segunda-feira, 21 de agosto de 2017

O futuro sempre interessa | Luiz Roberto Nascimento Silva

- O Globo

O século XXI é mais Schumpeter do que Keynes. A indústria da informática é a melhor tradução do seu conceito de destruição criadora

Kenneth Galbraith dizia que empresários e homens de negócios no seu pragmatismo costumavam repetir como se fossem seus pensamentos de economistas já falecidos. Assim parece importante buscar a fonte original, primária, dessa produção intelectual, pois ela nos ajudará a entender melhor o mundo. Certamente os dois grandes pilares do século XX foram Keynes e Schumpeter.

O inglês Keynes é o pensador mais completo. O único a ter uma obra com consistência teórica e abrangência como a que Marx produziu no século XIX. Devemos a ele a crítica ao dogma do equilíbrio fiscal como fundamento básico das contas públicas. Keynes sustentou e insistiu que nos momentos de depressão era conveniente que o Estado produzisse déficits intencionais com finalidades públicas para romper o ciclo do desemprego. Era necessário gastar o que havia sido poupado pelo setor privado e assim retirar os países da letargia da crise. Keynes rompe com o modelo clássico expurgando do capitalismo a depressão e o desemprego que o condenariam a extinção na profecia marxista. O New Deal implantado por Roosevelt, somado aos efeitos econômicos da Segunda Guerra, coroou no plano da realidade o que ele havia sustentado em nível teórico.

O austríaco Schumpeter atribuiu enorme importância aos novos bens de consumo, aos novos métodos de produção, transporte e de organização industrial criadas pela empresa capitalista. O salto tecnológico, a inovação, seria para ele o parâmetro fundamental para o futuro da economia de mercado. Enquanto os economistas clássicos detinham-se na concorrência dos preços, ele insistia numa superioridade decisiva pela qualidade ou pelo custo. Essa substituição do antigo pelo novo “numa eterna tempestade de destruição criadora” é que era essencial para o empreendedorismo e para o capitalismo, para ele indissociáveis.

Nesse ponto, o século XXI é mais Schumpeter do que Keynes. A indústria da informática é a melhor tradução do seu conceito de destruição criadora. Ela tem hoje tal expressão econômica que a lista do bilionários feita pela “Forbes” de 2017 é autoexplicativa. Bill Gates, Jeff Bezos, Mark Zuckerberg, Larry Ellison, Michael Bloomberg e Carlos Slim, ou seja, seis dos dez homens mais ricos do mundo pertencem a ela. Suas empresas representam um terço do movimento da Bolsa americana.

Curiosamente o sexto do time, o mexicano Slim, tem alertado em debates que nessa nova revolução industrial provavelmente o número de empregos criados será menor do que o de extintos. O setor de varejo dos shoppings nos Estados Unidos está se modificando abruptamente em decorrência do comércio eletrônico, fechando inúmeras lojas e aceitando novos aproveitamentos para outras. As grandes cadeias de departamentos concentram-se nos pontos mais rentáveis e fecham os outros. Mais gente trabalha em casa.

O desemprego está em tal proporção no Brasil que esse tema pode parecer prematuro no presente. Não temos estatísticas sobre o impacto da informática aqui. Não há tempo. Somos como passageiros do Titanic. Cada um à procura seu bote. Fora o agronegócio, todos os demais setores desempregam. A reforma trabalhista, apesar de aprovada, não trouxe ainda clareza nem segurança sobre sua aplicação e eficácia.

O que acontece nos países centrais depois se reproduz nos periféricos. Penso que o futuro deve sempre nos interessar. Primeiro, porque ele nos chega na velocidade de 60 minutos por hora todos os dias. Depois, como nos advertiu Valéry, porque estamos todos condenados a passar lá o resto dos nossos dias. 

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Luiz Roberto Nascimento Silva é advogado e foi ministro da Cultura

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