quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Contas públicas têm em janeiro melhor resultado em 22 anos

Superávit de R$ 31 bi foi puxado por Refis, e quadro fiscal ainda é de desafios

Bárbara Nascimento e Marcello Corrêa | O Globo

-BRASÍLIA E RIO- As contas públicas encerraram janeiro com o melhor resultado em 22 anos, desde o início da série histórica, informou ontem o Tesouro Nacional. No mês passado, o governo central, formado por Tesouro, Previdência Social e Banco Central, registrou superávit primário de R$ 31,07 bilhões. O número foi divulgado um dia após relatório da Receita Federal mostrar que a arrecadação federal teve em janeiro o melhor desempenho para o mês desde 2014. Apesar dos dados positivos, especialistas alertam que o quadro fiscal ainda é de desafios no longo prazo, principalmente em relação à reforma da Previdência, que o governo acabou abandonando. Em 12 meses, as contas públicas continuam deficitárias em R$ 111,2 bilhões.

Normalmente, janeiro é mês de resultados positivos, por fatores sazonais. Os dados divulgados ontem, no entanto, são considerados fora da curva. O superávit do mês passado representa uma alta real (já descontada a inflação) de 67,8% em relação a janeiro de 2017, quando o superávit foi de R$ 18 bilhões.

Isso foi possível porque as receitas cresceram muito mais que as despesas. Enquanto o gasto teve alta de 1,6%, as receitas líquidas registraram aumento de 11,7%. O Tesouro explicou que o resultado positivo tem relação com três fatores principais: as receitas do Refis (programa de regularização tributária), o aumento do PIS/Cofins sobre combustíveis e a retomada da atividade econômica.

Do crescimento de R$ 15 bilhões nas receitas totais, o último Refis foi responsável por uma parcela de R$ 7,8 bilhões, estima a equipe econômica. Já o PIS/Cofins representa R$ 1,3 bilhão da alta, e o crescimento da atividade, R$ 5,9 bilhões.

O Tesouro destaca que o movimento deve encolher em fevereiro. No segundo mês do ano, o governo faz transferências a estados e municípios, relativas à arrecadação trimestral de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e à parcela de participação especial de royalties.

Especialistas também acreditam que os recordes não se repetirão. Nas contas do economista Fábio Klein, da Tendências Consultoria, o país deve encerrar 2018 com déficit de R$ 135,6 bilhões, bem abaixo da meta fiscal, de R$ 159 bilhões, mas acima dos R$ 124 bilhões registrados no ano passado. Ele lembra que, como a recuperação da receita ocorreu praticamente na reta final do ano passado, o governo não teve tempo de desbloquear recursos contingenciados, o que contribuiu para um déficit bem menor do que se esperava no início de 2017.

Ele observa que, embora as receitas tendam a crescer com a recuperação da economia, o ajuste fiscal segue necessário no longo prazo. A Previdência teve rombo de R$ 14,4 bilhões em janeiro, o maior já registrado para o mês.

A economista Margarida Gutierrez, professora da Coppead/UFRJ, concorda. E lembra que o governo terá dificuldade para cumprir a regra de ouro, princípio constitucional que proíbe o governo de se endividar para pagar gastos correntes, como folha de pessoal.

— Hoje, temos três metas fiscais. A do teto de gastos está superapertada. A do resultado primário pode ter alguma folga pelo aumento da arrecadação. Mas a regra de ouro será um grande problema nos próximos anos — afirma. 

BNDES ANUNCIA DEVOLUÇÃO DE R$ 30 BI ATÉ ABRIL 
O relatório divulgado ontem pelo Tesouro mostra que, no acumulado em 12 meses, o governo descumpriria o dispositivo. Pela regra, gastos com operações de crédito não podem ser maiores que despesas com investimento. Nos 12 meses encerrados em janeiro, as receitas com operações de crédito somaram R$ 894,8 bilhões. E as despesas de capital, R$ 757,7 bilhões, uma diferença de R$ 24,2 bilhões.

O governo conta com um adiantamento de recursos do BNDES de R$ 130 bilhões para conseguir cumprir com a regra de ouro em 2018. Na noite de ontem, a instituição confirmou que devolverá R$ 30 bilhões até 2 de abril. Em nota, confirmou ainda que os R$ 100 bilhões restantes serão devolvidos no início do segundo semestre “uma vez que se confirmem, ainda no primeiro semestre, as projeções de recuperação econômica e todas as suas consequências positivas”. Os valores são referentes a aportes feitos pelo Tesouro no passado.

Para 2019, no entanto, a equipe econômica já sabe que não poderá contar com dinheiro do BNDES e analisa agora se é possível enviar o Orçamento já prevendo as medidas que terão de ser tomadas no Congresso para possibilitar o descumprimento da regra.

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