terça-feira, 13 de novembro de 2018

Aumento do STF é nova fonte de pressão nas contas públicas: Editorial | Valor Econômico

Está nas mãos do presidente Michel Temer barrar o aumento de 16,38% do salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), aprovado pelo Senado, após ter sido colocado em votação de surpresa, em uma manobra de seu presidente, Eunício de Oliveira. Entre os 41 votos a favor, foram identificados vários senadores com processos na Justiça; apenas 16 foram contra. Tudo indica que o aumento vai ser sancionado, pregando uma nova despesa anual de R$ 4 bilhões a R$ 6 bilhões nas contas públicas dos próximos governos.

Temer disse que iria esperar, no período de 15 dias que tem para se pronunciar a respeito, um gesto do STF em direção a acabar com o criticado auxílio-moradia. A promessa de rever a concessão do penduricalho foi feita pelo próprio presidente do STF, Dias Toffoli, como contrapartida para minimizar o impacto do reajuste salarial. Sai arranhado também o futuro presidente Jair Bolsonaro, já que ele no mesmo dia dito publicamente que era contra o reajuste.

No entanto, tudo parece encenação para tentar aplacar as críticas ao aumento e a revolta da opinião pública, amplificada pela expectativa com o anúncio de medidas que vão penalizar a população para cobrir o rombo do setor público. Com processos na Justiça, correndo no âmbito do STF, se Temer quisesse cortar o problema pela raiz, já poderia tê-lo feito. O reajuste dos salários dos ministros do STF foi inicialmente aprovado pela Câmara dos Deputados em 1º de junho de 2016, sem maiores comoções, beneficiando-se do vácuo de poder então existente, uma vez que o Congresso estava mergulhado no processo do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.

Naquele momento, Dilma havia sido intimada e afastada do poder, para ser finalmente declarada impedida em 31 de agosto. O aumento era veementemente defendido pelo então presidente do STF, Ricardo Lewandowski, que conduziu o processo de impeachment. Eunício tentou votar o projeto no Senado em setembro de 2016, mas estava assumindo a presidência da Corte a ministra Cármen Lúcia que, mais sensível a esse tipo de questão, engavetou o pedido. A demanda foi retomada logo que ela deixou o posto, em agosto, novamente por Lewandowski, que defendeu que o aumento fosse incluído no orçamento do STF para 2019. Essa condição era necessária para que o Congresso pudesse aprová-lo. O ministro chegou a argumentar que a Justiça estava recuperando bilhões que haviam sido desviados da Petrobras e que os ministros estavam sem reajuste desde 2015.

Os ministros podem estar sem reajuste há tempos. Mas o salário atual de R$ 33,7 mil certamente os coloca entre os mais bem "aquinhoados", como definiu Bolsonaro. O valor é equivalente a 15 vezes a renda real média dos 92,6 milhões de trabalhadores ocupados, reportadas pela Pnad Contínua de setembro. Com o aumento de 16,38% pedido, novamente em uma ocasião de transição de poder, um ministro do STF vai receber R$ 39,3 mil, quase 18 vezes a média do rendimento real dos trabalhadores.

A promessa de minimizar o impacto do aumento com a revisão do auxílio moradia concedido a juízes é falaciosa. Em 2014, o ministro Luiz Fux concedeu liminar permitindo que os juízes recebessem o benefício, atualmente no valor de R$ 4.377. Mesmo que todos os juízes federais parassem de ganhar o auxílio, a economia seria de R$ 333 milhões, de acordo com estudos da Consultoria de Orçamentos do Senado Federal - menos da metade dos R$ 717 milhões que custará o aumento dos juízes federais.

Pior ainda é o efeito cascata que o reajuste provocará uma vez que o salário dos ministros do STF é referencial para a remuneração de várias categorias do funcionalismo como as de juízes, de procuradores, de promotores e até dos parlamentares que aprovaram o aumento. Há uma preocupação especial com o impacto nos Estados. Pelo menos três Estados já atrasam salários e estima-se que o número chegue a dez a curto prazo. Dos 25 Estados, 16 estouraram algum limite estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

A despesa com pessoal é a maior do governo federal depois da Previdência. Todas as contas influenciam no déficit, que deve ficar ao redor de R$ 125 bilhões neste ano no resultado consolidado, ligeiramente menor do que o esperado graças a receitas extraordinárias e alguma contenção do Orçamento. O primeiro ano do próximo governo dificilmente contará com essa vantagem.

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