terça-feira, 23 de outubro de 2018

Opinião do dia: Luiz Sérgio Henriques*

Este vazio que acompanha toda incursão populista contra sistemas políticos em crise também aqui se busca recobrir com o apelo ao antimoderno no plano das crenças, dos costumes e orientações de valor. O motivado interesse por tudo o que define o perfil de uma sociedade tolerante - direitos humanos, pluralidade de estilos de vida, respeito aos valores de crentes e não crentes - se vê abafado pelo fragor de uma “guerra cultural” inédita entre nós, mas já testada, e aprovada, em outras latitudes. A sensatez parece bater em retirada diante de ideólogos que simulam viver ou, o que é mais grave, acreditam viver nos tempos sombrios da contraposição mortal entre capitalismo e comunismo.

Se quiser ir além do petismo, a esquerda terá pela frente uma longa temporada de autorreforma - na verdade, um verdadeiro processo constituinte, que ela irresponsavelmente andou receitando para o País. Com métodos, categorias e linguagem renovada, poderá então contribuir para um diálogo vivo entre culturas e tradições, e até para a mútua “contaminação” entre elas, como convém às sociedades da diversidade. De resto, a persistência das divisões atuais só nos garantirá uma continuada decadência para a qual - até hoje - nosso país não parece ter sido talhado.
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*Tradutor e ensaísta, Luiz Sérgio Henriques é um dos organizadores das obras de Gramsci. ‘Além das culturas que dividem’, O Estado de S. Paulo, 21/10/2018.

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