sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Vendas em queda mostram perda de ímpeto da economia: Editorial | Valor Econômico

Como parece ter acontecido com o resto da economia, o varejo entrou em compasso de espera eleitoral. O comércio varejista perdeu fôlego tanto no acumulado do ano quanto no dos últimos doze meses, e cresceu menos. Tanto o comércio ampliado, que agrega veículos e material de construção, quanto o restrito apresentaram média móvel trimestral negativa - e crescentemente negativa - no volume de vendas. Esse é mais um sinal de que a expectativa para expansão do PIB continuará sendo rebaixada - o mais recente boletim Focus aponta para uma taxa de 1,4%, claramente com viés de baixa.

Embora ainda seja possível que os indicadores tenham sofrido alguma influência residual da greve dos caminhoneiros e mesmo considerando que o comércio em 2017 foi estimulado pela liberação do FGTS, as vendas não vão bem. O ponto de inflexão tanto para o varejo restrito como para o ampliado ocorreu em abril, mês anterior à greve. De lá para cá a média móvel trimestral do varejo restrito foi sempre negativa. Com ajuste sazonal e em relação ao mês anterior, a média móvel além de negativa é descendente. No caso do comércio restrito, sai de -0,2% em junho para -0,8% em julho. No ampliado, vai de -0,4% para -1,1%.

A discriminação dos setores em recuo e os poucos que avançam também não faz prever nenhum desempenho animador à frente. No comércio como um todo há avanço em veículos e motos, enquanto os demais crescem menos que na comparação com junho e alguns, como combustíveis e equipamentos para escritório, informática e comunicação aprofundam a performance negativa.

Puxaram para baixo o índice das vendas tecidos, vestuário e calçados, com variação negativa no mês de 8,4% (variação positiva de 1,2% em doze meses). São bens dependentes dos salários e o resultado reforça a indicação de que eles deixaram de ter ganhos reais ou passaram a ter alguma perda. O desemprego alto desestimula absolutamente gastos supérfluos. Outro ramo com queda forte em julho, de -6,9% (alta de 5,2% em 12 meses) é o de móveis e eletrodomésticos, mais dependentes do crédito, que melhorou para as pessoas físicas ao longo do ano.

Para nenhum desses dois setores, que representam pelo menos um terço do índice do varejo restrito, há perspectivas positivas. Não há indícios de que os salários e o emprego possam reagir com algum vigor até pelo menos o fim das eleições e, dependendo de quem for eleito presidente, mesmo depois. Os dados da indústria foram ruins e, junto com os do varejo, embora sejam superiores aos do mesmo período do ano passado, não tão fortes e firmes para afastar o risco de volta à recessão em 2019, se as urnas não produzirem uma injeção de confiança e otimismo nos investidores e consumidores.

Por outro lado, o ramo que mais cresce, o de veículos e motos, com 14,1% de expansão nos doze meses encerrados em julho, dificilmente vai melhorar muito seu desempenho. As exportações de carros vem caindo e podem cair mais, uma vez que, com a recessão e a aguda depreciação cambial do peso, o mercado argentino, principal destino do produto brasileiro, capotou.

Há fatores positivos em cena, como a inflação persistentemente abaixo da meta, acompanhada de deflação dos alimentos, e a liberação do PIS-Pasep. Há outros, porém, que vêm com o ciclo eleitoral, que são francamente contracionistas da demanda. O real já se desvalorizou em 25% no ano e se se mantiver nesse nível por muito mais tempo acabará tendo alguma influência altista nos preços, o que não ocorreu até agora exatamente porque a demanda está na lona. A incerteza sobre o resultado da disputa presidencial também está jogando os juros para cima - o juro real dos contratos futuros, que de fato baliza a contratação de empréstimos, dobrou desde 27 de abril, para 4,14%. Isso significa que em breve os juros para o crédito ao consumidor voltarão a subir, se o ganhador das eleições não demonstrar disposição e força para conter a desastrosa situação fiscal do país.

Alguma reação é possível no último trimestre. Os investimentos não virão até lá e o consumo das famílias continuará contido. Os efeitos defasados da política monetária estimulativa parecem ter se esgotado e o único apoio possível para sustentar a retomada é o da confiança, que depende das eleições. Exceto a situação fiscal, os fundamentos da economia estão em relativa ordem e basta um sinal claro sobre o futuro para que ela volte a ganhar ímpeto. Nada garante que ele será dado.

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