terça-feira, 31 de outubro de 2017

A mediocridade do crescimento de 95 a 2016: Antonio Delfim Netto

- Valor Econômico

O quadro geral dos últimos 20 anos é desolador

Os números preliminares do Comitê de Datação dos Ciclos Econômicos (Codace) da Fundação Getulio Vargas, sugerem que a grande recessão que vivemos teve início no segundo trimestre de 2014 e terminou no quarto trimestre de 2016. Durou 11 trimestres. Produziu uma queda acumulada do PIB da ordem de 9%. Tratou-se de um ciclo absolutamente autóctone, produzido por uma política econômica voluntarista a partir de 2012, como se vê na tabela 1 abaixo.

Como é evidente, a comparação do comportamento de uma economia tem que ser referenciada à conjuntura real da economia mundial em que ela esteve inserida. No período registramos uma taxa de crescimento 15 vezes menor do que a de nossos companheiros (emergentes + em desenvolvimento) e 5 vezes menor do que as economias avançadas. Mais trágica foi a "variabilidade": 61 vezes maior do que a dos emergentes e 40 vezes maior do que as economias avançadas.


Se chamarmos o retrato de caótico não estaremos exagerando. O que surpreende é assistir ao espetáculo da oposição no Congresso. Cega pela paixão ideológica, recusa a aritmética em favor da "lógica do grito" e atribui tal tragédia à administração de Temer. Ela deixará sua marca registrada no resultado da mais pobre e irresponsável CPI já feita no Congresso, onde se "provou" que a Previdência é "superavitária"!

Como se saíram os governos FHC e Lula na mesma perspectiva? Comecemos pela administração de FHC, de 1995 a 2002. A tabela abaixo, a revela. Vê-se que a coisa não foi muito melhor do estrito ponto de vista do crescimento, que é o que interessa no longo prazo, porque é a condição necessária (ainda que não suficiente), para aumentar a inclusão social. Nosso crescimento foi cerca de metade dos emergentes e sua volatilidade 2,5 maior. É preciso alguma boa vontade para ver nisso uma grande virtude. Noutras dimensões (na inflação e numa certa ordem fiscal) há o que dizer sobre ela.

A administração Lula (2003-2010) está retratada na tabela 3 abaixo. Vê-se que, em matéria de crescimento econômico, a situação efetivamente melhorou. É certo que Lula se beneficiou: 1) da organização produzida por FHC (até a saída do ministro Palocci a política econômica foi a mesma); e 2) da rápida melhoria das relações de troca que ele soube aplicar em medidas de inclusão social. Quando comparado com a evolução das outras economias o resultado empalidece.

No governo Lula, o Brasil cresceu a uma taxa anual 70% maior do que no governo FHC, mas, se comparada com o crescimento dos emergentes, a situação se inverte: crescemos 40% a menos com mais que o dobro da variabilidade! Isso continua a garantir-lhe uma sólida aprovação por parte do eleitorado que recebeu os benefícios. Não há nada de surpreendente nisso, uma vez que o eleitor não percebe que nas mesmas circunstâncias uma política econômica mais adequada talvez pudesse ter melhorado muito mais a sua situação.

O quadro geral dos últimos 20 anos é desolador. O Plano Real e a melhoria institucional promovida por FHC foram bem-sucedidos no controle da inflação, mas a taxa de crescimento do PIB (que no longo prazo é o que importa à sociedade) ficou muito aquém da dos outros emergentes, como se vê no quadro 4 abaixo. Crescemos a uma taxa 50% menor do que os outros emergentes, com uma volatilidade 3,5 vezes maior! No período, o Brasil cresceu apenas 46% do crescimento dos emergentes.

Duas décadas de resultados tão medíocres estão a exigir uma profunda reflexão sobre as políticas econômica e social e sugerem a formulação de um sério projeto do que queremos ser em 2040. Se não acertarmos na eleição de 2018, talvez nunca mais nos livremos da armadilha em que fomos metidos.
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Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.

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