quarta-feira, 2 de agosto de 2017

Para Gilmar, STF cedeu às ‘loucuras’ de Janot

- O Globo

Ministro critica excesso de poder ao MPF para firmar acordos de delações

-BRASÍLIA- O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), voltou a soltar o verbo contra o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Segundo Gilmar, o STF foi muito concessivo e ficou “a reboque das loucuras” de Janot. Na avaliação do ministro, é preciso que a Procuradoria-Geral da República (PGR) volte a “um mínimo de decência, sobriedade e normalidade". Em setembro, haverá troca de comando no órgão: sai Janot e entra a futura procuradora-geral, Raquel Dodge.

Os atritos entre Gilmar Mendes e Rodrigo Janot são antigos, com frequentes trocas de farpas públicas. Ontem, depois de dizer que o direito penal brasileiro virou uma bagunça e uma loucura completa, ele foi questionado se isso poderia melhorar com Raquel Dodge. A resposta foi:

— É preciso voltar a um mínimo de decência e sobriedade e normalidade à Procuradoria da República.

Ele disse que, além da PGR, também houve erros no próprio Supremo Tribunal Federal.

— Certamente, o Supremo também errou. O Supremo foi muito concessivo, contribuiu com essa bagunça completa — disse Gilmar.

Indagado em seguida em que ponto o STF mais errou, ele disse que foi na questão das delações. Na avaliação de Gilmar, foi dado muito poder ao Ministério Público na hora de firmar acordos de colaboração com investigados, podando atribuições do Judiciário.

— As delações todas, as homologações sem discussão. Eu falei aqui. Uma bagunça completa, uma bagunça completa. E ficou a reboque das loucuras do procurador. Ficou a reboque — disse Gilmar.

Ele afirmou que o Brasil vai ter que parar para pensar no que foi feito. Segundo Gilmar, o STF precisa se reposicionar sobre algumas questões.

— Tudo isso é uma loucura completa, estabeleceu uma loucura completa. O direito penal foi todo reescrito nesse período. Então isso precisa ser arrumado. O Brasil tem que de novo parar para pensar. A gente bagunçou tudo, agora temos que arrumar. É isso que tem que fazer — disse Gilmar. — Certamente, o tribunal vai ter que se reposicionar, até para voltar a um quadro de normalidade de decência.

APÓS NOVO PEDIDO DE PRISÃO
Gilmar partiu para o ataque contra Janot um dia depois de o procurador-geral reafirmar o pedido de prisão do senador Aécio Neves, presidente afastado do PSDB. No pedido, Janot mostra que, na suposta manobra pra esvaziar a Operação Lava-Jato, Aécio acionou o ministro. Num telefonema ao ministro, Aécio pede a Gilmar para cabalar o voto do senador Flexa Ribeiro (PSDBPA) em favor do projeto de lei sobre abuso de autoridade.

Gilmar é relator de pelo menos dois inquéritos abertos a partir da Lava-Jato contra Aécio. “Agindo no sentido de concretizar essa empreitada (atrapalhar a LavaJato), o senador Aécio Neves ligou, no dia 26 de abril de 2017, para o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes, numa atitude inusual, pedindo para que este convencesse o senador Flexa Ribeiro para votar favoravelmente ao projeto de lei de abuso de autoridade”.

O projeto surgiu a partir de uma articulação de senadores e deputados interessados em enfraquecer juizes, delegados e procuradores responsáveis por grandes investigações. Depois de conversar com Gilmar, Aécio ligou para Flexa Ribeiro dizendo que um amigo iria ligar para falar com ele. Antes do diálogo com o ministro, Aécio já tinha sido flagrado em conversa com o empresário Joesley Batista falando sobre medidas para esfriar a Lava-Jato.

Ele e outros senadores queriam aprovar também anistia geral para políticos acusados de caixa dois, base de várias inquéritos sobre corrupção. Aécio também fala sobre demissão do então ministro da Justiça, Osmar Serraglio, e da troca de delegados da Polícia Federal. A ideia seria escalar delegados “amigos” para conduzir algumas investigações. Procurado pelo GLOBO, Janot não quis comentar as declarações de Gilmar.

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