sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

Opinião do dia: Montesquieu

Não haverá também liberdade se o poder de julgar não estiver separado do poder legislativo e do executivo. Se estivesse ligado ao poder legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário, pois o juiz seria legislador. Se estivesse ligado ao poder executivo, o juiz poderia ter a força de um opressor.

Tudo estaria perdido se o mesmo homem ou o mesmo corpo dos principais, ou dos nobres, ou do povo, exercesse esses três poderes: o de fazer leis, o de executar as resoluções públicas e de julgar os crimes ou as divergências dos indivíduos.

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Montesquieu (1689-1755) ‘Do Espírito das Leis’, p.202. Nova Cultura, 2005 (Tradução de Fernando Henrique Cardoso).

Jarbas de Holanda: Previdência e crise fiscal reforçam realismo econômico em 2018

Consiga, ou não, o presidente Michel Temer votar e aprovar ainda este ano na Câmara dos Deputados a proposta da reforma da Previdência, o imperativo de respostas à progressiva insolvência do sistema previdenciário vai colocando na defensiva, isolando na mídia, a aliança antirreformista articuladora dos interesses da elite da burocracia estatal, do “quanto pior, melhor” do lulopetismo (e seus satélites ultraesquerdistas) e de uma minoria de parlamentares tucanos com seu insistente “Fora Temer” (corretamente superado pelo PPS ao antecipar o fechamento de questão em favor da proposta). A intensificação e a virada qualitativa do debate do tema evidenciaram também que essa insolvência, ademais de constituir fator relevante da crise fiscal, processa-se com base em regras que geram e ampliam transferência de renda da população mais pobre – milhões de contribuintes da iniciativa privada – para a referida elite de privilegiados. Desmascarando a retórica “social” da resistência à mudança. Similar à da cúpula sindicalista em relação à reforma da CLT, centralmente contra o fim da indefensável “contribuição sindical obrigatória”.

O aumento, a cada ano perto de R$ 50 bilhões do déficit da Previdência, é parte do descontrole das contas públicas acumulado a partir do segundo mandato de Lula e turbinado pela sucessora Dilma Rousseff. Por meio de progressivo desrespeito a regras básicas da Lei de Responsabilidade Fiscal e através da multiplicação de programas assistencialistas e do empreguismo estatal com o reforço da máquina administrativa, bem como de generosas desonerações tributárias para segmentos do empresariado. Com os resultados, inevitáveis, da maior recessão da história do país, de mais de 15 milhões de desempregados e de agudos cortes nos programas sociais, bem como nos investimentos na infraestrutura e nos serviços públicos, por falta de recursos da União e dos estados e municípios também endividados. Do que é emblemático o Rio de Janeiro, com o colapso dos serviços de saúde, educação, transporte urbano e segurança. 

Paulo Fábio Dantas Neto* : Crise, reforma política e as âncoras da democracia brasileira**

Se fosse possível escolheria não escrever sobre reforma política. Tenho, na contramão de certo senso comum que se formou no Brasil, a percepção de que no nosso atual sistema político, ancorado na Constituição de 88, há mais a conservar que a reformar. Mas não é possível ignorar um bordão que vive sendo repetido, mesmo que, na maioria dos casos, quem o repete não saiba exatamente o que quer reformar. Todo mundo quer políticos melhores, eu também. Mas penso ser ilusão supor que eles serão achados ao adotarmos sistemas de governo, de partidos e de eleições diferentes. Os problemas que temos estão em softwares, não no hardware. Partindo desse entendimento tentarei tratar do tema evitando caminhos argumentativos que, a meu ver, costumam ser estéreis.

O primeiro caminho a evitar é o de reiterar um diagnóstico áspero, por vezes indignado, sobre patologias da política brasileira. Nesse tom costumam convergir certezas ingênuas de senso comum e normativas nos campos jurídico, sociológico e econômico, bem como na imprensa e em hostes empresariais e do ativismo social. O mantra mais notável desse território argumentativo é o que proclama a reforma política como a “mãe de todas as reformas”. Um estribilho que reverbera em vozes certamente dissonantes se o debate for sobre qualquer outro tema. Ele garante simpatia, o aplauso é provável mas o resultado substantivo é o de não contribuir ao debate. Contribui para torná-lo medíocre, pois não esclarece de qual reforma se fala, cada qual pensa numa, ou em nenhuma.

O segundo caminho a evitar penso que é, na contramão do primeiro, o da defesa acrítica do status quo institucional do sistema político. Até teve sentido esse papel de contraponto cumprido, desde os anos 90, pela ciência política brasileira. Ela nos ofereceu pesquisas que permitiram enfrentar preconceitos frequentes em ambiente social hostil, que tende a estigmatizar a política - e evidenciou a racionalidade do assim chamado presidencialismo de coalizão, cujo fracasso é hoje diagnosticado. É preciso que a ciência política não capitule, por viés político e/ou timidez intelectual, perante esse senso comum, mas também não é sensato aferrar-se a achados pretéritos como se fossem dogmas infensos ao certo derretimento objetivo daquele arranjo institucional.

*Fernando Gabeira: Restos a pagar

- O Estado de S.Paulo

A violência devia estar no topo da agenda de um país onde se morre mais do que na guerra

O fim de ano coincide com a divulgação do número de assassinatos no Brasil, nos primeiros 15 anos do século 21: 278.839. Mais do que a Síria, que vive uma longa guerra.

Anualmente são assassinadas 60 mil pessoas. A cada dez minutos alguém perde a vida pelas mãos de outro.

Essa mortandade dispersa passou ao largo da agenda política brasileira. Lembro-me de que, no início do processo de democratização, o foco voltou-se para os direitos humanos.

Em São Paulo, foi criada a Comissão Teotônio Vilela, da qual fiz parte. No Rio, Brizola implodiu o presídio da Ilha Grande.

A visão dominante na época tendia a considerar o crime nas ruas do Brasil como consequência direta da desigualdade social, da aspereza da vida nos bairros pobres. Mas os números indicam que países ainda mais pobres que o Brasil têm índices menores de assassinatos. É preciso mais que políticas sociais.

César Felício: Reforma previdenciária, missão cumprida

- Valor Econômico

Factóide permitiu a retomada do controle da agenda política

Uma reforma da Previdência a ser votada na Câmara dos Deputados em fevereiro do próximo ano é antes de tudo um símbolo, ou um factóide de acordo com a eterna, insuperável definição para o termo dada pelo então prefeito do Rio, Cesar Maia, em uma entrevista à revista "Veja" em 1995. "Ideias que você arremessa com certa base de realidade, embora sem grandes possibilidades de ser realizadas". O pai do atual presidente da Câmara chamava isso de um realismo delirante, "diferente do simples delírio, que é pura fantasia".

Rodrigo Maia assumiu o primeiro plano da articulação pela reforma no último mês e meio, pouco depois da rejeição pela Câmara da autorização para o prosseguimento da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer. Fez declarações ora otimistas, ora pessimistas, sobre a capacidade de mobilização do Planalto. No dia 1º deste mês disse que era muito difícil ter os 308 votos, no dia 4 havia toda condição para aprovar, no dia 5 se declarou cheio de esperança, no dia 6 falou em ter apenas 100 votos no plenário, e assim por diante.

Foram semanas em que o Centrão avançou sobre o Ministério das Cidades e a Secretaria de Governo, em que o Congresso aprovou um novo Refis e regras favoráveis aos devedores do Funrural, entre outras concessões feitas pelo governo. Muito se conseguiu com cobranças adiantadas em troca de um apoio futuro. Mas as expectativas geradas por toda a movimentação sempre foram modestas. Quando muito, acreditou-se na aprovação do texto na Câmara em primeiro turno este mês.

Hélio Schwartsman: Lula tem direito à lentidão?

- Folha de S. Paulo

Os advogados de Luiz Inácio Lula da Silva questionam a rapidez com que o recurso do ex-presidente tramitou no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Sustentam que a celeridade dada ao caso viola o princípio da isonomia, pelo qual todos os cidadãos deveriam receber igual tratamento.

Uma implicação interessante da tese da defesa é a de que haveria uma espécie de direito de usufruir da ineficiência do Estado. Se a Justiça é lenta, não pode ficar rápida logo no meu caso –mesmo que a morosidade seja reconhecida por todos como falha a extirpar. O debate é intelectualmente estimulante, mas, por outros motivos, acho que o TRF-4 está certo em correr com o processo de Lula. Não dá para fingir que este é um caso ordinário e não tem nada de especial.

Merval Pereira: O pós-TRF-4

- O Globo

O anúncio de que o governo só colocará em votação a reforma da Previdência depois do carnaval, no dia seguinte ao término do horário de verão, não tem nada a ver com esses dois eventos, tem apenas uma razão: fingir que ainda existe uma esperança de aprovação após negociações no recesso parlamentar. Mas o que determinou mesmo a data foi o anúncio do julgamento do ex-presidente Lula em 24 de janeiro.

Com ele fora do páreo, é possível que alguns dos deputados recalcitrantes se encorajem, na esperança de que a reforma ajude a economia a melhorar e aumente a possibilidade de um candidato que reúna as forças políticas de centro.

Se a confirmação da sentença contra Lula não provocar grandes manifestações populares pelo país, como sonham os petistas e aliados, a campanha eleitoral ganhará outra dimensão.

O governo terá condições de reunir os partidos aliados em torno de uma candidatura, que tanto pode ser a do governador Geraldo Alckmin pelo PSDB, no caso de ele decolar nas pesquisas, ou outro do grupo que reúna as melhores condições de disputa, como 40% do tempo de televisão e apoio distribuído pelo país.

Eliane Cantanhêde: Coleção de erros

- O Estado de S.Paulo

Ao colecionar erros na reforma da Previdência, Temer sofreu sua pior derrota

O governo colecionou erros na condução da reforma da Previdência e foi punido ontem com a sua maior derrota desde a posse, em maio de 2016. Ao adiar a votação na Câmara para 19 de fevereiro, foi obrigado a reconhecer que não tem os 308 votos necessários e aumentou a percepção de que, se não aprovou em 2017, não aprova mais.

O primeiro erro, sobretudo do próprio presidente Michel Temer, foi o salto alto. Após derrubar as duas denúncias da PGR na Câmara, Temer, que já presidiu a Casa três vezes, achou que seria capaz de aprovar qualquer coisa. O céu era o limite.

Essa arrogância – até compreensível para quem esteve acuado, sofreu um bocado e teve de lutar como um leão durante meses – foi reforçada pela lista de vitórias importantes do governo no Congresso, como a reforma trabalhista, o teto de gastos, a revisão do teto, a mudança do sistema de exploração do pré-sal e a reforma do ensino médio.

Depois de tantas vitórias e de tantos votos, como ele poderia perder justamente no seu projeto mais caro, o centro do seu programa de governo, a sua maior expectativa como legado à História? Pois é. Poderia perder perdendo e agora sem perspectiva de mudar esse quadro num ano eleitoral particularmente instável e desestabilizador.

Reinaldo Azevedo: Lula condenado, inelegível e solto

- Folha de S. Paulo

As forças associadas à Lava Jato acabaram criando uma armadilha contra a própria operação

Os dias em curso são de tal sorte insólitos que a simples marcação da data do julgamento de um recurso se torna o fato mais importante da corrida eleitoral. Refiro-me, é evidente, ao dia 24 de janeiro, quando o Tribunal Regional Federal da 4ª Região julga apelo da defesa de Lula contra a condenação a nove anos e meio de cadeia que o juiz Sergio Moro impôs ao petista no ruidoso caso do tríplex de Guarujá.

Curiosamente, ao percorrer caminhos heterodoxos na condução da investigação e do julgamento —refiro-me ao conjunto da obra, não apenas aos casos relacionados ao ex-presidente—, as forças associadas à Lava Jato acabaram criando uma armadilha contra a própria operação.

O risco é o povo desmoralizar nas urnas as urdiduras tramadas nos corredores do MPF e da Justiça.

Por que é assim? Porque a agressão ao Estado de Direito e ao devido processo legal sempre cobra o seu preço. Tenta-se remendar o malfeito com novas agressões, numa espiral sem fim para baixo. Não há explicação razoável para que o caso de Lula tramite com uma celeridade inédita, dados os padrões —atenção!— do próprio TRF-4. A pressa, nesse caso, tem propósito; trata-se de decisão "ad hoc".

Fernando Abrucio: Constituição Cidadã não pode ser esquecida

-Valor Econômico / Eu & Fim de Semana


Todos sabem que o próximo ano será importante porque haverá eleição presidencial em um momento decisivo do país. Praticamente perdemos o último quadriênio em meio a uma crise política, econômica e social. Quem for eleito terá a legitimidade para fazer as mudanças necessárias em prol da retomada do desenvolvimento. Mas 2018 também será marcado por uma comemoração importante: o trigésimo aniversário da Constituição de 1988. Seu legado histórico estará nas mãos dos eleitores brasileiros, que escolherão o modelo de cidadania que desejam ter e a maneira de implementar essa proposta. Trata-se de uma discussão central que os presidenciáveis terão de fazer.

Logo em sua promulgação, Ulysses Guimarães definiu o novo ordenamento institucional do país como "Constituição cidadã". Foram garantidos os mais variados direitos, individuais e coletivos, e propostos modelos institucionais gerais para construir um Estado de Bem-Estar Social. A maioria das conquistas não veio de imediato. Foram necessárias legislações de natureza complementar ou ordinária para efetivar o espírito constitucional.

O sucesso dessa empreitada, obviamente, não foi absoluto, pois a desigualdade e outras carências permanecem no país. Porém, é inegável que houve avanços extraordinários, especialmente pelo curto período de tempo em que foram alcançados. Os indicadores sociais melhoram significativamente em várias áreas: universalização do ensino fundamental, redução da mortalidade infantil, aumento da expectativa de vida, expansão da rede elétrica instalada, entre muitos exemplos que poderiam ser citados. Além disso, a participação da sociedade nos assuntos coletivos ampliou-se, com eleições regulares, conselhos de políticas públicas e garantia de acesso à informação pública.

Míriam Leitão: Aperto no cinto

- O Globo

O adiamento da reforma da Previdência e de outras medidas do ajuste fiscal vai levar o governo a apertar ainda mais o cinto em 2018. A aprovação da reforma traria uma economia em torno de R$ 5 bilhões no ano que vem, o mesmo valor estimado para o adiamento do reajuste dos servidores. Como o governo precisa cumprir o teto de gastos, isso quer dizer que R$ 10 bilhões de outras despesas terão que ser cortados.

A avaliação de uma fonte da equipe econômica é de que ainda há grande chance de aprovação da reforma em fevereiro. Apesar da volatilidade na bolsa e no câmbio, a visão é que o mercado financeiro segue dando um voto de confiança ao governo. A bolsa e o dólar caíram menos de 1%, e o risco-país ainda permanece muito abaixo dos piores momentos da crise (veja o gráfico).

Um dos argumentos usados pelo governo para tentar convencer a base aliada a aprovar a reforma é que o cenário de rejeição do texto será de enorme estresse na economia em pleno ano eleitoral. Ou seja, se aprovar a mudança nas aposentadorias pode ser impopular, um quadro de piora na recuperação também terá efeito adverso sobre as urnas. Muito além do impacto no mercado financeiro, o aumento do contingenciamento irá paralisar obras, adiar investimentos, e prejudicar o funcionamento de diversos órgãos que prestam serviços diretos à população, como a Receita e a Polícia Federal, que faz a emissão de passaportes.

Rogério L. Furquim Werneck *: O jogo da reforma da Previdência

- O Estado de S.Paulo

Esperança é de que a questão previdenciária venha a ser central na disputa eleitoral de 2018

No início de novembro, fragilizado pelas sucessivas batalhas políticas que teve de enfrentar, a partir de meados de maio, para se manter no cargo, o presidente Michel Temer deu mostras de estar desalentado com a possibilidade de aprovação da reforma previdenciária. Chegou a declarar que, se o Congresso não estivesse disposto a aprová-la, “paciência”.

Mas o Planalto logo percebeu que o sinal de que estaria prestes a “jogar a toalha” na luta pela aprovação da reforma havia sido lido como mais uma evidência de que o presidente estaria mesmo fadado a se arrastar até o fim do mandato, como um “pato manco”.

A correção de rumo foi imediata. O que se viu a seguir foi súbita mudança no empenho com que o Planalto passou a tratar a reforma da Previdência. O aparente desalento deu lugar à deflagração de ampla campanha de mobilização do País e do Congresso com o esforço de assegurar a aprovação ainda este ano, pelo menos na Câmara dos Deputados, de uma versão menos ambiciosa da reforma previdenciária, mas com efeitos fiscais equivalentes à metade dos inicialmente contemplados.

Vinicius Torres Freire: Já é Carnaval para o bloco de sujos

- Folha de S. Paulo

O ano político de 2018 começa mais cedo, com o julgamento de Lula da Silva em segunda instância marcado para 24 de janeiro. Mas o programa só acaba quando termina. A depender de Lula e do PT, o drama luliano e eleitoral em tese pode se arrastar até meados de setembro, quando termina o prazo para a substituição do candidato a presidente.

Pela lei eleitoral, se o candidato desistir de concorrer nos 20 dias anteriores ao da eleição, o partido não pode oferecer outro nome (a não ser em caso de morte). Mas, nestes tempos de leis polissêmicas e politraumatizadas, sabe-se lá qual será a interpretação e agilidade da Justiça nas decisões. De menos incerto, a gente sabe que a velocidade judicial para Aécio Neves é baixa.

Logo depois do primeiro capítulo do caso Lula, temporada 2018, o ano seguiria agitado, pois o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, marcou o início das discussões da reforma da Previdência para dia 5 de fevereiro, uma segunda-feira (rir, rir, rir).

Naercio Menezes Filho: Agenda Social para 2018

- Valor Econômico

O principal desafio é eliminar a pobreza com programas sociais bem geridos, focalizados e ininterruptos

O ano de 2018 será crucial para o futuro do Brasil. Depois de um período de crescimento sustentado que durou até o final da década de 70, nas últimas décadas nossa produtividade ficou praticamente estagnada. Além disso, por não termos investido em educação para diminuir as desigualdades históricas associadas à escravidão, o Brasil acabou se tornando um dos países mais desiguais do mundo, com reflexos sobre criminalidade e corrupção. As próximas eleições definirão o caminho que vamos seguir daqui para a frente.

Nosso principal objetivo na área social tem que ser tornar as oportunidades mais iguais para todos, independentemente das condições familiares. Para isso, nenhuma criança deve crescer em uma situação de pobreza. Vários estudos mostram a efetividade dos programas sociais direcionados para as mães sobre o futuro dos seus filhos e até mesmo de seus netos. É inadmissível que ainda haja pobreza e falta de saneamento básico no Brasil. Há recursos para melhorar a situação dos mais pobres, basta melhorar o gerenciamento dos recursos e ter mais vontade política. Senão vejamos.

Uma análise comparativa de dois programas sociais, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o Programa Bolsa Família (PBF) é bastante instrutiva. Os dois programas visam atingir famílias vulneráveis. O BPC é um direito instituído pela Constituição de 1988 que garante o pagamento mensal de 1 salário mínimo para idosos com 65 anos ou mais ou pessoas com deficiência de qualquer idade. Para ter direito ao benefício, é necessário que a renda familiar per capita seja menor que 25% do salário mínimo vigente

José de Souza Martins: Capitu traiu?

- Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

É curioso que, em relação a uma das mais importantes obras da literatura brasileira, "Dom Casmurro", de Machado de Assis, com estranha frequência leitores empaquem na figura de Capitu. Ao término do livro fica em muitos a dúvida: Capitu traiu ou não traiu Bentinho com Escobar, amigo de ambos? O filho, que tem a cara do amigo e não a do presumível pai, é filho de quem?

Em seminário recente sobre esse livro, no Clube de Leitura da Academia Paulista de Letras, aberto ao público, que ali se reúne toda última quinta-feira do mês, às 18h30, o escritor Luiz Carlos Lisboa chamou a atenção para um julgamento simbólico de Capitu, presidido por um ministro do STF, com a participação de pessoas eminentes. Capitu foi absolvida. Lisboa, erudito autor, sublinhou a distorção que semelhante procedimento representa em face da riqueza própria e característica da obra de Machado.

De fato, a querela em torno da figura de Capitu indica, entre nós, a deformante força da leitura fundamentalista, capturada por uma mentalidade bem nossa, polarizada e binária. Mentalidade que é a grande personagem da sociedade e da política brasileiras até hoje. Ao ler Machado de Assis desse modo redutivo expomos nossos defeitos de compreensão do que somos.

É alto o custo de se adiar a reforma da Previdência: Editorial/O Globo

Mudar o sistema no início de ano eleitoral, num Congresso que demonstra não entender a crise, implica riscos que podem abortar a recuperação lenta da economia

Sem a certeza da obtenção do apoio de no mínimo 308 votos na Câmara, para aprovar a minirreforma da Previdência, o governo confirmou ontem o que o senador Romero Jucá antecipara quarta à tarde e adiou a votação do projeto da reforma, em primeiro turno, para a penúltima semana de fevereiro, logo depois do carnaval.

Pode-se compreender a decisão, mas não se deve negar que existe um custo para o país. Se a Câmara, mesmo com os mimos recebidos no toma lá dá cá do fisiologismo — vagas e verbas — ainda não dá segurança ao Planalto para começar a votar o projeto, transferi-lo para 2018, ano eleitoral, implica mais riscos.

Um deles, o Planalto ser forçado a fazer novas concessões, e num ponto central da proposta como, por exemplo, a preocupação com o nivelamento das condições de aposentadoria entre servidores públicos, historicamente privilegiados na Previdência, e os assalariados do setor privado, do âmbito do INSS.

A incerteza golpeia o País: Editorial/O Estado de S. Paulo

Más consequências começaram a surgir logo depois de anunciado pelo presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, o adiamento da votação da reforma da Previdência, agora prevista para fevereiro. Mais um fator de insegurança foi acrescentado ao cenário, num momento de enorme importância para a consolidação da nova fase de crescimento, depois de uma longa e severa recessão. O primeiro golpe veio numa nota distribuída pela Moody’s, uma das principais agências de classificação de risco. O adiamento é fator negativo para o crédito brasileiro, afirmou o vice-presidente e analista sênior Samar Maziad em comentário escrito.

Segundo ele, a decisão torna menos provável a aprovação do projeto, por causa das incertezas quanto à eleição presidencial. Com isso, aumentam as preocupações quanto à capacidade do governo de manter os gastos abaixo do teto constitucional e de cuidar das “tendências fiscais adversas”. Essas tendências, lembrou, “têm gerado uma persistente deterioração do perfil de crédito do País nos últimos anos”.

Com essa observação, ele recordou de forma sumária o desastre ocorrido no fim do governo da presidente Dilma Rousseff: as três maiores agências de avaliação de crédito – a Moody’s, a Standard &Poor’s e a Fitch – cortaram a nota brasileira duas vezes, criando problemas para o Tesouro Nacional, para as estatais e até para empresas privadas de boa reputação financeira.

Planalto paga alto custo por reforma que não veio: Editorial/Valor Econômico

A votação da reforma da previdência foi adiada para fevereiro de 2018, se é que será mesmo feita neste governo. Os votos que o presidente Michel Temer dispôs para evitar por duas vezes que a Câmara dos Deputados autorizasse investigação de denúncias contra ele aparentemente evaporaram. O capital político de Temer se dissipou e nessa conta também se esvaiu dinheiro público. Vastas e generosas concessões foram feitas aos parlamentares para que fossem convencidos a aprovar a reforma. Eles não entregaram a mercadoria, mas as benesses foram concedidas assim mesmo.

O custo da reforma da previdência foi alto e pode ainda subir se os negaceios dos partidos continuarem em fevereiro. No ritmo com que foram aprovadas renúncias fiscais no fim dos trabalhos do Congresso, o teto de gastos logo desabará por obra da irresponsabilidade daqueles que o aprovaram. Com as despesas limitadas por lei, o Congresso partiu para a dilapidação das receitas. Enquanto a manutenção do teto vai exigir cada vez mais sacrifícios de despesas discricionárias, com o avanço dos dispêndios da previdência e da folha de salários dos funcionalismo, a realização do déficit de R$ 159 bilhões exigirá mais esforço da equipe econômica.

'Fake news' aos trilhões: Editorial/Folha de S. Paulo

O que deveria ser um complexo debate envolvendo questões orçamentárias, energéticas e ambientaistornou-se motivo de alarido nas redes sociais da internet.

Aprovada nesta quarta-feira (13) pela Câmara dos Deputados, a medida provisória 795 institui um regime tributário favorecido para produção e exploração de petróleo e outros combustíveis fósseis. Em postagens escandalizadas nos meios digitais, difundiu-se que a MP entrega R$ 1 trilhão em benefícios fiscais às petroleiras.

Há boas razões para questionar a proposta apresentada pelo Palácio do Planalto. Em tempos de colapso das finanças públicas, políticas que implicam abrir mão de receitas devem ser aplicadas com máxima parcimônia; tratando-se, ademais, de incentivo oficial a poluentes, a relação entre custos e benefícios fica mais desfavorável.

Entretanto os militantes eletrônicos preferiram o mantra do número bombástico e facilmente memorizável –enquanto a procedência e a solidez da cifra, como de hábito, não mereceram maior atenção.

Poder em jogo/O Globo: Temos vagas

O Brasil tem 149 estatais, sendo que 18 delas não sobrevivem sem o governo federal. O quadro de pessoal destas empresas mais que dobrou entre 2006 e setembro deste ano — o crescimento foi de 113,9%. No mesmo período, o número de empregados das estatais que não precisam de dinheiro do governo para existir aumentou menos de 10% (9,1%). A conta é da Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado. Nas empresas sem caixa próprio, havia 40,3 mil funcionários em 2011. Em setembro passado o número chegou a 74 mil. O quadro foi ampliado em plena crise econômica e política: 7,7% só no ano passado.

Fora da ordem
O governo financiou em mais de 90% as despesas de 13 das 18 empresas estatais que dependem do orçamento federal, em 2016. Para a IFI, o percentual elevado indica que algo não vai bem no atual modelo: “A organização de certas atividades de interesse público na forma empresarial sugere certa capacidade de geração própria de recursos.”

Tungas em série
O Ministério Público e a Polícia Federal identificaram um padrão de ações gerenciais para fraudar fundos de previdência de servidores públicos municipais, com pagamento de “comissões” a políticos. As investigações começaram no Fundo de Previdência da Prefeitura de Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, gerenciado pela empresa Terra Nova, e devem ser estendidas a várias outras prefeituras. Em Cabo de Santo Agostinho foram desviados R$ 93 milhões, correspondentes a 66% da poupança dos servidores do município.

Palpite infeliz
Tem a marca de João Santana a conta salgada de energia que pesa no orçamento doméstico e das empresas. Marqueteiro de Dilma Rousseff, condenado pela Lava-Jato, foi ele quem arbitrou em 20% o percentual de redução da conta de luz, em 2013. A proposta da indústria ficava em 9%. O marqueteiro achou que o índice era tímido e não traria benefícios à já desgastada imagem do governo da ex-presidente. Para analistas, a medida é um dos principais motivos da crise do setor. Custou cerca de R$ 60 bilhões aos cofres públicos em indenizações às empresas. E foi a principal culpada pela inflação de 10,67% em 2015. Segundo ex-assessores, o marqueteiro era a única pessoa que Dilma ouvia. Deu no que deu.

Acostumou na fantasia
Depois de deixar o PSDB, Luislinda Valois quer o apoio da bancada baiana para tentar manter o cargo de ministra dos Direitos Humanos. A Bahia não tem representantes na Esplanada, após a saída de Antonio Imbassahy, mas não há sinais de que a ex-tucana seja a eleita dos baianos.

Paciente rebelde
Michel Temer não cumpriu as ordens médicas de trabalhar cerca de três horas por dia, segundo assessores muito próximos. Ele tem mantido um ritmo frenético de trabalho. Nesta semana, a carga diária de trabalho chegou a 20 horas. Quando voltar ao Planalto, porém, Temer terá muito a fazer. A começar pela rearticulação política de sua base. A confusão criada por seus aliados em torno do adiamento da reforma da Previdência mostrou que ninguém se entende no governo.

Coluna do Estadão/O Estado de S. Paulo.: Aliados planejam lançar Rodrigo Maia ao Planalto

Um grupo do DEM quer aproveitar o palanque de filiação do deputado federal Danilo Fortes, que oficializa hoje o ingresso na sigla, para lançar o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, como candidato do centro à Presidência da República. Ele será apresentado como “o único nome que poderia unificar o País”. Maia tem afirmado que vai concorrer à reeleição na Câmara e tentar mais um mandato como presidente da Casa. Mas defende que o partido lance candidato na disputa presidencial que tenha “clareza ideológica de centro-direita”.

O cara.
O líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), define a situação do colega de partido. “Rodrigo Maia pode até não ser o candidato à Presidência, mas a sucessão de Michel Temer passará por ele.”

Rumo a 2018.
Com 30 deputados federais, o DEM acolheu 8 dissidentes do PSB e deve formar a quarta maior bancada na Câmara. O partido sonha em lançar 12 candidaturas próprias aos governos estaduais.

Mágica.
A ministra Grace Mendonça, da AdvocaciaGeral da União, conseguiu encontrar uma solução para o impasse da Oi sem a necessidade de o governo editar uma medida provisória. A saída, por ora, é guardada a sete chaves.

É exclusivo.
O governo não queria a MP porque ela contemplaria outras empresas em dificuldades financeiras além da Oi, quando o objetivo é atender apenas a operadora de telefonia.

Reta final.
O acordo de leniência da SBM Offshore, que admitiu ter pago propina em troca de contratos com a Petrobrás, vai ser analisado pela AGU no final de semana. Se não houver objeção, a tendência é de que seja assinado na terça.

Longa caminhada.
Será a primeira empresa alvo da Lava Jato a ter conseguido aprovar a leniência na Controladoria-Geral da União (CGU), no TCU e na AGU.

Credenciados.
A decisão do STJ que transformou o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), em réu por corrupção passiva animou os aliados do senador Aécio Neves no PSDB a lançá-lo ao governo mineiro em 2018 para disputar contra o petista.

Sem pacto.
O presidente do Senado, Eunício Oliveira, nega ter participado de acordo com Rodrigo Maia (Câmara) para empurrar a votação da reforma da Previdência para fevereiro de 2018. “Não combinei nada com ninguém. Só aprovei a LDO e o Orçamento no prazo certo”, enfatizou.

Vingança.
Eunício sinaliza que não vai correr com a votação da reforma quando chegar ao Senado. É o troco pela Câmara não ter dado sequência a matérias votadas no Senado, como foro privilegiado, abuso de autoridade e teto salarial.

Ciúme imortal.
O clima esquentou quarta-feira, 13, na Academia Brasileira de Letras. Numa quebra de tradição, o presidente Domício Proença Filho anunciou que o imortal Antonio Carlos Secchin não fará o discurso de recepção do novo acadêmico Antonio Cícero, que o tinha escolhido.

Pro túmulo.
Para evitar constrangimentos, a transcrição do debate tenso entre os intelectuais deixou de ser feita. Imortais reclamaram que Proença Filho tem “ciúmes” de Secchin, poeta e crítico literário de destaque.

Para FHC, Lula matou-se politicamente ao decepcionar eleitor

Fernando Taquari | Valor Econômico

SÃO PAULO - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem que o Brasil e os outros países do mundo demandam uma renovação de seus quadros políticos. Ao analisar o cenário nacional, o tucano afirmou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva "se matou politicamente". Ao explicar depois a declaração, afirmou que o petista representava a esperança quando foi eleito em 2002, mas decepcionou.

FHC, no entanto, não especificou se a decepção tinha relação com a administração petista ou os escândalos de corrupção que envolvem Lula, condenado em primeira instância por corrupção e lavagem no âmbito da Lava-Jato. "Se matou no sentido político. Não correspondeu à esperança que se depositava nele", afirmou o tucano, a despeito da liderança de Lula nas recentes pesquisas de intenção de voto para a eleição presidencial de 2018.

Ao lado do senador Cristovam Buarque (PPS-DF), FHC participou de um seminário, na capital paulista, no instituto que leva seu nome. O tucano afirmou que o processo eleitoral do ano que vem será um "grande desafio" ao país. "É preciso renovar a mensagem e a convicção", disse o tucano, acrescentando que as novas lideranças precisam encontrar um meio de se nacionalizarem.

Tanto o senador quanto o ex-presidente apontaram a educação como o melhor caminho para o Brasil reduzir as desigualdades sociais, ampliar o acesso da população à saúde e enfrentar um quadro de violência nas principais capitais do país. Ao abordar essa questão, FHC discordou da ideia de que a saúde, conforme pesquisas com os brasileiros, representa o maior problema nacional na atualidade.

"Não é verdade. Eu uso o SUS. Não é nada ruim", ressaltou o ex-presidente. Na rápida entrevista que deu, esclareceu que realmente usa o sistema público na condição de paciente. Além disso, o tucano manifestou preocupação com a possibilidade de o discurso de combate à violência ser apropriado por candidatos radicais em 2018. Ao tratar do assunto, contudo, não personificou.

Primeiro a discursar, Cristovam disse que falta ao país um "sentimento nacional". "A raiva tomou conta de tudo. O corporativismo é como os brasileiros raciocinam hoje", disse ao manifestar preocupação com a divisão entre "grupos e seitas". "Talvez, a ira seja a principal musa do processo eleitoral que se avizinha. É algo que não combina com eleição".

A mudança de rumo, segundo o parlamentar, passa pela universalização do ensino. "O vetor da construção de um Brasil diferente é um sistema educacional que faça com que nossas escolas estejam nos melhores padrões e que não haja diferença entre a educação oferecida a ricos e pobres", afirmou; Cristovam busca o apoio de seu partido, o PPS, para concorrer novamente à Presidência. Ele disputou o cargo em 2006. Na ocasião, a educação já tinha sido o principal mote de sua campanha. "Violência e saúde são necessidades imediatas. Mas educação é que muda os rumos de um país", declarou.

Os governantes, conforme Cristovam, também deve dar o exemplo para população. O próximo presidente, argumentou, deve concentrar os esforços em acabar com mordomias e privilégios, além de "quebrar a impunidade".

Afonso Schmidt: Caras sujas

Ao longo destas avenidas,
recordação de velhas lendas,
cantam as chácaras floridas
com suas líricas vivendas.

Lá dentro, há risos, jogos, danças,
crástinas, módulas fanfarras,
um pandemônio de crianças,
um zangarreio de cigarras.

Fora, penduram-se na grade
os pobres, como gafanhotos;
têm dos outros a mesma idade.

mas estão pálidos e rotos.
Chora a injustiça da cidade
na cara suja dos garotos.