quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Luiz Carlos Azedo: A fraude e o golpe

- Correio Braziliense

“Com as urnas eletrônicas, ninguém até hoje comprovou fraudes em resultados eleitorais cujos votos são apurados no mesmo dia da votação, em todo o território nacional”

Se tem uma coisa pela qual o candidato do PSL, Jair Bolsonaro, deveria agradecer é a existência de urnas eletrônicas. Essa é a maior garantia de que poderá vir a assumir a Presidência da República se essa for a vontade da maioria dos eleitores. Graças a elas, a eleição nos mapas de apuração das seções eleitorais controladas por oligarquias políticas, que era mais comum do que se imagina, inclusive durante o regime militar, acabou definitivamente. E o Brasil se tornou a democracia de massas com o sistema eleitoral mais eficiente que se conhece no mundo. Critica-se o Congresso, os partidos, o voto proporcional, o abuso do poder econômico, a manipulação midiática, os cambaus. Mas ninguém até hoje comprovou fraudes em resultados eleitorais cujos votos são apurados no mesmo dia da votação, em todo o território nacional, principalmente para o Executivo.

No domingo, o candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro, em transmissão ao vivo pelo Facebook, disse que as eleições 2018 podem resultar em uma “fraude” por causa da ausência do voto impresso. Questionou o Supremo Tribunal Federal (STF), que em junho deste ano, por oito a dois, derrubou a adoção do voto impresso nas próximas eleições, que havia sido aprovado na minirreforma eleitoral de 2015, pelo Congresso Nacional. Ontem, a presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Rosa Weber, defendeu a confiabilidade das urnas eletrônicas: “Temos 22 anos de utilização de urnas eletrônicas. Não há nenhum caso de fraude comprovado. As pessoas são livres para expressar a própria opinião, mas quando essa opinião é desconectada da realidade, nós temos que buscar os dados da realidade. Para mim, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, as urnas são absolutamente confiáveis.”

Rosa Weber lembrou que, em 2014, foi feita uma auditoria requerida pelo PSDB, que não identificou nenhuma irregularidade. “Nós abrimos para possibilidade de auditagem de maneira geral (…) Nas últimas eleições presidenciais houve uma desconfiança, o partido que no caso não saiu vencedor, expressou, requereu e o TSE abriu todos os dados e depois de um ano se constatou que de fato não havia nada”, garante. O questionamento feito pelos tucanos serviu para demonstrar duas coisas: primeiro, que não houve fraude na reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff; segundo, que as urnas eletrônicas são auditáveis, ou seja, é possível conferir se o resultado divulgado corresponde à votação.

A conversa de Bolsonaro lembra a trajetória de levantes militares e tentativas de impedir a posse de presidentes eleitos que marcaram a história do Brasil no século passado. A maior virada de mesa foi na Revolução de 1930. A chamada política café com leite, pela qual mineiros e paulistas se revezavam no poder, foi rompida nas eleições de 1930 pelo presidente Washington Luiz, que indicou o governador de São Paulo, Júlio Prestes, como candidato à Presidência. Líderes do partido Republicano Mineiro se uniram ao Partido Republicano e ao Partido Libertador do Rio Grande do Sul, ao Partido Democrático de São Paulo e ao Partido Republicano da Paraíba para criarem a Aliança Liberal, que lançou a candidatura de Getúlio Vargas, o então governador gaúcho.

Radicalismo
Júlio Prestes venceu as eleições com quase 1 milhão de votos contra 737 mil de Getúlio. Entretanto, em 26 de julho, antes da posse do presidente eleito, o governador da Paraíba, João Pessoa, candidato a vice-presidente na chapa de Getúlio, foi assassinado no Recife. Embora o crime tenha sido passional e não político, ao contrário da narrativa difundida na época, esse foi o estopim para a Revolução de 1930. Getúlio ficou 15 anos no poder, graças ao “autogolpe” de 1937, quando implantou o Estado Novo e uma nova Constituição de inspiração fascista, conhecida como “Polaca”.

Atualmente, vivemos o maior período de estabilidade política da história republicana, apesar dos impeachments de Collor de Mello, em 1992, e de Dilma Rousseff, em 2016. Nesse aspecto, a narrativa do golpe que embala a campanha do PT é das mais nefastas, porque fragiliza as instituições democráticas e abre espaço, aí assim, para um golpe de Estado de verdade.

O que está acontecendo nas eleições brasileiras, no momento, é uma radicalização do processo político direita versus esquerda, protagonizada pelo candidato do PSL, Jair Bolsonaro, e pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que da cadeia conseguiu catapultar seu substituto, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, para o segundo lugar nas pesquisas de intenções de voto. Se não houver mudança de cenário nas próximas semanas, os dois disputarão o segundo turno no dia 28 de outubro. As declarações de Bolsonaro, ao aventar a possibilidade de fraude nas eleições, têm duas possibilidades: a primeira, é aprofundar a polarização política na esperança de decidir a eleição no primeiro turno, forçando uma espécie de “voto útil” antipetista, ou seja, uma típica jogada eleitoral; a segunda é mais grave, seria a construção de uma narrativa para impedir a posse do seu adversário, caso perca a eleição no eventual segundo turno, em razão do seu isolamento político, mesmo sendo o mais votado no primeiro.

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