quinta-feira, 16 de novembro de 2017

Opinião do dia – Norberto Bobbio

(...) donde a recorrente exigência, à qual não se subtrai nem Gramsci, de atribuir ao Estado o caráter da eticidade. Entre as três teorias tradicionais do Estado – que eram as do Estado-força, do Estado de direito e do Estado-direito -, a ideologia italiana dera preferência à primeira e à terceira, ou seja, conseguira converter de vários modos uma na outra, sendo ambas irredutíveis à segunda, em relação à qual havia sempre demonstrado uma invencível desconfiança.

Não mencionei esses autores e essas teorias por acaso. Quem tiver alguma familiaridade com as obras de Gramsci sabe que uns e outras aparecem em seus escritos. Na filosofia política, não Locke ou Montesquieu, mas Maquiavel, com a correspondente literatura (Croce e Russo. Ercole e Chabod) e os da razão de Estado (Zuccolo, por exemplo). Não Tocqueville ou os escritores políticos americanos e ingleses, mas Hegel e os hegelianos napolitanos. Não falta Treitschke. Na ciência política, Gramsci demonstra ter, como se sabe, um conhecimento direto de Mosca e de Michels, cujas teses critica com alguma aspereza, mas considera, de qualquer modo, dignas de atenção. Reconhece a importância de Max Weber, que começara a ser conhecido mais amplamente através da tradução de Parlamento e governo na Alemanha reordenada, por obra do mesmo tradutor da Política de Treitschke, Enrico Ruta.

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Norberto Bobbio (18/10/1909-9/1/2004), ‘Ensaio sobre Gramsci e o conceito de sociedade civil’. p.88, 2ª edição, Editora Paz e Terra, 2002.

*Rubens Barbosa: O Brasil e a nova geopolítica global

- O Estado de S.Paulo (14 Novembro 2017)

País perdeu espaço nos últimos 15 anos e para voltar ao jogo vai ter de pagar um alto preço

A geopolítica tem como objetivo fazer a interpretação dos fatos da atualidade e do desenvolvimento político dos países, além de compreender e explicar os conflitos internacionais e as principais questões politicas da atualidade, a partir do seu território, do produto interno bruto (PIB) e da população.

Tornou-se clichê dizer que o mundo passa por grandes transformações: surgem múltiplos polos de poder, a China volta ao centro do cenário internacional, as dificuldades nos EUA, na União Europeia, a crise do multilateralismo (ONU e OMC) e os rápidos avanços tecnológicos, por exemplo.

Essas mudanças afetaram também a geopolítica, que passou a incorporar três novas dimensões: a construção de espaços regionais, o crescimento do mundo digitalizado (internet, TV) e a expansão dos espaços econômicos sem fronteiras, com a globalização dos fluxos de capital e de investimentos.

O regionalismo afirma-se como uma resposta à globalização, como se observa na Ásia, na Europa e na América do Norte. Na prática, evidencia-se pela negociação de mega-acordos regionais que geram crescente volume de intercâmbio comercial e cadeias produtivas de valor agregado.

Os avanços tecnológicos, com ciclos cada vez mais rápidos, permitem a ampliação dos espaços digitalizados na indústria (4.0) e nos serviços (e-commerce), sem falar no papel que a internet e a televisão desempenham nas comunicações e nos movimentos sociais, com grande impacto na política dos países.

Raul Jungmann: Vigilância continental

- O Globo

América do Sul é uma das regiões mais violentas do mundo

Na reunião dos governadores e ministros em Rio Branco, no Acre, dia 27 de outubro último, o ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes, deu voz a uma proposta coletiva da área de Defesa, Justiça e Inteligência: uma Iniciativa Sul-Americana para a Segurança. O crime organizado não somente cresce com velocidade em escala nacional, expandindo-se dos grandes centros urbanos para regiões do interior, como se transnacionaliza, corrompendo instituições e ampliando seus laços com quadrilhas de outras regiões e países, numa rede poderosa, regional e global.

Como é de conhecimento geral, a América do Sul é uma das regiões mais violentas do mundo. Além disso, é uma das maiores produtoras de drogas ilícitas, sendo o Brasil o segundo maior consumidor de cocaína do planeta.

Murillo de Aragão: Democracia e política

- Blog do Noblat

É tenso, uma vez mais, o momento político que vivemos. A inflação está sob controle, as reformas avançam e a economia volta a crescer. Mas a popularidade do presidente é baixa, a questão fiscal domina a agenda e o cenário sucessório é nebuloso. Itensa contradição.

Nessas horas de angústia, nossa inclinação é, na busca precipitada de uma solução, pôr na mesa aquela discussão que vai e volta sobre nosso modelo de governança. Ou seja, o sistema político de acordo com o qual organizamos a gestão do estado. O parlamentarismo é sempre a alternativa em vista.

Antes de tudo, porém, cabem algumas reflexões a respeito de nossos origens, temperamento e condução atual. Para começo de conversa, não somos uma democracia no sentido moderno nem temos uma boa política na rotina de nossas decisões. Por quê? Nos faltam instituições e, antes mesmo dessas, nos faltaram líderes que nos conduzissem a uma patamar institucional mais sólido.

Roberto Macedo*: Do mercado econômico ao de votos

- O Estado de S.Paulo

As condições para o sucesso nesses dois mercados são muito diferentes

O quadro da eleição presidencial de 2018 mostra Lula como o contendor mais importante. Do outro lado do espectro ideológico pontifica Jair Bolsonaro, ora em busca de orientação quanto ao que vai propor fazer se chegar lá, em particular na economia. Mas até aqui não se mostrou muito aberto a conselhos, dado o seu estilo “deixa comigo”, um tanto “trumpiano”. Entre os dois, o espaço é disputado por vários candidatos em busca de maior destaque.

Nesse contexto, especula-se que alguém de fora da política poderia ser eleito, a exemplo de João Doria na última eleição para a Prefeitura paulistana, quando se disse um gestor, e não um político, cuja classe, com exceções cada vez mais excepcionais, é muito mal vista pelos eleitores em geral.

Essa opção entre um político tradicional e um gestor, ou outra figura que tenha alcançado projeção fora do governo, costuma enaltecer pessoas bem-sucedidas na iniciativa privada. Quanto a isso, li interessante artigo de Jorge Vianna Monteiro, economista especializado em escolhas públicas (public choices, em inglês). A teoria dessas escolhas, que sintetizou em www.escolhaspublicas.com, aponta, por exemplo, que a política macroeconômica não é escolhida só por formuladores em busca de resultados como menor inflação ou maior crescimento do PIB. É plasmada por uma configuração institucional, a escolha pública, em que atuam, entre outros elementos, a autonomia decisória pública, a estabilidade constitucional e a separação de Poderes.

Assim, arranjos alternativos dessas instituições (no sentido lato) condicionam a escolha. Noutro exemplo, este meu, os formuladores da proposta do Executivo de reforma da Previdência Social subestimaram a importância desses arranjos, pois o atual revela forte discrepância de interesses entre o mesmo Executivo e o Legislativo, o que vem prejudicando o avanço dessa proposta.

Merval Pereira: Lewandowski contra o STF

- O Globo

Ao devolver à Procuradoria-Geral da República, sem homologar, a delação premiada do marqueteiro Renato Pereira, o ministro Ricardo Lewandowski está indo de encontro a uma decisão do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) em que ficou derrotado pela maioria. Ele está, monocraticamente, se rebelando contra uma decisão final da própria Corte da qual faz parte.

No julgamento que definiu que os acordos gerados pelas delações premiadas só podem ser revistos caso seja constatada alguma ilegalidade, com base no §4º, artigo 966 do Código de Processo Civil, a maioria do plenário decidiu que o STF deveria avaliar a eficácia pura e simplesmente do acordo firmado, e não seu mérito.

Foi o decano Celso de Mello quem melhor definiu a postura do Supremo, afirmando durante os debates que o STF não pode recusar homologação de acordo de delação premiada aprovado pela Procuradoria-Geral da República, como fez agora Lewandowski, sob o risco de arquivar a investigação.

Pelo entendimento vitorioso no plenário, a legislação em vigor não permite a intervenção do magistrado nessa fase do processo. A homologação só deve levar em conta aspectos formais da delação, como definiu no voto que liderou a divergência o ministro Luís Roberto Barroso: os acordos fechados pela Procuradoria-Geral são analisados em um primeiro momento pelo relator dos processos, apenas sob o prisma da voluntariedade, espontaneidade e legalidade, e num segundo momento, pelo colegiado, na hora de dar a sentença, pela eficácia das denúncias.

Matias Spektor: Dobradinha

- Folha de S. Paulo

Luciano Huck tem até o fim do ano para decidir se entra na corrida pelo Planalto. Quem torce por sua candidatura enxerga nas últimas pesquisas o potencial para construir uma coalizão pluriclassista entre mercado financeiro e classes C, D e E. Enxerga, ainda, um nome para arrancar votos de Bolsonaro no Sul-Sudeste e de Lula (ou de seu indicado) no Nordeste.

Nos próximos dois meses, porém, a decisão de concorrer depende tanto de Luciano quanto de Angélica, sua esposa. O motivo disso não se limita ao impacto de uma campanha na vida da família ou ao fato de ela ter de sacrificar seu espaço na televisão. Há algo mais importante em jogo.

Angélica é um dos principais ativos políticos de uma eventual candidatura Huck. Sua projeção independente junto ao eleitorado tem valor inestimável para uma campanha que, apesar de ter dinheiro, pode terminar com pouco tempo de propaganda oficial na televisão.

José Roberto de Toledo: Procura-se disruptivo

- O Estado de S.Paulo

Como candidato togado, Joaquim Barbosa seria tão disruptivo quanto Huck

É insano o caminho para Luciano Huck viabilizar sua candidatura a presidente. Os primeiros eleitores que ele ainda precisa conquistar são os mais próximos: a mulher, o irmão, o patrão. A Globo lhe deu até o fim de dezembro. Se nem ele nem Angélica aparecerem na grade de programação da emissora para 2018 é porque Huck estará filiado ao PPS e pronto para se lançar em campanha. É salto sem volta. Dará adeus ao Caldeirão, mas não só ele fará sacrifícios.

Com 30 anos de carreira e sucesso como apresentadora de TV, Angélica terá que ser convencida pelo marido a abandonar seu Estrelas e a nova atração que deveria estrear em 2018. Em troca, estrelaria algum programa herdado de Marcela Temer. Na melhor das hipóteses. Se Huck vender o plano à esposa terá dado sinal de que é capaz de negociar com o Congresso sem perder a carteira.

Como animador de auditório, não falta popularidade a Huck. Mas para chegar aos 12% de intenção de voto como candidato a presidente – taxa que políticos interessados na sua candidatura andam ventilando – é preciso que nem Lula nem Bolsonaro apareçam no cartão das pesquisas. Com ambos no páreo, o apresentador fica, hoje, junto dos outros índios da tribo do dígito solitário. Se equipara a Alckmin.

Maria Cristina Fernandes: A cadeira cativa do PP

- Valor Econômico

Partido se habilita para ficar no poder sob qualquer governo

Tirante o partido do presidente da República, o PP é a legenda mais governista. Liderou o centrão no desembarque que selou o destino da ex-presidente Dilma Rousseff e foi a legenda que contribuiu com o maior percentual de votos para que Michel Temer se safasse em ambas as vezes que a Câmara dos Deputados se pronunciou sobre as denúncias da Procuradoria Geral da República.

É também a legenda com a maior proporção de réus na Lava-Jato, mas a blindagem não basta para explicar seu governismo. Nenhum partido trilhou melhor a ponte para o futuro que o PP. Foi sob o PT que o partido ganhou assento no clube dos grandes, mas foi o governo do PMDB que lhe deu cadeira cativa. A partir dela tornou-se o partido mais bem posto para arrebanhar o quinhão tucano no governo, não apenas pelos serviços prestados, mas por aqueles que ainda pode vir a oferecer.

Na segunda-feira, o presidente do PP, o senador piauiense Ciro Nogueira encontrou o presidente. A Previdência não entrou em pauta. A versão espalhada pelo Palácio do Planalto, de que a reforma ministerial está condicionada à sua votação, é uma tentativa de dar continuidade ao jogo de faz de conta que cerca o tema.

Jarbas de Holanda: PSDB. De referência de agenda reformista à disputa do oposicionismo a Temer

O candidato presidencial praticamente certo do PSDB, Geraldo Alckmin, conseguirá (ou não) superar o agudo conflito instalado no partido sobre o relacionamento com o governo Temer e, em caso afirmativo, recompor unidade interna, esvaziando tal disputa, e ganhar condições para terminar afirmando-se como representante do campo reformista, por meio de alianças com o PMDB, o DEM, outras legendas centristas e de centro-esquerda como o PPS?

A incerteza a respeito dessas condições foi reforçada com o pedido de demissão do ministro das Cidades, Bruno Araujo, que o justificou alegando falta de respaldo partidário ao exercício do cargo e reiterando apoio à agenda reformista assumida e posta em prática pelo presidente Michel Temer.

A persistência do referido conflito, ademais de dificultar a recomposição da unidade essencial para Alckmin, poderá levar à perda da imagem do PSDB de principal referência partidária reformista por causa do empenho de grande parte de dirigentes e militantes pela disputa do oposicionismo ao governo. Disputa em que o partido teria, ou terá, um papel secundário (este sim, de “coadjuvante”), pois dominada amplamente pelo lulopetismo (com satélites e dissidentes ultraesquerdistas).

Zeina Latif *: Precisamos evitar o grande abraço de afogado

- O Estado de S.Paulo

Ciclos econômicos tão acentuados e curtos revelam uma sociedade imatura

A crise sem precedentes para a qual o Brasil foi arrastado não foi obra individual. Foi construída a várias mãos. Ainda que o governo anterior seja o maior culpado, a responsabilidade é coletiva.

Houve conivência dos aliados e omissão da oposição. O setor privado aproveitou para obter ganhos privados em detrimento de responsabilidade fiscal e de uma agenda progressista de redução do custo Brasil. As instituições públicas não cumpriram seu papel de alerta e controle, e, em alguns casos, ampliaram seus privilégios, se valendo de sua autonomia administrativa e financeira. Organizações da sociedade civil, imprensa e academia também falharam.

A intensidade da crise, que foi causada por nossas escolhas e não por choques inesperados ou guerras, revela uma sociedade que tem muito a avançar em termos de maturidade democrática e civilidade. Sociedades civilizadas “organizam-se para proporcionar a todos crescente igualdade de oportunidades”, como ensina Delfim Netto.

Laura Carvalho: A metamorfose de Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

A tentativa de Bolsonaro de ser do sistema pode ser um tiro no pé na candidatura que tanto mal faz ao país

Sobre o suposto apoio do "mercado" a Jair Bolsonaro, Clóvis Rossi não se surpreendeu: "Afinal, lembrou, agentes de mercado financiaram, durante a ditadura, a Operação Bandeirantes, embrião do que viria a ser o tenebroso DOI-Codi, centro de torturas e demais violências aos direitos humanos".

No entanto, Rossi enxerga alguma contradição na participação de agentes de mercado "favoráveis à livre iniciativa" em "regimes liberticidas, como foi a ditadura do período 1964/85". Ainda que haja coerência histórica na associação de "liberais" com regimes autoritários, o jornalista parece considerar que há uma incoerência de princípios.

Quando se entende o liberalismo econômico no sentido clássico, como em Adam Smith, talvez haja mesmo contradição. Smith foi um defensor do livre mercado não apenas pelos seus efeitos sobre a eficiência econômica mas também porque considerava que a livre concorrência era o melhor caminho para a justiça distributiva e o bem-estar da sociedade.

Quando Smith diz na "Riqueza das Nações" que "pessoas do mesmo comércio raramente se encontram, mesmo que para se divertir ou se distrair, mas as conversas acabam em uma conspiração contra o público, ou em alguma invenção para aumentar os preços", é possível enxergar esse tipo de preocupação. Muitos interpretaram o trecho como autorizando a regulação de mercados para a defesa da concorrência.

Ribamar Oliveira: Não se assustem com dados fiscais de outubro

- Valor Econômico

A trajetória é melhor do que se imaginava inicialmente

A divulgação do resultado do Tesouro Nacional em outubro, que ocorrerá daqui a duas semanas, deve provocar um forte ruído no mercado. Em primeiro lugar, tudo indica que o governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) registrou déficit primário no mês passado, enquanto em outubro de 2016 o resultado foi positivo em R$ 40,8 bilhões.

O mais ruidoso, no entanto, será o déficit acumulado de janeiro a outubro, que poderá chegar a R$ 120 bilhões, de acordo com projeção do próprio governo, enquanto ficou em R$ 55,8 bilhões no mesmo período do ano passado.

Parece uma trajetória fiscal desastrosa, muito pior do que a do ano passado, mas nem sempre se deve confiar em números antes de submetê-los a uma análise cuidadosa. Há questões relacionadas com a receita e com a despesa da União que precisam ser consideradas, como observou, recentemente, a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi.

Míriam Leitão: O preço do populismo

- O Globo

A Venezuela desce a ladeira há tantos anos que ninguém se surpreendeu pelo fato de três agências de risco terem declarado que o país está em default, e o Brasil ter reclamado junto ao Clube de Paris por não estar recebendo do país vizinho. O populismo, seja de esquerda ou de direita, sempre termina em desastre, que aprisiona o país por anos, como ocorre na Venezuela.

O encontro com a verdade, que o populismo adia com discursos de ódio contra os supostos inimigos, algum dia chega. E na Venezuela tem estado presente há muitos anos, mas agora está num ponto de não retorno. Nesta quinta-feira, os credores reunidos na Isda, uma associação internacional de detentores de títulos, ainda conversarão com o governo, mas a tendência é a de se juntarem às agências Standard&Poors, Moody's e Fitch e também declararem que a Venezuela não paga dívidas. O acordo fechado ontem com a Rússia não ajuda muito. A dívida total do país é de US$ 150 bi, e a parte renegociada é de US$ 3,1 bi. Rosamnis Marcano, da consultoria venezuelana Econometrica, conta que a negociação pouco tem avançado. Os EUA determinaram que credores americanos não devem negociar sem a presença da Assembleia Nacional, controlada pela oposição e que, depois do plebiscito, perdeu poderes.

Robert Muggah: Declínio devido a globalização não representa fim dos Estados-nação

-Folha de Paulo

A Era dos Estados-Nação está em declínio. Eles são, afinal, retardatários na história.

Até meados do século 19, o mundo era dividido em impérios, cidades-Estados e os recém-nascidos Estados-Nação, que só se consolidaram no século 20. Mas esses, com fronteiras definidas, governos centrais, comunidades imaginadas e autoridade soberana, não são inevitáveis nem eternos, como pode ser visto ao fim da Guerra Fria.

Há menos clareza sobre o que ocorreria sem eles. Conforme Estados-Nação sucumbem ao populismo e ao separatismo, a pergunta que fica é: que ordem (ou desordem) global surgirá em seu lugar?

Esse enfraquecimento de poder é frequentemente atribuído à globalização. Em meados da década de 90, Jean-Marie Guehenno e Kenichi Ohmaepreviram que a disseminação de instituições globais acabaria com a relevância dos Estados-Nação.

Historiadores discordaram, argumentando que as tecnologias da globalização —da navegação a vela à internet— não eram necessariamente destrutivas. Com sua natureza de destruição criativa, a globalização fortaleceria os Estados-Nação.

Ainda assim, o caráter da globalização transformou-se no fim do século 20, tornando-se mais predatório.

A hiperglobalização —que inclui a desregulação financeira acentuada, a aceleração dos fluxos do capital e a desintegração das taxas cambiais fixas— cresceu desenfreada nas décadas de 80 e 90.

Corrupção entra na campanha chilena

Favorito nas presidenciais, Piñera é criticado por compra de empresa falida

Janaína Figueiredo / O Globo

-BUENOS AIRES- Apesar de ser a terceira maior preocupação entre os chilenos — segundo pesquisas — a corrupção esteve ausente durante quase toda a campanha para as presidenciais do dia 19. O silêncio foi rompido no domingo passado, quando o favorito do pleito, o ex-presidente Sebastián Piñera, candidato da coalizão Chile Vamos, irritou-se num programa de TV ao ser perguntado sobre a menção de seu nome no livro “Empresários zumbis. A maior evasão tributária da elite chilena”, no qual os homens de negócios mais ricos do país são acusados de terem comprado empresas falidas para pagar menos impostos. A discussão entre o ex-chefe de Estado — dono de uma das maiores fortunas do Chile — e um grupo de jornalistas instalou o debate sobre a corrupção na mídia e nas redes sociais, na reta final de uma campanha sem grandes emoções e que, de acordo com a maioria das pesquisas, terminará com a vitória de Piñera.

O ex-presidente não conseguiria superar 50% mais um dos votos e o mais provável é que seja obrigado a disputar um segundo turno em dezembro contra seu rival mais forte, o senador e jornalista Alejandro Guillier, do movimento Força de Maioria (a centro-esquerda chilena terá quatro candidatos nesta eleição, e nenhum deles foi respaldado publicamente pela presidente Michelle Bachelet). Mesmo as denúncias surgidas nos últimos dias, apontaram analistas locais, não modificariam este cenário, apesar da importância dada pelos chilenos à corrupção.

Direita chega como favorita para eleições presidenciais no Chile

O ex-presidente Sebastián Piñera, da coligação Chile Vamos, tem 40% das intenções de voto; aliança de centro-esquerda tem dois candidatos

Caio Sartori, Especial para O Estado, O Estado de S.Paulo

Com a base governista da presidente Michelle Bachelet dividida, a direita é favorita para voltar ao poder no Chile, em eleição no domingo. O ex-presidente Sebastián Piñera, da coligação Chile Vamos, aparece na liderança com 44,4% das intenções de voto, segundo pesquisa do instituto CEP.

A Nova Maioria, coligação de partidos de centro-esquerda e centro, que dá sustentação ao governo, está dividida em duas candidaturas: a do senador independente Alejandro Guillier, mais à esquerda no espectro político e segundo colocado nas pesquisas, e a da democrata-cristã Carolina Goic, em quinto lugar.

“Naturalmente, Guillier seria mais competitivo se Goic não estivesse na disputa. Mas o problema dele não é só a fragmentação da Nova Maioria. O problema de Guillier é que sua candidatura não embalou porque ele é um líder pouco carismático”, aponta o cientista político Patricio Navia, das universidades Diego Portales, em Santiago, e de Nova York.

Na terceira posição, a jornalista Beatriz Sánchez, da novata Frente Ampla, atrai o eleitorado que exige propostas mais à esquerda do que as da Nova Maioria. A tendência, caso ocorra um segundo turno, é que Guillier e Sánchez apoiem quem dos dois for escolhido para enfrentar Piñera. O mesmo vale para o quarto colocado, Marco Enríquez-Ominami, outro nome da esquerda dividida.

O milionário ex-presidente tende a receber os votos do candidato José Antonio Kast – faceta chilena da nova extrema direita mundial, que elogia o ex-ditador Augusto Pinochet, cujo regime (1973-1990) matou mais de 3 mil pessoas e torturou cerca de 40 mil, segundo o último levantamento. Ele aparece com 5% das intenções de voto nas pesquisas.

Concertação chilena dá lugar a fragmentação

Sylvia Colombo / Folha de S. Paulo

BUENOS AIRES - O Chile que vai às urnas neste domingo (19) eleger um novo presidente, 23 senadores e 155 deputados acaba de fechar um ciclo e vive uma dispersão político-partidária inédita desde a redemocratização, em 1990, quando o general Augusto Pinochet deixou o poder após 17 anos.

"Dos 14 partidos que tínhamos até 2016, fomos para 28, e a maior parte dos novos tem um espírito antiglobalização, protecionista, tanto à esquerda como à direita", disse à Folha o cientista político Guillermo Holzmann, da Universidade de Valparaíso.

Analistas ouvidos pela Folha concordam que essa fragmentação resulta da diluição da histórica aliança de partidos de centro, centro-esquerda e esquerda na primeira frente contra a ditadura pinochetista, a Concertação.

Fundada antes do plebiscito pelo fim da ditadura (então com o nome "Concertação de Partidos pelo 'Não'"), governou o Chile por 20 anos após o fim do regime.

Depois, passou a chamar-se Nova Maioria, incorporando mais partidos. É por essa aliança que a atual presidente, Michelle Bachelet, governa hoje em seu segundo mandato (não consecutivo).

"O fim da ditadura foi um momento histórico e romântico de aliança de forças por um objetivo comum, pôr fim à ditadura. Isso foi útil em seu momento", diz Hollzman.

"Nos últimos tempos, a Nova Maioria foi desiludindo seus eleitores por não conseguir derrubar o legado pinochetista, devido às acusações de corrupção e pela mudança de conjuntura histórica, que favoreceu o desmembramento dos partidos."

Já para Patricio Navia, sociólogo e professor da Universidade de Nova York, desde que a ditadura chegou ao fim, o bloco de centro-esquerda se beneficia da polarização com Pinochet (1915-2006).

"Primeiro, com ele vivo. Depois, com ele morto, ao se posicionar contra sua herança, seu modelo econômico, sua Constituição. Mas, agora, essa coalizão, que avançou ao devolver a democracia ao Chile, lida com o desgaste e um fracasso, que é não ter podido substituir a Carta de Pinochet", explica.

Na TV, PMDB ataca delatores e mostra FH

Temer, denunciado duas vezes, diz que foi vítima de injustiças

Eduardo Barretto / O Globo

-BRASÍLIA- O PMDB vai usar a propaganda partidária que veiculará a partir de hoje no rádio e na TV para atacar as investigações da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer e seus ministros mais próximos, Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (SecretariaGeral) e, temendo novas investigações, dirá que “os ataques” ao governo devem continuar, numa tentativa de criar uma vacina contra novos escândalos.

Temer foi alvo de duas denúncias do ex-procurador-geral Rodrigo Janot por organização criminosa, obstrução de justiça e corrupção passiva. Ambas foram rejeitadas pela Câmara dos Deputados, e o presidente só poderá ser investigado por essas acusações em janeiro de 2019, quando deixa o cargo.

Temer aparece em um vídeo atacando “injustiças” de que diz ter se livrado.

Na TV, PMDB diz que 'perseguição' contra Temer 'ultrapassou limites'

Marina Dias, Gustavo Uribe / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O PMDB usará a propaganda partidária que vai ao ar em rede nacional a partir desta quinta-feira (16) para fazer a defesa do governo Michel Temer e dizer que "a perseguição" contra o presidente "ultrapassou todos os limites".

Em um dos vídeos, ao qual a Folha teve acesso, não há citação nominal ao ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, mas um narrador afirma que houve uma "trama" para "derrubar" Temer e que ela foi "desmontada".

O presidente e seus aliados dizem que Janot trabalhou para tirar Temer do cargo ao apresentar contra ele duas denúncias –uma por corrupção passiva e outra por obstrução da Justiça e organização criminosa. Ambas tiveram seu prosseguimento barrado pela Câmara.

"Tentaram derrubar o presidente, mas o Brasil está de pé", diz o narrador, seguido pelo discurso de Temer: "A verdade é libertadora e não só nos livra das injustiças como nos dá ainda mais mais força, vontade e coragem para seguir em frente. É isso que vamos fazer com muita convicção, porque agora é avançar", diz o peemedebista.

Em outro dos dez vídeos de 30 segundos que serão exibidos nesta semana, o partido trata as reformas, principais bandeiras do governo, como um evento histórico, comparando-as com a luta contra a ditadura, as campanhas pelas "Diretas Já" e pela Constituinte e, por fim, a avanços sociais da última década.

Desde que tomou posse, em maio de 2016, Temer tenta se colocar como um presidente reformista, que apostou nas reformas trabalhista e, agora, da Previdência –que ainda precisa ser aprovada no Congresso– como os legados de seu governo.

Risco eleitoral de 2018 já traz ansiedade ao mercado

"Se a gente fizer uma agenda ruim a partir da próxima eleição, provavelmente estaremos fadados a cair no precipício"

"Haverá um momento em que, ou se quebra direitos adquiridos, ou o país quebra. As duas coisas são ruins"

Por Lucinda Pinto | Valor Econômico

SÃO PAULO - A falta de unidade entre aqueles que defendem a continuação da atual agenda econômica traz de volta o risco de um "acidente" na eleição de 2018, com a vitória de um candidato não comprometido com as reformas. O alerta é do ex-diretor de Política Monetária do Banco Central Luiz Fernando Figueiredo. "De novo, estamos brincando perto do precipício", diz, e isso estaria trazendo grande ansiedade ao mercado.

Economista vê risco de um 'acidente' na eleição de 2018
A falta de unidade daqueles que defendem a continuidade da atual agenda econômica traz de volta um risco, até aqui minimizado, de haver um "acidente" na eleição de 2018, e um candidato não comprometido com as reformas vencer o pleito. Esse é o alerta do ex-diretor de Política Monetária do Banco Central e atual sócio da Mauá Capital, Luiz Fernando Figueiredo.

Evitando mencionar nomes de potenciais candidatos, o gestor diz que o PSDB, visto como historicamente o partido comprometido com a continuidade da atual política econômica, deve buscar um "processo de aglutinação" para evitar que a eleição acabe dando vitória "ao lado mais populista". "De novo, estamos brincando perto do precipício", diz.

A preocupação com o processo eleitoral, afirma Figueiredo, tem trazido grande ansiedade ao mercado e explica, em parte, a piora dos preços dos ativos. Isso porque a garantia de que o próximo governo dará continuidade às reformas é essencial para que o país não entre num processo de desorganização, que pode, inclusive, abrir espaço para uma nova recessão ainda mais severa.

"O Brasil está numa situação de oportunidade ou de precipício. A gente foi para o limite", afirma. "Se a gente fizer uma agenda ruim a partir da próxima eleição, provavelmente estaremos fadados a cair no precipício", diz. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: Os mercados financeiros voltaram a reagir ao noticiário político nas últimas semanas. Há, de fato, uma frustração que leve a uma deterioração no cenário local?

Luiz Fernando Figueiredo: No curto prazo, o que a gente sente é uma separação do processo político do econômico. O país está voltando a crescer, até o crédito está melhorando. Melhora para a pessoa física e, para pessoa jurídica, tem uma cara de que vai melhorar. A economia está voltando a ter vida, mesmo com esse imbróglio político. Mas, como temos um processo eleitoral mais à frente, isso não terá vida muito longa, principalmente se o processo for muito instável. O Brasil está numa situação de oportunidade ou de precipício. A gente foi para o limite. A situação fiscal passou do ponto em que havia espaço de acomodação. Isso não quer dizer que o Brasil precise resolver sua situação fiscal agora, mas a gente tem um fato muito relevante que são as eleições. Se a gente fizer uma agenda ruim a partir da próxima eleição, provavelmente estaremos fadados a cair no precipício.

TSE vai dividir com PF digitais de eleitores

Coluna do Estadão / O Estado de S. Paulo.

As impressões digitais dos eleitores que se cadastraram para votar em urnas eletrônicas biométricas serão compartilhadas com a Polícia Federal. O convênio entre o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a instituição será assinado hoje, em Brasília, pelo presidente da Corte, Gilmar Mendes, e o diretor-geral da PF, Fernando Segóvia. A polícia poderá utilizar as informações em investigações criminais. O TSE também terá acesso ao banco de dados da PF, que será usado para cadastrar automaticamente eleitores que não tiveram suas digitais coletadas.

» Acelera. O convênio também pode acelerar a emissão de passaportes. Quem tiver as digitais cadastradas no TSE não precisará repetir o procedimento ao pedir o documento à PF.

» Dado. O TSE já colheu as impressões digitais de 50,4 milhões de pessoas, o que corresponde a 34,4% do total do eleitorado. A meta é concluir a identificação de todo o eleitorado até 2022.

» Ensaio. O ministro Henrique Meirelles (Fazenda) já teve duas reuniões com o marqueteiro Luiz Felipe Soutello, responsável pelo programa do PSD. Cotado para disputar a eleição presidencial de 2018, ele será a estrela da peça que vai ao ar dia 21 de dezembro.

» Todo seu. O ministro Gilberto Kassab e parlamentares da sigla não vão aparecer no programa. O foco será a recuperação econômica e o esforço de Meirelles para o equilíbrio fiscal.

Após Magno Malta exibir preso por pedofilia no plenário, senadores tentam acabar com CPI

Painel / Folha de S. Paulo

Ovo da serpente Um grupo de senadores tenta dar cabo da CPI dos Maus-Tratos, presidida por Magno Malta (PR-ES). Na sessão do dia 9, um dia depois de aprovar a condução coercitiva do artista que provocou polêmica ao se apresentar nu em SP, Malta levou ao plenário um acusado de pedofilia, algemado e com uniforme de detento. “O sr. foi abusado na infância?”, indagou. O depoente disse que sim, mas que não queria falar. O senador insistiu. O preso chorou. O depoimento virou peça de propaganda.

Histórico Alessandro da Silva Santos é acusado de abusar de 11 menores. Ele ainda não foi julgado. Chegou ao Senado desacompanhado de um defensor. “O sr. tem advogado?”, questionou Malta. “Tenho”, respondeu o homem. “Ele sabia que o sr. viria aqui?”. “Não. Nem eu sabia, excelência.”

Escapou O senador designou um advogado, funcionário da Casa, para auxiliar o preso. Eles conversaram por dois minutos. Depois o servidor saiu de cena. É possível ouvir o diálogo na gravação da TV Senado porque Malta não desligou o microfone. Fala entre defensor e cliente é inviolável.

Peso da lei O advogado avisou Alessandro de que tudo poderia ser usado em seu julgamento. No interrogatório, Malta quis que ele confessasse os crimes, detalhasse o número de vítimas e, diante do pedido do homem para só falar em juízo, disparou: “Se fosse juiz, ficaria ofendido. É como se ficasse mais fácil”.

Atrasos em série

Poder em jogo / O Globo

Recém-empossado na diretoria-geral da Polícia Federal, Fernando Segóvia estreou no cargo tentando saber mais sobre as investigações envolvendo autoridades abertas no Supremo Tribunal Federal. Na véspera do feriado, ele enviou à Corte pedidos de prorrogação de prazo em pelo menos dez inquéritos — entre eles, apurações contra os senadores alagoanos Fernando Collor (PTC) e Renan Calheiros (PMDB). Há casos da Lava-Jato e também sobre outros assuntos. O antecessor de Segóvia na PF, Leandro Daiello, já havia pedido a prorrogação de boa parte dos mesmos inquéritos. Entre ministros do STF, essa praxe tem sido malvista, porque é uma forma de prolongar indefinidamente as apurações. E, quando os processos se alongam demais, normalmente, é o tribunal que leva toda a culpa pela demora.

Insaciáveis
A tendência do governo de entregar o Ministério das Cidades ao PP desagradou a outros partidos do centrão com menos espaço no governo. Os responsáveis pela articulação política no Planalto foram alertados pelos descontentes: se o PP acumular Cidades e o Ministério da Saúde, que mantém atualmente com Ricardo Barros, “vai dar problema”. As duas pastas têm orçamentos volumosos.

Troca rápida
Atacado pelos partidos do centrão, é quase certo que o ministro tucano Antonio Imbassahy, da Secretaria-Geral da Presidência, deixará o Palácio do Planalto, onde despacha um andar abaixo do gabinete de Michel Temer. Um dos cotados para substituí-lo é seu secretário executivo, Carlos Henrique Menezes Sobral. Ele já trabalhou com Eduardo Cunha, na Câmara, e ocupou o atual cargo na gestão de Geddel Vieira Lima. Outra hipótese discutida no governo é que o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, acumule as funções, mantendo Carlos Henrique.

A responsabilidade de todos – Editorial: O Estado de S. Paulo

O déficit das contas da Previdência é a tal ponto calamitoso que a necessidade de aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016, que muda as atuais regras para a concessão de pensões e aposentadorias, já está acima do debate político. Trata-se de uma questão de salvação nacional que escapa às nuances político-ideológicas que ora dividem a Nação.

Receosos diante dos supostos desdobramentos eleitorais negativos que o apoio firme a uma medida impopular, porém mandatória, como a reforma da Previdência poderia ocasionar, muitos parlamentares jogam com o tempo sem levar em consideração o risco que eles mesmos estão correndo e, ainda mais grave, que impõem às futuras gerações que dependem da sensatez e da responsabilidade dos que devem tomar decisões hoje.

Ao dar como certo que a oposição à reforma da Previdência pode representar mais votos nas urnas nas eleições de 2018, o que, absolutamente, não é verdade, esse grupo de parlamentares ignora que a responsabilidade de desarmar essa bomba-relógio também recai sobre eles.

Uso e abuso – Editorial: Folha de S. Paulo

Numa decisão capaz de trazer importantes consequências para o futuro das delações premiadas, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, determinou a revisão do acordoque beneficiava um publicitário do Rio de Janeiro, suspeito de irregularidades na campanha do governador Luiz Fernando Pezão em 2014.

O marqueteiro Renato Pereira obtivera da Procuradoria-Geral da República diversas vantagens, em troca das revelações feitas sobre o esquema de que participou.

Para o ministro, não se justificaria deixar de lado sete dos oito casos delituosos em que estava envolvido o colaborador, assim como prever condições especiais no cumprimento da pena de quatro anos que lhe restasse a cumprir.

A medida de Lewandowski reflete as polêmicas surgidas no STF, quando se discutiu a validade do acordo que, com aberrante generosidade, beneficiou os irmãos Joesley e Wesley Batista, da JBS.

Os números falam – Editorial: O Globo

Tudo justifica que servidores contribuam para o ajuste de forma equivalente às vantagens usufruídas

Há de existir algo no imaginário da população que leva a que figuras caricatas de servidores públicos apareçam em roteiros de ficção, cômicos ou não, e mesmo inspirem piadas em que o funcionário sempre assume papéis incômodos. Como de operadores insensíveis da infernal burocracia do Estado brasileiro.

Obras ficcionais costumam explorar estereótipos, mas nem por isso deixam de ter uma ligação com a realidade. Daí a popularidade de muitas delas. O traço de injustiça que pode existir nessas imagens do servidor público está na generalização. Mas elas refletem o que se passa em torres de marfim no serviço público, em que salários e outros benefícios chegam a superar a realidade da administração pública de países ricos. Sem falarmos da corrupção, no varejo e atacado.

Venezuela caminha para o default na dívida externa – Editorial: Valor Econômico

Um default pode coroar a trágica história da decadência econômica da Venezuela, provocada por Hugo Chávez e, agora, Nicolás Maduro. A empresa de rating S&P qualificou o atraso de R$ 200 milhões de pagamento de juros de dois bônus soberanos como "calote seletivo" e há mais R$ 400 milhões de outros bônus que já deveriam ter sido pagos. Até agora os chavistas deram prioridade ao pagamento dos credores, relegando o país à escassez de divisas, a uma drástica carestia e escassez de alimentos, remédios etc. Os dólares terminaram e o fato de Maduro afirmar que "o default nunca chegará à Venezuela" é mais um sinal de que ele está a caminho.

As reservas internacionais do país são baixas, mal alcançam US$ 10 bilhões, e mais US$ 8 bilhões vencem em 2018. A truculência política isolou o governo na cena doméstica e no exterior, tornando especialmente delicada, se não impossível, a tarefa de negociar com os detentores de títulos. Estimativas privadas indicam uma dívida em bônus de US$ 63 bilhões e uma dívida externa total entre US$ 100 bilhões e US$ 150 bilhões. O banco central venezuelano diz que a Venezuela deve US$ 93 bilhões, mas nenhuma informação oficial é confiável em um regime que decidiu não divulgar sequer os índices de inflação.

João Cabral de Melo Neto: Vida e morte Severina

(Trecho)

Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte,
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).