quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Macron na planície: Editorial | Folha de S. Paulo

Cabe ao presidente francês demonstrar habilidade para ouvir quem se sente desassistido

Por maior que seja seu prestígio, governantes que se distanciam das demandas dos governados tendem à impopularidade e, cedo ou tarde, são forçados a lhes dar satisfação. Nessa situação encontra-se o presidente da França, Emmanuel Macron, que tentou contornar, em vão, uma onda de manifestações de rua em curso há semanas.

Talvez pelo fato de que o direito de protestar esteja tão incorporado à vida política do país o mandatário tenha subestimado os “coletes amarelos” —termo pelo qual ficaram conhecidos os participantes desses atos, por vestirem o acessório que todo motorista deve levar no carro como item de segurança.

Entretanto a resistência e a capacidade de mobilização do grupo logo ficaram claras com o bloqueio de estradas —a exemplo do que caminhoneiros fizeram no Brasil— e o fechamento de lojas por dias. Nesta terça (4), Macron cedeu à principal queixa e suspendeu, por seis meses, o aumento de um imposto sobre os combustíveis.

A medida marca uma inflexão em um governo determinado a empreender uma agenda de reformas, em larga medida necessárias para modernizar o Estado e dinamizar a economia, sem se importar com contestações de oposicionistas ou dos demais cidadãos.

Amparava-se o presidente no grande respaldo das urnas, com 66% dos votos, e no posterior triunfo legislativo que conferiu a seu então recém-fundado partido maioria na Assembleia Nacional.

Aos olhos de Macron, o eleitorado, de fato desiludido com as legendas tradicionais à esquerda e à direita, dava-lhe carta branca para adotar um novo modelo de administração, que o dispensaria de negociar projetos com as demais siglas e de recorrer a canais de mediação, como sindicatos.

Tal era a confiança em si mesmo que, mais de uma vez, afirmou que os franceses esperavam um líder “jupiteriano”, alguém com altivez e autoridade semelhantes ao deus maior na mitologia greco-romana. Não tardou para críticos, com certa razão, enxergarem arrogância.

Eis que o mandatário se vê impelido a descer do Olimpo por um movimento de reivindicações mundanas. Sem comando claro e aparentemente dissociados de interesses partidários, os “coletes amarelos” reclamam do preço da gasolina, mas também da carga tributária em geral e do plano de alterar os regimes de aposentadoria.

Cabe a Macron demonstrar habilidade para ouvir quem se sente desassistido e empreender sua plataforma de forma gradual. Os franceses, agora, pedem um presidente mais terreno.

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