terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Yoshiaki Nakano: Incerteza política e economia

- Valor Econômico

Incertezas políticas agudas foram incorporadas nas decisões dos agentes econômicos como a nova normalidade

O quadro político ainda é de grande incerteza e, como 2018 será o ano de eleição presidencial, a indefinição sobre o futuro que nos espera é ainda maior. Com o nível tão alto de incerteza, é até contraditório que a economia esteja em plena recuperação, ainda que lentamente. Desde 2014, o quadro político quebrou a confiança da sociedade e nos lançou numa profunda recessão. Mas isto já é o passado. Precisamos olhar para o futuro e construir novas esperanças e sonhos.

Olhando para este ano, os otimistas esperam que a economia brasileira cresça pelo menos 3 %. Os mais cautelosos ficam entre 2,5% e 3%. Portanto, há uma grande convergência e concordância de que estamos em plena recuperação cíclica. Entretanto, ninguém espera uma retomada do crescimento, muito menos de forma sustentada, e todos tendem a concordar que o crescimento potencial da economia brasileira, se mudou, foi para pior.

A atual conjuntura econômica indica que houve um certo descolamento entre a incerteza e instabilidade políticas e a economia. Isto é até compreensível, pois o comportamento humano é flexível e tende a se adaptar e aceitar como "normais" situações antes consideradas caóticas e de quase pânico, o que tipicamente geraria uma crise econômica de confiança. Esse tipo de comportamento humano é confirmado quando construímos índices de percepção de criminalidade da população. Por exemplo, o índice de percepção de criminalidade da população, em cidades nas quais a ocorrência de fatos como assassinatos e assaltos é elevada e recorrente há muito tempo, é muito menor do que em cidades em que esses crimes não ocorriam e passaram a ocorrer recentemente. Até mesmo os altos índices de ocorrência de crimes fazem com que a população se acostume e passem a ser "normais".

Pelas mesmas razões acima, as incertezas políticas agudas como as que estamos vivendo, aparentemente, foram incorporadas nas decisões diárias dos agentes econômicos como a "nova normalidade". De fato, como Keynes já apontava, mesmo num quadro de grande incerteza o agente econômico precisa tomar decisões no dia a dia, e para isto, formam-se convenções necessárias, pois de outra forma ficaria totalmente paralisado. Dai um descolamento entre as incertezas políticas e o comportamento econômico. Nas decisões de curto prazo tornaram-se o núcleo da nova convenção. No momento, prevalece a convenção de que no curto prazo a economia está se recuperando e que neste ano o PIB poderá crescer entre 2,5% a 3%. Mas o horizonte desta convenção é curta cobrindo no máximo 2018 e 2019.

No longo prazo, o horizonte continua de total incerteza. Caso o próximo governo seja capaz de implementar um conjunto de reformas estruturais e formular novas políticas, particularmente macroeconômicas, criando um ambiente favorável à geração de novos conjuntos de investimentos capaz de criar uma onda longa de expansão da economia brasileira. Investimentos em 1- infraestrutura capaz de gerar uma longa onda de ganhos em produtividade; 2- um novo complexo industrial, competitivo internacionalmente e capaz de se inserir no mercado global, e 3- um novo complexo agro-industrial-serviços, como núcleo de inovação tecnológica.

Um grande projeto desta natureza, infelizmente, tem dois requisitos fundamentais: o surgimento de uma nova liderança política que busque o desenvolvimento econômico voltado para o bem comum, com horizonte amplo e temporalmente longo, capaz de levar este projeto nacional de "catch up" adiante; e uma reforma estrutural do Estado, eliminando as vantagens exorbitantes do funcionalismo e o seu caráter extrativista, introduzindo o princípio da eficiência como força motriz e tornando-o capaz de promover as mudanças e reformas necessárias para o Estado prover serviços de qualidade para a população.

Qualquer previsão na política e nas eleições daqui a 10 meses só é possível fazendo pressupostos heroicos. Hoje nas pesquisas de opinião despontam dois candidatos: Lula e Bolsonaro. Portanto, há uma polarização entre a esquerda e a direita, mas é impossível prever a decisão do próximo dia 24 de janeiro pelo Tribunal Federal do Rio Grande do Sul e seus desdobramentos, o que pode ou não mudar totalmente o quadro eleitoral tornando Lula inelegível.

Mas esta hipótese de excluir Lula da corrida presidencial seria uma nova hipótese heroica: instâncias superiores no nosso sistema judiciário poderão anular ou neutralizar a decisão. Hoje estamos assistindo decisões e fatos que nos levam a este quadro de incerteza jurídica. Se o cenário eleitoral se definir em torno dos nomes que estão colocados, sem uma grande novidade, é possível que um candidato que aglutine o centro e seja contra o atraso proposto pelos extremos, com propostas concretas e discurso capaz de empolgar o eleitorado, tenha grandes chances de vencer as eleições. Será que o governador Alckmin reunirá estas condições, particularmente, de empolgar o eleitorado e criar uma mobilização massiva?

Enfim, é importante lembrar que a maioria da população quer mudança, que o Brasil saia deste marasmo, uma liderança que traga esperanças, com ideias e propostas para retomar o crescimento mais acelerado, gerar empregos, eliminar a pobreza, e garantir maior bem estar para todos.

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Yoshiaki Nakano, com mestrado e doutorado na Cornell University, é professor e diretor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP)

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