quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Dominó do crime

Qual será o futuro dos delatores e das provas apresentadas no acordo de delação premiada?

Vera Chemim* | O Estado de S.Paulo

O atual contexto político-institucional apresenta muitas nuances entre o preto e o branco, no que diz respeito ao futuro próximo dos delatores da JBS e das provas que apresentaram em sua delação, ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Diante da ainda suposta omissão e/ou depoimentos que demandam um profundo exame jurídico para serem corroborados ou não, o objetivo imediato é saber:

- o novo desdobramento daquelas delações, principalmente, no que se refere às provas coletadas, ambos, objeto de decisão do STF; e
- o seu impacto, caso elas sejam anuladas, nas várias investigações em curso, que envolvem nomes de políticos tradicionais, como Lula, Dilma, Temer, Aécio Neves, bem como alguns dos ministros do atual governo.

A Corte terá ainda, a importante missão de julgar a suspeição de Janot, uma vez que estará em jogo, uma provável e segunda denúncia contra Temer e a decorrente validade das provas dos mesmos delatores.

Com relação ao primeiro aspecto, há que se reconhecer o caráter aberto de algumas das normas que compõem a recente Lei n.º 12.850/2013, que propiciam uma interpretação diversa por parte do seu intérprete, levando a uma certa insegurança jurídica quanto às decisões a serem tomadas.

A despeito de tal observação, a suspensão dos benefícios concedidos a Josley e Saud poderão ser definitivamente rescindidos, se for comprovada a omissão e/ou falsidade de delitos inexistentes ou de delitos cometidos pelos delatados e que não foram denunciados por meio do acordo de delação premiada.

Nessa direção, o perdão judicial concedido pela PGR aos delatores será revogado e eles serão julgados pelos crimes cometidos, além de sofrerem as sanções decorrentes, (reclusão e aplicação de multa) acrescidas das penas correspondentes à possível falsidade e/ou omissão de fatos previstos nos artigos 19 e 21, da Lei 12.850 e do artigo 342, do Código de Processo Penal.

Com relação ao disciplinamento de provas é importante ressaltar que o acordo de delação premiada é um negócio jurídico considerado personalíssimo, uma vez que se refere à pessoa do delator, enquanto colaborador da justiça. No entanto, representa apenas, um “meio de obtenção de prova”, o qual será corroborado e alcançará êxito, quando levar à efetiva coleta de provas idôneas que provocarão finalmente a sua eficácia.

Tomando como pressuposto, o fato de que Joesley e Saud tenham omitido informações ou feito afirmações falsas, o STF terá que examinar com muita cautela toda a documentação disponível, assim como proceder a uma profunda investigação para poder emitir um juízo técnico definitivo sobre a validade das provas anteriormente apresentadas pelos delatores.

No caso de as provas serem reconhecidas como ilícitas pelo STF, todas as investigações voltarão à estaca zero, tendo que ser reiniciadas e redirecionadas para a obtenção de novas provas para poderem integrar um processo.

O fundamento para a ilicitude das provas estaria disposto no inciso LVI do artigo 5.º, da Constituição Federal de 1988 e no artigo 157, do Código de Processo Penal que prevê a ilicitude de provas, quando obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.

Na hipótese de serem consideradas lícitas, independentemente do processo e das sanções a serem impostas aos delatores, as provas continuarão válidas e comporão em caráter definitivo todos os processos dos agentes até então envolvidos.

Nesse sentido, o § 1.º do artigo 157 dispõe: ”são igualmente inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras”.

O § 2.º define fonte independente como “aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova”.

Pode-se entender pelo teor dos referidos parágrafos, que: 1.º, tendo as provas sido obtidas por fonte independente do suposto vício originário (o fato de elas serem obtidas por intervenção de funcionário público ou de qualquer outro meio considerado legalmente ilícito) e sem nexo causal entre as mesmas e 2.º, com forte potencial para serem corroboradas durante a investigação ou a instrução criminal, elas serão lícitas, descartando-se assim, a teoria do fruto da árvore envenenada (vício originário).

Levando-se em consideração o número de agentes públicos e políticos indiciados e a relevância dos supostos crimes contra a Administração Pública, a possibilidade maior é a de se dar andamento às investigações e aos processos correspondentes, com base nas provas preexistentes.

Finalmente, quanto à suspeição de Janot, o STF muito provavelmente o manterá nas investigações relacionadas ao presidente Temer, em função do pouco tempo que lhe resta na chefia do MPF.

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*Advogada constitucionalista com mestrado em Administração Pública pela FGV-SP

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