terça-feira, 17 de julho de 2018

Ana Carla Abrão: Um Congresso contra o Brasil

- O Estado de S.Paulo

Não precisamos de representantes que trabalhem pela bancarrota do Brasil

O Brasil hoje flerta com o caos. A relação dívida/PIB supera os 70%, sem perspectivas de reversão nos próximos anos caso não se aprofundem os cortes de gastos. Precisamos de um forte ajuste fiscal para finalmente equilibrar as contas. E não se trata aqui de cumprir ou não o teto de gastos, a regra de ouro ou a LRF e a Constituição. Trata-se de evitar o pior com a volta dos juros altos, a impossibilidade do crescimento, a manutenção do desemprego.

Mas essa perspectiva, cada vez mais provável, parece não sensibilizar um Congresso Nacional que aprofunda a crise, atuando de forma irresponsável e descolada da realidade.

Estamos tratando de dois lados da mesma moeda. Irresponsabilidade fiscal significa sacrificar a população, em particular os mais pobres. Isenções fiscais concedidas por pressão de empresas financiadoras de campanha representam falta de recursos para investimentos. A consequência é um setor público que investe menos de 2% do seu Orçamento, comprometendo nossa produtividade e garantindo que um dos nossos grandes gargalos para o crescimento se mantenha presente. Projetos de leis ou jabutis incluídos às pressas por pressões corporativistas e que garantam benefícios tributários, blindagens e privilégios a categorias ou a setores específicos, vedando cortes de gastos determinam, por outro lado, a piora adicional no atendimento público de saúde já precário e condenam nosso ensino público a manter a qualidade sofrível de hoje.

Ao proteger os recursos de alguns, nossos congressistas estão colaborando para que faltem recursos para todos. Ao garantir que alguns poucos mantenham privilégios, estão contribuindo para que a crise econômica se aprofunde, para que a confiança piore, para que a criminalidade aumente, para que a desigualdade social se perpetue. A irresponsabilidade fiscal de um Congresso que teima em não fazer os ajustes necessários condena o nosso País a não crescer e deixa à mercê do azar os mais de 12 milhões de brasileiros que lutam contra o desemprego.

A crise atual está em todos os níveis federativos. Na União, ela se reflete na rigidez dos gastos obrigatórios, que consomem quase todo o Orçamento e dificultam um ajuste mais profundo, colocando em risco conquistas recentes como a redução dos juros; nos Estados, é o colapso dos serviços públicos básicos, fruto de um comprometimento das receitas com despesas de pessoal que há muito deixou os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal para trás, comprimindo investimentos e agora também custeio; nos municípios, cada vez mais dependentes de transferências de Estados quebrados e de uma União depauperada, prefeitos tentam prover com poucos recursos próprios os muitos serviços que lhes caíram no colo com a Constituição de 88. Ou seja, a situação é grave e mereceria atuação direta do Congresso na direção de buscar soluções para a crise – e não de aprofundá-la ainda mais.

Se por um lado são grandes as dificuldades em aprovar medidas de ajuste, como a redução de subsídios injustificáveis e as restrições a gastos da Lei de Diretrizes Orçamentárias, há clara tendência em aprovar aumentos de gastos, ignorando a situação fiscal e seus impactos sobre a sociedade como um todo. Vide os projetos de criação de novos municípios, de aumentos dos tetos salariais, do marco regulatório para o transporte de cargas e de revisão das compensações por perdas por exportações, cujo principal objetivo é o de salvar governadores com a corda da LRF no pescoço.

Não precisamos de um Congresso assim, não precisamos de representantes que atentem contra 200 milhões de brasileiros e trabalhem pela bancarrota do Brasil. Suas decisões têm significado menos emprego e menos renda para a população, elas têm colaborado diretamente para que mais brasileiros morram nas filas dos hospitais, mais crianças estejam fora da creche ou em escolas que nada ensinam e mais jovens se percam para o crime. Decisões como as que estamos assistindo significam um País sem futuro, uma população sem perspectivas, uma sociedade sem esperança. É isso que senadores e deputados estão nos legando, esquecendo que foram eleitos para lutar por nós, e não contra nós.
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Economista e sócia da Consultoria Oliver Wyman

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