sábado, 7 de abril de 2018

Lula se entrincheira em sindicato e não cumpre prazo dado por Moro

STJ nega novo pedido de habeas corpus, e defesa entra com recurso no STF

Petista deve se entregar hoje de manhã

O ex-presidente Lula usou o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, que o projetou na política nos anos 70, como trincheira para tentar evitar a prisão. Ele ignorou o prazo concedido pelo juiz Sergio Moro para que se apresentasse voluntariamente até as 17h. Cercado por aliados e advogados, Lula não falou aos manifestantes reunidos em frente ao prédio: concentrou-se na estratégia de negociação com a Polícia Federal das condições para ser preso. A defesa ingressou com pedido de habeas corpus, negado pelo STJ. À noite, um recurso foi encaminhado ao STF. Lula participará da missa pelo aniversário da ex-primeira-dama Marisa Letícia, às 9h30m de hoje, e deve se entregar à PF depois disso. Ex-presidente não cumpre prazo dado pelo juiz Sergio Moro, mas deve se entregar hoje à Polícia Federal

Cleide Carvalho, Thiago Herdy e Sergio Roxo | O Globo

SÃO PAULO - Ao não cumprir o prazo dado pelo juiz Sergio Moro de se entregar até às 17h de ontem, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva transformou o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, berço de sua carreira política, numa espécie de bunker de resistência contra a operação Lava-Jato. Ao permanecer no local por mais de 24 horas, cercado de aliados, simpatizantes, advogados, familiares e políticos, Lula se empolgou com a mobilização e terminou o dia discutindo alternativas sobre como e quando deveria começar a cumprir sua pena de 12 anos e um mês de prisão.

LULA PODE SE ENTREGAR HOJE
Até o fechamento desta edição, as negociações entre a banca de advogados do petista e os delegados da Polícia Federal caminhavam para que o ex-presidente se entregasse hoje — após uma missa pelo aniversário de dona Marisa Letícia, que faria 68 anos hoje, a ser rezada no próprio sindicato. Embora não seja praxe prisões ocorrerem no fim de semana, a não ser em casos de flagrante, o caso do ex-presidente tem sido tratado de forma excepcional.

Lula quis transformar o ato da prisão num marco político, se valendo de um velho recurso que já havia utilizado nos anos 1970, quando presidia o sindicato: o de se refugiar na sede da entidade. Foram várias noites passadas na entidade, naquela época para evitar uma detenção pelo aparelho de repressão da ditadura militar.

Lula iniciou a sua vigília, anteontem, disposto a radicalizar e não se entregar. Recebeu inúmeros aliados, posou para fotos e chegou a aparecer na janela para acenar ao público do lado de fora. Os seus cinco filhos também estavam presentes, assim como três dos irmãos. Por volta das 2h30 da madrugada de ontem, com o prédio já bem vazio, Lula se recolheu em uma sala anexa da presidência e usou uma cama montada para ele no local por dormir por pouco mais de quatro horas.

Depois de um café da manhã com iogurte e pães servido pelos metalúrgicos, Lula retomou as conversas políticas. Um dos primeiros a voltar ao sindicato pela manhã foi o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, hoje principal nome para assumir a cabeça da chapa petista à Presidência da República, caso o ex-presidente seja impedido de concorrer.

Nas primeiras horas da manhã, o líder petista seguia irredutível. Mas, a partir do almoço, os advogados começaram a alertá-lo sobre o risco de Moro decretar a sua prisão preventiva. Foi quando Lula começou a “baixar a temperatura”. Caso o magistrado seguisse por esse caminho, Lula não se beneficiaria de uma reinterpretação do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento das ações diretas de constitucionalidade sobre a prisão em segunda instância. O tema deve voltar ao plenário do Supremo na próxima quarta-feira, quando o ministro Marco Aurélio discutirá pedido de liminar para que se crie uma espécie de salvo conduto aos presos sem o trânsito em julgado — caso de Lula. Ou seja, poderia ter como destino um longo período na cadeia.

— Ele entendeu que numa posição de confronto, poderíamos perder os aliados que temos no Supremo — conta um petista.

Conforme o relógio se aproximava das 17h, o nervosismo crescia. Os petistas mantiveram até os últimos minutos a expectativa sobre o que fariam quando o relógio chegasse ao horário estabelecido por Moro para a sua apresentação espontânea. Em uma sala, parlamentares do PT e de partidos aliados entravam e saiam num ritmo frenético.

Qualquer movimento atípico era motivo de tensão entre militantes. O cheiro de um sinalizador foi confundido com o cheiro de bombas de gás lacrimogêneo. Uma viatura da polícia que entrou na rua errada foi motivo de vaia. Imagens de uma formação do Batalhão de Choque supostamente a cerca de um quilômetro do sindicato circulava de tela e tela de celular.

Numa sala restrita ficaram apenas três dos advogados, todos com carreira política, que coordenaram a negociação com a Polícia Federal — Sigmaringa Seixas, ex-vice governador do Distrito Federal; Emídio de Souza, ex-prefeito de Osasco (SP) e o deputado federal Wadih Damous. O ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, durante parte do dia, também assumiu as conversas na sede da PF em São Paulo.

O advogado de Lula, Roberto Batochio, chegou a afirmar que pedir a Lula que abdicasse da liberdade era “coisa de Casa Grande e Senzala”.

DERROTAS CAUSARAM DESÂNIMO
Novas derrotas na Justiça desanimaram o entorno do ex-presidente, que passou a reforçar as negociações sobre o desfecho da decretação de sua prisão. Lula passou a admitir ser preso, mas ainda não concorda com a ideia de uma apresentação discreta à polícia.

Ao longo do dia, além de petistas, políticos de partidos do campo da esquerda, como Manuela D’Avila (PCdoB) e Guilherme Boulos (PSOL), ambos pré-candidatos à Presidência, estiveram no sindicato dos metalúrgicos. O apoio a Lula também reuniu antigos aliados que, até então, estavam distantes do petista, como Ivan Valente e Luiza Erundina, que abandonaram o PT por discordarem dos rumos do partido.

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