quarta-feira, 28 de março de 2018

Crédito retoma expansão e bancos elevam margens: Editorial | Valor Econômico

O crédito começou a deslanchar no primeiro bimestre do ano, mas com juros mais altos - paradoxalmente, quando a taxa básica, a Selic, atinge recordes de baixa. Os empréstimos para pessoas físicas feitos com recursos livres, que passaram a crescer bem antes do que aqueles destinados às empresas, caíram em fevereiro, mas no ano mostram expansão de 16,6%, ainda que tenham recuado mais de 10% em fevereiro. O crédito corporativo, severamente contido até janeiro, acertou o passo com o das pessoas físicas e avançou 15,8% no ano.

Na ata da mais recente reunião do Comitê de Política Monetária divulgada ontem, o Banco Central acenou para um novo corte dos juros e tornou praticamente certa uma redução de mais 0,25 ponto percentual, apontando corretamente que a economia ainda precisa de mais estímulos da política monetária. O aumento dos spreads bancários, acompanhado ou não da elevação da taxa de juros nos empréstimos pelos bancos, porém, representa um obstáculo a que a política monetária acomodatícia possa dar plena e rapidamente frutos.

Desde que começou a cortar os juros, a taxa Selic caiu 7,25 pontos percentuais. O spread bancário é a diferença entre os custos de captação dos bancos, que são distintos e hoje pouca coisa superiores à Selic, e as taxas pelas quais emprestam a seus clientes. Houve aumento desses spreads em janeiro e fevereiro, exatamente quando a demanda por empréstimos começou a reagir nas empresas e manteve-se bastante ativo para os consumidores. Os spreads subiram mais para pessoas físicas, que pagam o triplo do que os bancos obtêm com os clientes corporativos. A inadimplência, por sua vez, manteve-se estável, com tendência de queda.

O estímulo para que a queda dos juros básicos chegue até os clientes é pequeno em um sistema bancário concentrado, em que os cinco maiores bancos, dois deles estatais, detêm 90% do crédito. É um sistema sólido, seguro, e um dos mais lucrativos do mundo. Os resultados de 2017 foram excelentes, mesmo com uma recessão mal terminada e um crescimento de apenas 1%, com altos ganhos, quando a recessão terminou e a economia cresceu 1%. O lucro das cinco maiores instituições atingiu R$ 64,9 bilhões, o melhor resultado desde 2008.

O resultado foi obtido mesmo com uma redução da oferta de crédito - o saldo de financiamentos caíra pelo segundo ano consecutivo - e de queda da taxa básica de juros. Os bancos mantiveram spreads elevados, aumentaram tarifas de serviços e taxas de administração de fundos. Há enorme rigidez para baixo nos spreads. Tomando como parâmetro os juros cobrados de pessoas físicas com recursos livres e a taxa média das operações de crédito, observa-se que elas subiram constantemente durante a pior recessão da economia em muito tempo (Valor, ontem).

O movimento dos spreads bancários nos dois primeiros meses do ano indica que, mesmo com a Selic a níveis mínimos históricos, as margens não deverão cair mais. Com o avanço da concentração, o preço da segurança do sistema bancário foi, e possivelmente continuará sendo no médio prazo, o de um alto custo de capital para empresas, do crédito para consumidores e ganhos expressivos para as instituições financeiras.

O BC tem uma agenda promissora, que indiretamente ataca a concentração pelas margens, em mercados até então cativos com taxas de intermediação generosas, como a do uso de cartões de débito e crédito. O primeiro passo na direção correta foi ampliar a concorrência na área das credenciadoras - onde reinava praticamente um oligopólio em que os principais agentes estão associados aos conglomerados bancários. Anteontem, o BC reduziu a taxa de intermediação paga aos bancos emissores de cartões em um movimento cujo objetivo é reduzir o custo cobrado dos lojistas pela aceitação de pagamentos com cartão de débito - algo praticamente sem risco.

O Banco Central já reduziu um pouco os depósitos compulsórios e simplificou suas regras. Ele conseguiu tornar viável a prática de preços diferentes para pagamento a vista e a prazo e tenta criar um cadastro positivo, sobre o qual há dúvidas pertinentes sobre seu modo de operação, mas não quanto à necessidade. São medidas importantes para minorar os efeitos da concentração.

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