sábado, 4 de novembro de 2017

Merval Pereira: A velha política

- O Globo

Pelo jeitão que as alianças políticas para a eleição de 2018 estão tomando, dificilmente veremos uma renovação profunda dos quadros políticos nacionais, por mais que essa seja a vontade do cidadão comum.

Os partidos políticos, que fazem as regras eleitorais, já estão retomando velhos hábitos, e as alianças partidárias continuam refletindo interesses regionais que têm mais a ver com vantagens pessoais do que com programas de governo.

Ao anunciar, terça-feira passada, que estava “perdoando” os golpistas, Lula deu o sinal esperado para reagrupar antigos interesses fisiológicos, separados momentaneamente no impeachment da ex-presidente Dilma. Ela, aliás, vai ser a grande abandonada desta campanha.

Embora insista em que a anulação do impeachment na Justiça é possível, Dilma, pelo jeito, não tem a menor chance de ganhar o respaldo político para tarefa tão ingrata. Mesmo que tenham surgido denúncias de que o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha andou distribuindo dinheiro para ganhar votos contra Dilma, houve também informações de que os executivos da JBS entraram em campo do outro lado, ajudando a comprar votos em favor de Dilma.

E ninguém esquece a presença de Lula na suíte presidencial de um hotel em Brasília, tentando ganhar votos contra o impeachment, tendo ao lado Joesley Batista e suas burras cheias de dinheiro. Não bastassem essas dificuldades, Lula já havia dito dias atrás que o eleitorado se sentiu traído pela ex-presidente quando ela começou a tentar fazer o reajuste das contas públicas com um ministro da Fazenda saído das hostes adversárias.

O ex-prefeito de São Bernardo Luiz Marinho, um dos petistas mais próximos ao ex-presidente Lula, admitiu em entrevista recente que a maioria do povo apoiou o impeachment de Dilma, “e nós precisamos recuperar a maioria do povo”, justificando a permissão de Lula para que alianças eleitorais sejam feitas com partidos que eram chamados de golpistas.

Luiz Marinho ainda insinuou que Dilma não será candidata a nada nas eleições de 2018 e, sendo assim, sua presença no palanque de Lula “não ajuda nem atrapalha”. Já Lula tentou dar um tom épico ao seu comando de ficar o dito pelo não dito, comparando-se ao mesmo tempo com Getulio, Jango e JK: “Todas as vezes em que a direita neste país resolveu usurpar o poder, a primeira coisa que fez foi destruir moralmente seus adversários. Foi assim com Getulio (Vargas), depois com Juscelino Kubitschek, depois com Jango (João Goulart). Sou mais paciente que Getulio e João Goulart, e talvez mais que JK, que tentaram tirar três vezes, e ele sempre perdoou. Estou perdoando os golpistas deste país”, afirmou o ex-presidente, em ato na Praça da Estação, na região central de Belo Horizonte, durante o encerramento da caravana que percorreu 20 cidades mineiras.

Como explicou Lydia Medeiros no GLOBO, a decisão de Lula não tem nada a ver com sentimentos elevados. A reconstrução da aliança entre PMDB e PT para as eleições de 2018 tem uma base puramente pragmática: o fundo eleitoral recém-aprovado pelo Congresso, de cujo saldo os dois partidos ficam com 25% do total, algo em torno de R$ 450 milhões. O restante será distribuído para mais de 30 partidos.

Esse acordão político-eleitoral, por mais que a retórica seja uma, na prática está em curso também na ação congressual para aprovação de medidas inibidoras das investigações da Lava-Jato, sendo que a mais madura é a lei de abuso de autoridade, posta novamente na pauta pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

A proibição de delação de réus presos, restrição de conduções coercitivas, limites para investigações sobre escritórios de advocacia são outras medidas engatilhadas, com apoios suprapartidários.

Correção
Na coluna de ontem, citei erradamente o traficante Nem, da Rocinha, como denunciante de acordo eleitoral com o ex-governador Sérgio Cabral. Errei de traficante, pois a denúncia foi feita por Marcinho VP, e de eleição, pois o fato ocorreu na eleição para prefeito do Rio. Mas não errei ao abordar a ligação entre o tráfico e as campanhas políticas no Rio, como denunciou o ministro da Justiça, Torquato Jardim. Aliás, a justificativa do ministro, de que falara em caráter pessoal, não em nome do governo, não se sustenta. Ele se baseou em informações colhidas por serviços de segurança e inteligência da Polícia Federal e das Forças Armadas. Nem que estivesse em uma mesa de bar com amigos, estaria falando em nome pessoal.

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