quarta-feira, 7 de junho de 2017

Temer à espera

Criminalizar a política não resolve, é preciso reformar, defende relator

Ao retomar o julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE, o relator, Herman Benjamin, condenou a corrupção e o “sistema eleitoral falido”. “Sem reforma abrangente e corajosa, os erros objetos dessa demanda se repetirão nos próximos pleitos”, disse. Mas ressaltou: “Que fique claro que enfraquecer a Justiça Eleitoral é condenar as eleições ao descrédito.” O procurador Nicolao Dino pediu a cassação de toda a chapa e a perda dos direitos políticos de Dilma. Advogados da petista e do presidente tentaram excluir do processo depoimentos de executivos da Odebrecht e dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura. Após mais de três horas, a sessão foi encerrada no fim da noite, sem a conclusão do voto do relator, para ser retomada hoje, a partir das 9h.

Primeiro round

Relator do julgamento de Temer no TSE começa a votar com discurso contra a corrupção

André de Souza, Carolina Brígido e Eduardo Bresciani | O Globo

-BRASÍLIA- O relator do processo de cassação da chapa de Dilma Rousseff e Michel Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Herman Benjamin, começou a votar ontem com duro discurso contra a corrupção. Para ele, não se pode apenas criminalizar a política; mas também é necessário mudar as leis para garantir a normalidade das eleições. No primeiro dia de julgamento que pode levar à cassação de Temer, foram rejeitadas quatro questões preliminares apresentadas pelos advogados do PT e do PMDB. Hoje, a partir das 9h, o tribunal deve analisar outras cinco questões preliminares antes de entrar no mérito. A expectativa é de que, depois da fase inicial, o relator vote pela condenação da chapa.

— Talvez seja o caso de pensar, no futuro, em alteração legislativa que permita uma espécie de reconvenção eleitoral, já que o objetivo maior das ações eleitorais, além de punir candidatos vencedores, seja precisamente garantir a normalidade e legitimidade das eleições como um todo contra influência do poder econômico e político — defendeu.

O relator afirmou, ainda, que eventual punição não pode significar “demonização” dos partidos, para não comprometer a democracia.

— Na Justiça Eleitoral, investigar e punir ilícitos praticados não deve conduzir à demonização generalizada dos partidos, parlamentares e governantes eleitos. Pois esse seria o passo inicial a nos jogar pelo esfacelamento da democracia, no abismo de soluções messiânicas, na esperança tão vã como desesperada de que um autocrata ou populista qualquer chegará para salvar a nação de seus infortúnios — alertou.

Logo no início do voto, Herman fez um alerta: a Corte analisaria fatos, e não a situação política do país. O julgamento ocorre logo depois da delação da JBS e da divulgação de um áudio em que Temer avalizou o pagamento de propina em troca do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha. Ele lembrou que, desde que o processo foi aberto, em 2014, a realidade mudou muito – mas isso não influenciaria no julgamento.

— De lá até agora, mudou-se por impeachment parlamentar o presidente da República. Além disso, o partido que começou o processo (PSDB) se tornou principal parceiro da coligação de sustentação do atual presidente, que continua réu nas quatro ações. Não obstante essas profundas alterações do quadro político, os fatos e as leis continuam os mesmos. Estou convencido que tampouco mudou a forma de julgar ou a têmpora dos ministros do TSE. Nós, juízes brasileiros do TSE ou de qualquer instância da magistratura brasileira federal ou estadual, julgamos fatos como fatos, e não como expedientes políticos de conveniência oscilante.

Em seguida, o presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, pediu um aparte ao colega para pregar cautela no julgamento.

— Estamos a tratar não de uma ação comum nem rotineira. Estamos a tratar de uma ação contra o presidente da República, como nunca tínhamos tido antes. É um processo extremamente complexo. Só não podemos esquecer que aqui temos uma situação totalmente singular, que não pode se tornar comezinha, que é a impugnação de chapa presidencial num grau de instabilidade que precisa ser considerado — recomendou Gilmar.

DITADURA X DEMOCRACIA
O presidente da corte acrescentou que visitantes estrangeiros, quando apresentados ao número de cassações da Justiça Eleitoral, comentam que há mais cassações que na ditadura. Herman rebateu, deixando claro que os colegas estavam em polos opostos.

As ditaduras cassavam e cassam quem defende a democracia; o TSE cassa aqueles que vão contra a democracia. Nós temos que ser cuidadosos em tudo que diz respeito à soberania do voto popular, tanto para resguardá-lo quanto para impugná-lo, quando ele está eivado de irregularidades — disse o relator.

Ainda no voto, Herman destacou que a ação foi aberta para investigar apenas os dois principais partidos da coligação vencedora — ou seja, PT e PMDB. E ponderou que a corrupção não está restrita apenas a esses dois partidos.

— Como o foco é apenas a chapa presidencial eleita em 2014, a coligação Com a Força do Povo (Dilma-Temer), o não especialista, talvez até o estudante que está aqui hoje, corre o risco de imaginar equivocadamente que todos os malfeitos éticos e eleitorais do Brasil narrados pelos autores, a coligação Muda Brasil (de Aécio) e o PSDB, reúnem-se e se esgotam nos dois maiores partidos políticos da coligação vencedora, sobretudo o Partido dos Trabalhadores, por a ele pertencer a cabeça de chapa, a presidente Dilma Rousseff — ressaltou o ministro.

O vice-procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino, afirmou que há "elementos robustos" para cassar a chapa. Ele defendeu o uso de depoimentos dos delatores da Odebrecht e dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura.

— Há elementos robustos que evidenciam a prática de abuso econômico e a cassação da chapa como um todo — afirmou Dino.

Ele diz que o processo demonstrou ter havido repasse de recursos para a campanha do esquema de corrupção investigado na Operação Lava-Jato, em especial do grupo Odebrecht.

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