sexta-feira, 7 de julho de 2017

Visão dupla | Míriam Leitão

- O Globo

O Banco Central continua no pêndulo. Olha para a conjuntura inflacionária e admite que os juros podem cair no mesmo ritmo de antes, de um ponto percentual a cada reunião, mas olha o cenário da aprovação das reformas e pensa que é preciso reduzir o corte. Ilan Goldfajn diz que o BC tem colocado suas dúvidas para a sociedade. Mas o que se discute, segundo ele, é o tamanho do corte e não o corte em si.

“Estamos vendo se será reduzido um pouco o corte na taxa, pela incerteza em relação às reformas, ou se mantém o ritmo em função desse quadro de inflação caindo e atividade recuperando gradualmente. É algo que vamos avaliar. As duas questões fazem parte da realidade. O Banco Central tem colocado para a sociedade as suas dúvidas. A dúvida não é se os juros vão baixar, mas qual é a calibragem”, disse Ilan Golfajn numa entrevista que me concedeu e que foi ao ar ontem na Globonews.

Como a inflação caiu muito, e hoje isso deve ficar mais uma vez claro com a deflação em junho, a taxa de juros nominal foi reduzida, mas a real continua aumentando em plena recessão. Ilan disse que a taxa de juros real está no menor nível em termos históricos:

— Olhando os 12 meses para frente, a taxa de juro real está em 4% porque está se olhando a taxa de juros de 8,5%. Estamos caminhando. Se a gente puder aproveitar este momento de expectativas ancoradas e ir mais além, ótimo. Estamos todos no mesmo barco, mas a única questão é que essa queda tem que ser sustentável. Ela tem que vir para ficar.

Os juros bancários, no entanto, sobem ou permanecem muito altos mesmo numa época de crise econômica, em que o natural seria facilitar a vida do devedor para que ele pague. Ilan diz que, na verdade, os juros estão caindo nos últimos três meses e que uma das providências que estão tomando, através da Medida Provisória 775, é permitir garantias eletrônicas, mais fácil de verificar do que o documento físico:

— Está havendo entrada de banco estrangeiro, apesar de alguns haverem saído. E o que nós estamos fazendo aqui para estimular a competição é a divisão do sistema bancário por segmentos: os grandes, os médios e os pequenos e cooperativas. Cada segmento vai ter uma regulamentação proporcional. Aliviar um pouco mais para os mais simples e fazer uma regulamentação mais complexa para os maiores. De tal forma que o custo não seja igual. Isso ajuda os menores a competirem com os maiores. O segundo foco é que a inovação, as fintechs, tem gerado competição, vai mordendo de um lado e de outro e obrigando o sistema a se adequar aos competidores. E isso é algo que estamos incentivando.

Sobre a tese de André Lara Resende que as metas de inflação são a nova ortodoxia, Ilan discorda:

— Não existe uma nova ortodoxia. Existe uma política monetária que usa a taxa de juros no mundo. Na academia, onde florescem ideias, quando os juros estavam muito baixos houve essa discussão. Alguns acadêmicos começaram a especular se a política de juros baixos estava funcionando. E neste meio tempo a inflação voltou um pouco e conseguiu-se pleno emprego nos Estados Unidos. Discussões são saudáveis na academia. Aqui no Brasil nós tivemos uma experiência de juros mais baixos e não funcionou, porque foi uma redução voluntariosa, e tivemos uma experiência recente em que os juros mais altos levaram a inflação para baixo, como estamos hoje. O debate tem que ser feito com base em dados, no que está acontecendo.

Ele acha que o problema no Brasil é que há uma demanda grande por soluções mágicas, como a de achar que a Previdência não tem déficit e por isso o problema está resolvido, ou, na área fiscal, a sugestão de gastar mais para crescer mais e assim elevar a arrecadação. E, na política monetária, a solução mágica é apenas reduzir os juros. Às vezes dá errado, como aconteceu recentemente, explica:

— Quem senta nessa cadeira sabe que precisa baixar a inflação e que isso seja sustentável.

Ilan disse, sobre a crise política, que o Banco Central continuará sendo bastante explícito na necessidade das reformas para termos “um sossego nas contas públicas”. Sobre o cenário econômico de curto prazo, disse que o país terminará o ano sem queda de PIB, aposta em alta de 2% de dezembro contra dezembro e, na média, 0,5%. Ele acredita em melhora gradual, apesar das incertezas políticas.

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