sexta-feira, 7 de julho de 2017

Sinais de aperto monetário intranquilizam investidores – Editorial | Valor Econômico

A perspectiva de fim da acomodação monetária nos dois lados do Atlântico provocou um reajuste de preços dos ativos nervoso, embora ordenado. Em poucos dias, indicações do presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, ata do BCE, sinais do Banco da Inglaterra e do Banco do Canadá, foram todos na direção de que a época de emergência da política monetária está perto do fim. É a estimativa de quão perto do fim isso está que deixou os investidores intranquilos. As bolsas, que vinham batendo recorde atrás de recordes, especialmente as americanas, iniciaram o caminho contrário, ainda que lentamente e sem oscilações muito fortes. Os bônus dos países da zona do euro subiram, com o juro do título alemão de 10 anos exibindo ontem seu maior valor em 18 meses, de 0,56%.

O Federal Reserve americano, o mais adiantado no processo de normalização monetária, resolveu manter seu rumo na última reunião de seu comitê de mercado aberto. O banco, salvo mudanças inesperadas da situação econômica, fará mais um aumento da taxa de juros, que a levará a 1,5%. Em 2018, repetirá a dose, colocando-a em 2,25% no fim do ano e 3% em 2019, quando deverá dar seu trabalho por concluído.

Esse cenário está longe de parecer brusco, mas os membros do Fed apontam riscos de desvio. A discussão dos efeitos da atual taxa de desemprego, de 4,3% - abaixo da taxa histórica - condensou os dilemas da autoridade monetária. Uma parte dos membros do Fomc considerou ser necessária a permanência desse nível de ocupação por tempo suficiente até que apareçam sinais evidentes de aumento de salários e alta da inflação para que se altere a atual política do Fed. Outros entenderam o contrário, isto é, um desemprego tão baixo produzirá mais inflação e em um ritmo que pode ser tão rápido quanto surpreendente, pegando o banco central "atrás da curva".

Essas considerações diziam mais respeito ao início da redução do balanço do Fed, de US$ 4,5 trilhões, anunciado para este ano, mas que, para alguns membros, deveria se iniciar logo, em um par de meses. O Fed fará uma escada ascendente trimestral e se desfazer de US$ 50 bilhões ao mês, um ano após o início do programa - quantidade quase idêntica ao de suas aquisições de títulos para sustentar uma economia em crise.

Enquanto os salários estão se movendo muito devagar, a inflação recuou para 1,4% em maio nos EUA, por "fatores temporários", segundo o Fed, que prevê que ela chegará na meta de 2% só em 2019. Assim, a taxa de desemprego continuará abaixo da natural por um bom tempo, o juro estrutural será menor do que já foi, enquanto que o crescimento potencial se reduziu. Para o Fed, a expansão de longo prazo é de 1,8%.

O paradoxo dos salários também intriga o BCE, que o mencionou em sua ata, a mesma que retirou a menção a cortes adicionais de juros. A perspectiva para a inflação foi reduzida a 1,5% este ano, a 1,3% em 2018 e a 1,6% em 2019, ao passo que a recuperação foi considerada generalizada, em ritmo ligeiramente superior ao previsto. A expectativa do crescimento foi elevada a 1,9% este ano. Esse é o paradoxo: alguns membros do BCE consideraram essa combinação "surpreendente, ainda mais porque a perspectiva de fechamento do hiato do produto no horizonte deveria se traduzir em maior pressão altista nos salários e nos preços".

De qualquer forma, os mercados elevaram a atitude cautelosa do BCE um tom acima. Está claro que não há sinais visíveis e convincentes de alta da inflação, segundo a ata, é que a consecução da meta, perto mas inferior a 2%, será "condicionada a um grau bastante substancial de acomodação monetária".

A ligeira mudança de ênfase elevou o preço dos bônus soberanos. Se a tendência prosseguir, esse será um problema para países altamente endividados, mas não para o Brasil, cuja dívida é em grande parte em reais e tem robustas reservas. Como as taxas dos bônus estavam no chão enquanto as bolsas reluziam, o movimento inverso agora, caso seja intenso, retirará o brilho das ações. Como a correlação com a bolsa de Nova York é alta, no caso da Bovespa, isto poderá murchar o índice e produzir mais saídas pelo câmbio financeiro, provocando alguma pressão na taxa.

Entretanto, isso pode não ser mais que uma acomodação passageira e nada mais. O problema é que, mesmo com as taxas de juros subindo nos EUA, e a proximidade maior do fim da liquidez excessiva, a aversão ao risco não diminuiu - imprevistos podem trazer sérios danos a investidores e mais instabilidade.

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