segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Celso Rocha de Barros: Candidatura de Marina fica entre Lula e Macron

- Folha de S. Paulo

A pré-candidata apoiou o impeachment, o que, do ponto de vista do programa da Rede, foi erro histórico

Marina Silva parece indecisa se vai para a eleição como o Lula de saias ou como o Macron brasileiro.

O maior erro de Marina Silva foi não ter sido capaz de entender o que aconteceu com ela na campanha de 2014. Naquele ano, quando Marina decolou nas pesquisas, o PT lançou contra sua candidatura uma campanha publicitária muito agressiva, como nunca havia feito contra os tucanos. Marina acabou ficando fora do segundo turno.

A lição que deveria ter tirado era: opa, apavorei os petistas como os tucanos nunca apavoraram. Alguma coisa eu devo ter feito certo, vou investir nisso.

Não era difícil descobrir o que apavorou os petistas: Marina poderia ter sido o que, reza a lenda, José Dirceu teria chamado de "Lula de saias": infância pobre, história de militância com Chico Mendes, trajetória de sucesso no PT, ministra de Lula; mas sem qualquer acusação de corrupção contra si. Concorrendo em 2014 com um programa econômico mais liberal, era a opção "Ganhe o Lula de volta sem os escândalos e sem perder o direito de dizer 'presidenta'". Foi isso que apavorou os petistas e os fez perder o controle.

Marina poderia ter capitalizado essa imagem, mas preferiu uma opção mais confortável: passar quatro anos denunciando os comerciais de João Santana como a maior catástrofe humanitária desde o genocídio do Camboja.

Os comerciais do PT contra Marina foram, de fato, horríveis. Mas Marina perdeu 2014 por não ter estrutura partidária. Quatro anos depois, ainda lhe falta um partido forte, mas deu tempo de reclamar bastante de João Santana.

Como já disse aqui, o impeachment foi péssimo para a Rede Sustentabilidade. Impeachment só tem sim ou não, não tem terceira via. A Rede entrou na guerra com a posição mais razoável de todas: cassar a chapa e realizar novas eleições. Marina apoiou o impeachment, o que, do ponto de vista do próprio programa da Rede, foi um erro histórico: quando Dilma caiu, morreu a possibilidade de novas eleições. O TSE estava com Gilmar. Gilmar condenaria Dilma, mas não Temer.

O impeachment distanciou Marina da esquerda, mas ela ainda é a candidata que herda mais votos de Lula. A estratégia "Lula de saias" ficou mais difícil, mas ainda não morreu.

Desde o impeachment, entretanto, Marina parece ter apostado em outra alternativa, a opção Macron. Foi ministra de Lula, como Macron foi de Hollande, e agora se apresenta com um discurso mais próximo do liberalismo.

Já está claro que, quando os analistas brasileiros dizem "Macron", querem dizer alguém que some os votos não bolsonaristas de Aécio aos de Marina Silva. Bom, Marina Silva já começa com os próprios votos. Não sei bem por que o pessoal quer um Macron, mas, se quiserem, a opção mais clara no Brasil é Marina.

O notável é que a turma em busca de Macron quase nunca cite seu nome como opção. O pessoal quer um tucano que conquiste o eleitorado de Marina, não uma Marina que conquiste o eleitorado dos tucanos.

Prefiro Marina na reconstrução da esquerda do que como opção Macron. Mas a escolha é dela, e não faço apostas com as cartas dos outros.

Só noto que, se o ressentimento por 2014 distanciar Marina da esquerda de vez, João Santana terá sobre a eleição de 2018 uma influência muito maior do que o papel absolutamente secundário que teve em 2014.
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Celso Rocha de Barros é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford, com tese sobre as desigualdades sociais após o colapso de regimes socialistas no Leste Europeu.

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