segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Retomada tira empresas de aplicações em títulos | Angela Bittencourt

- Valor Econômico

PIS/Pasep e juro do consignado põem consumo no radar

A perspectiva para a economia é sinalizada por indicadores de atividade e indicadores financeiros. A atividade, em alta ou em queda, tem efeito na confiança que consumidores e empresários têm na recuperação. A produção industrial, as vendas no varejo e o mercado de trabalho avançam, prova o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No mínimo por contágio, todos os índices de confiança construídos e monitorados pela Fundação Getulio Vargas (FGV) estão em alta, à exceção do Índice de Incerteza da Economia (IIE) que melhora quando cai - e está caindo.

Os indicadores financeiros são usualmente representados pela trajetória da taxa de juros e da demanda por crédito. A taxa Selic está próxima de sua mínima histórica. Hoje, a Selic é de 8,25%, mas já é vista a 7,50% nas projeções para o resultado da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) marcada para o fim deste mês. Em dezembro, no último encontro do Comitê, deve chegar a 7%. A demanda por crédito não cresceu em agosto, segundo os dados mais recentes divulgados pelo Banco Central (BC). Contudo, a movimentação de um estoque de dinheiro, em particular, autoriza apostas no crescimento econômico que pode ser diferenciado no seu ponto de partida.

Empresas brasileiras, que chegaram a manter, em 2016, quase R$ 220 bilhões em aplicações financeiras temporárias em títulos públicos federais, reduziram em cerca de 60% essas operações.

Essa modalidade de investimento - remunerado pela taxa Selic e de liquidez garantida por recompra dos títulos pelo BC em data predeterminada - marcou seu recorde de volume em março do ano passado, quando era corrente a expectativa de que a ex-presidente Dilma Rousseff não escaparia do pedido de impeachment por crime de responsabilidade. Confirmado. Dois meses depois, em maio de 2016, Dilma era afastada provisoriamente do cargo e, no fim de agosto, definitivamente.

Um ano depois, em agosto de 2017, a aplicação das empresas em operações compromissadas do BC estava em R$ 89 bilhões. Esse desmonte espetacular, que pode explicar resistência aos empréstimos bancários, não ocorreu da noite para o dia. As empresas começaram a resgatar os seus recursos no quarto trimestre de 2016.

No primeiro trimestre de 2017, os resgates foram substancialmente reduzidos, mas voltaram a aumentar no segundo trimestre e as estatísticas do BC sobre meios de pagamento revelam que o movimento prosseguiu no terceiro trimestre. Em doze meses encerrados em agosto, aproximadamente R$ 68 bilhões já estavam em mercado - distante portanto de amarras impostas, embora temporariamente, pelas aplicações na carteira de títulos públicos que pertence ao BC.

Passado o choque de meados de maio, provocado pela delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista, sócios do Grupo J&F, que instalaram o presidente Michel Temer no centro da Lava-Jato, a queda persistente da taxa de juro - orientada pela política executada pelo BC - contagiou investidores não financeiros com a tentação de mobilizar seus próprios recursos como alternativa ao crédito. Não indefinidamente, mas ao menos até o fortalecimento dos índices de confiança na retomada. A utilização de dinheiro próprio sanciona a expectativa de que a estrutura produtiva no país vai se reerguer, possivelmente, em base menos endividada.

Disposição à maior cautela com processos de endividamento também evita maiores percalços na retomada. Somam-se a isso a existência de considerável capacidade ociosa na indústria brasileira e a percepção de que consumidores potenciais estão à espreita, aguardando o melhor momento para voltar às compras.

Não à toa, consumidores estão mais otimistas. A depender do governo, eles podem começar a arregaçar as mangas e competir pelos melhores preços a partir deste último trimestre. Após a liberação de R$ 44 bilhões de contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), estão autorizados saques nas contas do PIS/Pasep em um total estimado em R$ 15,9 bilhões. O calendário foi anunciado na quinta-feira passada: a partir de 19 de outubro podem sacar os que tem mais de 70 anos; a partir de 17 de novembro os aposentados; e, a partir de 14 de dezembro, os demais cotistas beneficiados pelo critério de idade. O Natal será mais comemorado.

Também na quinta-feira, indiretamente, o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, acenou com o ingresso de mais R$ 5 bilhões em circulação ao longo de um ano. Esse montante de recursos é equivalente à economia com pagamento de juros por tomadores do crédito consignado - descontado em folha de pagamento. A folga no orçamento das famílias será proporcionada pela segunda redução do teto da taxa de juro em 2017 cobrada nesse segmento. Para os servidores públicos, grupo mais numeroso de beneficiários da cobrança de juro bem inferior ao de mercado, o teto do consignado passou de 2,20% ao mês para 2,05% ou de 28,9% anualizados, para 28%. Para aposentados e pensionistas, o teto do consignado recuou de 2,14% ao mês para 2,08%.

O editor-assistente Gabriel Caprioli detalha, em análise publicada nesta edição do Valor , a trajetória favorável e generalizada do sentimento de consumidores e dos empresários. Os índices de confiança, em evidente melhora no início do ano, sofreram avaria considerável com a instabilidade política mais aguda provocada pela inesperada delação dos irmãos Batista.

O Índice de Confiança na Indústria (ICI) da FGV foi escolhido há alguns meses por analistas do banco UBS para um estudo que concluiu: todas as vezes que esse índice aproximou-se de 100 pontos, ao final de doze meses à frente a economia brasileira cresceu pelo menos 2,5%. Essa indicação para o PIB, visto nas projeções do mercado, revela um fundo do poço em 70 pontos. Em meados de 2015, o ICI chegou a 72,70 pontos. Em maio deste ano, alcançou 92,30. O "tombo Batista", rompeu o suporte de 90 pontos. Em agosto, o ICI havia retornado aos 92,20 pontos.

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