sábado, 7 de outubro de 2017

A besta | Hélio Schwartsman

- Folha de S. Paulo

Relembre polêmicas nas artes cênicas e visuais

A vantagem de viver em sociedades multiculturais é que elas trazem diversidade, o que é bom para os negócios (companhias mais diversas tendem a lucrar mais), para a ciência (artigos acadêmicos escritos por equipes mais diversas tendem a ter impacto maior) e para os próprios cérebros de quem vive nessas comunidades (ter seus pressupostos questionados funciona como ginástica mental).

Há, é claro, o outro lado dessa moeda. Grupos menos diversos têm mais facilidade para formar consensos sociais. Oferecem ainda menor espaço para desavenças interpessoais, o que, dependendo de outros fatores, ajuda a reduzir a violência.

Faço essas reflexões a propósito da série de polêmicas envolvendo exposições artísticas. Uma das funções da arte, no que a aproxima da diversidade, é justamente a de provocar estranhamentos e dissensos interpretativos. Uma obra que cause rigorosamente a mesma reação em todos não é uma obra muito boa.

Nesse contexto, é não apenas totalmente esperado como também positivo que a tribo dos progressistas e o clã dos conservadores discordem com veemênciaem seus juízos sobre "Queermuseu", a peça com Jesus como transexual e, mais recentemente, a performance "La Bête", que teve sua octanagem octuplicada pelo fato de uma criança ter interagido com o artista nu. Não há problema nenhum, além da falta de educação, em que os dois lados vociferem e se xinguem.

Só o que não pode, se quisermos permanecer no terreno da democracia e do respeito à diversidade, é que se use a intimidação e o poder do Estado para calar artistas ou impedir o acesso do público a espetáculos.

Vivemos num mundo complexo, mas a solução para o problema em questão é surpreendentemente simples. Quem não gosta de determinado gênero, estilo ou temática de arte não é obrigado a contemplá-la, mas não tem o direito de determinar o que os outros podem ver.

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