domingo, 25 de junho de 2017

Meta menor inibe inflação, dizem analistas

Flavia Lima, Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Ainda que o Brasil esteja distante das distorções que marcaram o período de hiperinflação, a percepção de boa parte dos economistas é que os preços num período mais longo estacionaram em um nível alto se comparado a países semelhantes, e a redução da meta de inflação seria um poderoso remédio para corrigir o problema.

A expectativa de economistas é que a meta de inflação (IPCA), hoje em 4,5%, caia ao menos para 4,25%, aproveitando um ambiente inédito para reduzi-la. A inflação, dizem, sempre foi entregue muito próxima do teto, com exceções em 2006, 2007 e 2009.

A discussão sobre reduzir a meta voltou ao centro do debate econômico porque na quinta (29) o Conselho Monetário Nacional vai se reunir para decidir o número de 2019.

Ex-diretor de Política Econômica do BC e um dos maiores especialistas sobre o tema, o atual economista-chefe do Itaú Unibanco, Mario Mesquita, diz que, na maioria dos países com regime de política monetária semelhante ao nosso, a meta de inflação fica entre 2% e 3% ao ano, inclusive na América Latina.

"Por aqui, temos perseguido, com dedicação cambiante e êxito limitado, uma meta muito maior, de 4,5%, desde 2005", diz.

Segundo Mesquita, expectativas bem ancoradas e a queda recente e disseminada da inflação criam uma boa oportunidade para tentar perenizar patamares inflacionários inferiores, mais próximos aos internacionais.

Mesmo com a volta do crescimento, diz ele, que nem sequer chega a ser consenso entre os analistas, o elevado grau de ociosidade da economia e, em particular, a piora nas condições do mercado de trabalho continuarão exercendo pressão desinflacionária ao longo de 2018.

O BTG Pactual ressalta a trajetória de queda da inflação, que chega a 4,3% nos 12 meses encerrados no segundo trimestre de 2019, segundo o Relatório de Inflação.

O movimento, diz a equipe liderada por Eduardo Loyo, ex-diretor do BC, justifica que a meta fique onde está em 2018, mas caia no ano seguinte. A expectativa é que ela chegue a 4,25% em 2019.

O sistema de metas de inflação foi estabelecido em 1999 no Brasil, com o objetivo de dar previsibilidade ao mercado e, com isso, manter a inflação controlada.

Segundo estudo do Credit Suisse, entre 30 países que reduziram o centro da meta em algum momento durante o regime, 70% apresentaram patamar de inflação menor, próximo ao centro do novo alvo.

Considerando apenas países que implementaram o regime de metas antes de 2010 (23 países), 78% mantiveram a inflação inferior ao período anterior à mudança de meta.

Ex-diretor do BC, Tony Volpon diz que a meta para 2019 deveria ser reduzida para 4%.

Para o economista-chefe do UBS, como hoje fatores conjunturais levam à queda da inflação, uma meta menor vai servir como ponto de convergência quando esses fatores se dissiparem no tempo.

Gustavo Arruda, do BNP Paribas, diz que, em um cenário no qual as expectativas já estão apontando para inflação abaixo de 4,5% neste e nos próximos anos, não alterar a meta pode ser custoso.

Não é o que pensa Aloisio Araújo, ex-consultor do BC e professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) e do Impa.

Segundo ele, as condições para a redução da meta não estão associadas apenas à credibilidade do BC ou ao fato de a inflação corrente estar mais baixa, mas também à questão fiscal.

E os países que se assemelham ao Brasil e têm meta menor, diz, também têm uma situação fiscal mais robusta.

DEFESA DIFÍCIL
Estudo de 2014 de Araújo feito com Tiago Berriel, hoje diretor de assuntos internacionais do BC, aponta que não convém a países com situação fiscal frágil, como o Brasil, e que podem ainda enfrentar situações de instabilidade política, ter meta de inflação muito baixa porque seria mais difícil defendê-la.

Na mesma linha, o ex-diretor de Política Econômica do BC Sergio Werlang diz que alguns aspectos da economia local fazem com que o país tenha uma inflação um pouco mais alta. E, em situações nas quais é preciso reduzir gastos, ela acaba funcionando como instrumento de ajuste.

"Como não pode reduzir salários de funcionários públicos, por exemplo, o país precisa de uma inflação um pouco maior para reduzir gastos em termos reais", diz.

Mais cético, o Credit Suisse diz que, independentemente da meta estabelecida, o insucesso no processo de consolidação fiscal reconduziria a economia a um ambiente de inflação elevada e recessão.

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