domingo, 17 de dezembro de 2017

Opinião do dia: Fernando Henrique Cardoso

A questão central de um partido que nasceu como o PSDB, para se diferenciar da geleia geral que se formou na Constituinte, é a de se distinguir pela afirmação, não pela negação. Não será em função de posições que ocupa ou deixa de ocupar nos governos que se afirmará, mas das bandeiras que simboliza e das políticas que apoia para o Brasil. A hora é de coragem para mostrar como o partido vê o futuro e como colabora para formar uma sociedade melhor (apoiando medidas igualadoras e votando a favor das reformas). Não se trata de questão eleitoral, mas de compromisso com o povo e com o Brasil. A história de um partido não se escreve apenas com manifestos e programas, mas com gestos e com pessoas que simbolizem a mensagem que se quer transmitir. Se o preço para ganhar eleições for o de desfigurar as crenças - no que não creio -, melhor ficar com estas e semear para o futuro.


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Fernando Henrique Cardoso é sociólogo, foi presidente da República, ‘Coragem e decência’, O Estado de S. Paulo, 3/12/2017.

Luiz Sérgio Henriques*: As duas faces da nossa miséria

- O Estado de S.Paulo

Derrotar as ideias extremas é o desafio que todo democrata deve continuamente se impor

Do ponto de vista democrático, o recente ciclo das esquerdas latino-americanas no poder, entre elas o petismo, não foi particularmente entusiasmante. Em seu conjunto, em grau maior ou menor, não souberam dirigir-se a toda a sociedade, ao optarem por uma ideia substantiva de democracia, hostil à dimensão que reputam “meramente” formal, fazendo-a acompanhar por estratégias discursivas fortemente divisivas, próprias de percursos já cumpridos, sem êxito, no passado.

O caso extremo, que, no entanto, chegou a ter pretensões de se tornar a matriz de transformações revolucionárias em boa parte do Continente, terá sido o bolivarianismo venezuelano, desde o começo tingido por um autoritarismo de feição militar que, recorrendo a instrumentos plebiscitários e arregimentando uma parte da população – por certo aquela socialmente mais destituída –, foi capaz, como ainda hoje é, de obter sucessivas vitórias eleitorais, por bem ou por mal.

Nenhuma dúvida, especialmente durante os sucessivos mandatos de Hugo Chávez, de que, manipulações à parte, o regime contou com adesão majoritária. Um dos requisitos da democracia, assim, parecia plenamente preenchido, a saber, o respeito à vontade majoritária na constituição dos governos. Menos ou nada respeitados, ao contrário, ficavam outros requisitos igualmente essenciais, como o respeito aos direitos da minoria, que do ponto de vista formal deve ter a possibilidade de se tornar governo em eleições disputadas em razoáveis condições paritárias.

Celso Lafer*: Em defesa da OMC

- O Estado de S.Paulo

Não identifico boa-fé na diplomacia de combate ao multilateralismo do governo de Trump

Identificar interesses comuns e compartilháveis num mundo pluralista, heterogêneo e assimétrico, permeado por tensões, é um dos grandes desafios da ação diplomática voltada para a cooperação pacífica entre Estados e sociedades.

Essas considerações de natureza geral dão a moldura das múltiplas dificuldades que caracterizaram a reunião da OMC em Buenos Aires, que se encerrou, quarta-feira, sem a dimensão unificadora de uma declaração ministerial. Ajudam também a esclarecer as ameaças que sobre ela pairam. Estas não resultam só da gestão institucional de conflitos de interesses entre seus membros, incluídos os que advêm do impacto das novas tecnologias ou da grande presença da China no comércio internacional. Têm como nota a diplomacia de combate ao multilateralismo conduzido pelos EUA na presidência de Donald Trump, alimentada pelo unilateralismo do America First. Essa postura é um obstáculo a uma ação conjunta dos membros da OMC. Torna ainda mais problemáticas leituras compartilháveis sobre como encarar os tradicionais e os novos temas do comércio internacional, num mundo de múltiplos e diversificados atores econômicos, onde os EUA detêm relevantes, mas circunscritos, 15% das exportações globais.

O risco inerente à prática da diplomacia de combate de Trump e às reações que suscita é o de minar a credibilidade e a efetividade de uma instância de governança da ordem mundial.

Explico a importância da OMC como instância de governança, lembrando que suas normas de mútua colaboração foram negociadas na Rodada Uruguai do Gatt, almejando favorecer o comércio de bens e serviços. Tiveram como fonte material enfrentar, construtivamente, os desafios de um mundo de crescente interdependência, que tornou inviável o desenvolvimento em isolamento.

Fernando Gabeira: As marcas do ano

- O Globo

Os japoneses escolheram um ideograma para definir o ano de 2017: um símbolo gráfico que significa Norte, uma alusão aos coreanos que frequentemente lançam seus foguetes no mar do Japão. Com um inimigo externo desvairado como Kim Jong-un é mais fácil achar um símbolo. Trabalhando com o alfabeto, uma revista norte-americana optou pela palavra feminismo, referência ao furacão de denúncias de assédio sexual que sacudiu Hollywood e se desloca a cem quilômetros por hora rumo à Casa Branca.

Tentei encontrar algo que simbolizasse o ano no Brasil. Pensei na tornozeleira eletrônica, pois este ano estivemos de novo sob o impacto da Operação Lava-Jato. Mas ponderei: as tornozeleiras representam os empresários que já estão saindo da cadeia. Os políticos com foro privilegiado ainda nem chegaram. Pensei num pé com a tornozeleira, outro com uma asinha. Seria difícil, embora o símbolo Yin Yang da filosofia chinesa talvez desse conta dessas energias opostas.

Deixando o território da política e olhando apenas o Brasil, soubemos que, em 15 anos, matou-se mais no Brasil do que na Síria em guerra, mais que em toda a América do Sul, mais do que em toda a Europa.

Merval Pereira: A lei e a política

- O Globo

Considerar que a Lei da Ficha Limpa é um obstáculo à democracia representativa, pois não permite que um líder popular como Lula seja julgado pelo eleitor nas urnas, é misturar alhos com bugalhos, como se uma eleição vitoriosa isentasse o candidato de seus crimes.

Oque deveria ser julgado nas urnas é a vida pública do candidato. Mas, se ela foi usada para cometer crimes contra o patrimônio público, em benefício próprio ou de terceiros, não há nenhuma justiça em permitir que esse candidato, que se aproveita da popularidade para enganar seus eleitores e burlar a lei, continue disputando eleições como maneira de não ser julgado. Não importa quanto suposto bem-estar esse líder espalhou em sua passagem pelo governo.

Aceitar a tese de que, por ser popular e até mesmo líder das pesquisas de opinião neste momento, Lula não deveria ser impedido de concorrer, pois isso tiraria a legitimidade da escolha final, é submeter as leis à política partidária, o que desvirtua a democracia. A lei é ou não para todos?

Bernardo Mello Franco: A incerteza continua

- Folha de S. Paulo

Há muita torcida e pouca clareza sobre o que vai acontecer com a candidatura de Lula em 2018. A pressa do Tribunal Regional Federal da 4ª Região não elimina a incerteza do cenário eleitoral. A pendenga jurídica será longa, mesmo que o recurso do ex-presidente seja negado até o fim de janeiro.

Em tese, uma condenação em segunda instância impediria Lula de disputar a eleição. O petista precisaria encontrar um aliado capaz de substitui-lo na liderança das pesquisas. Como esta pessoa parece não existir, seus votos se espalhariam entre diversos candidatos.

Há vários pretendentes fora do PT, dos veteranos Ciro Gomes e Marina Silva aos novatos Manuela d'Ávila e Guilherme Boulos. A fragmentação da esquerda mudaria o eixo da disputa, com a possibilidade inédita de dois candidatos do campo conservador irem ao segundo turno.

Clóvis Rossi: Chile-17, espelho para 2018?

- Folha de S. Paulo

A campanha eleitoral chilena começou, no início do ano, com a perspectiva de que marcaria mais um avanço do liberalismo na América do Sul, superando o ciclo esquerdista dos primeiros anos do século.

Chega ao fim neste domingo (17) como mais uma tradicional batalha entre esquerda e direita, em que o liberalismo é apenas tangencial. É verdade que Sebastián Piñera, presidente entre 2010 e 2014, faz parte tranquilamente do clube liberal que ganhou na Argentina, com Mauricio Macri, e no Peru, com Pedro Pablo Kuczynski.

E ascendeu também aqui no Brasil, não pela desejável via eleitoral e nem tanto por Michel Temer em si, mas pela agenda liberal que ele encampou.

Acontece que o inesperado empate entre esquerda e direita no primeiro turno forçou ambos os candidatos a correrem para os seus próprios lados, Piñera para a direita e o senador Alejandro Guillier para a esquerda.

Como, no Chile, as reformas liberais já foram feitas —e de forma radical— pela ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990), Piñera usou pouco dessa linha programática durante a campanha.

Eliane Cantanhêde: 2018 nas mãos do TRF-4

- O Estado de S.Paulo

O processo contra Lula é hoje mais decisivo para a eleição do que os próprios eleitores

O ano do Executivo, do Legislativo e do Judiciário acabou na sexta-feira e 2018 já começou com a decisão do TRF-4 de julgar o ex-presidente Lula em 24 de janeiro pelo triplex do Guarujá (SP). É em torno de Lula que se movem todas as peças do tabuleiro da eleição presidencial. Logo, as articulações e expectativas estão em suspenso dentro e fora do PT. O cenário é totalmente nebuloso.

Mesmo que Lula seja absolvido – o que não é a principal aposta do mundo político e jurídico –, ele não estará livre, leve e solto para concorrer, pois ainda há possibilidade de uma série de recursos da acusação. E não se pode esquecer que ele responde a seis outros processos. Ou seja, se o TRF-4 inocentá-lo no caso do triplex, Lula continuará como está hoje: alvo da Justiça e com destino incerto e não sabido.

Da mesma maneira, uma condenação na segunda instância, confirmando o veredicto do juiz Sérgio Moro, ou até aumentando a pena de 9 anos e 6 meses, não significará o fim de Lula. As leis brasileiras permitem um festival de recursos da defesa, no próprio TRE e, depois, nas instâncias superiores. Na prática, Lula estará condenado, mas não estará; estará inelegível, mas não estará.

Vera Magalhães: Erro de cálculo

- O Estado de S.Paulo

O atual Congresso Nacional é incapaz até do cálculo eleitoral mais comezinho

O adiamento da votação da reforma da Previdência não mostra só a impossibilidade de o atual Congresso desempenhar um papel minimamente responsável. Isso já se sabia. O mais assustador é a completa falta de cálculo político por parte dos congressistas, incapazes da aritmética eleitoral mais comezinha.

Deveria ser óbvio para parlamentares da chamada base aliada que é melhor pedir votos para a sua reeleição num país com crescimento mais acelerado, uma retomada mais consistente do emprego e confiança interna e externa restabelecida.

Mais: parece óbvio que eles deveriam querer se livrar desse pepino o quanto antes, para não avançar com uma pauta desgastante pelo ano eleitoral adentro, ou até correr o risco de adiar a discussão para a próxima legislatura.

Partidos de oposição aproveitaram a covardia dos “aliados” do governo Michel Temer para coalhar Brasília de faixas com dizeres do tipo “reforma da Previdência: quem vota não volta”.

Acoelhados, deputados governistas não devem nem ter se dado ao trabalho de checar se essa afirmação é verdadeira ou só um trocadilho fraco.

Se tivessem ido pesquisar, veriam que não é assim. Estudo do economista e consultor legislativo do Senado Pedro Nery, disponível no site da Casa, analisa o desempenho eleitoral de deputados federais que se candidataram à reeleição em 1998, meses depois da aprovação da primeira reforma da Previdência, no governo Fernando Henrique Cardoso.

Vinicius Torres Freire: Lula e os pobres na eleição bananeira

- Folha de S. Paulo

Da eleição de 2018, o que se pode dizer de menos incerto é que deve ser uma disputa bananeira, que se ignoram obviedades sobre o sucesso de Lula e que a maioria da elite, nós, está se lixando para o que os pobres estão a dizer.

Nessa democracia esmolambada, Lula pode ser um tumulto judicial até 20 dias antes do primeiro turno, partidos sem voto podem apelar a forasteiros da política, um ferrabrás das cavernas é assunto nacional e parlamentares federais serão candidatos a fugir da polícia, metade deles, por aí.

A conversa política por enquanto trata de: 1) como enganar o eleitor a respeito da dureza que será o próximo governo; 2) como caçar e cassar Lula; 3) quem pode ser a marionete à frente de um programa ou candidato liberal por ora sem voto: o "novo", o "outsider". Este também seria o problema de um programa ou candidato social-democrata sem voto. "Seria": não há programa social-democrata.

Samuel Pessôa*: O debate da política fiscal

- Folha de S. Paulo

Há um debate sobre a importância da política fiscal no atual momento do ciclo econômico. Em geral, defende-se que a política fiscal seja contracíclica. Ou seja, em momentos de forte recessão ou depressão, o governo deve reduzir o superavit primário ou elevar o deficit primário para estimular a demanda.

O impulso à demanda acelera o crescimento econômico. Se a ociosidade da economia for muito elevada, o crescimento acelerar-se-á fortemente e a economia sairá rapidamente da recessão.

Evidentemente, no final do processo, a dívida pública será maior, mas a elevação da dívida pública é mais do que compensada pelo ganho de bem-estar de uma redução mais rápida da taxa de desemprego.

Mas será que não seria possível que a aceleração do crescimento promovida pelo ativismo fiscal fosse tão intensa que o crescimento da receita de impostos –que acompanha a aceleração do crescimento econômico– mais do que compensasse o aumento do gasto (isto é, o ativismo fiscal) e, no frigir dos ovos, teríamos o melhor dos mundos: crescimento maior, desemprego menor e relação dívida-PIB menor?

Ou seja, será que não é possível termos uma política fiscal ativa autofinanciável?

A teoria econômica e a evidência empírica indicam que em economias com juros reais elevados esse não é o caso. O motivo é claro: dadas as defasagens naturais entre a política fiscal e seu efeito sobre a atividade e a receita, seu impacto sobre o endividamento já se acumulou na forma dos juros compostos.

Incerteza sobre Lula estimula partidos a lançarem candidatos

Bruno Boghossian / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A definição da data do julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em segunda instância (PT) reforçou a movimentação de partidos para lançar seus próprios candidatos ao Palácio do Planalto e pode estimular a multiplicação de nomes inscritos na corrida de 2018.

Para dirigentes de siglas como DEM, PMDB, PSD e PSB, a velocidade dada ao processo contra o petista amplia as chances de que o ex-presidente fique fora das urnas, o que abriria espaço para candidaturas alternativas tanto na esquerda quanto no centro e na direita.

A cúpula do DEM, por exemplo, voltou a trabalhar com a hipótese de convencer Luciano Huck a se candidatar à Presidência da República no ano que vem.

Integrantes do comando da legenda mantiveram contato com o apresentador da TV Globo mesmo depois que ele publicou na Folha artigo em que afirma que não disputará o Planalto em 2018.

Eles acreditam que podem convencer Huck a voltar a considerar esse projeto caso haja indícios fortes, nos próximos meses, de que Lula não conseguirá manter sua candidatura amparado por uma decisão judicial. Nesse caso, ele precisaria se filiar a um partido até o início de abril.

Dirigentes do DEM avaliam que o apresentador conseguiria atrair boa parte do eleitorado do petista e planejam oferecer o partido como plataforma para esse projeto, rompendo conversas iniciais da sigla com o PSDB do pré-candidato Geraldo Alckmin.

Além do plano Huck, os democratas ainda trabalham com os nomes do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), e do prefeito de Salvador, ACM Neto.

PSB, a sigla desejada por Lula, Alckmin, Ciro e Marina

Depois da morte de Eduardo Campos, partido hoje está dividido entre defensores dos quatro presidenciáveis

Sérgio Roxo / O Globo

SÃO PAULO - Depois de viver o seu auge no plano nacional com os 22 milhões de votos recebidos por Marina Silva na eleição de 2014, o PSB se transformou na noiva da disputa presidencial de 2018. Em razão do racha interno provocado pela morte da sua principal liderança, Eduardo Campos, em 2014, o partido hoje se divide entre defensores de uma aliança com Lula (PT), Geraldo Alckmin (PSDB), Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva, hoje na Rede.

Enquanto o PSB trava sua batalha interna, os quatro précandidatos lançam suas armas para tentar atrair o aliado. A ofensiva inclui visitas a Renata Campos, a viúva de Eduardo, que exerce influência na cúpula. Em agosto, Lula esteve na casa dela, em Recife. Alckmin a visitou em novembro.

Os quatro presidenciáveis acenam com o posto de vice. Sem nenhum outro aliado em vista, já que seus parceiros tradicionais, como o PCdoB, lançaram pré-candidatos, o PT, no momento, é o que tem jogado as fichas mais pesadas. Os petistas oferecem apoio à reeleição de Paulo Câmara, em Pernambuco, e de Márcio França, que deve assumir o governo de São Paulo em março quando Alckmin renunciar ao posto para concorrer a presidente. Ele já anunciou que tentará um novo mandato.

Com desgaste do PMDB, Paes avalia migrar para PP ou PTB

Os dois partidos, no entanto, são marcados por escândalos de corrupção

Fernanda Krakovics / O Globo

Com a implosão do PMDB fluminense, o ex-prefeito do Rio Eduardo Paes está em busca de um novo partido para disputar o governo do estado no ano que vem, embora, neste momento, esteja inelegível por decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio. Paes, segundo aliados, avalia a possibilidade se filiar ao PP ou ao PTB.

O PP é um dos partidos mais investigados na Lava-Jato. Já o PTB tem como presidente o exdeputado Roberto Jefferson, delator do mensalão. Ele cumpriu pena de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.

Paes tenta se desvencilhar do desgaste do PMDB do Rio, cuja cúpula está presa.

Em sua passagem pelo Rio neste mês — o ex-prefeito está morando nos Estados Unidos —, Paes se reuniu com o vicegovernador do estado e presidente de honra do PP, Francisco Dornelles. E teve também um encontro com Roberto Jefferson e sua filha, a deputada federal Cristiane Brasil (PTB)

Tanto Dornelles quanto Jefferson afirmaram que Paes seria bem-vindo em seus partidos, mas negaram que a conversa tenha passado por aí.

Publicamente, o ex-prefeito tem afirmado que só no mês que vem, quando volta a morar no Brasil, discutirá eventual troca de partido.

Reforma branda beneficiará 52% dos servidores federais

Governo estuda alternativa para manter aposentadoria integral dos que ingressaram no serviço público até 2003

Adriana Fernandes Idiana Tomazelli / O Estado de S. Paulo.

Pouco mais da metade dos servidores federais será beneficiada se o governo decidir abrandar a reforma da Previdência e manter a aposentadoria integral – com o último salário da carreira – e os reajustes iguais aos dos funcionários da ativa para quem ingressou no serviço público até 2003. São 380 mil pessoas, ou 52% do contingente total, nessa situação. O texto em tramitação na Câmara quer cobrar dos servidores as idades mínimas de 65 anos para homens e 62 para mulheres para manter a integralidade e paridade. As categorias, no entanto, pressionam os deputados para derrubar a proposta, e uma alternativa “mais leve” está em estudo pela equipe econômica. Se pagos hoje, todos os benefícios futuros custariam R$ 507,6 bilhões à União, de acordo com cálculos da Secretaria da Previdência – algumas áreas têm remuneração no fim da carreira acima de R$ 20 mil mensais.

Se o governo ceder à pressão do funcionalismo público para abrandar a proposta de reforma da Previdência, vai beneficiar 52% dos servidores federais. São 380 mil servidores que ainda estão em atividade e que vão se aposentar com o último salário da carreira e reajustes iguais aos dos funcionários da ativa. Eles ingressaram no serviço público até 2003 e têm o direito às chamadas integralidade e paridade – privilégios que o governo quer acabar ao aprovar a reforma, mas que as categorias pressionam para manter.

Com extras, 71% dos juízes recebem acima do teto

Remuneração média de magistrados nos estados é de R$ 42,5 mil

Levantamento inédito com números do Conselho Nacional de Justiça revela que benefícios como auxílio-moradia e gratificações representam um terço dos contracheques

Dois em cada três juízes dos tribunais de Justiça dos estados e do Distrito Federal recebem acima do teto constitucional, de R$ 33.763. A disparidade entre o limite e o que efetivamente aparece no contracheque de 11,6 mil magistrados (71,4% do total) se deve a uma brecha legal que retira do cálculo as verbas indenizatórias, como dinheiro extra para moradia, alimentação e gratificações, revela MARLEN COUTO. Os dados foram comparados com base nas folhas de pagamento enviadas, pela primeira vez e em um mesmo padrão, pelos tribunais ao Conselho Nacional de Justiça. Assim, é possível verificar o peso dos benefícios nos salários, que chega a 33%, em média. Em um único mês, 52 juízes e desembargadores tiveram remuneração superior a R$ 100 mil.

Teto sem limite

Nos TJs, penduricalhos representam um terço da renda; 71% dos juízes passam de R$ 33 mil

Marlen Couto / O Globo

Folhas de pagamento entregues este mês ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por tribunais de todo o país mostram que, ao menos nas cortes estaduais, receber remunerações superiores ao teto constitucional é regra, não exceção. Levantamento do Núcleo de Dados do GLOBO, com base nas informações salariais divulgadas pela primeira vez pelo CNJ, aponta que, nos últimos meses, 71,4% dos magistrados dos Tribunais de Justiça (TJs) dos 26 estados e do Distrito Federal somaram rendimentos superiores aos R$ 33.763 pagos aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) — valor estabelecido como máximo pela Constituição.

Irrealismo orçamentário: Editorial/O Estado de S. Paulo

A impossibilidade de previsão de qualquer nova obra, a necessidade de cortar despesas já no início do ano e o risco que a inclusão de receitas ainda não garantidas traz para sua execução ao longo do ano são algumas das características da Lei Orçamentária Anual (LOA) da União para 2018 que o Congresso Nacional aprovou na quarta-feira passada, em votação simbólica. Registre-se o fato, raro nos últimos anos, de a decisão ter sido tomada dentro do prazo legal, isto é, antes do encerramento da sessão legislativa. O orçamento aprovado retrata a grave crise fiscal que o País enfrenta, as restrições formais para a aplicação mais racional dos recursos e a maneira pouco responsável com que os parlamentares lidam com o dinheiro público. Esse tipo de comportamento se torna muito mais nocivo diante da crise das finanças públicas agravada pelo adiamento, pelos próprios congressistas, da discussão das reformas, a começar pela do sistema previdenciário.

Como observou o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, responsável pela execução do Orçamento da União, seria bom para o País ter um orçamento adequado às suas necessidades e às suas prioridades. Mas, como reconheceu em seguida, “lamentavelmente, o que nós temos na realidade é um orçamento engessado, que responde muito mais à capacidade de pressão e de mobilização de alguns grupos no Congresso, que acabam fazendo valer as suas prioridades dentro do orçamento”.

Salto no escuro: Editorial/Folha de S. Paulo

Cresceu o risco de que o próximo presidente da República assuma o governo em meio a um agravamento da crise orçamentária.

Ao adiar para fevereiro a votação da reforma da Previdência, a coalizão situacionista deu flagrante mostra de fraqueza -até nas idas e vindas do anúncio atabalhoado.

Dispendiosas concessões a setores empresariais e unidades federativas foram feitas durante as negociações para o avanço da proposta, além de alterações destinadas a tornar seu texto mais brando. Nem assim se obteve o apoio necessário de 308 dos 513 deputados.

Ao contrário, ficou patente o quanto os políticos se intimidam diante das pressões das castas mais privilegiadas do serviço público em favor de suas benesses.

Enquanto isso, deixaram de ser examinadas medidas destinadas a reduzir o rombo nas contas do Tesouro Nacional, casos do adiamento dos reajustes salariais do funcionalismo e das majorações de tributos sobre folhas de pagamento e aplicações financeiras.

Os privilégios salariais do servidor público: Editorial/O Globo

A remuneração do funcionalismo, assim como a aposentadoria, é desproporcionalmente elevada; daí, a necessidade também de uma reforma neste campo

A conhecida e repetida frase do bilionário americano Warren Buffett — “sabe-se quem está nadando nu quando a maré baixa” — ajusta-se à perfeição ao efeito pedagógico da maior crise fiscal brasileira de que se tem notícia. Devido a estudos e debates, ela tem disseminado informações sobre fortes mecanismos de concentração de renda operados pelo Estado brasileiro. Alguns deles sempre justificados por bons propósitos: por exemplo, os bilhões de reais de crédito do BNDES subsidiados pelo dinheiro do contribuinte vão (ou estavam indo) para grandes empresas em condições de obter financiamentos no exterior, sob o argumento meritório da criação de empregos e de riquezas no país. Principalmente dos controladores das empresas, é certo, constata-se.

A explosão há tempos anunciada do sistema da Previdência apareceu à frente da sociedade, de forma mais visível, e tem sido possível chamar a atenção para o injusto desnível entre a aposentadoria dos servidores públicos e a do assalariado do setor privado. Neste, o limite do benefício, difícil de alcançar, é de cinco salários mínimos (R$ 5.531), enquanto em castas do funcionalismo há aposentadorias de vários milhares de reais. Nos servidores do Legislativo, por exemplo, a média é R$ 28 mil. Como o Tesouro cobre os inevitáveis déficits do sistema, esta é uma eficiente máquina de transferência de renda de pobres para ricos.

Coluna do Estão/O Estado de S. Paulo: Governo terá placar para contar novos empregos

O governo federal quer instalar um “trabalhômetro” na Esplanada dos Ministérios. O painel eletrônico será atualizado a cada emprego gerado no País. O placar, ainda sem data para ser inaugurado, vai começar a contar os empregos a partir de 1,1 milhão, número de vagas criadas no último trimestre, segundo o IBGE. O governo estima criar 2 milhões de empregos com as novas regras previstas na reforma trabalhista. O número é a aposta da base de apoio do presidente Temer para conseguir eleger um nome desse grupo para o Planalto em 2018.

» Do seu bolso. Uma versão do “trabalhômetro” foi lançada esta semana na página oficial do governo na internet. A campanha foi criada pela Isobar, agência de publicidade que atende o Planalto. O custo do painel sairá do contrato.

» Ser ou não ser. Preparada há meses, a peça publicitária demorou a sair do papel porque os publicitários tinham dúvidas sobre qual número usar. Isso porque há diferença nos dados de trabalho formal e informal. Optou-se pelo primeiro.

» Agilidade. Nas redes sociais, a campanha diz que “enquanto você dá um nó na gravata, 12 brasileiros arrumam trabalho. É uma oportunidade gerada a cada 7 segundos”. Mas reconhece que o País tem 13 milhões de desempregados e ainda há muito a fazer.

» Caros. A União gasta mais com militares aposentados e seus pensionistas do que com os da ativa. Em 2017, o Tesouro vai pagar R$ 26 bilhões com quem ainda está de farda e R$ 44,8 bilhões com quem já está na reserva.

Comparecimento vai decidir 2º turno no Chile

Segundo turno apertado no Chile será decidido por comparecimento às urnas

Sebastián Piñera, de centro-direita, e Alejandro Guillier, de centro-esquerda, duelaram nas últimas semanas em busca do eleitor que não compareceu no primeiro turno da eleição presidencial chilena; abstenção pode bater novo recorde

Rodrigo Turrer / O Estado de S.Paulo

Há menos de um mês, a vitória de Sebastián Piñera na eleição presidencial do Chile parecia certa. Ele teve apenas 36% dos votos, mas seu maior rival não foi Alejandro Guillier, que teve 22% dos votos, mas a abstenção, que chegou a 46%. Por isso, nas últimas semanas, os dois candidatos protagonizaram um tudo ou nada na tentativa desesperada de atrair às urnas mais da metade dos eleitores chilenos.

A verdadeira batalha política travada no Chile agora é para tirar do sofá os chilenos que não votaram. Desde que o voto deixou de ser obrigatório no país, em 2012, o índice de abstenção só aumenta. No primeiro turno, foi recorde: dos 14 milhões de chilenos habilitados a votar, apenas 6,7 milhões compareceram às urnas.

No segundo turno, historicamente, essa participação cai até 10%. “É difícil convencer aqueles que votaram em postulantes derrotados no primeiro turno a saírem de casa para votar em um candidato que foi rejeitado”, afirma Eugenio Guzmán, sociólogo e professor da Faculdade de Governo da Universidade do Desenvolvimento de Santiago.

Referendo sobre Piñera

Disputa acirrada no Chile será decidida por tamanho da rejeição a retorno de ex-presidente

Janaína Figueiredo / O Globo

BUENOS AIRES - Desde o retorno da democracia, em 1990, nunca houve tanta incerteza em relação a uma eleição presidencial no Chile como existe hoje. Depois de um primeiro turno no qual todas as pesquisas erraram ao projetarem até mesmo um triunfo contundente do ex-presidente Sebastián Piñera (2010-2014), nos últimos dias ninguém se arriscou a cravar quem será, finalmente, o sucessor de Michelle Bachelet. Há pouco menos de um mês, Alejandro Guillier, o candidato apoiado pela chefe de Estado, obteve um magro desempenho no primeiro turno, superando por menos de dois pontos percentuais a grande revelação da campanha, a jornalista Beatriz Sánchez, da esquerdista Frente Ampla, a novidade política de 2017. Para tentar reverter sua desvantagem, a estratégia de Guillier — senador sem longa trajetória, carisma e base política — foi transformar a eleição num referendo sobre Piñera, dono de uma das maiores fortunas do Chile.

A jogada de Guillier poderia dar certo, já que a rejeição ao ex-presidente é alta, sobretudo na classe média. O candidato, que durante toda a campanha buscou mostrar-se como um outsider da política, espera captar a maioria dos votos anti-Piñera. Esse cenário é possível, mas implicaria problemas a curto prazo. Caso Guillier consiga passar dos 22,7% alcançados no primeiro turno (contra 36,7% do ex-presidente) e ultrapasse Piñera, muitos apontam semelhanças com a situação no Peru. O atual presidente, Pedro Pablo Kuczynski, atualmente mergulhado numa gravíssima crise política desencadeada por denúncias de recebimento de subornos pagos pela Odebrecht, venceu por representar o antifujimorismo. A tática foi efetiva mas, uma vez no poder, Kuczynski perdeu apoio e tornou-se um chefe de Estado fraco.

— O ex-presidente não tem boa imagem entre muitos chilenos, que o consideram pouco confiável e o veem como um empresário que só pensa em fazer negócios — comentou Marco Moreno, reitor da Faculdade de Governo da Universidade do Chile.

Cacá Diegues: Quem são os vândalos

- O Globo

Quem quiser que acredite na visão convencional de que o brasileiro é um povo ordeiro e pacífico, incapaz de qualquer violência. Essa fake news histórica está na maioria dos livros didáticos sobre nós mesmos e, ainda, em ensaios dignos de respeito pela assinatura de seus autores. Assim como nosso povo não é tão bonzinho assim, as elites do país não deixam também de ser, muitas vezes, assombrosamente injustas e selvagens.

Na História do Brasil, a reação das elites a movimentos de iniciativa popular nos ajuda a compreender como elas consideram quem afirmam representar. Peguem, por exemplo, sem ordem cronológica, Canudos, os Malês, as Revoltas da Vacina e da Chibata, a Guerra do Contestado, a Revolução de 32, os Mascates, Cabanagem, Balaiada, Palmares, a Revolução Federalista de 1894, os Farrapos, Confederação do Equador e muito mais (ufa!). Todas essas revoltas foram encerradas com muita cadeia, tortura e morte.

Os movimentos de alguma grandeza e importância, que não sofreram reação armada de quem estava no poder, foram aqueles em que as elites se entenderam muito bem entre elas mesmas, num acordo de cúpula em que as partes garantiram suas vantagens. Como a Independência (sob proteção da Inglaterra e aquiescência de Portugal) ou a República (proclamada pelos cafeicultores senhores de terras, irritados com a Abolição da Escravatura).

Nossa história é contada em séculos de conflitos sangrentos, resistências heroicas, lutas contra o trabalho escravo a serviço dos senhores das múltiplas riquezas do país. E com muita porrada das oligarquias que sempre mandaram, sobre aqueles que, em algum momento, se negaram a obedecer. Não é à toa que o Brasil foi o país ocidental que mais escravos importou da África negra, sendo o último a acabar formalmente com a escravidão.

Política dá o tom do cinema no ano que vem

Filmes estrangeiros de Guillermo del Toro, Marvel e Luca Guadagnino, e nacionais de Cacá Diegues e Sérgio Rezende têm tom político intenso

Luiz Carlos Merten / O Estado de S.Paulo

Pode ser que o Globo de Ouro não seja mais um indicativo seguro para as premiações da Academia, como foi no passado, mas o glamour da festa ainda conta pontos em Hollywood. A Forma da Água, de Guillermo Del Toro, cravou seis indicações para o prêmio de drama da Associação dos Correspondentes Estrangeiros, incluindo filme, diretor, roteiro e atriz (Sally Hawkins). Em setembro, o filme do mexicano venceu o Leão de Ouro no Festival de Veneza. Vencerá em janeiro o Globo de Ouro? Terá quantas indicações para o Oscar?

Uma coisa é certa: A Forma da Água se antecipa como um dos grandes lançamentos de 2018. Conta a história de uma garota muda que trabalha na limpeza de um laboratório de segurança máxima. Chega essa estranhíssima criatura anfíbia que os norte-americanos tentam esconder dos soviéticos. Em plena Guerra Fria, as superpotências correm para ver quem envia primeiro um homem à Lua. O ser anfíbio poderá ser cobaia numa disputa que envolve agentes russos infiltrados. Mas há outra leitura possível: a criatura, por quem se apaixona a faxineira, representa os ‘outros’ que o mundo ainda teima em discriminar, 50 anos depois. Embora se passe nos anos 1960, A Forma da Água é totalmente contemporâneo, até porque, em todo o mundo, tem havido uma polarização política e comportamental, mesmo que os conceitos de esquerda e direita pareçam ultrapassados em plena era do liberalismo econômico.

Fernando Pessoa: Datilografia

Traço, sozinho, no meu cubículo de engenheiro, o plano,
Firmo o projeto, aqui isolado,
Remoto até de quem eu sou.

Ao lado, acompanhamento banalmente sinistro,
O tique-taque estalado das máquinas de escrever.
Que náusea da vida!
Que abjeção esta regularidade!
Que sono este ser assim!

Outrora, quando fui outro, eram castelos e cavaleiros
(Ilustrações, talvez, de qualquer livro de infância),
Outrora, quando fui verdadeiro ao meu sonho,
Eram grandes paisagens do Norte, explícitas de neve,
Eram grandes palmares do Sul, opulentos de verdes.

Outrora.

Ao lado, acompanhamento banalmente sinistro,
O tique-taque estalado das máquinas de escrever.

Temos todos duas vidas:
A verdadeira, que é a que sonhamos na infância,
E que continuamos sonhando, adultos, num substrato de névoa;
A falsa, que é a que vivemos em convivência com outros,
Que é a prática, a útil,
Aquela em que acabam por nos meter num caixão.

Na outra não há caixões, nem mortes,
Há só ilustrações de infância:
Grandes livros coloridos, para ver mas não ler;
Grandes páginas de cores para recordar mais tarde.
Na outra somos nós,
Na outra vivemos;
Nesta morremos, que é o que viver quer dizer;
Neste momento, pela náusea, vivo na outra ...

Mas ao lado, acompanhamento banalmente sinistro,
Ergue a voz o tique-taque estalado das máquinas de escrever.