domingo, 5 de novembro de 2017

Luiz Carlos Azedo: O fogo amigo

- Correio Braziliense

O ministro da Justiça, Torquato Jardim, pode pôr as barbas de molho porque o fogo amigo só aumenta. De um dia para o outro, o eixo do problema da segurança pública no Rio de Janeiro, onde a pirotecnia não está dando conta do recado, deixou de ser a infiltração do crime organizado no sistema de segurança e no mundo político para ser a inabilidade do ministro, que disse o que todos os cariocas sabem, embora nem todos gostem de ouvir. O pior ainda está por vir: avançam as articulações do ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, para substituir o diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello, pelo delegado Fernando Segóvia, ligado ao ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes.

Não é de agora que as articulações para substituir o diretor da Polícia Federal estão sendo feitas. O litígio entre o ministro da Justiça e os caciques do PMDB fluminense, principalmente o governador Luiz Fernando Pezão, e o presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani, é grande oportunidade a ser aproveitada. A autonomia da Polícia Federal sob comando de Daiello é uma ameaça para o Palácio do Planalto por causa da Operação Lava-Jato. A rejeição da denúncia do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot não resolveu o problema; apenas blindou constitucionalmente o presidente da República, assim como aos demais envolvidos, entre os quais Padilha, até dezembro de 2018. Quando o mandato de Temer acabar, a denúncia seguirá seu curso inexorável.

Outras investigações que estão sendo feitas pela Polícia Federal chegam muito perto do Palácio do Planalto, ainda mais porque os ex-ministros Geddel Vieira Lima e Henrique Alves e o ex-deputado Rocha Loures, bolas da vez da Operação Lava-Jato, não têm foro privilegiado. Há também uma conexão com a situação do Rio de Janeiro, onde o que seria a “banda boa” da Polícia Militar, para fazer a ressalva que muitos cobram do ministro Torquato, tem profundas ligações com o establishment político fluminense, que está sendo investigado. A grande dificuldade que a força-tarefa comandada pela nova procuradora-geral da República, Raquel Dodge, encontrará pela frente será ter a colaboração do governo fluminense para encontrar essas conexões.

O assassinato de um comandante de batalhão no Méier é suspeito até que tudo seja esclarecido, mas o ministro foi politicamente incorreto ao citar o caso em meio à comoção dos familiares dos policiais militares cariocas mortos, que estão sofrendo com a violência, a maioria homicídios com características de execução. Um dos fios da meada é a própria Lava-Jato, pois o doleiro Lúcio Funaro, que fez delação premiada, era o operador de propina do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, que está preso em Brasília.

Como se sabe, todo crime tem uma motivação e deixa um rastro. Procuradores federais da área criminal estarão carecas de saber que o padrão de queima de arquivo adotado pela banda podre da polícia é a simulação de latrocínio, de preferência com um “bode” para levar a culpa se um dos sicários for preso. Mas, a esta altura do campeonato, a lavagem de dinheiro de propina, no caso dos políticos fluminenses envolvidos na Lava-Jato, talvez seja um caminho muito mais fácil para se chegar à “banda podre” da polícia fluminense, porque o rastro da propina geralmente tem pegadas de policiais ou ex-policiais envolvidos.

Lava-Jato
Ninguém deve se enganar. Os adversários da Lava-Jato estão na ofensiva. O ex-ministro Geddel Vieira Lima, por meio de seus advogados, embora preso, vive dias de caçador: quer que a Polícia Federal informe como ficou sabendo e quem denunciou a existência das malas e caixas com R$ 51 milhões no apartamento de Salvador, com o nítido propósito de anular a investigação no Supremo Tribunal Federal (STF), como aconteceu com a Operação Castelo de Areia. Os deputados petistas Paulo Pimenta (SP) e Wadih Damous (RJ), que são advogados experientes, recentemente, divulgaram entrevista do ex-advogado da Odebrecht Rodrigo Tacla Durán, com propósito de anular a delação premiada de Marcelo Odebrecht.

As grandes bancas de advocacia do país saíram do estado de torpor em que se encontravam desde a delação premiada do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto da Costa, o primeiro êxito da Operação Lava-Jato. Articulam-se para anular os acordos de delação premiada de Marcelo Odebrecht, homologados em janeiro, a “delação do fim do mundo”. Seu efeito pode ser comparado à “teoria do caos”, pois motivou a abertura de investigações contra nove ministros de Temer, 42 deputados e 28 senadores, além de arranhar ou mesmo manchar a reputação de centenas de políticos citados no caixa dois da empresa. A delação de Joesley Batista, que seguiu a mesma receita, atingiu o presidente Michel Temer (PMDB) e serviu de base para a primeira denúncia de Janot contra o presidente Temer, que agora está pessoalmente empenhado em conseguir sua anulação. As delações abriram tanto o leque de acusações que levaram Janot ao isolamento político; entretanto, a delação de Funaro é focada na relação entre Eduardo Cunha e o presidente Temer.

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