quarta-feira, 19 de julho de 2017

Brasil está parado no jogo do comércio internacional – Editorial | Valor Econômico

A proteção comercial às empresas brasileiras é contraproducente, aponta o relatório de avaliação sobre o Brasil preparado pela Organização Mundial do Comércio. Apesar da parafernália burocrática e de tarifas de importação, que fazem muita diferença para alguns setores - como veículos, dominado por multinacionais, por mais estranho que pareça - os produtos fabricados no país não eram, não são e não serão competitivos, se tudo continuar como está. A OMC deixa implícita a conclusão de que a política nacional de evitar a abertura comercial, mas privilegiar a atração de investimentos estrangeiros, deixa o caminho aberto para a conquista do mercado interno pelas empresas multinacionais e não permite um milímetro sequer de avanço dos produtos brasileiros nos mercados internacionais. O Brasil está fora das cadeias globais de valor e é um participante marginal no comércio internacional, conclui a OMC.

O relatório sobre revisão da política comercial brasileira, feito a cada 4 anos, aponta que o objetivo principal do Brasil tem sido o de proteger "indústrias nascentes", algo que deixou de fazer qualquer sentido ainda mais quando as escolhidas estão entre as mais tradicionais do mundo, como têxteis, calçados e, mais uma vez, a indústria de automóveis, que fazem jus à maior tarifa de importação, de 35%. Por vários ângulos de visão, aponta a OMC, o Brasil é um país voltado para si próprio, fechado e que favorece a produção local em detrimento do mercado externo, o único capaz de proporcionar um estímulo e um atalho para o aumento de competitividade.

A colcha de retalhos de incentivos, subsídios financeiros e creditícios, tarifas de importação, exigências de conteúdo local, margens de preferência nas concorrências para o fornecimento ao Estado e a malha de impostos carentes de racionalidade torna o Brasil um jogador lento e pesado no comércio global, com custos maiores do que deveria ter se estivesse realmente preocupado com o assunto.

O relatório da OMC dá a entender que os incentivos à exportação, que não são muitos, mas podem ser contestados, se destinam afinal a não mais que 500 empresas, que carregam consigo 93% do valor adicionado dos bens vendidos ao exterior. O poder competitivo brasileiro se firmou na última década em torno das commodities agrícolas, contra as quais existem barreiras de vários tipos nos países desenvolvidos. A OMC não se alonga, obviamente, sobre esse ponto.

Um aspecto importante para a OMC é que ao proteger o mercado interno o país "reduz os incentivos para elevar a eficiência, qualidade ou diferenciação de produtos, ao mesmo tempo em que impede os produtores domésticos de terem acesso a fornecedores de insumos de preços menores e qualidade maior". O relatório não faz menção à desnacionalização das indústrias brasileiras, o que seria prova do fracasso da intrincada rede de proteção.

Entre a última revisão e agora quase nada mudou, segundo a OMC, o que significa que o que já era ruim continuou sendo ruim ou piorou. O Brasil é objeto de duas ações relativas a incentivos específicos para a indústria, como o Inovar-Auto, tecnologia da informação e indústria farmacêutica. Em relação a práticas discriminatórias de acesso ao mercado doméstico, onde sobressaem diretamente as ações antidumping, e indiretamente a proibição de acesso estrangeiro a mercados como energia nuclear e aviação, sua extensão não é significativa. Elas afetam 1,06% do total de mercadorias importadas pelo país.

Como sabem os empresários nacionais, os inimigos internos têm papel fundamental na falta de competitividade, para a qual as barreiras de proteção são um motivo importante. A lista é conhecida: um sistema complexo, caro, desestimulante e imprevisível de impostos, um dos fatores mencionados com frequência pela OMC. Há outros: burocracia, infraestrutura inadequada, falta de mão de obra qualificada, pouco acesso a capital de longo prazo. Não há impulso externo que possa contrabalançar um pouco essa asfixia doméstica. A quantidade e peso dos acordos comerciais feitos pelo Brasil é pequena, e, com exceção do Mercosul, irrelevante.

A resposta brasileira às indagações que emergem do relatório da OMC é sensata, mas não serve de consolo - as condições que prejudicam o acesso das empresas estrangeiras ao mercado local e do mercado internacional a empresas brasileiras são as mesmas. Há décadas é assim e não há sinais de que esse panorama desolador vá mudar logo.

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