segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Vinicius Mota: Acabou o monopólio

- Folha de S. Paulo

Surge com Bolsonaro outra corrente que denuncia complôs, questiona legitimidade do pleito e avilta a imprensa

A batalha simbólica em torno da tentativa de assassinar Jair Bolsonaro escancara uma mudança notável na arena política brasileira. A esquerda perdeu o monopólio das narrativas conspiratórias.

Não espanta a reação imediata, epidérmica, de militantes esquerdistas ao esfaqueamento. Aquilo haveria de ser armação para beneficiar o próprio candidato do PSL, uns sugeriam, outros declaravam mesmo.

O preenchimento instantâneo, com os fragmentos que estiverem à mão, do longo e acidentado caminho entre um fato e a sua causa é uma faculdade do cérebro humano. Provavelmente nos ajudou mais que atrapalhou no curso de centenas de milhares de anos de evolução.

Seu uso político sistemático nas últimas três décadas no Brasil se restringia na prática a correntes oriundas do socialismo. O marxismo, ao pressupor uma engrenagem subterrânea e um conflito binário como motores da história, facilita a tarefa.

Segundo a fábula, antes de Lula ser eleito um complô das elites sabotava o desejo do povo. Depois, a crítica e a oposição ao governo tornaram-se armas de quem não queria dividir aeroportos com a ralé.

Bolsonaro rompeu a monotonia. A facada, espalham seus seguidores, foi uma tramoia entre os esquerdistas e a mídia, infestada deles, para evitar o triunfo eleitoral do capitão.

O PT já não faz monólogo quando insinua que só a eleição do seu candidato redimirá o processo de outubro de ser considerado fraude. Bolsonaristas dizem que qualquer resultado diferente da vitória de seu ídolo terá sido produzido pela manipulação dolosa das urnas eletrônicas.

A coisa é tão curiosa que os dois lados agora compartilham inimigos. Ambos escolhem como alvos grandes veículos da imprensa e o Supremo Tribunal Federal, por exemplo.

Se alguém quer ver o circo dos contos do vigário pegar fogo, torça para um embate final entre Bolsonaro e Haddad. Eu, que sofro encostos episódicos do espírito de porco, às vezes me divirto a pensar nessa hipótese.

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