quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Reforma política muda pouco, mas traz avanços | Editorial | Valor Econômico

Com muito mais razões do que nas tentativas anteriores, a reforma política termina como mais um remendo provisório - à espera de uma nova reforma. Votações finais ocorrem ainda esta semana no Senado, mas a maior parte da miríade de ideias estapafúrdias de ocasião foram felizmente sepultadas. Sob pressão da lei, a maior e quase exclusiva preocupação dos parlamentares foi a de assegurar a reeleição e a prerrogativa de foro da qual muitos continuarão necessitando. A outra motivação foi como conseguir dinheiro para bancar uma campanha que lhes garantisse isso.

Uma solução de compromisso trouxe a aprovação de mudança fundamental, a do fim das coligações partidárias, que cortará o oxigênio à profusão das legendas de aluguel que se espalharam pelo sistema político e contribuiram para a exaustão negocial dos governos de coalizão, tornaram cada vez mais instáveis os arranjos de maioria para as votações no Congresso. Além disso, com a medida, que só valerá para as eleições de 2020, terminará a fraude institucionalizada a que o eleitor era submetido, a de votar em um candidato de um partido e eleger um outro, desconhecido, ou com programa oposto.

Outro dos poucos pontos positivos que restaram foi o da cláusula de desempenho, na verdade mais flexível do que se poderia esperar da denominada "barreira". Já em 2018, a legenda que não obtiver 1,5% dos votos distribuídos em um terço dos Estados, com um mínimo de 1% dos votos válidos em cada um deles, ou não eleger 9 deputados federais, não terá direito aos recursos do fundo partidário nem à divisão do tempo de TV nas campanhas eleitorais. O eleito por partido que não atingir a performance estabelecida poderá filiar-se a outra legenda e ter presença assegurada no parlamento. Por meio de uma escala, esse desempenho obrigatório será progressivamente maior, até atingir 3% dos votos ou 15 deputados em 2030.

Especialmente na Câmara dos Deputados, a usina de ideias ruins e outras péssimas esteve em pleno funcionamento, mas, felizmente, a quase totalidade delas foi descartada, seja em comissão, seja no plenário. O relator Vicente Cândido (PT-SP), por exemplo, apresentou a proposta de impedir que 8 meses antes do pleito os candidatos pudessem ser presos. Batizada de "emenda Lula", foi arquivada, por esdrúxula.

Para garantir eleição aos que já detém cargo legislativo, criou-se a aberração do distritão, pelo qual só os mais votados seriam eleitos, mas isso também não prosperou. O distritão foi vendido como um expediente de transição para as eleições de 2022, quando entraria então em vigor um sistema distrital misto, em que parte dos candidatos é eleito por quantidade de votos, parte em distribuição por voto na legenda. A proposta também foi para a lata do lixo.

Na cláusula de desempenho, tentou-se instituir uma salvaguarda para que tudo continuasse como está, apenas com outro nome. Seriam formadas federações entre os partidos para que pudessem sobreviver e obter o desempenho exigido, e os eleitos teriam de atuar em bloco no parlamento. A racionalidade prevaleceu e as federações foram enterradas.

O capítulo do fundo que irá sustentar a próxima campanha eleitoral ainda está em aberto e foi o que mais estimulou a criatividade do Congresso. Houve a tentativa de espetar no orçamento a dotação de 0,5% da receita corrente líquida para essa finalidade - algo como R$ 3,6 bilhões, que conviveria com o fundo partidário existente, de quase R$ 900 milhões. A reação da opinião pública não foi exatamente receptiva a esse projeto. Em sua última versão, os recursos viriam de duas fontes: do tradicional fundo partidário e de metade do valor das emendas dos congressistas no orçamento. Em 2017, o total de emendas é de R$ 6,4 bilhões ou R$ 10,8 milhões por parlamentar.

No rol dos fiascos merecidos constam ainda as doações individuais não identificadas, a permissão para que partidos fizessem bingos, loterias e rifas, e o cerceamento da realização e divulgação das pesquisas eleitorais.

Nenhuma reforma é melhor do que uma reforma ruim, e a que sai agora do Congresso muda pouco, mas traz progressos importantes. Ela deve diminuir o número de partidos, diversidade que será aos poucos abrigada nas grandes legendas amorfas existentes, da qual o maior exemplo é o PMDB. Um conserto de maior envergadura ficou de novo para o futuro.

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