sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Claudia Safatle: A mais lenta recuperação da história

- Valor Econômico

Sete anos de déficit público explica a demora da retomada

A economia brasileira passou por nove recessões dos anos 1980 para cá, mas a lentidão do atual processo de recuperação da atividade não encontra paralelo na história do país. Também é inédita a profundidade da deterioração fiscal de hoje. O déficit primário deverá durar até 2022, completando um ciclo de sete anos de um considerável "buraco" nas contas públicas. O prolongado período de crise fiscal é, muito provavelmente, um elemento a explicar a demora da recuperação.

Técnicos do Ministério do Planejamento fizeram um estudo para encontrar alguma regularidade histórica nas retomadas do crescimento após as recessões, usando como medida o crescimento médio trimestral do PIB nos dez anos que antecedem o começo das retrações. À exceção do início dos anos de 1980 - quando a comparação com a média de dez anos anteriores ficou comprometida pela alta performance do PIB durante o "milagre" econômico -, em todos os demais casos o país cresceu mais do que a média do período anterior.

A conclusão, feitos vários exercícios, é de que a retomada esperada pela pesquisa Focus, do Banco Central, está muito aquém do padrão e é mais demorada do que a mais lenta de todas, que ocorreu em 1998. Isso ocorre mesmo considerando a projeção mediana do Focus acrescida de um desvio padrão (ver gráfico abaixo).

Em outro texto, os técnicos do Planejamento, sem encontrar correlação histórica no país, estabelecem um comparativo com os Estados Unidos e identificam uma grande similaridade entre a recuperação da economia brasileira hoje e a da economia americana no pós-crise global de 2008/2009.

A natureza dessas crises, é claro, são bem distintas. Nos EUA a recessão decorreu do colapso do sistema financeiro. No Brasil, a marca é um desarranjo fiscal sem precedentes. Lá, depois de uma acentuada recessão, só se retornou aos níveis do PIB pré-crise após 15 trimestres. Aqui, segundo a pesquisa Focus, serão necessários 23 trimestres para o PIB voltar ao desempenho anterior à crise. Em ambos os casos, a inflexão começou pelo aumento do consumo das famílias.

É grande a semelhança entre os componentes da demanda nos dois países. O peso do consumo no PIB supera 60% e o do investimento é próximo de 15%. Nos dois casos a recessão teve início no investimento, que também demora mais a voltar ao patamar anterior à crise, por causa do aumento da ociosidade da economia; e a reversão se deu pela expansão do consumo.

No caso do Brasil, houve a ajuda do saque de R$ 44 bilhões das contas inativas do FGTS - uma ponte até a queda da taxa básica de juros começar a fazer efeito - para inverter nove trimestres consecutivos de retração do consumo das famílias.

Segundo o trabalho do Planejamento, serão necessários cerca de 18 trimestres para o consumo voltar ao nível do fim de 2014. Ou seja, só em 2019, o que também puxará o PIB para algo mais próximo do que era antes da recessão.


O investimento somente deverá retornar ao crescimento que precedeu a recessão por volta do ultimo trimestre de 2022. Isso significa que vão se passar 32 trimestres entre o princípio da recessão e a retomada da expansão do investimentos.

O PIB per capita teve retração de R$ 3 mil por brasileiro, com queda de 9% sobre seu maior valor, em 2013, e também vai demorar a retomar o padrão anterior.

Segundo o secretário de Planejamento e Assuntos Econômicos, Marcos Adolfo Ferrari, que coordenou esses trabalhos, uma série de medidas já foram e vêm sendo tomadas pelo governo para acelerar a recuperação da atividade no país, seja mediante a expansão do consumo privado ou do investimento. Medidas que vão da liberação das contas do FGTS e, agora, do PIS/Pasep, redução dos juros do crédito consignado e ações estruturais, como a reforma trabalhista, à criação da Taxa de Longo Prazo (TLP) e o programa de concessões, dentre várias outras.

São iniciativas que, ressalta ele, não têm custo fiscal para a União e que devem ser potencializadas pela menor taxa básica de juros (Selic), em um ambiente de controle da inflação.

A grande diferença entre as recessões passadas - na sua maioria decorrentes de crises cambiais, de financiamento do balanço de pagamentos - e a atual é que, agora, o problema está na dramática situação das contas públicas domésticas. Não há crise no resto do mundo que, ao contrário, vive um período de prosperidade e alta liquidez, nem restrições ao financiamento das contas externas do país.

Se a raiz da lenta retomada do crescimento está no déficit público e na trajetória crescente da dívida bruta como proporção do PIB, só resta ao país agir para acelerar o ajuste fiscal. E esse é um retrato que realça, uma vez mais, a urgência da reforma da previdência.

Para esta a questão não é "se" mas "quando" será aprovada. E, como já foi dito, ela não esgota a necessidade de reformas para dar ganhos de produtividade à economia e sustentação ao novo ciclo de crescimento.

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