quinta-feira, 8 de março de 2018

País leva 52% de seus jovens à exclusão do mercado

Maioria está destinada ao subemprego

Pesquisa do Banco Mundial mostra ensino precário e distante do setor produtivo no Brasil

Pesquisa do Banco Mundial (Bird) mostra que a educação falha e desconectada das necessidades do setor produtivo é a principal razão para que 52,2% dos jovens entre 15 e 29 anos percam o interesse pelo estudo, correndo o risco de não se inserirem no mercado formal de trabalho. De acordo com o Bird, esses jovens deixam a escola e não conseguem voltar, ou optam por conciliar estudos com trabalho informal, ou são afetados pela defasagem idade/série. 

Chance desperdiçada

Mais de 50% dos jovens perdem interesse pelo estudo e correm risco de não encontrar trabalho

Bárbara Nascimento | O Globo

 -BRASÍLIA E RIO- Com um sistema educacional falho e pouco conectado com as necessidades do setor produtivo, 52,2% dos jovens brasileiros entre 15 e 29 anos perdem interesse pelos estudos e correm o risco de não conseguirem se inserir no mercado de trabalho. Esta é uma das principais conclusões de um estudo do Banco Mundial (Bird), que mostra um cenário de desalento para a juventude do país. São pessoas que se encontram em três situações: desistiram da escola, conciliam os estudos com trabalho informal ou estão defasados na relação idade/série.

 Com os investimentos para diminuir a evasão escolar e aumentar o acesso à educação, o percentual é menor do que no passado. Em 2004, 61,7% dos jovens corriam risco de não encontrar seu lugar no mercado de trabalho, mas a taxa ainda é considerada muito alta pelo banco. Segundo o Bird, em 2015, só 38% dos adolescentes estavam na série correta. Aos 18 anos, metade dos jovens está fora da escola.

— Desde 2000, tivemos mais jovens na escola, redução da informalidade, e os “nem-nem” (nem estudam nem trabalham) tiveram trajetória de diminuição. Mas os números de desengajamento econômico são muito altos — diz a economista Rita Almeida, uma das responsáveis pelo estudo.

O estudante Raamon Almeida, de 22 anos, tenta concluir o Ensino Médio só agora, cinco anos depois da idade ideal. Ele conta que precisou interromper os estudos aos 16:

— Precisava colocar comida na mesa. Ficou inviável conciliar o trabalho com o estudo.
Há um ano, ele conseguiu voltar à escola. É aluno do curso técnico de Edificações. Conseguiu um estágio há seis meses na área. Para ele, as escolas deveriam oferecer aulas e cursos mais atraentes, relacionados ao cotidiano e à preferência dos alunos.

APENAS 43% CONCLUÍRAM O ENSINO MÉDIO
O relatório do Banco Mundial mostra que a crise dos últimos anos provocou mais desemprego entre os jovens do que nos demais segmentos da população. Em tempos de recessão, eles são os primeiros a perder o emprego e os que mais têm dificuldade de encontrar um novo trabalho. De 2013 a 2015, a taxa de desemprego juvenil ficou em níveis muito superiores à média. Em 2015, foi próxima dos 20%, enquanto o índice do país estava em cerca de 8% (dados da Pnad).

A desilusão com a sala de aula fez Guilherme Henrique Muglia, de 23 anos, desistir do Ensino Médio. Após repetir o primeiro ano três vezes, está desempregado e vive com a sogra e a namorada.

— Na época, achava que não valia a pena continuar, e ainda acho. Levando em consideração o sistema educacional brasileiro, a vontade só diminuiu. Falta dinheiro para a escola. Ela não é atraente: há bullying, calor, livros velhos, falta de merenda. Tudo isso gera frustração — conta.

Uma das sugestões do Bird é um salário mínimo diferente para jovens. Segundo o estudo, isso já é estudado por Reino Unido, Nova Zelândia e Grécia. Para o organismo internacional, a rigidez de um piso salarial imposto por lei empurra os trabalhadores de menor produtividade para o desemprego ou a informalidade. O relatório mostra que 17,9% dos jovens brasileiros ganhavam abaixo do salário mínimo em 2015, não muito distante do cenário de 2001, quando essa proporção era de 19,7%.

Com o rápido envelhecimento da população, o Bird alerta que o Brasil pode estar perdendo a “última onda da transição demográfica”, ou seja, a última parcela significativa de jovens ingressando na população ativa do país. Segundo o relatório, o potencial de produtividade será cada vez mais determinado pela atual juventude. Para isso, será necessário aprimorar a capacidade das instituições de desenvolver as competências do jovem e do mercado de trabalho de engajá-los na economia.

“Equipado com políticas de competências e empregos sólidos e adequados, especialmente para os jovens, o Brasil pode superar a posição de renda média surfando essa onda. A alternativa é que essa onda quebre e afunde a perspectiva do país em atingir novos níveis de prosperidade compartilhada”, alerta o documento.

Melhorar a produtividade da parcela que ingressa no mercado de trabalho passaria por uma reestruturação do modelo educacional. Hoje, apenas 43% das pessoas com mais de 25 anos concluíram o Ensino Médio. A média dos países da OCDE é de 65%. Nos EUA, 88%. O Bird analisa que a falta de interesse é resultado de um currículo escolar “muito mais voltado para a memorização do que para o pensamento crítico”.

O Banco aponta que o jovem brasileiro não tem a real noção do valor efetivo da educação para seu futuro, como o impacto que anos a mais de estudo geram no salário, por exemplo.

A economista do Bird explica que esse risco de o jovem não se inserir no mercado de trabalho, o “desengajamento econômico”, tem reflexos diretos na produtividade. Com as deficiências na educação, o Brasil é o único país em que anos a mais de estudo não impactam a produtividade do país. Para se ter uma ideia, na Coreia do Sul, um ano a mais de escolaridade gera US$ 7 mil para a economia.

— O impacto fundamental de um alto risco de desengajamento econômico é ter um jovem com oportunidade baixa no mercado de trabalho. E isso tem consequências importantes para o crescimento e para a produtividade — aponta.
Colaborou Luana Souza, estagiária, sob supervisão de Lucila de Beaurepaire

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