segunda-feira, 21 de maio de 2018

Luiz Carlos Mendonça de Barros: A recessão vai chegar aos EUA

- Valor Econômico

É só questão de tempo até a inflação superar o teto do Fed e ele iniciar processo mais agressivo de aumento de juros

Os últimos dias foram marcados por uma quase histeria nos principais mercados financeiros mundiais. O fator mais importante por trás deste comportamento irracional foi identificado por mim na coluna de fevereiro passado: a política econômica do governo Trump.

A economia americana vinha se recuperando da grande depressão, que se iniciou no primeiro mandato do governo Obama, de uma forma extraordinária. Sob o efeito de medidas fiscais e monetárias lúcidas e corajosas foi-se construindo nos últimos cinco anos uma recuperação da atividade econômica sólida e com os principais fundamentos em terreno firme.

O mesmo aconteceu na zona do euro, apesar de um atraso inicial em relação à recuperação nos Estados Unidos por conta das disputas no BCE entre os membros da escola germânica e um grupo influenciado pelo Fed. Mas depois de encerrada a disputa - com a posse da Mario Draghi e o início da política de "quantitative easing"- o crescimento na zona do euro também se consolidou.

Como as economias americana e europeia se movem por questões estruturais em velocidades diferentes, a recuperação cíclica entre 2013 e 2017 se deu em intensidades diferentes. Por esta razão os estágios do ciclo econômico são distintos, com o da maior economia do mundo muito mais maduro do que o da europeia. Vamos a alguns exemplos: o índice de preços de residências multi-famílias nos Estados Unidos (S&P Case-Schiller) está hoje em nível superior ao existente quando se iniciou a derrocada do chamado sub prime em 2008. O mesmo vem ocorrendo com o nível de desemprego e outros indicadores do estágio do ciclo econômico.

Como consequência lógica, a inflação americana é hoje muito mais elevada do que a europeia e a meta do Fed de 2% ao ano já foi atingida na virada do ano. Na Europa ainda temos a inflação abaixo do número fixado pelo BCE como referência para o sistema de metas de inflação.

Foi neste cenário de ciclo econômico maduro nos Estados Unidos, depois de vários anos de crescimento sustentado e racional, que aterrissa na Casa Branca esta figura deletéria do presidente Trump. Como já explorado em minha coluna de fevereiro passado, ele rompe com uma política econômica sólida e de sucesso e começa a tomar decisões contraditórias. Como todo populista, decide realizar uma reforma tributária abrangente para cumprir sua proposta eleitoral, sem uma análise mais cuidadosa sobre o momento atual da economia.

Com isto cria um estímulo econômico de grandes proporções em uma economia que já caminhava para uma perigosa fase de super-excitação da atividade. Agora será apenas uma questão de tempo para que a inflação supere o teto superior do Fed e obrigue esta instituição - que não foi ainda tomada pelo bando de bárbaros de Trump - a iniciar um processo mais agressivo de aumento de juros. Quando isto acontecer, o nível atual de 3% ao ano para os títulos de dez anos vai ser visto pelos mercados como uma doce lembrança. Este cenário - que já é visualizado por muitos em Wall Street - vai provocar um fim traumático para o ciclo econômico vivido no mundo nos últimos anos.

Neste cenário, como ficará a economia brasileira é certamente a pergunta da maioria dos leitores do Valor. Foi apenas uma ilusão que tivemos no Brasil, ou podemos confiar nos fundamentos da economia como ancora para passarmos pelas turbulências de hoje? Para responder a esta questão quero dividir com o leitor minha convicção que as economias de mercado sempre vencem estes períodos de crise e conseguem estabilizar novamente o crescimento. É apenas uma questão de uma gestão correta e de tempo!

E isto vai acontecer novamente com a economia americana entrando em recessão ao longo de 2019 e recolocando-a em outro ponto do ciclo econômico. Quando isto ocorrer o crescimento voltará a prevalecer, a menos que Trump e sua equipe produzam um desastre de maiores proporções. Neste caso, o risco maior fica por conta de uma crise financeira internacional nesta passagem de um momento de superexcitação para uma recessão na maior economia do mundo.

O Brasil entra nesta zona de turbulência em uma fase de seu ciclo de crescimento que vai nos proteger das turbulências externas. As principais linhas de defesa são um hiato do produto de enorme proporção, um cenário de inflação favorável e um déficit de conta corrente muito baixo para nosso padrão. Além disto, temos um saldo comercial muito expressivo e que, com a desvalorização do real vai aumentar ainda mais, para não falar no volume gigantesco de nossas reservas.

Como sempre ocorre nestes momentos de tensão nos mercados, o Brasil sofre mais por ter o mercado futuro de câmbio mais líquido do mundo emergente. É por isto que o exército de bárbaros do mundo todo vem para cá especular contra o real e a favor do dólar americano. Este fato é conhecido pelos mais experientes, mais ainda é uma situação nova para os mais jovens. Me parece que alguns membros do Copom sofrem atualmente deste pânico precoce, como mostrou sua última reunião.
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Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é presidente do Conselho da Foton Brasil. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.

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