quinta-feira, 20 de julho de 2017

O alvo comum de Temer e Alckmin | Maria Cristina Fernandes

- Valor Econômico

Inchaço do DEM ameaça hegemonia do campo liberal

O fôlego que o presidente Michel Temer ganhou no recesso deu alento ao inquilino do Palácio dos Bandeirantes. O procurador-geral da República ainda não terminou seu mandato, mas o denunciado ganhou sobrevida política ao estancar a carroça que o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) colocou à frente de sua boiada. No açodamento com o qual pôs-se a recuperar o terreno perdido nos últimos anos, o DEM acendeu o sinal amarelo não apenas no PSDB, partido que poderia vir a ser o mais prejudicado pela proeminência do partido do presidente da Câmara, como no PMDB. Na afoiteza, Maia fez do DEM um alvo comum para tucanos e para o presidente Michel Temer, que dará uma ideia do seu poder de arregimentação no leilão a ser promovido pela janela partidária.

Ao DEM não é mais permitido reviver seus dias de PFL, quando chegou a ser o principal partido no Congresso e nos governos estaduais. Mas com o Palácio do Planalto nas mãos o partido poderia tentar liderar o campo liberal e fazer um grande estrago no PSDB e na rede com a qual Alckmin espera contar, a começar do PSB. Antes de Maia se aparelhar para retomar os quadros que o falecido governador de Pernambuco, Eduardo Campos, atraíra para o PSB, Alckmin já se posicionara para fazer do partido seu aliado preferencial desde 2014 quando escolheu o ex-deputado da Baixada Santista, Márcio França, para sua chapa.

O vice-governador de São Paulo está longe de ter o controle do partido, hoje dividido em tantas alas quanto o próprio PSDB, mas o acúmulo da presidência estadual do PSB com a secretaria nacional de finanças dá a medida de seu quinhão na legenda. França quer ser governador, mas sabe que as chances para isso se estreitam. Se Alckmin conseguir tirar João Doria do páreo presidencial, terá que lhe oferecer o Morumbi como prêmio de consolação, ainda que o empenho que se espera do governador em relação ao prefeito seja semelhante àquele que José Serra, titular no Bandeirantes, dedicou à candidatura Alckmin na disputa que reelegeu Gilberto Kassab em 2008 em São Paulo.

Doria é o segundo dos açodados a perder terreno. A afoiteza com a qual partiu pra cima do senador Aécio Neves (PSDB-MG) na reunião da semana passada em São Paulo reforçou o isolamento do prefeito paulistano na legenda. Não há dúvida de que o senador mineiro deu inestimável contribuição para apodrecer a sigla, mas o prefeito ignorou os códigos da política. O primeiro é o de que, na condição de controlador do cartório em que transformou o PSDB, Aécio é credor de muitos correligionários. No degredo ao qual está condenado pela Lava-Jato, cabe uma pá de tucanos. Não causa surpresa a mobilização do partido para salvá-lo no Conselho de Ética.

O governador não vê a hora de Aécio entregar o partido de uma vez por todas, mas não surpreende que tenha ligado pessoalmente para convidá-lo à reunião da qual foi anfitrião. O senador mineiro já está morto, mas não será Alckmin que lhe servirá de coveiro. A única surpresa ficou por conta da disposição com a qual Doria partiu pra cima, numa atitude definida por participantes da reunião como "sem noção". Desde que viu sua popularidade cair pelo menos 15 pontos desde a posse, com desastres como a operação Cracolândias Espraiadas, comandada pela Polícia Militar do Estado, o prefeito de São Paulo já não mete medo nos alckmistas.

Depois de correr atrás para recuperar o espaço ganho por Doria em redes sociais, o governador resolveu recuperar suas relações com o Planalto, terreno do qual o prefeito nunca se descuidou. Até Joesley Batista surgir no porão do Jaburu, Alckmin sempre temeu que o presidente partisse para tentar a reeleição. Hoje vê um Michel Temer que reequilibrou o jogo com a aprovação da reforma trabalhista e o resgate da base que Rodrigo Maia lhe ameaçou tomar, mas fora do jogo eleitoral de 2018. Os alckmistas que visitam o Palácio do Bandeirantes saem com a cartilha dos três fatores que devem guiar o voto no plenário no dia 2 de agosto: se há indícios jurídicos suficientes para a abertura de processo, se o país aguenta mais uma troca de presidente e se a sucessão seria negativamente abalada. Sempre pode aparecer um Rodrigo Rocha Loures a dizer de quem era a mala mas até lá a recomendação é não esticar a corda.

A Lava-Jato, na visão dos alckmistas, não é problema do governador, mas de Adhemar Ribeiro, o cunhado que, segundo as delações da Odebrecht, fez a triangulação dos repasses ilegais nas campanhas de 2010 e 2014. A denúncia de formação de cartel para superfaturamento em licitações na Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, que já foi aceita pela justiça, tampouco seria problema do governador mas dos executivos da CPTM denunciados.

Enquanto o cunhado e os executivos paulistas estiverem de acordo, Alckmin permaneceria livre para disputar 2018. Já começou a ensaiar o discurso, o de que chegou a hora de comprar briga com interesses corporativos. Quando lembrados de que o governador manteve, ao longo de quatro mandatos, profícuas relações com as corporações judiciais, alckmistas reagem com estudada indignação. Trata-se de uma casta privilegiada, que não se submete ao teto constitucional e chega a tirar R$ 120 mil por mês dos cofres públicos.

Contra o jogo de esconde de 2014, a disposição agora seria a de assumir a reforma do Estado. Alckmin pretende abusar da fala que explicita todas as sílabas para convencer que reformar a Previdência é fazer justiça social. Não pretende sapatear em cima do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como faz Doria, até porque pretende conquistar o Nordeste conflagrado com a propaganda de sua política de segurança pública. Pretende fazer caravanas a cada 15 dias. Depois do rombo aberto pelos carteis, acredita ter montado em São Paulo um modelo de gestão para obras públicas que pode resolver gargalos de infraestrutura Brasil afora.

Só precisa que o PSDB antecipe a definição da candidatura para janeiro. Insurgem-se contra a tarefa todos os mortos-vivos do partido que sempre trabalham pelo adiamento das decisões para a última hora na tentativa de que anistia, janela partidária, parlamentarismo ou um salvo-conduto qualquer os mantenha no jogo.

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