terça-feira, 20 de março de 2018

Moro afirma que alteração seria ‘desastrosa’ para o combate à corrupção

Juiz da Lava-Jato fez comentários ao mandar prender empresário

Cleide Carvalho | O Globo

-SÃO PAULO- O juiz Sergio Moro classificou como desastrosa uma possível revisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da execução das penas a partir da sentença em segunda instância. Ontem, no despacho em que determinou a prisão do ex-vice-presidente da Engevix Gerson de Mello Almada, disse que mudanças prejudicariam o combate à corrupção.

“Com todo o respeito ao Egrégio Supremo Tribunal Federal, uma eventual alteração seria desastrosa para os avanços havidos recentemente em prol do fim da impunidade da grande corrupção no Brasil”, escreveu o juiz, acrescentando que a mudança de posição dos ministros afetaria dezenas de condenações por corrupção e lavagem de dinheiro em todo o país.

Moro atribuiu parte da responsabilidade pela corrupção “sistêmica e descontrolada" no Brasil justamente à falta de efetividade dos processos penais. Disse que não manter a execução da pena da forma como está hoje seria conceder liberdade sem qualquer avaliação das provas contra criminosos poderosos — e tempo para que “busquem prescrição e impunidade” à “custa da credibilidade da Justiça e da confiança dos cidadãos”.

Para o juiz, a jurisprudência atual do STF “acaba com o faz de conta das ações penais que nunca terminam”, nas quais o trânsito em julgado é somente “uma miragem” num cenário de impunidade.

“A presunção de inocência não deve ser interpretada como um véu de ignorância que impede a apreensão da realidade nem como um manto protetor para criminosos poderosos, quando inexistir dúvida quanto à sua culpa reconhecida nos julgamentos”, afirmou o juiz. Moro usou ainda a memória do ministro Teori Zavascki para defender sua posição. Disse que a execução provisória da pena a partir da condenação em segunda instância é um legado do ministro para o fim da impunidade. Argumentou ainda que a posição do STF permitiu, apenas na 13ª Vara Federal de Curitiba, que fossem executadas penas relacionadas ao desvio de mais de R$ 26 milhões em verbas de educação, saúde e segurança pública.

USO DE SÚMULA DO TRF-4
Para determinar a prisão de Almada, Moro não esperou ser oficiado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que analisa as sentenças da Lava-Jato, como já fez em alguns casos. Para isso, usou a súmula do próprio TRF-4 que determina a prisão sempre que esgotados os recursos na própria instância.

O ex-vice-presidente da Engevix havia sido condenado por Moro a 19 anos de prisão por pagamentos de R$ 15,2 milhões em propinas à diretoria de Abastecimento da Petrobras. O TRF-4 aumentou a pena para 34 anos. No último dia 25 de janeiro, os desembargadores do tribunal julgaram improcedentes os embargos infringentes apresentados pela defesa de Almada.

Inconformados com a decisão, os advogados apresentaram embargos de declaração contra o acórdão dos desembargadores, que também foram considerados improcedentes no último dia 15. Um recurso especial foi dirigido pela defesa ao Superior Tribunal de Justiça, mas ainda não foi julgado. Moro ressaltou no despacho que esse recurso, porém, não tem efeito suspensivo. Almada se apresentará hoje e deverá cumprir pena no Complexo Médico Penal, na ala reservada aos presos da operação.

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