terça-feira, 26 de setembro de 2017

Primeiras, segundas e terceiras intenções | Raymundo Costa

- Valor Econômico

Texto do Senado tem emenda chamada Doria

A dita mãe de todas as reformas deu em nada, ou melhor deu no fundo para financiar as campanhas eleitorais que era aonde todos queriam chegar. Nem mesmo o fim das coligações nas eleições proporcionais (vereadores e deputados), primeira medida para o enxugamento partidário, deve ser comemorada, visto que ficou para 2020 e até lá sempre se pode dar um jeitinho para que tudo permaneça como está. O passado fala pelo Congresso.

Segundo cálculo feito nos partidos, apenas o fim da coligação proporcional (na qual uma legenda pequena se junta a outra maior para conseguir um ou dois deputados) reduziria o número de 25 partidos atualmente representados na Câmara dos Deputados para seis ou sete, nas próximas três eleições. A Câmara também aprovou a cláusula de barreira, pela qual os partidos devem ter um percentual mínimo de votos nacionalmente, mas esta exigência também foi rebaixada. E a redução do número de partidos é fundamental para a retomada das condições de governabilidade no país.

A esta altura, a verdadeira reforma está sendo tecida no Senado a partir de um esboço desenhado pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR) para o fundo eleitoral. O texto final deve ser dado pelo senador Armando Monteiro (PTB-PE), provável relator da matéria, ainda a confirmar. Da Câmara deve ficar o relatório aprovado da deputada Shéridan (PSDB-RR) - cláusula de barreira mitigada e o fim das coligações nas proporcionais.

Entre uma coisa e outra tem o relatório do deputado Vicente Cândido (PT-SP), a ser votado entre hoje e amanhã. Suas possibilidades são mínimas. Entre outras barbaridades, prevê que não pode ser candidatos em 2018 pessoa com menos de um ano de filiação partidária. A lei atual prevê seis meses. Um casuísmo para tirar do jogo candidatos como Joaquim Barbosa e Ayres Britto, ex-presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), ou o juiz Sergio Moro, para citar alguns exemplos.

É improvável que o relatório Cândido vá em frente. Não existe acordo entre os partidos. O deputado petista perdeu mais de ano com distrações do que realmente importava, que era o fundo. Poderia ao menos levar adiante as negociações para acabar com a farra partidária, o que foi conversado mas ignorado pelo relatório Shéridan. A ideia era fechar as janelas para o troca-troca partidário, sem a perda do mandato, em março de 2018. Se ficar como está, prevalecerá a "Lei Eduardo Cunha", com janelas de dois em dois anos. De qualquer forma, ainda há tempo.

Levantamento publicado na edição de ontem do jornal "O Estado de S. Paulo" revela que, desde 2015, nada menos do que 124 deputados trocaram de partido, dos quais 31 mudaram mais de uma vez. É a legislatura mais infiel dos últimos dez anos. Uma vergonha movida a todo tipo de interesse. A fidelidade partidária, sem dúvida, deveria ser um dos pilares de uma reforma política de verdade.

Na prática, a reforma em gestação no Senado trata da questão do fundo e dos tetos de financiamento, salvo as surpresas de última hora. O fundo para financiar as campanhas seria constituído por três fontes. A primeira delas decorrente do fim da propaganda partidária no rádio e na TV. O fundo receberá um valor equivalente à compensação fiscal dada aos veículos de rádio e televisão pela propaganda partidária veiculada no ano anterior à promulgação da lei, ou seja, 2016. Só dessa fonte o fundo seria abastecido com algo em torno de R$ 300 milhões.

É assunto que divide os partidos, por motivos diversos. Existem aqueles que se opõem ao cancelamento do horário partidário, pura e simplesmente, e questionam por que se deve dar isenção fiscal a emissoras que ao fim e ao cabo são uma concessão, como pensa o ex-presidente do PT Rui Falcão. Outra parte acha que depois das eleições o Congresso pode simplesmente repor o tempo dos partidos no rádio e na televisão, e outros que acham o debate ocioso - ninguém mais prestaria mesmo atenção à dissonância de 30 partidos.

A segunda fonte de receitas seria a apropriação de pelo menos 50% das emendas previstas para as bancadas estaduais e a terceira, as multas e penalidades aplicadas aos partidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Pelo cálculo dos parlamentares, o fundo contaria, já para a eleição de 2018, com alguma coisa entre R$ 2,5 milhões e R$ 3 bilhões. Essa composição acaba com a resistência do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE) - ele declarou publicamente que não botaria em pauta qualquer projeto que tirasse dinheiro da saúde ou da educação.

A proposta está virtualmente acordada mas falta passar pelo plenário. Há duas novidades no projeto costurado pelos senadores. A primeira: os recursos serão partilhados de acordo com a composição da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e não apenas com a representação proporcional, como sempre ocorreu. A contribuição de pessoas físicas será de até 10% da renda bruta declarada no ano anterior ao pleito, com um teto de R$ 10 mil, para impedir que empresas dividam grandes contribuições entre seus executivos.

A segunda novidade pode ser chamada de "emenda Doria" - fica proibido o autofinanciamento de campanhas para cargos majoritários, ou seja, presidente da República, governador e senador, em 2018.

150 anos
Além da rede de proteção social, que considera a maior do mundo, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE) acha que basta olhar para as obras de transposição das águas do rio São Francisco para entender por que Lula se mantém popular no Nordeste: "Essa água foi esperada por 150 anos, aí você vai entender o Lula no Nordeste". O senador só não sabe dizer se a popularidade do presidente será suficiente para transferir os votos que tem na região para outro candidato do PT. Neste caso, não tem dúvida: o nome mais receptivo seria o do ex-governador da Bahia Jaques Wagner.

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