sábado, 6 de outubro de 2018

Em eleição para deputado federal, diversidade de opiniões marca partidos

Folha analisou respostas de 1.032 candidatos, de 25 partidos, a 20 questões do Match Eleitoral

Ana Estela de Sousa Pinto, Daniel Mariani | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Candidatos a deputado federal por São Paulo tendem ao centro em economia e costumes, mas há grande diversidade de opinião dentro da maioria dos partidos.

É o que mostra análise do Match Eleitoral, ferramenta criada pela Folha que aproxima candidatos e eleitores a partir de um questionário com 20 perguntas.

Os candidatos podem concordar total ou parcialmente com (ou discordar total ou parcialmente de) temas como reforma da Previdência, proteção da indústria, participação do Estado na economia, aborto, casamento gay e liberação de drogas.

Na análise, o NIF (Núcleo de Inteligência da Folha) considerou partidos com respostas de no mínimo um terço dos candidatos, e excluiu os com menos de dez participantes.

Ficaram dentro dos parâmetros 25 partidos e 1.032 candidatos --67% do total de candidatos desses partidos e 96% dos participantes do Match.

O grau de coesão nas posições dentro de um mesmo partido variou bastante.

No PT e no PSOL, por exemplo, a grande maioria fica à esquerda na economia (mais presença do Estado) e progressista nos costumes. No Novo, há concentração também no polo progressista, mas à direita (mais liberal).

Já em partidos como o MDB, o Podemos ou o Solidariedade, as respostas ocupam todas as graduações de opinião.

Regimes presidencialistas têm dificuldade de gerar partidos programáticos, afirma o cientista político Carlos Pereira, professor da Ebape (Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas) da FGV-RJ e da Universidade do Estado de Michigan.


No Brasil, o multipartidarismo agudiza essa tendência, diz ele. "São raríssimos os que conseguem ter a ideologia como fator de agregação. Só os muito pequenos ou os que estão em busca de uma identidade no mercado."

Nesses casos, a ideologia funciona como uma marca, ajuda a diferenciá-los dos demais. "Mas a tendência é que, ao ocupar os espaços institucionais, o Parlamento, o Executivo, os partidos vão perdendo a tônica ideológica e adquirindo características de oportunidade política", diz Pereira.

Um exemplo, segundo ele, é o MDB, hoje o maior do país em número de filiados, cerca de 2,4 milhões. "Surgiu como uma grande frente democrática contra a ditadura, e foi se transformando num partido mais pragmático."

"O partido é muito grande e o país tem uma diversidade enorme, que precisa ser respeitada", diz o ministro das Minas e Energia, Moreira Franco, representante da ala histórica emedebista. Para ele, a defesa da democracia é a causa comum aos seus membros.

Para o professor de ciência política da USP e colunista da Folha André Singer, a origem dos partidos explica a maior ou menor coesão ideológica. "O MDB é tipicamente um partido parlamentar, criado de cima para baixo."

A partir dos anos 1960, surgem os chamados partidos de massa, "que saem do Parlamento e vão organizar a sociedade", diz Singer, autor de um livro sobre o PT.

Para ele, nos partidos "formados de baixo para cima" é preciso um programa para organizar as bases, e a ideologia passa a ter mais peso.

A chamada cláusula de desempenho, que começou a valer nestas eleições, pode ter incentivado a diversidade intrapartidária, na avaliação da professora da ciência política da Unicamp Andréa Freitas.

Para ter acesso ao fundo partidário, as legendas deverão ter representatividade em no mínimo nove estados. "A expansão territorial ficou mais necessária, principalmente nos pequenos partidos, e uma estratégia é buscar lideranças locais que possam ampliar esse alcance."

Independentemente da mudança nas regras, a procura de candidatos com força eleitoral pode explicar pontos fora da curva, como o candidato Marcelo Correa, do PSOL.

Evangélico, ele tem posições discordantes da quase totalidade dos colegas de partido em relação ao casamento gay, o aborto e a pena de morte.

Apesar disso, diz se sentir à vontade na sigla, à qual se filiou em 2013, por causa de sua militância comunitária de duas décadas e sua liderança em rádios comunitárias.

"O partido respeita minhas posições, e eu respeito a decisão dos companheiros. No aborto, por exemplo, é preciso debater muitas questões. Mas, no partido, defendemos que o corpo pertence à mulher e não ao Estado."

A posição pessoal do candidato pode não se traduzir em votos no Legislativo, mostram pesquisas.

Análise das votações na Câmara dos Deputados em legislaturas passadas, feitas pelos cientistas políticos Argelina Figueiredo, da Unicamp, e Fernando Limongi, da USP, mostram que, na prática, há fidelidade partidária nas decisões dos eleitos.

Segundo Andréa Freitas, especialista em Legislativo, "mesmo no auge da crise política os partidos ficaram unidos em votações nominais".

Ainda assim, eleger uma bancada muito heterogênea traz custos. "Dificulta a coordenação, que já é complexa. O líder partidário precisará de recursos mais fortes para manter a bancada unida."

Outra consequência é o aumento de trocas de legenda, por eleitos que não se conformam às decisões dos líderes.

Bancadas heterogêneas também dificultam formar maiorias, diz a pesquisadora do Cebrap Joyce Hellen Luz.

"A função do partido é justamente chegar a um ponto comum entre pessoas nunca iguais. Se o líder tem dificuldade no consenso, como garantir que os parlamentares vão votar com o partido?"

O NIF mostra também que, dos 25 partidos analisados, 19 lançaram candidatos cujas posições aproximam as agremiações do centro.

Nos extremos, há quatro destaques: PSOL e PT, cujos candidatos dão respostas de esquerda e progressistas, Novo, com respostas à direita e progressistas, e PSL, que aparece como o mais conservador e à direita em economia.

Rede e DEM se afastam do centro em um dos eixos --a primeira tem candidatos progressistas, mas sem viés econômico, enquanto o segundo tem candidatos de direita, sem viés moral.

Apesar das diferenças ideológicas entre os partidos, há assuntos nos quais a grande maioria dos candidatos pensa de forma semelhante.

Nos temas econômicos, por exemplo, a tendência geral é aprovar a avaliação de funcionários públicos e a proteção da indústria nacional, considerar necessário o programa Bolsa Família e condenar o uso de áreas de floresta para agricultura e a ocupação de imóveis por quem não tem moradia.

Em temas sociais e de comportamento, a quase totalidade concorda que a defesa dos direitos humanos é fundamental, condena a pena de morte e discorda de que a liberalização das drogas seja importante para combater crimes.

Outros temas mostram clara divisão na posição dos partidos.

Em economia, eles são a reforma da Previdência, privatizações e o uso de recursos públicos para ajudar empresas. Também há polêmica sobre a afirmação de que pobreza ou não depende do esforço de cada um, e na discussão sobre o que é prioritário: controlar inflação ou crescer.

No campo social e moral, há grande divergência sobre o ensino de valores religiosos na escola, o aborto, casamento gay, cotas para negros e o uso do Exército para garantir a segurança nas ruas. A afirmação de que a Operação Lava Jato é imparcial em suas ações também divide a opinião dos partidos.

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