Duelos de toga | Luiz Carlos Azedo

- Correio Braziliense

A crise da Lava-Jato acirra a luta interna no Ministério Público e no Supremo Tribunal Federal (STF), nos quais procuradores e ministros começam a se estranhar. Não é nenhuma novidade a existência de disputas no chamado poder instalado, que revelam choques de concepção ou doutrinários, às vezes misturados a rivalidades e idiossincrasias pessoais. Essas disputas, porém, abriram uma brecha para o presidente Michel Temer virar o jogo a seu favor na Lava-Jato, a exemplo do que já aconteceu no julgamento da campanha de Dilma Rousseff no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cuja condenação poderia ter lhe custado o mandato com a cassação de toda a chapa.

No caso do Supremo Tribunal Federal (STF), a Operação Lava-Jato aumentou a tensão entre os ministros, por causa da delação premiada de Joesley Batista e de outros executivos da JBS. No epicentro das disputas estão o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato, e os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, cujas relações andam estremecidas por causa da suspeita de grampos e gravações. Os ministros Luiz Fux e Rosa Weber (que se alinharam com o relator Herman Benjamin no julgamento da chapa Dilma- Temer) comporiam o grupo que apoia Fachin, ao lado do ministro Luiz Barroso e da presidente do Supremo, ministra Cármem Lúcia.

Os demais ministros começam a se posicionar no sentido de conter eventuais excessos dos procuradores da Lava-Jato e evitar a suposta ameaça de colapso institucional do país, na linha do posicionamento de Gilmar Mendes à frente do julgamento no TSE. O Supremo não endossaria excessos do Ministério Público, nos limites de sua missão constitucional. A responsabilidade pela superação da crise seria dos políticos e do Congresso. Os ministros Celso de Mello, decano do tribunal, Marco Aurélio, Dias Toffoli e Alexandre Moraes formariam a nova maioria na Corte, com Gilmar e Lewandowski, para negar os pedidos de anulação do julgamento do TSE.

Nesse ambiente, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, corre contra o relógio. Seu mandato acaba em setembro. Por isso, está sendo acusado de açodamento na condução das investigações da Operação Lava-Jato por adversários. A propósito, toda a movimentação do Palácio do Planalto em relação à Lava-Jato será no sentido de ganhar tempo, para que o presidente Michel Temer possa nomear um procurador-geral de suas relações. Dificilmente, porém, poderá fazê-lo, ignorando a lista tríplice eleita pelos próprios procuradores, numa disputa que já tem oito candidatos.

Os favoritos na eleição são os subprocuradores da República Eitel Santiago e Rachel Dodge, ambos da oposição à Janot. Além de indicado por Temer, o novo procurador precisa ter seu nome aprovado pelo Senado, o que é uma via crucis. A investigação sobre o procurador da República Ângelo Goulart Villela também estressa o ambiente no Ministério Público. Chamado de traidor pelos colegas da Lava-Jato, ele é acusado de passar informações sigilosas para o grupo JBS, mas há rumores de que teria gravado as reuniões com os colegas nas quais se discutiu a negociação da delação premiada de Joesley e as ações controladas da Polícia Federal. O assunto é um dos mais comentados na disputa eleitoral.

Coalizão
O Palácio do Planalto explora essas contradições ao traçar a estratégia para enfrentar a denúncia de Rodrigo Janot contra o presidente Michel Temer, que é acusado de receber propina de R$ 500 mil semanais da JBS na delação premiada de Joesley Batista. O grande número de políticos envolvidos, entre os quais o senador Aécio Neves, que foi afastado do cargo pelo ministro Edson Fachin, armou uma ampla coalizão contra a Lava-Jato no Congresso, que une os políticos de todos partidos envolvidos nas delações da JBS, sobretudo os do PMDB, do PSDB e do PT.

Para prosperar no Supremo, a denúncia depende de autorização de dois terços da Câmara dos Deputados. O Palácio do Planalto se articula para garantir pelo menos 171 votos, dos 513 deputados, mas hoje contaria com muito mais, graças à convergência entre governistas e oposicionistas enrolados nos processos da Lava-Jato. O problema, porém, é a pressão da opinião pública. Não seria a primeira vez que parlamentares pressionados pelos eleitores purgariam os males do Congresso defenestrando alguém da própria classe. A diferença agora é que não seria um colega, mas o presidente da República. No Congresso, porém, como diz o ditado popular, para trair e coçar, é só começar.

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