quarta-feira, 14 de novembro de 2018

O Ministério da Defesa: Editorial | O Estado de S. Paulo

A nomeação de um militar para o Ministério da Defesa, em fevereiro, representou um claro retrocesso institucional. Ao nomear o general Joaquim Silva e Luna para a pasta - primeiro, como interino; em junho, efetivando-o no cargo -, o presidente Michel Temer rompeu o benfazejo ciclo de ministros civis na chefia do Ministério da Defesa desde que ele foi criado, em 1999, no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Como foi dito nesta página à época (ver editorial Retrocesso institucional, publicado em 28/2/2018), o problema não era a pessoa do general Joaquim Silva e Luna, evidentemente, homem de bem e de grandes serviços prestados ao País. O problema residia na atribuição de um poder eminentemente político - o cargo de ministro de Estado - a um militar. Não é uma prática que se coadune com o Estado Democrático de Direito.

Pode-se alegar que o presidente Michel Temer passava por período particularmente tenso de seu mandato. O ano havia começado com uma série de violentas rebeliões em presídios nas Regiões Norte e Nordeste do País. A crise da segurança pública era, como ainda é, tema mais do que presente na agenda de todas as esferas de governo. Não foi por outra razão que o presidente Temer criou o Ministério da Segurança Pública e nomeou para a pasta o então titular da Defesa, Raul Jungmann. E no lugar de Raul Jungmann foi nomeado o general Joaquim Silva e Luna.

A investidura do general Silva e Luna no cargo de ministro da Defesa tinha caráter de interinidade. Esta característica indicava que, uma vez dissipado o calor do momento, a pasta voltaria à chefia de um ministro civil. Não foi o que ocorreu. A criminosa greve dos caminhoneiros, em maio, fez com que o governo federal, às pressas, tomasse as ações que, àquela altura, julgava ser devidas diante da gravidade da crise. Não apenas o presidente Michel Temer sancionou a lei que criou o Ministério da Segurança Pública - originalmente concebido por meio de uma Medida Provisória -, como efetivou o general Silva e Luna na pasta da Defesa.

O tema voltou ao centro do debate na transição de governo e da formação do Ministério do presidente eleito Jair Bolsonaro. Não era novidade que Bolsonaro tinha forte predileção por um militar na chefia do Ministério da Defesa. Chegou a indicar para o cargo o general Augusto Heleno Ribeiro, que só não foi confirmado na pasta porque assumirá o Gabinete de Segurança Institucional.

Nesta terça-feira, 13, o presidente eleito usou o Twitter para comunicar a indicação do general Fernando Azevedo e Silva para o Ministério da Defesa. Jair Bolsonaro, portanto, fez uma opção equivocada, deixando de devolver às mãos de um civil o comando do Ministério da Defesa e, assim, dar um claro sinal à Nação de que no curso de seu governo as Forças Armadas exercerão o estrito papel que lhes reserva a Constituição, e do qual elas não têm se esquivado. Não vão nessas críticas reparos ao general Fernando Azevedo e Silva, quer do ponto de vista pessoal, quer do profissional.

Não faltaram vozes sensatas e insuspeitas a indicar que teria sido este o melhor caminho a ser seguido pelo futuro governo no que tange ao Ministério da Defesa. Em entrevista à Folha de S.Paulo, o general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, afirmou ter sugerido ao presidente eleito que “colocasse um civil na Defesa”. “Mas ele (Jair Bolsonaro) insistiu que fosse um oficial-general de quatro estrelas”, disse.

Como o colega de Arma a que sucederá, o general Azevedo e Silva é um homem honrado e extremamente capacitado para as missões que lhe foram atribuídas. Não obstante, um civil como titular do Ministério da Defesa tem especial significado no regime democrático consagrado pela Constituição. Significa a subordinação política, jurídica e até simbólica das Forças Armadas ao poder civil. A Carta de 1988 é precisa ao determinar o papel das Forças Armadas. Não há linha no texto constitucional que dê aos militares autorização para ingerências na vida política da Nação.

Jair Bolsonaro perdeu uma importante oportunidade de asseverar o vigor que o Estado Democrático de Direito terá no curso de seu mandato.

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