sábado, 12 de agosto de 2017

O mundo ajuda | Míriam Leitão

- O Globo

A economia mundial vive seu melhor momento em muitos anos, desde que a crise financeira abalou os EUA e ameaçou a existência da zona do euro. As projeções do PIB mundial estão altas, a inflação está baixa, e a elevação dos juros americanos deve ser mais lenta. O dólar, que se fortalecia, parece ter mudado a tendência. Isso favorece os preços das commodities e ajuda países emergentes como o Brasil.

Não é por falta de ajuda externa que o Brasil permanecerá em crise. O PIB mundial deve ter este ano e no próximo os melhores números desde 2011. Ninguém fala mais em risco de colapso do euro, a China tem atingido suas metas de crescimento, e, nos EUA, Trump provoca perturbação política, mas o país tem conseguido crescer, gerar empregos e manter a inflação baixa. É com esse pano de fundo que o economista-chefe para América Latina do banco francês BNP Paribas, Marcelo Carvalho, analisa as perspectivas para o Brasil.

— O cenário externo favorece. A alta dos juros nos EUA será mais lenta, isso enfraquece o dólar e fortalece os preços das commodities. Essa maré de liquidez vai subir e elevar junto com ela “vários barquinhos”. Muitos países emergentes vão se beneficiar desse cenário, inclusive o Brasil — disse Marcelo Carvalho.

A produção industrial nos países desenvolvidos dobrou de ritmo desde o ano passado. O desemprego nos EUA caiu a 4,3%, a taxa mais baixa desde 2001, e, surpreendentemente, a inflação permanece em 1,3%, abaixo da meta de 2% perseguida pelo Fed. Com isso, o BNP Paribas espera que os juros nos EUA fiquem inalterados até o final do ano e subam três vezes no ano que vem, e não quatro, como estimado inicialmente:

— Teremos juros baixos lá fora, dólar fraco, aumento de preços das commodities e inflação baixa no mundo. Isso ajuda o Banco Central brasileiro a continuar reduzindo a taxa Selic, que é fundamental para a nossa recuperação.

Desde abril, o BNP já estima a taxa Selic em 7% no final deste ano, muito abaixo da mediana do mercado. Marcelo Carvalho diz que a projeção está em “viés de baixa” e acredita que o país tem uma oportunidade enorme de reduzir os juros reais de forma estrutural, apesar da incerteza política. Por causa da recessão, há grande ociosidade na indústria e no mercado de trabalho, o que ajuda no curto prazo, o dólar está fraco, e há avanços sendo costurados pela equipe econômica que vão além da aprovação das reformas.

— O fim da TJLP, por exemplo, vai ser muito importante para reduzir a Selic. É o fim do orçamento parafiscal, que tem um custo enorme não contabilizado. A reforma da Previdência original teria uma economia em torno de R$ 120 bilhões por ano, daqui a 10 anos. Se aprovar a idade mínima, a economia gira entre R$ 30 bilhões e R$ 60 bilhões. Não é o ideal, mas já é um número considerável — acredita.

Os cenários dos economistas para o Brasil esbarram sempre no calendário eleitoral do ano que vem. Tudo muda dependendo do candidato que possa vir a liderar as pesquisas, se ele ou ela é pró ou antirreformas. Mesmo assim, o mercado financeiro está convencido de que, independentemente de quem ganhar, o país terá que enfrentar a reforma da Previdência em 2019. Do contrário, viverá “um cenário grego”, ou seja, com a mesma intensidade de crise vivida pela país europeu desde a crise internacional de 2008/2009.

Por isso, a provável mudança da meta fiscal para este ano e o próximo teve pouco efeito sobre a bolsa de valores, o risco-país e o real. Quando há mais tensão na economia internacional, qualquer revés, como a mudança da meta fiscal, pode provocar uma onda de desconfiança em relação ao país.

Há, no mercado financeiro, uma grande expectativa de que a sensação de bem-estar melhore no ano que vem. Haverá aceleração do crescimento, desemprego, inflação e juros em queda. Marcelo Carvalho aposta ainda que haverá uma recuperação do crédito. Segundo ele, os bancos estão prontos para destravar os empréstimos, porque não é possível “viver de tarifas eternamente”. A esperança que ele tem é que essa sensação de mais conforto econômico possa favorecer os candidatos que defendem o ajuste. Na verdade, a eleição de 2018 é uma incógnita, a mais incerta das eleições brasileiras.

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