sábado, 24 de junho de 2017

Opinião do dia – Edson Fachin

É preciso ter forças que unam as pessoas e nada mais certo que ter valores fundamentais em torno dos quais a sociedade há de se manter minimamente coesa. É hora da redenção constitucional brasileira, é mais que urgente o tempo de edificar no espaço da grande política o tripé mínimo para a liberdade, a ética e o desenvolvimento, como bem se assentou à época na terra de Nelson Mandela: “para que não se esqueça e para que nunca mais aconteça” . "

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Edson Fachin, ministro relator dos processos da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), O Globo, 24/6/2017

PF conclui que áudio de diálogo de Temer não foi adulterado

PF conclui que não houve edição em áudio de conversa entre Temer e Joesley

Segundo peritos, laudo aponta que conversa gravada entre o presidente e empresário no Palácio do Jaburu tem mais de 100 interrupções, mas não sofreu nenhum tipo de adulteração

Fabio Serapião e Beatriz Bulla, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - A Polícia Federal concluiu que o áudio da conversa gravada pelo empresário Joesley Batista com o presidente Michel Temer, no dia 7 de março, no Palácio do Jaburu, não foi editado ou adulterado. O Estado apurou que o laudo sobre a gravação aponta para mais de cem interrupções, mas que nenhuma delas foi causada por agente externo ou realizada posteriormente à gravação.

De acordo com fontes ouvidas pela reportagem, a perícia realizada no Instituto Nacional de Criminalística relaciona as interrupções ao gravador usado pelo empresário do Grupo J&F, do qual faz parte a JBS.

Perícia da PF conclui que gravação não foi editada

Laudo sobre conversa entre Temer e Joesley será entregue ao Supremo

Áudio tem interrupções causadas pelo gravador, mas não há sinais de manipulação; defesa de Temer, que contratara perito para contestar autenticidade, agora diz que laudo ‘não é verdade absoluta’

Laudo do Instituto Nacional de Criminalística, da PF, concluiu que não houve edição na gravação da conversa entre o presidente Temer e Joesley Batista, dono da JBS. Segundo os peritos da PF, há cerca de 200 interrupções no áudio, mas elas foram provocadas pelo gravador usado pelo empresário. A gravação é íntegra e sem adulteração, concluíram. A defesa de Temer argumentou que o laudo “não é uma verdade absoluta”. Antes, o perito Ricardo Molina, contratado pelo presidente, afirmara haver 50 ou 60 “pontos de obscuridade” na gravação. O laudo da PF será anexado ao inquérito em que Temer é investigado por obstrução de Justiça. A PF já entregou ao ministro Fachin relatório preliminar atribuindo ao presidente o crime de corrupção passiva. O procurador Rodrigo Janot deve apresentar denúncia contra ele na segunda-feira.

Áudio sem edição

Laudo da PF confirma que não houve adulteração do diálogo entre Temer e Joesley

Jailton de Carvalho, O Globo

-BRASÍLIA- Laudo do Instituto Nacional de Criminalística (INC), vinculado à Polícia Federal, informa que não houve edição do diálogo entre o presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista, da JBS, segundo disse ao GLOBO uma fonte que acompanha o caso de perto. A perícia derruba a principal estratégia da defesa de Temer que, até então, buscava dizer que foram feitos cortes e houve manipulação de trechos da conversa gravada por Joesley.

‘Não se pode demonizar a política’, diz Fachin

Relator da Lava-Jato diz que sistema penal não é solução para todos os males

André de Souza, O Globo

BRASÍLIA - O ministro Edson Fachin, relator dos processos da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), disse ontem que a política não pode ser demonizada e que o sistema penal punitivo não é a resposta para todos os males. Ele também afirmou que o país precisa se reconciliar e que é hora de uma “redenção constitucional”, de modo que o Brasil não se esqueça do que houve de errado e não deixe isso acontecer de novo.

— Falar de Constituição corresponde também a sustentar que não se pode demonizar a politica. Não será o sistema penal punitivo a resposta de todos os males. Nos dias correntes, a propósito, permito-me trazer a lição do eminente ministro Cezar Peluso, a quem muito admiro, segundo o qual nenhum juiz verdadeiramente digno de sua vocação condena alguém por ódio — disse Fachin durante um debate no STF, fazendo uma referência ao ex-ministro do STF que deixou o tribunal em 2012. — Nada mais constrange o magistrado do que ter de, infelizmente, condenar um réu em matéria penal, afirma o ministro Peluso.

FH diz que Lula é um candidato ‘derrotável’

Para ex-presidente tucano, Michel Temer deveria deixar o governo antes de 2018

- O Globo

SÃO PAULO - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso criticou ontem a Justiça Eleitoral, que absolveu o presidente Michel Temer. FH voltou a defender a ideia de convocação de eleições antecipadas e disse a empresários e profissionais do setor de saúde, que ouviram sua palestra num hotel de luxo em São Paulo, que eles devem estar preparados para enfrentar o também ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas urnas.

— O Lula está por conta da Justiça, não sei o que a Justiça vai fazer. Mas suponhamos que a Justiça diga que o Lula não fez nada: ele é candidato, é o único candidato possível (do PT). Só resta vencer na urna. Ou então dar golpe, mas como eu sou contra golpe, só resta é vencer na urna — afirmou FH, em evento mediado pelo colunista do GLOBO Merval Pereira.

FH disse achar difícil Lula recuperar “o que perdeu na classe média” e não acreditar que o petista “seja não-derrotável”.

'Gravíssimo', diz FHC sobre denúncia de Temer

Ex-presidente diz que ação movida pela PGR, por um lado, 'é sinal de que as instituições estão independentes, por outro lado, é gravíssimo' e volta a defender antecipação das eleições

Adriana Ferraz, O Estado de S.Paulo

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) ressaltou na manhã desta sexta-feira, 23, que o País caminha para uma situação inédita e muito séria: a de ter um presidente da República denunciado por corrupção.

"O procurador-geral da República, baseado em uma investigação da Polícia Federal, que é submetida à Presidência, se dispõe a mover uma ação contra o presidente. E por corrupção. Isso nunca houve", disse o tucano durante palestra em São Paulo. "Se por um lado isso é sinal de que as instituições estão independentes, por outro lado, é gravíssimo."

Ao falar sobre a chance do presidente Michel Temer (PMDB) ser denunciado pelo procurador-geral Rodrigo Janot, FHC lembrou os últimos dias de Getúlio Vargas.

"Quando Getúlio Vargas era presidente, em um tempo em que os militares estavam muito assanhados, existia a chamada 'República do Galeão', formada pelo pessoal da Aeronáutica que fazia inquéritos militares. Um dia, chamaram o irmão do Getúlio, Benjamin Vargas. Pouco depois, Getúlio se matou porque descobriu que o irmão estava metido em confusões junto com o chefe de sua guarda pessoal. Era grave", disse o ex-presidente, que acrescentou: "Não estou dizendo que o Temer se mate, claro, prefiro outra coisa".

A "outra coisa", segundo FHC, é a antecipação das eleições por determinação do próprio Temer. "Ele podia chamar as forças políticas e antecipar a eleição para daqui a oito, nove meses. Isso para ter legitimidade."

O Dilema tucano

O conflito do PSDB é permanecer ou não na base de sustentação do governo Michel Temer

*Marco Antonio Teixeira, O Estado de S.Paulo

“Longe das benesses oficiais, mas perto do pulsar das ruas, nasce o novo partido.” A frase, cuja autoria é atribuída ao governador Franco Montoro, aparece na epígrafe do manifesto de criação do PSDB em 1988. Entretanto, passados quase 30 anos, os tucanos vivem o maior dilema de sua história, que coloca o partido em conflito com suas próprias raízes: permanecer ou não na base de sustentação do governo Michel Temer.

O que está em jogo? Questões que envolvem a sobrevivência do governo Temer, interesses de lideranças com projetos para a sucessão presidencial de 2018 e o naufrágio que pode representar uma eventual condenação de Aécio Neves (MG) pelo STF.

Geraldo Alckmin e João Doria estão liderando a resistência pró-Temer. O aumento da instabilidade política com um possível afastamento de Temer poderia atingir eleitoralmente aliados do governo, como ocorreu em 2016 com o PT, o que poderia comprometer o projeto presidencial de Alckmin. Por isso, continuar apoiando o governo com a justificativa de que é preciso “aprovar as reformas” aparece como explicação na busca de estabilização política.

A defesa de Doria ao governo Temer segue o mesmo caminho, mas incorpora uma tonalidade perigosa. Ao alegar que “nosso inimigo é o PT”, ele aposta que a atual polarização serve de escudo de proteção para o governo e que a disputa PT versus PSDB poderá sobreviver a 2018, por isso vem mantendo uma retórica antipetista agressiva.

Por fim, a tentativa de salvar Aécio é um dos ingredientes que mantêm os tucanos ligados ao PMDB. Certamente, o rompimento do PSDB com o governo também enfraqueceria eventuais iniciativas legislativas voltadas para a diminuição da extensão das punições que políticos dos mais diferentes partidos denunciados pela Operação Lava Jato poderão sofrer.
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*Cientista Político

Conselho de Ética diz que Aécio foi vítima de armação e arquiva pedido de cassação

O pedido de cassação do mandato do senador afastado Aécio Neves (PSDB) foi arquivado pelo presidente do Conselho de Ética, João Alberto de Souza (PMDB). Ele argumentou que não houve quebra de decoro e que o dinheiro que Aécio pediu ao dono da JBS não era propina. “O que eu vi foi uma grande armação que fizeram contra o senador Aécio”, alegou.

Presidente do Conselho de Ética arquiva caso de Aécio

‘Fizeram uma armação contra ele’, diz João Alberto, do PMDB

Maria Lima, O Globo

BRASÍLIA - O presidente do Conselho de Ética do Senado, João Alberto de Souza (PMDB-MA), decidiu arquivar o pedido de cassação do mandato do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG). No início da semana, o peemedebista havia dito que seguiria o entendimento de uma eventual decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o pedido de prisão de Aécio. Mas João Alberto decidiu nem esperar a votação do STF, adiada para a semana que vem.

Depois de receber a análise preliminar da assessoria jurídica do Senado, o presidente do Conselho decidiu não dar prosseguimento ao processo, por considerar que não houve quebra do decoro parlamentar ou flagrante continuado no caso das gravações em que Aécio pede dinheiro ao empresário Joesley Batista. O arquivamento do pedido de cassação no Conselho, entretanto, não devolve a Aécio o exercício do mandato, que continua suspenso pelo STF.

Partidos reagem a proposta que beneficia PMDB

Proposição de Jucá para fundo eleitoral é criticada; deputado do PSOL diz que há risco de compra de bancadas

Maria Lima, O Globo

BRASÍLIA - Amarrada com o apoio inicial de presidentes de sete partidos, a proposta de autoria do líder do governo e presidente do PMDB, senador Romero Jucá (RR), para criação do fundo parlamentar com estimativa de R$ 3,5 bilhões de recursos públicos para financiar a eleição de 2018 passou a enfrentar forte reação entre diversos partidos e poderá ser alterada. O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) alertou para o risco de a nova regra de distribuição, que levaria em consideração o tamanho das bancadas na data de promulgação da proposta, resultar na compra de filiações.

— Definir tudo pelo tamanho das bancadas no momento da promulgação da lei é um convite à compra de filiações, à velha barganha política. Essa portabilidade dos eleitos para outro partido, para o qual migrarem, é um esbulho à ética e ao mínimo bom senso. Um estímulo à mercantilização de mandatos — disse.

Ministro diz que vai trocar o diretor da PF e quer reorganizar instituição

Wálter Nunes, Mario Cesar Carvalho, Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Em reunião de 15 minutos com sindicalistas nesta quinta (22), o ministro da Justiça, Torquato Jardim, anunciou que fazem parte de seus planos promover duas mudanças na Polícia Federal: trocar o diretor-geral, que é uma espécie de fiador da Lava Jato, e colocar em outro órgão os funcionários que cuidam de funções que não têm relação com a atividade policial, como emissão de passaportes e controle de estrangeiros.

A saída do diretor geral, Leandro Daiello, é vista por seus pares como uma tentativa de interferir na investigação, o que o ministro nega.

Um dos nomes cotados para assumir o cargo ocupa o segundo posto na hierarquia da PF, o delegado Rogério Galloro, apontado por seus pares como um policial de perfil mais político.

A indicação de Galloro para o cargo foi feita pelo general Sérgio Etchegoyen, chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República), segundo a Folha apurou.

O general foi o responsável pela indicação do ministro da Justiça e do diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência).

Prévia da inflação é a menor em dez anos

IPCA-15 tem alta de 3,52% em 12 meses. Preço das carnes cai 0,70% em junho

Lucianne Carneiro, Ana PaulaA Ribeiro, O Globo

RIO E SÃO PAULO - Com vários itens registrando queda, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), considerado a prévia da inflação, subiu apenas 0,16% em junho. Em 12 meses, o índice acumula alta de só 3,52% — o menor patamar em 10 anos. Os grupos de alimentos e transportes, que respondem por quase metade do IPCA-15, tiveram deflação. Os preços de alimentos recuaram 0,47% — com queda ainda mais intensa entre os que são consumidos em casa (-0,83%) — e os de transportes, 0,10%.

O preço das carnes teve deflação de 0,70%, como reflexo de uma maior oferta devido à crise da JBS. Houve recuo de preços em vários cortes, como filé mignon (-0,65%), chã de dentro (-1,13%), pá (-1,57%), acém (-1,80%) e lagarto comum (-0,88%). Por outro lado, os grupos que pressionaram para cima a inflação foram habitação — com alta de 0,93%, puxada pela variação de 2,24% da energia elétrica — e saúde e cuidados pessoais, que subiu 0,64%.

Marx não morreu

Por Helena Celestino | Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

RIO - Só 11 pessoas foram à cerimônia fúnebre de Karl Marx, em 1883. "O Capital", a obra que consumira duas décadas da sua vida, estava inacabada e causara-lhe tantos sofrimentos e privações que ele se referia ao trabalho como "o maldito livro". Foi escrito em tempos de convulsão como o atual século XXI, em que tudo que é sólido parece se desmanchar no ar. Às guerras napoleônicas, sucederam-se revoluções pela Europa (França, Itália, Alemanha, Império Austríaco). O capitalismo nascia na Inglaterra e a moderna indústria revolucionava o mundo.

"As inovações ultrapassavam todas as grandes civilizações do passado. Em nome do livre comércio, as fronteiras nacionais foram derrubadas, os preços caíram, o planeta tornou-se interdependente e cosmopolita. Bens e ideias agora circulavam em todos os lugares. Mas tinha um problema. A riqueza não era igualmente distribuída." Parece banal? Agora, talvez, mas essa citação apareceu pela primeira vez no "Manifesto Comunista", um panfleto de 23 páginas distribuído em Londres em 1848, e reapareceu em 1887 em "O Capital", a monumental obra sobre a gênese do capitalismo.

O seu autor, Karl Marx (1818-1883), às vésperas de chegar ao bicentenário de nascimento, não errou. A obra da sua vida completa 150 anos em setembro e, sem notar, incorporamos no falar cotidiano do século XXI as ideias básicas da crítica marxista ao capitalismo. "As pessoas sabem que há desigualdade social, sabem que há luta na distribuição dos recursos segundo a posição de poder de cada um na sociedade. Estou usando outra linguagem, mas isso é luta de classes, e é disso que as pessoas falam", afirma o ex-ministro da Cultura e professor Francisco Weffort, referindo-se ao conflito de interesses entre os "detentores do capital e os que vendem a força de trabalho".

'Socialismo marxista ainda é utopia'

Por Helena Celestino | Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Nascido em 1957, o cientista político alemão Michael Heinrich lê "O Capital" há 43 anos e não acha chato. "Li outras coisas também nesse período", diz em tom de brincadeira. Ele reconhece que Marx sozinho não dá conta de explicar a realidade hoje, mas acha engraçado o sucesso do francês Thomas Piketty, o célebre autor do "O Capitalismo do Século XXI". "Ele descobriu o que os marxistas sabiam", diz Heinrich, autor de nova biografia sobre Marx, a ser lançada no Brasil pela Boitempo em setembro.

Valor: Qual é o principal legado de Karl Marx e de "O Capital"?

Michael Heinrich: Ler "O Capital" como uma análise, e não como um previsão. Nos últimos cem anos, Marx foi lido por suas previsões sobre o colapso do capitalismo, sobre a revolução. Esse tipo de leitura perde o ponto crucial: Marx traz uma análise sobre a estrutura da sociedade capitalista, de suas contradições básicas e da impossibilidade de evitar crises. Marx realmente explica o mundo em que estamos vivendo, não faz uma previsão do que vai acontecer em 50 ou 70 anos. Para entender nossa situação concreta hoje, Marx sozinho não é suficiente, mas sem ele não entendemos nada.

Jornalismo, política e interesses materiais | Marco Aurélio Nogueira*

- O Estado de S.Paulo

Quando um órgão de imprensa toma posição, inúmeras e complicadas mediações interferem

A questão da corrupção entrou em nova fase nos últimos meses, em decorrência do impacto das delações da JBS e da explicitação das divergências entre Executivo e Judiciário, STF e PGR, juízes e procuradores, defensores e críticos da Lava Jato. A grande imprensa dividiu-se e abriu-se uma espécie de disputa entre os principais jornais e revistas. Alguns órgãos passaram a atacar o governo Temer e a figura do presidente, outros saíram em sua defesa, ainda que sem necessariamente deixarem de criticá-lo.

Rapidamente proliferaram explicações associando a atitude dos jornais e das redes de televisão aos interesses do mundo empresarial, que estaria tomando posição diante da crise política, do “reformismo” do governo Temer e da sua maior ou menor serventia para os planos do “grande capital”.

Sempre há “interesses materiais” na base dos conflitos sociais ou das posições políticas. Partidos de esquerda defendem os interesses dos trabalhadores, partidos liberais fazem o mesmo com os empresários, partidos de extrema direita tentam explorar interesses da “classe média”. Não são alinhamentos automáticos ou seguros, especialmente quando se lembra que há distinções poderosas entre as camadas burguesas, entre trabalhadores manuais e intelectuais, operários e prestadores de serviços, e assim por diante.

Escadas ou caminhos | *Cristovam Buarque

- O Globo

Cada grupo busca aumentar os seus benefícios e não o melhor para o país

Houve um tempo em que os políticos debatiam qual o melhor caminho para o progresso, hoje discute-se como o Brasil pode oferecer escadas mais fáceis para permitir ascensão social aos grupos com poder de pressão no uso dos recursos públicos. Procura-se beneficiar indivíduos, não o país. A discussão sobre as reformas, trabalhista e previdenciária, é exemplo deste desvio da estratégia do “caminho” para a estratégia da “escada”.

Cada grupo estuda e defende suas posições, favoráveis ou contrárias às reformas, não em função de qual será o melhor caminho para desamarrar o Brasil e permitir caminhar para o aumento de nossa eficiência, produtividade, justiça, independência, sustentabilidade, incentivo aos jovens, proteção aos velhos, pobres e doentes; mas em função de como evitar perdas para seu grupo, ou para conseguir aumentar seus benefícios ou seus votos. Busca-se escadas para indivíduos, não caminhos para o conjunto do país.

O Termidor da Lava Jato | Demétrio Magnoli

- Folha de S. Paulo

STF hesita em mostrar o caminho da lei, abortando o embrião de um Terror policial e judiciário

O Reino do Terror terminou no 9 do Termidor, 27 de julho de 1794, dia da queda de Robespierre e do início da repressão contra os jacobinos. Treze meses depois, instalou-se a ditadura do Diretório, que abriu caminho ao 18 do Brumário, 9 de novembro de 1799, elevação de Napoleão Bonaparte a Primeiro Cônsul.

A Lava Jato perecerá, desgastada por uma reação termidoriana, se não for contido o espírito jacobino que anima uma parcela do Ministério Público. Deploravelmente, o STF hesita em mostrar o caminho da lei, abortando o embrião de um Terror policial e judiciário.

A crise em curso | Merval Pereira

- O Globo

Sem possibilidades de prospectar o futuro com alguma margem de segurança, por absoluta falta de parâmetros, é possível, no entanto, cruzar informações para se tentar formar um quadro de probabilidades do desenrolar de fatos em curso. De uma palestra de Fernando Henrique Cardoso ontem, em São Paulo, pode-se aprofundar dois ou três fatos fundamentais para o encaminhamento de nossa crise.

O ex-presidente classificou de “momento gravíssimo” e “inédito” este com a possibilidade de ser o presidente da República denunciado por corrupção: “O procurador-geral da República, baseado em uma investigação da Polícia Federal, que é submetida à Presidência, se dispõe a mover uma ação contra o próprio presidente. E por corrupção. Isso nunca houve,” afirmou.

O líder tucano comparou a crise do governo Michel Temer com a que resultou no suicídio de Getulio Vargas, devido às investigações da Aeronáutica na chamada República do Galeão, sobre o atentado contra Carlos Lacerda que matou o major Rubens Vaz, que fazia a segurança do líder da oposição a Getulio. O desfecho trágico, ressaltou Fernando Henrique, no caso de Getulio, poderia ser substituído, no caso de Temer, por um gesto de grandeza do presidente convocando eleições diretas “para daqui a oito ou nove meses”. Pois bem. A Polícia Federal vai encaminhar ao Supremo Tribunal Federal (STF) na segunda-feira o relatório final do inquérito que investiga o presidente Michel Temer, com o laudo da perícia da gravação que ficou pronto ontem à tarde.

Incerto amanhã | João Domingos

- O Estado de S.Paulo

A espinha dorsal da reforma da Previdência pode estar se desmanchando

Por ser impossível saber até se o dia de amanhã será mesmo o dia de amanhã no Brasil, é difícil acreditar que no passo atual o Congresso aprovará a reforma da Previdência no segundo semestre, o novo prazo estipulado pelos articuladores do governo.

Esquecem-se eles de que não dá para fixar prazos para nada, especialmente agora. A delação do corretor Lúcio Funaro está para começar a pipocar por aí. Em paralelo, a ação contra o presidente Michel Temer por parte do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, talvez a conta-gotas. Uma para crime de corrupção passiva, outra para obstrução aos trabalhos da Justiça e, quem sabe, uma terceira para organização criminosa.

Desidratação ou morte | Julianna Sofia

- Folha de S. Paulo

Os perceptíveis desânimo e isolamento de Michel Temer em sua viagem internacional espelham as dificuldades do peemedebista para manter-se no Palácio do Planalto. Em meio à definição da estratégia para esquivar-se das denúncias que a Procuradoria-Geral da República deverá apresentar a partir de segunda (26), o presidente se vira nos 30 para passar a impressão de que as reformas avançam.

A nova Previdência está parada na Câmara desde que o vendaval JBS começou. O postulado corrente é que a proposta será desidratada o suficiente para assegurar sua aprovação. As novas concessões podem atingir pontos nevrálgicos, como a idade mínima para mulheres. Discute-se agora fixá-la em 60 anos, em vez de 62. A ideia inicialmente era estabelecer 65 anos independentemente de gênero, mas esse limite acabou sendo previsto somente para homens.

Intelectual duvida | Míriam Leitão

- O Globo

O economista André Lara Resende mantém a convicção de que a política monetária está errada, mesmo diante da queda recente do índice que, em um ano e meio, foi de dois dígitos a 3,6%. “É altamente discutível se a gente teve sucesso por essa política monetária”, disse ele. A polêmica que começou em artigos agora chegou ao livro. Ele se defende das críticas avisando que intelectual duvida.

André define a política de regra para taxas de juros e metas inflacionárias como a nova ortodoxia, que substituiu a velha teoria quantitativa da moeda, contra a qual ele escreveu no começo da sua vida profissional:

— Durante todo o século XX, a teoria quantitativa da moeda esteve errada. Nunca entendeu a inflação crônica e nunca conseguiu vencer a inflação no Brasil. A ortodoxia dominante sempre foi equivocada. Eu tenho uma longa tradição de crítica a essa política.

A Previdência fatigada | Suely Caldas*

- O Estado de S.Paulo

O comportamento de quem vacila ou se opõe às reformas não é mais ideológico, é político e oportunista

O inverno começou, mas a temperatura vai ferver nos próximos dias em Brasília, com a denúncia que o procurador Rodrigo Janot vai apresentar contra o presidente Michel Temer. Disposto a resistir até um limite desconhecido, é improvável que a denúncia do procurador o leve a renunciar. Ou a se autodemitir, segundo regra que ele próprio criou para os ministros suspeitos de crimes na Lava Jato: se houver denúncia, o ministro será afastado provisoriamente; se a Justiça acolher a denúncia e virar réu, o afastamento será definitivo.

Pressões empresariais – Editorial | Folha de S. Paulo

O BNDES, banco federal de fomento, promoveu nesta semana seminário comemorativo de seu 65º aniversário, ocasião sem dúvida oportuna para repensar sua estratégia de atuação.

Em "sua melhor idade", como apregoava o evento, a instituição ressente-se dos enormes erros cometidos em sua gestão nos últimos anos —basta mencionar a política de campeões nacionais e o agigantamento sustentado por injeções de recursos do Tesouro Nacional.

Não serão pequenas as pressões contra os ajustes necessários, como se depreende da manifestação do presidente da Fiesp, Paulo Skaf, durante os debates.

O líder industrial cobrou retomada vigorosa das operações de crédito, que sofreram queda acentuada em 2016, na administração de Maria Silvia Bastos Marques —ela deixou o posto há poucas semanas, desgastada com o empresariado.

A inflação bem-comportada – Editorial | O Estado de S. Paulo

Num cenário político conturbado, os preços vêm tendo um comportamento surpreendente. Não poucos previram que o agravamento da crise política – provocado pela divulgação, em meados de maio, do conteúdo da delação na qual o empresário Joesley Batista, do Grupo JBS, apontou o envolvimento do presidente da República em esquemas de corrupção – alimentaria a inflação, mas os números mais recentes mostram o contrário.

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 – conhecido como IPCA-15 e calculado pelo IBGE para medir a variação média dos preços nos 30 dias que antecedem a data de corte (dia 15 de cada mês) – registrou aumento de apenas 1,62% em seis meses, a menor alta no primeiro semestre desde 1994, e muito menor do que a alta observada no primeiro semestre do ano passado, de 4,62%. A variação no mês, de 0,16%, é a menor para junho desde 2006, quando se registrou redução média dos preços de 0,15%. Também no acumulado dos 12 meses o resultado é excepcional: os 3,52% agora aferidos estão abaixo dos 3,77% constatados em maio e ficaram acima apenas da variação acumulada em igual intervalo em junho de 2007 (3,44%).

STF sinaliza com segurança jurídica para delações – Editorial | O Globo

Votos já proferidos e outros anunciados levam à preservação do instrumento da ‘colaboração premiada’, sem a qual o combate à corrupção não teria avançado

Não seria mesmo um processo sem percalços o amadurecimento de instituições na luta contra a corrupção, que se tornou sistêmica no Estado brasileiro. Com um tamanho descomunal, no controle, só na esfera federal, de mais de 100 empresas, por onde circulam bilhões de dólares, este Estado passou a ser alvo crescente de quadrilhas formadas por políticos, empresários, burocratas servidores públicos e outros mais. Não é de agora.

No momento, transcorre no Supremo um desses julgamentos capazes de ser divisores de água no embate contra o roubo do dinheiro público, em especial a Lava-Jato. No centro da discussão, o instrumento da delação premiada, sem a qual não teria sido possível sequer começar-se a desencavar o propinoduto do petrolão e outros. Trata-se de um dispositivo legal que funciona também com eficácia em outros países. A possibilidade de criminosos delatarem comparsas em troca de benefícios penais é, por óbvio, arma imprescindível nas mãos dos organismos de Estado que defendem a sociedade. E não só em crimes de corrupção. No caso específico, a reclamação de um político citado na delação do grupo JBS, governador do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), contra a permanência do ministro Edson Fachin, do Supremo, como relator de todo este processo levou ao debate da própria delação premiada e do acordo com o grupo JBS.

Alguns Toureiros | João Cabral de Melo Neto

A Antônio Houaiss

Eu vi Manolo Gonzáles
e Pepe Luís, de Sevilha:
precisão doce de flor,
graciosa, porém precisa.

Vi também Julio Aparício,
de Madrid, como Parrita:
ciência fácil de flor,
espontânea, porém estrita.

Vi Miguel Báez, Litri,
dos confins da Andaluzia,
que cultiva uma outra flor:
angustiosa de explosiva.

E também Antonio Ordóñez,
que cultiva flor antiga:
perfume de renda velha,
de flor em livro dormida.

Mas eu vi Manuel Rodríguez,
Manolete, o mais deserto,
o toureiro mais agudo,
mais mineral e desperto,

o de nervos de madeira,
de punhos secos de fibra
o da figura de lenha
lenha seca de caatinga,

o que melhor calculava
o fluido aceiro da vida,
o que com mais precisão
roçava a morte em sua fímbria,

o que à tragédia deu número,
à vertigem, geometria
decimais à emoção
e ao susto, peso e medida,

sim, eu vi Manuel Rodríguez,
Manolete, o mais asceta,
não só cultivar sua flor
mas demonstrar aos poetas:

como domar a explosão
com mão serena e contida,
sem deixar que se derrame
a flor que traz escondida,

e como, então, trabalhá-la
com mão certa, pouca e extrema:
sem perfumar sua flor,
sem poetizar seu poema.