sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

Privatização da Eletrobras não pode ser barganhada: Editorial/O Globo

Governo Temer já cedeu demais no ajuste da economia, e não pode recuar numa operação estratégica diante de pressões cujos objetivos são espúrios

A mistura de hecatombe fiscal e crise política tem sido pródiga em revelar ou a dar mais contraste a tipos de resistência de grupos organizados contra ajustes necessários para reequilibrar as contas públicas e desobstruir os espaços, a fim de a economia voltar a crescer de forma equilibrada.

Fica evidente a resistência de castas do funcionalismo público à equalização das regras de aposentadoria na sociedade brasileira — não só em nome da questão fiscal, mas também da tão falada e pouco praticada justiça social —, bem como se torna cada vez mais claro que a privatização não interessa a políticos, devido a motivos nada republicanos.

À medida que se aproxima a venda do controle do sistema Eletrobras, armam-se barricadas no Congresso contra a privatização de subsidiárias como Furnas e Chesf. Não por acaso, parlamentares e políticos mineiros em geral tentam manter Furnas sob controle estatal, enquanto nordestinos fazem o mesmo com a Chesf, e assim por diante.

E não é pelo fato de estarem sinceramente preocupados com o futuro do setor elétrico. Se estivessem, não resistiriam à privatização, única forma de se dar condições ao setor de realizar os pesados e extensos investimentos que a geração de energia requer.

Poderiam discutir modelos de passagem da holding do setor elétrico ao controle privado, mas não se opor pura e simplesmente à operação, sem dar qualquer alternativa viável de financiamento do setor, sem envolver o Tesouro, que está e continuará por algum tempo — a depender da reforma da Previdência — em situação fiscal frágil.

Não interessa a políticos de praticamente todos os partidos a privatização de estatais, porque — como ensinou a Lava-Jato — elas são usadas de várias maneiras, todas espúrias. Seja para empregar apaniguados, mas também, e principalmente, gerar comissões em negócios para financiar campanhas e, é certo, também visando ao enriquecimento pessoal.

É assim que o tucano Aécio Neves tem lugar de destaque na bancada mineira antiprivatização de Furnas, mesmo que seu partido ostente no programa a defesa da desestatização. Aplicada nos governos de Fernando Henrique Cardoso. Os mesmos motivos movem os nordestinos na resistência à venda da Chesf.

É simples: sem a Petrobras não haveria o petrolão lulopetista, com os aliados MDB e PP. O ex-deputado Roberto Jefferson, pai da nova ministra do Trabalho, Cristiane Brasil, conhecedor desses subterrâneos, com a experiência de ex-presidiário do mensalão, diz que ter alguém numa estatal significa construir acessos a empresários que poderão financiar campanhas. O resto, sabe-se.

O governo Temer não pode é se curvar a mais esta pressão e colocar na mesa de barganhas um projeto estratégico como este. Tem cedido muito, não pode mais recuar.

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