segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Luiz Carlos Mendonça de Barros: Na economia, Trump segue Dilma

- Valor Econômico

Economias de mercado, sempre acabam superando as crises criadas pela má gestão dos homens públicos

O populismo, seja de direita ou de esquerda, segue sempre o mesmo roteiro para o desastre. Esta máxima, que vários analistas políticos extraíram do comportamento da história em vários momentos do passado, mais uma vez está presente no início do segundo ano de mandato do presidente Trump. A demagogia barata do presidente republicano, na linha do movimento Tea Party, entra em conflito direto com a dinâmica de uma economia de mercado madura e funcional como a dos Estados Unidos. O resultado vai ser novamente um desastre de grandes proporções.

O presidente americano herdou de seu antecessor democrata um cenário econômico altamente favorável, depois de quase dez anos de uma crise mundial gravíssima. O governo Obama corajosamente seguiu, no início de seu mandato, uma agenda tipicamente keynesiana, com intervenção do governo no resgate de bancos e empresas privadas e o apoio político a uma gestão heterodoxa por parte do Federal Reserve. Posteriormente, articulou com a liderança política da Europa o engajamento do BCE na política monetária super expansiva adotada pelo Fed, mesmo sob o bombardeio dos ultra ortodoxos do Banco Central alemão. A eleição do italiano Mario Draghi como presidente do BCE permitiu que os dois gigantes econômicos do ocidente trabalhassem lado a lado para tirar o mundo de uma das mais graves crises econômicas da história.

A recuperação que se seguiu nos Estados Unidos e na Europa alinhou o mundo todo em novo ciclo de expansão econômica global. Neste início de 2018 todos os continentes estão assistindo a um crescimento harmônico, embora respeitando as características de cada economia nacional. Por ter uma economia mais competitiva, os EUA sempre estiveram à frente da Europa no que diz respeito à fase do ciclo econômico de crescimento que se seguiu à recuperação. Neste início de 2018 seus indicadores apontam claramente para uma economia trabalhando com força máxima e sem a necessidade de estímulos externos para continuar a crescer.

Aliás pelo contrário. Com o déficit fiscal em sua tendência histórica, e com o desemprego chegando a níveis muito baixos, o Fed iniciou em 2017 o processo de normalização de sua política monetária para evitar a aceleração da inflação. São dois os principais instrumentos que vem sendo utilizados com eficiência e parcimônia na busca deste objetivo: elevação dos juros básicos de intervenção nos mercados e redução de sua gigantesca carteira de títulos via venda em leilões periódicos. Com o devido tempo a autoridade monetária americana teria condições de estabilizar o crescimento econômico sem que se atingisse uma situação de superaquecimento que -- como sempre - levaria a um ajuste de demanda traumático e com crise financeira.

Mas o presidente Trump e sua equipe de agitadores políticos tem uma agenda diferente. Eles querem manter o crescimento acelerado para mostrar a seus eleitores a validade do princípio de que com menos impostos a vida de todos americanos será muito melhor. E como na Casa Branca ninguém acredita em ciclos econômicos não houve oposição à reforma fiscal já em execução e que levou a uma redução importante dos impostos, principalmente os pagos pelas grandes empresas americanas. Mas não foi só isto. Também na aprovação do orçamento foi incluída uma elevação de despesas militares e de obras de infraestrutura que levaram a estimativa de déficit nos próximos anos para algo próximo de US$ 1,4 trilhão.

Ora, nesta etapa do ciclo econômico nos Estados Unidos um déficit fiscal desta ordem representa um estímulo externo adicional à demanda agregada via aumento dos investimentos e dos gastos de consumo. Esta receita é perfeita para criar mais à frente uma situação de estagflação clássica como mostra o exemplo do Brasil a partir de 2012/2013.

Os números do déficit fiscal e da taxa de desemprego de hoje nos Estados Unidos, quando comparados com o período do primeiro mandato do presidente Obama, permitem uma reflexão muito clara sobre este risco. Em 2010/2012 o déficit fiscal americano era também de US$ 1,4 trilhão - cerca de 10% do PIB -, mas a taxa de desemprego caminhava para 9% da população ativa e o PIB vinha caindo a taxas crescentes gerando um hiato do produto gigantesco. O estímulo fiscal estava na direção certa.

Agora, o déficit bilionário criado por Trump vai agir sobre uma economia superaquecida e sem um hiato do produto que possa acomodar um crescimento adicional da demanda. Mas não é só esta aberração macroeconômica que ocorrerá ao longo de 2018 e possivelmente 2019. Os déficits acima de um US$ 1 trilhão obrigarão o Tesouro americano a vender no mercado volumes crescentes de títulos, no mesmo momento em que o Fed também estará se desfazendo de volumes também gigantescos de títulos de sua carteira. Um choque de gigantes que vai provocar o fenômeno do "crowding out" nos mercados de títulos e consequente elevação adicional dos juros de mercado!

Finalmente gostaria de chamar a atenção do leitor para um aspecto particular da coluna de hoje. Há trinta dias, em janeiro passado, fiz uma reflexão sobre não apostar contra as economias de mercado, pois elas sempre acabam superando as crises criadas pela má gestão dos homens públicos. Hoje levanto um segundo vetor desta minha crença no funcionamento das economias de mercado: também as crises mais graves sempre respondem a uma gestão errada das economias de mercado, como nos mostrou a presidente Dilma Rousseff e sua equipe de populistas.
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Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é presidente do Conselho da Foton Brasil. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.

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