quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

Opinião do dia: Zygmunt Bauman

Não há atalhos que leve a um represamento rápido, hábil e sem esforço das correntes “de volta para” – seja Hobbes, as tribos, a desigualdade ou o útero. Eu repito: a tarefa presente de erguer a integração humana até o nível de toda a humanidade provavelmente se mostrará muito árdua, onerosa e difícil de se levar a efeito e de se completar. Nós temos de nos preparar para um longo período marcado por mais perguntas que respostas e mais problemas que soluções, assim como para atuar à sombra de chances muito equilibradas de sucesso e derrota. Nesse caso específico, porém – em oposição aos casos aos quais Margaret Thatcher o imputou -, o veredicto “Não há alternativa” vai se afirmar e consolidar sem possibilidade de apelo. Mais que em qualquer outro tempo, nós – habitantes humanos da terra – estamos numa situação ou\ou: estamos diante da perspectiva de nos darmos as mãos ou de rumar para as nossas valas comuns.


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Zygmunt Bauman (1925-2017). “Retropia”, p. 155. Editora Zahar, 2017.

Gilmar Mendes: Em defesa do habeas corpus

- Folha de S. Paulo

Os juízes têm uma relação paradoxal com a liberdade. De um lado, são defensores da ordem: apenas a ordem escrita e fundamentada de um juiz legitima que alguém seja mantido preso (artigo 5º, LXI, da Constituição). De outro, eles são defensores da liberdade: sempre que a lei admitir a liberdade, a obrigação do juiz é assegurá-la (art. 5º, LXVI, da Constituição).

O Brasil é um país violento e corrupto. A sociedade clama por reação, ainda que simbólica, especialmente em face de crimes de sangue e corrupção. Não é surpresa que as decisões que privilegiam a ordem, determinando o encarceramento, sejam bem vistas pelo público.

Por outro lado, decisões que afirmam a liberdade são impopulares. O juiz também é um membro da sociedade e, como tal, compartilha o sentimento coletivo. Ainda assim, ao determinar a prisão, deve seguir a lei à risca, evitando encarceramento além do necessário.

Dentre outras maneiras, o sistema jurídico manifesta a preferência pela liberdade por meio da ação de habeas corpus (HC), uma via processual prevista constitucionalmente, destinada a assegurar a liberdade, podendo ser proposta por qualquer um do povo para fazer cessar uma prisão indevida.

O habeas corpus é igualmente valorado pelos tribunais, seja ele escrito pelo advogado consagrado, em papel especial timbrado, seja pelo próprio preso —ou seus parentes— em folhas de caderno.

O HC acaba sendo o meio para coibir interpretações equivocadas e mesmo abusos na prisão. Essa característica de defesa da liberdade o torna bastante impopular entre aqueles que pregam a punição desmedida, gerando reações destinadas a limitar sua utilização.

Merval Pereira: Em busca do confronto

- O Globo

A declaração, no mínimo irresponsável, que no limite pode ser considerada uma incitação à violência, da presidente do PT, senadora investigada Gleisi Hoffmann, de que, para prender Lula, será preciso “matar muita gente”, é o retrato fiel da escalada de radicalização, por enquanto retórica, que os aliados do ex-presidente Lula estão fazendo à medida que se aproxima o dia do julgamento do recurso no Tribunal Regional Federal de Porto Alegre (TRF-4).

Mas também do descontrole emocional que domina as principais lideranças do partido, pois a mesma Gleisi, em entrevista à agência de notícias Bloomberg dias antes, mandara um recado aos investidores estrangeiros para que não se preocupassem, pois Lula, segundo ela, é um líder político conciliador e estaria disposto a publicar uma nova versão da carta aos brasileiros para garantir seus compromissos com o equilíbrio fiscal.

A presidente do PT, por sinal, dá provas, dia sim outro também, de que está fora de sintonia com a realidade, provavelmente devido ao temor de que seu líder máximo acabe o processo em curso na cadeia ou, pior ainda para os planos petistas, impedido de concorrer à Presidência da República.

A senadora petista colocara recentemente no Facebook uma foto da torcida do time de futebol alemão Bayern de Munique onde se leria, segundo sua postagem, uma faixa de apoio a Lula, como se o julgamento estivesse mobilizando até mesmo torcidas organizadas alemãs. Na verdade, a foto mostrava uma faixa onde se lia “Forza, Luca”, comum ultimamente nos estádios da Alemanha devido a um acidente sofrido por um torcedor. O fanatismo provocou uma ilusão de ótica que fez Gleisi ler Lula em vez de Luca, deixando-a no ridículo.

Bernardo Mello Franco: A caravela vai partir

- Folha de S. Paulo

Em outubro, a Constituição fará 30 anos. Parece pouco, mas não é. O Brasil nunca viveu tanto tempo em democracia. Aos trancos e barrancos, o país busca um rumo. Às vezes, como agora, passa a sensação de que caminha para trás. "É caminhando que se abrem os caminhos", ensinou Ulysses Guimarães, em 5 de outubro de 1988.

O velhinho sabia das coisas. Ao apresentar a nova Carta, ele lembrou que não bastava mandá-la à gráfica. Os eleitores precisariam fiscalizar seus representantes. "Do presidente da República ao prefeito, do senador ao vereador", prescreveu.

Por mais que se esforce, o cidadão não pode vigiar o poder sozinho. Depende de uma imprensa livre. Independente. Disposta a mostrar o que os políticos tentam esconder. O jornalismo profissional não está imune a erros, mas continua a ser imprescindível. Ainda mais agora, quando o público é bombardeado por notícias falsas ao alcance de um clique.

Míriam Leitão: Tempo de atenção

- O Globo

O presidente do TRF-4, Carlos Thompson Flores, não demonstrou ansiedade na conversa de terça-feira com a ministra Cármen Lúcia. Apenas relatou que o tribunal tem tido todo o apoio das forças de segurança do Estado e avisou que comunicaria se houvesse qualquer anormalidade. Nos meios jurídicos, o que se diz é que a Justiça está em estado de atenção, mas não de tensão.

Thompson Flores não pediu reforços de segurança, apenas relatou todos os fatos da perspectiva do Tribunal. Explicou o trabalho da segurança do próprio Tribunal, e das forças do Estado. Disse que não seria conveniente que o TRF-4 sofresse qualquer tipo de ameaça indevida. A Constituição prevê a liberdade de manifestação, mas ela precisa ser comunicada pelos organizadores. Ele ficou de avisar ao Conselho Nacional de Justiça sobre qualquer anormalidade.

De qualquer maneira, o país vive entre esses dois estados, atenção e tensão, nestes dias prévios do julgamento do ex-presidente Lula. O que o país está vendo é a proximidade de um acontecimento inédito: o julgamento em segunda instância de um ex-presidente da República condenado por corrupção. O PT recorre à militância e à retórica porque isso é parte do jogo político, mas na Justiça o que se diz é que o Judiciário não é um poder político, portanto essa estratégia não funciona para o fim desejado pelo partido.

Hélio Schwartsman: O poder do palavrão

- Folha de S. Paulo

Tenha ou não Donald Trump se referido a nações africanas e ao Haiti como "países de merda" ("shithole countries"), o poder do palavrão é algo que impressiona.

A primeira surpresa diz respeito aos efeitos dessas palavras-tabu. Por que elas despertam reações tão veementes naqueles que as ouvem. Se Trump tivesse usado o termo "países subdesenvolvidos" ou mesmo "países fracassados", teria transmitido o que pensa sobre essas nações sem despertar tanto alarde. Como disse "países de merda", desencadeou uma série de consequências diplomáticas e políticas. É possível até que esse incidente contribua para o fracasso de um acordo acerca dos "dreamers".

Outro paradoxo está na própria existência de palavras-tabu. Por que diacho desenvolvemos uma linguagem e logo a seguir escolhemos alguns termos para "proibir"? A julgar pelas evidências científicas, estamos falando de mais do que uma frescura. Xingamentos, palavrões e profanidades integram circuitos cerebrais diferentes dos da linguagem ordinária. Há casos de pessoas que sofrem lesões cerebrais que lhes tiram a capacidade de falar (afasia), mas conseguem praguejar. Ao que tudo indica, a forma ultraemocional com a qual lidamos com certas palavras tem base biológica.

Fernando Exman: Alerta na aplicação da Lei das Estatais

- Valor Econômico

A não execução das regras pode gerar impactos políticos

A campanha eleitoral já domina a pauta política, mas um instrumento fundamental para a manutenção da prestação de serviços à população é mantido à margem do debate travado pelos pré-candidatos e das prioridades de diversos governantes. Todas as empresas públicas precisam se enquadrar à Lei das Estatais em um prazo de aproximadamente seis meses. Mesmo assim, gestores públicos em Brasília e no restante do país parecem não dar a devida atenção à questão.

Esse risco é descrito com detalhes em um estudo produzido pela EY, empresa de auditoria e consultoria. De autoria de Luis Pontes, sócio-líder para Governo e Setor Público para a América Latina da EY, do gerente sênior de consultoria Rafael Colnago e do consultor sênior Daniel Silveira, o trabalho identificou 252 empresas estatais no Brasil, sendo 150 controladas pelo governo federal, 77 estaduais e 25 nos municípios de maior Produto Interno Bruto (PIB). Desse total, 49 atuam na área elétrica, 34 no setor de petróleo e derivados, 17 no segmento financeiro, 16 em comércio e serviços e 8 em portos. Há ainda companhias de transportes, abastecimento, saúde e assistência social, por exemplo. Ou seja, serviços urbanos, de infraestrutura e sociais de extrema importância, cuja qualidade costuma influenciar inclusive a popularidade de presidentes, governadores e prefeitos.

Luiz Carlos Azedo: O medo ambiente

- Correio Braziliense

O medo é uma variável importante do processo eleitoral de 2018. Ele está sendo retroalimentado pela radicalização política

Um dos fatores de mal-estar na sociedade é o chamado “medo ambiente”. É um fenômeno do mundo contemporâneo, decorrente das mudanças geopolíticas, tecnológicas e econômicas, mas no Brasil ele tem a ver também com o atraso e as desigualdades. Isso faz com que as incertezas do tempo presente sejam agravadas pelas certezas do tempo passado. No mundo mais desenvolvido, houve uma troca consciente e individualista da segurança pela liberdade a partir da relação dos cidadãos com o Estado e o conjunto da sociedade. As utopias coletivas e as ideologias se esfarinharam.

Na periferia do mundo, a situação é diferente. O mundo socialista que protagonizou a guerra fria não existe mais. A China, o Vietnã, a Coreia e Cuba continuem sendo ditaduras comunistas, mas os dois primeiros estão plenamente integrados à economia mundial; enquanto os últimos mantêm-se em cena como heranças da guerra fria, para alegria dos falcões dos Estados Unidos, de Donald Trump. E o que seria o terceiro mundo agora é o segundo; sua periferia exporta uma crise humanitária para o primeiro mundo, que é o grande responsável pela desordem na nova ordem mundial. O choque de civilizações, no plano religioso, completa o cenário, levando o terrorismo paras capitais mais protegidas do mundo. O “medo ambiente” está em toda parte.

No Brasil, ele tem identidade nacional. Por exemplo, a urbanização acelerada teve como consequência a favelização nas grandes cidades; ao mesmo tempo, essas “comunidades” estão conectadas virtualmente com o moderno, enquanto fisicamente continuam presas ao atraso. O que vai resultar disso aí é uma incógnita, mas o saldo atual dessa mistura de modernização com iniquidade social é a violência cotidiana. Às incertezas subjetivas se soma o temor físico de perder a própria vida. O Rio de Janeiro que o diga.

Monica de Bolle: Talentos desvalorizados

- O Estado de S.Paulo

Cerca de 77% das vezes, os livros de economia usam exemplos masculinos para explicar conceitos fundamentais

Em meio ao furor gerado pelos escândalos de assédio sexual nos Estados Unidos – assédio, não galanteios –, perdida ficou uma discussão para lá de urgente: o papel da mulher na academia, sobretudo na Economia. Na última reunião da American Economic Association, convenção que reúne milhares de economistas acadêmicos todo início de ano, houve uma sessão especialmente dedicada ao papel da mulher na economia e às evidências de discriminação que saltam aos olhos na profissão. Para o Brasil rebaixado devido às falhas da equipe de homens de Temer, pode ser que essa pareça discussão menor, sem sentido, bobagem. Não é.

Betsey Stevenson, professora da Universidade de Michigan, analisou a ocorrência de nomes e pronomes masculinos nos exemplos dos livros-texto mais utilizados nos cursos básicos de economia. Seus achados? Cerca de 77% das vezes, os principais livros de economia valem-se de exemplos com homens para explicar conceitos fundamentais: “Fulano de tal é um fazendeiro que vende trigo em um mercado onde há concorrência perfeita. Ele é, portanto, um tomador de preços”.

As mulheres aparecem apenas 18% das vezes, e, quando aparecem, são consumidoras, donas de casa, ou pessoas que sofrem a ação de outras – elas raramente aparecem como tomadoras de decisão e quase nunca são citadas como gestoras de política econômica. A única citada com frequência é a ex-dirigente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) Janet Yellen. Ela foi a primeira mulher a ocupar o cargo e ficou apenas um mandato na posição, tendo sido recentemente substituída por Jerome Powell, cujas credenciais acadêmicas e experiência como gestor de política econômica não chegam aos pés das de Yellen.

Cristiano Romero: Muito além da aritmética

- Valor Econômico

Em Brasília, ninguém representa os pobres e os interesses difusos

Certa feita, uma jornalista se aproximou do economista Luiz Guilherme Schymura, presidente do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, e perguntou o que ele achava da necessidade de corte dos gastos públicos e da implantação no Brasil do "Estado mínimo". Sem pestanejar, Schymura respondeu: "Você está fazendo a pergunta à pessoa errada. Eu tive condições de estudar e ter hoje um doutorado. Meu escritório na FGV é grande, tem ar-condicionado e vista para o Pão de Açúcar. Eu não uso quase nada dos serviços públicos. Você deve fazer essa pergunta a quem precisa do Estado".

Há quem veja na resposta de Schymura um viés antiliberal ou até mesmo um deboche - o Estado brasileiro está quebrado e o gasto público precisa, sim, ser reduzido. Não é ironia do economista: políticas públicas só dão certo se a torcida do Flamengo for ouvida antes. Ademais, o presidente do Ibre teve irretocável formação liberal - graduação na PUC do Rio, mestrado e doutorado na FGV, onde, além de presidir o mais antigo "think tank" liberal do país, dá aulas.

Alexandre Schwartsman: Fiz, mas não fui eu...

- Folha de S. Paulo

"Narrativa" virou uma palavra da moda. Há quem acredite que, mais que uma verdade, só é necessária uma narrativa que possa ser facilmente reproduzida pelos militantes de plantão, o que no contexto da disputa política é possivelmente verdade, mas certamente não quando estamos tentando entender o que de fato ocorreu.

Digo isso porque está em curso uma tentativa de criar uma narrativa (ou várias) que tire do governo anterior a responsabilidade pelo desastre que se abateu sobre a economia brasileira a partir do começo de 2014, do qual só começamos a sair no fim de 2016 e no começo do ano passado.

Não falta quem tente atribuir a recessão bíblica que vivemos ao suposto "austericídio", apesar do aumento persistente das despesas públicas (R$ 16,5 bilhões, já ajustados à inflação, de 2014 para cá, equivalentes a 1,7% do PIB) e da elevação do deficit público (limpo de "pedaladas" e afins) de 1,2% para 3,1% do PIB no mesmo período, ignorando acintosamente o papel dos erros da política econômica acumulados até o final de 2014.

Tentativa mais sutil de relativizar os erros do período é a de Marcio "Antonieta" Holland, em artigo recente na revista "Conjuntura Econômica", em que ensaia um mea-culpa, algo envergonhado, mas que esbarra numa série de problemas.

Uma chance para o Legislativo: Editorial/O Estado de S. Paulo

Há muitas formas de ver o novo rebaixamento da nota de crédito do Brasil dada pela Standard & Poor’s (S&P). A que melhor serve aos interesses nacionais, sem dúvida, é encará-lo como mais um importante chamamento ao dever àqueles sobre os quais recai a enorme responsabilidade de zelar pela estabilidade do País.

O presidente Michel Temer se reuniu no domingo passado com os ministros Henrique Meirelles (Fazenda), Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) e Torquato Jardim (Justiça), além de Gustavo do Vale Rocha, subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, para discutir os desdobramentos econômicos da piora do rating brasileiro e traçar um plano de ação do governo para viabilizar a aprovação, no Congresso Nacional, da PEC 287/2016, que trata da reforma da Previdência, cuja votação é prevista para 19 de fevereiro na Câmara dos Deputados.

O adiamento da votação da reforma da Previdência, que era para ter ocorrido no final do mês passado, foi uma das principais razões citadas pela agência de classificação de risco para rebaixar a nota de crédito do Brasil de BB para BB-, três níveis abaixo do patamar mínimo para obtenção do grau de investimento.

Não é difícil acompanhar a lógica por trás da decisão da S&P. A reforma da Previdência é uma medida indispensável para garantir a solvência do País nos próximos anos, criando, assim, o ambiente de segurança e previsibilidade que é fundamental para a atração de investimentos. A rigidez das despesas obrigatórias previstas no Orçamento da União, aliada à saudável imposição de um teto constitucional para os gastos públicos, deixará pouca margem de manobra para o governo central gerir bem as contas públicas caso as distorções do atual sistema previdenciário não sejam corrigidas. Cabe lembrar que só a Previdência compromete 57% das despesas da União, segundo dados do Ministério do Planejamento.

Atrito infeliz: Editorial/Folha de S. Paulo

Anos eleitorais, como se sabe, tendem a encurtar o tempo útil de trabalho de governo e Congresso. Tratando-se de uma gestão já por si reduzida e de um pleito que se afigura especialmente complexo, o risco de tal efeito aumenta.

Não obstante, lideranças do governismo dedicaram o início de 2018 a promover picuinhas e embates improdutivos, que podem prenunciar novas dificuldades para remover os empecilhos à estabilidade econômica e social do país.

O desarranjo político ficou evidente no modo como Henrique Meirelles, ministro da Fazenda, e Rodrigo Maia, presidente da Câmara, desentenderam-se em temas cruciais para a administração federal —e mais por politicagem canhestra do que por divergência programática.

As duas autoridades puseram-se a discutir, por exemplo, o provável estouro do limite legal de endividamento extra, a chamada "regra de ouro".

O vazamento inepto de tais tratativas causou má impressão entre os observadores da economia e os credores do governo. Reforçou a ideia de progressivo relaxamento nas contas públicas.

O positivo avanço de bancos privados na infraestrutura: Editorial/O Globo

Redução da inflação e dos juros é essencial para ampliar crédito de longo prazo a empresas, com a redução do papel do BNDES e dos bilhões em incentivos creditícios

A devastação causada pela histórica recessão do biênio 2015/16 atingiu, de maneira dura, como não poderia deixar de ser, os investimentos, em especial na infraestrutura, em que os projetos, além de serem geralmente de maior porte, costumam ter longa maturação.

O BNDES, banco público, a única grande fonte de crédito de longo prazo no país, detectou esta retração. Mas há projeções de elevação dos investimentos neste setor, seguindo a tendência já verificada em outros segmentos da economia, no segundo semestre de 2017.

A mudança de sinal na evolução dos investimentos coincide com a ação de fatores que induzem o aumento da participação privada no suporte financeiro aos projetos. Os fatores são a queda da inflação e a dos juros, o que facilita a troca da TJLP (taxa de longo prazo) pela TLP, com a consequente queda no enorme volume de subsídios que o contribuinte é forçado a despender com financiamentos do BNDES, ironicamente chamados de “bolsa empresário”. Mais uma transferência de renda de pobres para ricos.

Surto de febre amarela expõe limites do sistema de saúde: Editorial/Valor Econômico

A ocorrência nas últimas semanas de casos de febre amarela e de mortes provocadas por ela é mais um infeliz exemplo do descaso com que é tratada no Brasil a medicina preventiva. Basta ler os relatórios da Organização Mundial da Saúde (OMS) para se constatar que, com planejamento estratégico e aplicação de recursos financeiros e humanos nas regiões sob risco, é possível evitar que a doença se torne um enorme problema social e econômico, como começa a acontecer em alguns Estados.

A febre amarela é uma doença hemorrágica viral aguda transmitida por mosquitos infectados. O adjetivo "amarelo" designa a tonalidade da pele que afeta alguns doentes. Uma pequena percentagem de doentes que contraem o vírus revelam sintomas graves e cerca de metade deles morrem no prazo de 7 a 10 dias.

Segundo informações da OMS, a febre amarela é evitada por uma vacina extremamente eficaz, que é segura e economicamente acessível. Uma dose única da vacina da febre amarela é suficiente para conferir uma imunidade sustentada e uma proteção para toda a vida contra esta doença, não sendo necessária uma dose de reforço desta vacina, que fornece uma imunidade eficaz no prazo de 30 dias a 99% das pessoas vacinadas.

Advertência a ser ouvida: Editorial/O Estado de S. Paulo

O comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, voltou a tratar do problema do uso cada vez mais frequente das Forças Armadas em operações de segurança pública, o que demonstra a importância que os militares lhe dão e o tamanho da preocupação que ele acarreta. Foram duas manifestações em apenas duas semanas. Desta vez, em entrevista a Tânia Monteiro, publicada pelo Estado, ele se estendeu mais sobre a questão – de forma clara e direta –, apontando os perigos que essas ações representam para a instituição, com a agravante de que não resolvem o problema.

Antes, em mensagem divulgada no Twitter dia 30 de dezembro passado, a ênfase foi na repetição das ações para Garantia da Lei e da Ordem (GLO). Agora, um dos pontos principais é o que se refere ao risco de “contaminação das instituições” pelo crime organizado, que vai da sua interferência no processo político – com a colocação de pessoas ligadas à delinquência, ou mesmo chefes de quadrilhas, em cargos públicos importantes – à cooptação de pessoal das tropas empregadas naquelas ações. Segundo o general Villas Bôas, o fato de “as facções criminosas do Rio e de São Paulo” se estenderem para outros Estados e sua relação com o narcotráfico em nível internacional dão-lhe uma força que aumenta muito aquela capacidade de contaminação.

Nesse caso, o comandante do Exército vai direto ao que interessa aos militares: “Há preocupação de contaminação das tropas, e por isso queremos evitar o uso frequente das Forças Armadas”. Para comprovar que esse temor tem bases concretas, cita o que chama de “desvios” de integrantes das tropas em ação no Rio, registrados recentemente: “Foram pontuais, restritos a um ou outro indivíduo, de nível hierárquico baixo. Está infinitamente distante de representar um problema sistêmico ou institucional. Mas temos preocupação e estamos permanentemente atentos”.

Por Lula, PT sobe o tom contra julgamento

A senadora Gleisi Hoffmann disparou contra a possibilidade de prisão do ex-presidente Lula: “Vai ter que matar gente.” Ontem, Lula esteve no Rio para encontro com intelectuais e artistas.

‘Vai ter que matar gente’

Lula foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, na primeira instância

Presidente do PT sobe o tom e diz que prisão de Lula poderia resultar até em mortes

Jussara Soares / O Globo


-SÃO PAULO E BRASÍLIA- A uma semana do julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), o PT subiu o tom que vem adotando de perseguição política ao partido e ao seu maior líder. Com a possibilidade de condenação em segunda instância de Lula, a senadora Gleisi Hoffmann, presidente do PT, radicalizou o discurso e criticou o processo. Ao duvidar de uma eventual prisão de Lula, em entrevista ao site Poder360, ela declarou que pode haver até mortes antes que o petista vá para a cadeia.

— Ah, isso não vai. (Lula ser preso). Para prender o Lula, vai ter que prender muita gente. Mas, mais do que isso, vai ter que matar gente. Aí vai ter que matar — afirmou Gleisi ao site.

O clima de hostilidade chegou em forma de ameaça via rede social aos três desembargadores que julgarão Lula na próxima quarta-feira, em Porto Alegre. Segundo Roberto Veloso, presidente da associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), os responsáveis já foram identificados e seus nomes encaminhados à Procuradoria-Geral da República para providências.

As declarações de Gleisi ocorreram após o presidente do TRF-4 ir a Brasília discutir questões de segurança durante o julgamento do recurso petista. Lula foi condenado a nove anos e seis meses de prisão pelo juiz Sergio Moro. Mesmo que o TRF-4 confirme a pena, a prisão imediata já foi descartada pelo tribunal. Em nota, o órgão informou que a eventual detenção dos envolvidos no julgamento só ocorrerá após a análise de todos os recursos cabíveis à corte.

No Rio, Lula ataca presidente do TRF-4 e diz que Moro deve ser exonerado

Em teatro do Leblon, petista é recebido por intelectuais e artistas

Marco Grillo / O Globo

Com artistas, intelectuais e militantes de esquerda, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou ontem de um encontro no teatro Oi Casa Grande, no Leblon, e atacou o presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), Carlos Eduardo Thompson Flores. Na semana que vem, a corte vai julgar o recurso da defesa de Lula contra a condenação no caso do tríplex do Guarujá.

— Não vou falar mal dos juízes de Porto Alegre porque não os conheço. Acho estranho o presidente do tribunal não ter lido a sentença e ter falado que era irretocável. Estranhei um cara (desembargador) ler não sei quantas mil páginas em poucos dias, mas, como tem leitura dinâmica, pode ser. O que me chamou atenção foi que esse cidadão vai a Brasília pedir proteção da Suprema Corte, no Temer, no Etchegoyen, sem dizer quem está ameaçando. Esse cidadão é bisneto do general Thompson Flores, que invadiu Canudos e matou Antônio Conselheiro. É da mesma linhagem. Quem sabe esteja me vendo como cidadão de Canudos — provocou.

Lula sugeriu ainda que o juiz Sergio Moro, que o condenou, deveria ser exonerado pelo “bem do serviço público”.

O petista ironizou a acusação de que recebeu um apartamento no Guarujá como propina da empreiteira OAS em troca de benefícios em contrato na Petrobras. Ao citar a infância pobre, Lula afirmou que nunca roubou naquela época e que, portanto, não faria sentido roubar depois de firmar um “compromisso com o povo brasileiro”:

— Eu ia roubar apartamento de R$ 500 mil quando poderia ter apartamento cheio de malas com dinheiro, quando poderia estar participando desse conjunto da Odebrecht, ter participado de conta na Suíça?

Chico Buarque, que assinou recentemente manifesto em defesa do ex-presidente, não apareceu. Mas a classe artística foi representada por nomes como a cantora Beth Carvalho e os atores Osmar Prado, Bemvindo Siqueira, Herson Capri e Gregório Duvivier. Do mundo político, o ex-ministro Celso Amorim, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) e o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, possível candidato do PSOL à Presidência, foram alguns dos nomes. Do meio acadêmico, participaram do evento o antropólogo Luiz Eduardo Soares e a filósofa Marcia Tiburi, entre outros que lotaram o teatro na Zona Sul da cidade.

Lula chegou às 19h40m e desceu do carro bem na porta do teatro, sem passar pelos simpatizantes que o aguardavam e tampouco pelos opositores que o insultavam do outro lado da calçada.

Análise de discurso

- O Globo

Incitação à violência e à polarização

- José Alvaro Moisés, professor titular de Ciência Política da USP

O PT tem o direito de apresentar recursos às decisões de Sergio Moro e do TRF-4. O que o PT não pode fazer é previamente afirmar que a decisão da Justiça só será correta e legítima se coincidir com as posições do partido. É uma forma antidemocrática de tratar a questão, além de atribuir aos atores da Justiça um papel político. As declarações da senadora Gleisi Hoffmann a colocam num cenário de líder autoritária, que incita a violência, estimula o debate polarizado, reforça a perspectiva de intolerância a quem pensa diferente e, principalmente, coloca em questão a legitimidade do Judiciário.

Perseguição tem grande apelo eleitoral

- Marco Antônio Teixeira, cientis político da FGV

O endurecimento do PT está dentro do jogo quando o seu líder está ameaçado. Não se esperava que o PT fosse ter um discurso menos rígido quando não apenas a reputação da legenda está em risco, mas também a candidatura de Lula. O discurso que o PT adota de perseguição ao ex-presidente tem grande apelo eleitoral. A temperatura sobe com o enfrentamento direto ao Judiciário, mas não vejo como ameaça à democracia. Na época do depoimento de Lula em Curitiba também se temia radicalização, o que acabou não ocorrendo. O que observo é uma disputa de narrativas e de pontos de vista.

Linguagem usada é desafio ao judiciário

David Fleischer, cientista político e professor da UnB

O que a Justiça decide está decidido. Com as recentes declarações da senadora Gleisi Hoffmann, presidente do partido, o PT está tentando ferir a democracia ensaiando um desafio à Justiça. É claro que a democracia permite a divergência de opinião e que qualquer cidadão do país se expresse livremente. Mas, no caso da senadora Gleisi Hoffmann, a linguagem usada é um desafio ao Judiciário. Se suas declarações forem levadas às últimas consequências, temos um sério risco à democracia.

Petistas minimizam declaração de Gleisi sobre 'matar gente'

Catia Seabra / Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Dirigentes petistas buscaram minimizar nesta terça (16) declaração da presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR). Ela disse que, para que o ex-presidente Lula seja preso, "vai ter que matar gente".

"Para prender o Lula, vai ter que prender muita gente, mas, mais do que isso, vai ter que matar gente. Aí, vai ter que matar", afirmou Gleisi, em entrevista ao site "Poder360", em alusão a eventual condenação de Lula pelo TRF4(Tribunal Regional Federal da 4ª região), no próximo dia 24, em Porto Alegre.

O presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, chamou a declaração de infeliz, afirmando que essa foi uma força de expressão.

"Haverá uma comoção social. Vamos ficar chateados. Eu mesmo, se o Lula for preso, vou morrer do coração", reagiu Okamotto, que disse que não há orientação de endurecimento às vésperas do julgamento. "Não haverá uma revolução, infelizmente."

Ele acrescentou: "Vamos insistir na via institucional, o que não significa entrar com uma ação [na Justiça] e ir para casa de braços cruzados".

Para o líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS), a fala de Gleisi foi "força de expressão". "Não tem sentido literal. Não tem relevância."

O deputado Carlos Zarattini (PT-SP) opinou que Gleisi sofreu de "ansiedade cibernética", fruto de tentativa de se mostrar proativa na internet.

RS quer fechar prédios públicos para julgamento

Lava Jato. Secretário integra polícias, Exército e Abin em operação no dia 24, quando TRF-4 em Porto Alegre analisará recurso de Lula; Gleisi fala em mortes em caso de prisão

Ricardo Brandt / O Estado de S. Paulo.

A Secretaria da Segurança Pública do Rio Grande do Sul pediu o fechamento de todos os prédios públicos do Parque Maurício Sirotsky Sobrinho, conhecido como Parque da Harmonia, no entorno da sede do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), em Porto Alegre. A 8.ª Turma Penal da Corte vai analisar, no dia 24, um recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O petista foi condenado a 9 anos e 6 meses de prisão pelo juiz Sérgio Moro, da Lava Jato em Curitiba, no caso do triplex no Guarujá (SP). A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), afirmou ontem ao site Poder 360 que, “para prender Lula, vai ter que matar muita gente”. Em uma rede social, ela ainda bateu boca com o prefeito da capital gaúcha, Nelson Marchezan Jr. (PSDB).

A uma semana do julgamento, o esquema de segurança foi reforçado em Porto Alegre. O efetivo foi aumentado na área do tribunal. A Brigada Militar está de prontidão no local e equipes da Polícia Federal e até do Exército já estão em atividade. Estão previstas manifestações contra e a favor do petista.

O secretário Cezar Schirmer disse ao Estado que já pediu, por meio de ofício, a suspensão das atividades dos órgãos públicos instalados no parque. Incra, Receita Federal, IBGE e Serpro – empresa federal de processamento de dados – deverão fechar na véspera e no dia do julgamento. Ele afirmou também que já recebeu sinalização de que o pedido será atendido.

“A democracia pressupõe a convivência de contrários, respeito às divergências, então os contra e os a favor querem se manifestar, vão se manifestar democraticamente. Queremos protegê-los e proteger a população de Porto Alegre. Não queremos nenhum incidente violento, queremos respeito à ordem pública e à lei”, disse Schirmer.

'Caneta na mão' será decisiva, diz consultor

Por Fabio Murakawa e Lucinda Pinto | Valor Econômico

BRASÍLIA E SÃO PAULO - Enquanto muitos enxergam o desfecho desta eleição presidencial de 2018 como imprevisível, para o cientista político Luciano Dias, da CAC Consultoria, o cenário está quase todo traçado. Com a "caneta na mão", diz, a chamada "centro-direita" tem poucas chances de sair derrotada, seja quem for o candidato: o governador Geraldo Alckmin, de São Paulo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ou até mesmo o presidente Michel Temer.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o apresentador Luciano Huck teriam problemas por ainda não haverem sido testados. Assim como o prefeito de São Paulo, João Doria, "que nunca experimentou a derrota ou a traição". Ainda assim, diz ele, seriam favoritos.

O ex-presidente Lula, por sua vez, é "menos perigoso" do que um eventual candidato indicado por ele. E Marina Silva já teve seu "recall consumido pelo tempo".

Nesse contexto eleitoral, o único ponto fora da curva, ou "anomalia", é o desempenho de Jair Bolsonaro na Região Norte. Um fenômeno ainda sem explicação.

Doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), Dias fundou a CAC em 1997. Tem como clientes bancos, corretoras e políticos - especialmente alguns ligados ao PP. Chefiou a equipe de transição do ex-prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal, em 2012. Também prestou consultoria ou atuou como conselheiro de políticos ligados a partidos como o DEM e o PR.

Suas análises e acertos em votações no Congresso, como a aprovação da reforma trabalhista, têm chamado a atenção de operadores no mercado. Previu o impeachment da presidente Dilma Rousseff com meses de antecedência, quando ela preteriu o PMDB de Temer e Eduardo Cunha, então presidente da Câmara, em detrimento do PMDB do Nordeste, em uma malsucedida reforma ministerial no fim de 2015. "A eleição neste ano é muito mais fácil de prever. Porque a caneta mudou de mão", afirma Dias, nadando novamente contra a corrente.

Brasil não precisa de 'showman', diz Alckmin

Por Fernando Taquari | Valor Econômico

SÃO PAULO - Pré-candidato à Presidência da República, o governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB), reagiu ontem à possibilidade de o país eleger neste ano um 'showman'. O Brasil, conforme disse o tucano em entrevista à Rádio Bandeirantes, precisa de um líder capaz de resolver seus problemas.

A declaração ocorre no momento em que volta-se a especular no meio político a possibilidade de o apresentador de TV Luciano Huck concorrer ao Palácio do Planalto neste ano.

"O Brasil não precisa de 'showman'. Quem quer assistir show, têm gênios no Brasil [do entretenimento]. O Brasil precisa de alguém que resolva os problemas", disse Alckmin. O governador fez a observação ao responder sobre a pressão de dirigentes tucanos que lhe cobram um desempenho melhor nas pesquisas de intenção de voto.

No último Datafolha, ele oscila entre 8% e com 12%. Os levantamentos neste momento de pré-campanha, segundo o governador, não têm significado". O tucano lembrou que o senador Aécio Neves (MG) tinha 5% das preferências em abril de 2014. "Não me preocupa muito", reforçou.

Maia: Justiça interfere indevidamente no país

Presidente da Câmara critica impedimento de Cristiane Brasil

Henrique Gomes Batista / O Globo


-WASHINGTON- O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, afirmou na tarde de ontem, em Washington, onde cumpre agenda de visita oficial, que o Judiciário interfere excessivamente na política, atrapalhando o país. Maia falou especificamente sobre o caso da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ), escolhida pelo presidente Michel Temer para assumir o Ministério do Trabalho — e impedida pela Justiça de tomar posse. Para Maia, um juiz de primeira instância não pode limitar o poder do presidente do país.

— Acho que isso está desorganizando o Brasil. Esse protagonismo excessivo do Judiciário não é bom. Daqui a pouco, a sociedade vai achar que o Judiciário pode tudo e vai cobrar deles melhoria na Educação, na Saúde. No caso da nomeação da ministra, estão bloqueando uma decisão do presidente da República. Independente do que as pessoas acham, se deveria ou não nomear a Cristiane, é um absurdo que a Justiça interfira nisso — afirmou o presidente da Câmara.

Questionado se o caso não seria semelhante à decisão do Supremo que impediu o expresidente Luiz Inácio Lula da Silva de ser ministro na fase final do governo de Dilma Rousseff, Maia disse que a situação é diferente. Segundo Maia, o grande questionamento é se o juiz Sergio Moro poderia ou não divulgar aquelas gravações (onde Dilma oferece o cargo a Lula como uma forma de se proteger de um eventual pedido de prisão por causa da Lava-Jato). Para o presidente da Câmara, contudo, depois que as conversas ficaram conhecidas, “não havia dúvidas” de que a nomeação era um tipo de obstrução de Justiça.

Deputados tucanos defendem candidatura de Doria ao governo

Dos parlamentares da bancada do PSDB na Alesp, 12 apelam para que prefeito dispute a sucessão de Alckmin

Fabio Leite / O Estado de S.Paulo

Deputados estaduais tucanos que integram o grupo político do governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB) iniciaram nesta terça-feira, 16, um movimento público em defesa da candidatura do prefeito da capital, João Doria (PSDB), a governador de São Paulo nas eleições deste ano.

Um grupo de 12 parlamentares – 60% da bancada do partido na Assembleia Legislativa (Alesp) – passou duas horas no gabinete de Doria para “fazer um apelo” para que o prefeito renuncie ao cargo em abril para disputar a sucessão de Alckmin. Doria já disse publicamente que cumprirá os quatro anos de mandato na Prefeitura, mas articula nos bastidores sua candidatura ao governo.

Liderado pelo presidente da Alesp, Cauê Macris (PSDB), o movimento ocorre no momento em que o vice-governador Márcio França (PSB) articula apoio de partidos aliados e de tucanos para sua candidatura ao governo. França deve assumir o comando do Estado em abril, quando Alckmin deverá renunciar para disputar a Presidência da República.

O discurso que está sendo difundido por Macris para minimizar uma possível saída precoce de Doria da Prefeitura é de que no governo do Estado o atual prefeito “poderá fazer mais pela cidade”. Deputados ligados ao ex-governador e senador José Serra, como Barros Munhoz, não foram ao encontro. Serra e outros dois tucanos também são pré-candidatos.

Paes volta ao Rio de olho em disputar governo pelo PSB

Presidente do partido é obstáculo; ex-prefeito acha que ele vai cair

Chico Otavio, Miguel Caballero / O Globo

O ex-prefeito Eduardo Paes chega hoje ao Rio de Janeiro para dar partida à corrida sucessória pela cadeira do governador Luiz Fernando Pezão (PMDB), apostando suas fichas em vir a ser o candidato do PSB. Paes reconhece que tem problemas com o atual presidente nacional do partido, Carlos Siqueira, que declarou publicamente a intenção de barrá-lo, mas acha que a correlação de forças pode mudar na legenda.

— Disseram que esse presidente nacional vai cair. Ele está enrolado com a história do jatinho do Eduardo Campos. Vamos aguardar — disse o ex-prefeito.

As conversas sobre uma possível filiação ao PSB vinham ocorrendo entre o deputado Hugo Leal, presidente estadual do partido, e o deputado federal Pedro Paulo (PMDB-RJ), braço-direito de Paes.

Procurado, o presidente do PSB rebateu a insinuação de Paes.

— Gostaria que ele mostrasse uma notícia sequer me vinculando a este episódio (jatinho de Eduardo Campos). Desafio a provar qualquer mínima vinculação minha a isso.

PERMANÊNCIA NO PMDB DESCARTADA
Siqueira, que já havia chamado os governos do PMDB no Rio de “herança maldita”, voltou a citar o atual partido de Paes para justificar por que não deseja o ex-prefeito no PSB:

— Nada a declarar sobre o retorno dele (ao país) ou sobre a eleição. Ele é do PMDB, e os políticos deste partido têm de ser julgados pela população nas urnas pelo que fizeram com a cidade e o estado do Rio. Nunca ouvi qualquer cogitação (de Paes ir para o PSB).

Outras possibilidades de partidos citadas pelo ex-prefeito são o PTB (mas ele torce o nariz diante da hipótese de negociar com Roberto Jefferson), o PDT e o PP. No PDT, um entrave poderia ser o ex-governador Ciro Gomes, pré-candidato do partido à Presidência da República, visto como um político de temperamento imprevisível. No PP, Paes tem boa relação com o vice-governador do Rio, Francisco Dornelles, mas reconhece que a composição nacional do partido é “quase suicídio”.

O que está descartado pelo ex-prefeito é a possibilidade de permanecer no PMDB de Sérgio Cabral e Jorge Picciani, os dois principais caciques do partido no estado e que estão presos em Benfica.

O ex-prefeito não esconde o desejo de concorrer, mas evita analisar os futuros adversários. Disse apenas que, quando candidatou-se pela primeira vez a prefeito, foi motivado pela intenção de ajudar a cidade.

Ruy Castro: Quem sabe, sabe

- Folha de S. Paulo

A dias de ter seu destino selado pela Justiça, o ex-presidente Lula vai jogar sua última cartada para a galera, recrudescendo o grau de ira de seu discurso. É verdade que não falta mais ninguém para ofender —o próprio juiz Sergio Moro já foi chamado por ele de parcial, ilegítimo, mentiroso, czar e até de surdo. E sua ladainha contra a "burguesia loura e de olhos azuis" teve de ser posta de lado quando se percebeu que seu advogado é louro e de olhos azuis —tal como, aliás, a falecida dona Marisa.

Será o confronto final entre seu discurso triunfalista de que, por falta de documentos, nunca poderão provar que ele era dono de sítios e triplexes, e a constatação óbvia de que ninguém passa recibo por malfeitos. O outro argumento, dirigido aos desinformados do exterior, de que não lhe dão direito de defesa, não pode ser usado aqui diante das dezenas de recursos dirigidos por sua defesa à Justiça e da repetida convocação de testemunhas para ilibá-lo —segundo José Simão, nem Jeová teve tantas testemunhas quanto Lula.

Será interessante também assistir, nos próximos dias, à campanha da ex-presidente Dilma Rousseff pregando que os inquéritos visam apenas impedir que Lula volte à Presidência. Supondo que seja verdade, nada disso estaria acontecendo se, ao fim de seu mandato em 2014, ela tivesse aberto mão de sua candidatura à reeleição e devolvido a vaga a Lula —como ficara combinado que aconteceria quando ele a inventou como candidata em 2010.

Donald Trump, presidente dos EUA, chamou há pouco o Haiti e os países africanos de "países de merda". Lula não precisou ir tão longe —chamou o próprio Brasil de país de merda. "Este país não nasceu para ser a merda que é", ele disse em Feira de Santana, na Bahia, no dia 20 de agosto do ano passado.

Quem sabe, sabe.

Fernando Pessoa: Acaso

No acaso da rua o acaso da rapariga loira.
Mas não, não é aquela.

A outra era noutra rua, noutra cidade, e eu era outro.

Perco-me subitamente da visão imediata,
Estou outra vez na outra cidade, na outra rua,
E a outra rapariga passa.

Que grande vantagem o recordar intransigentemente!
Agora tenho pena de nunca mais ter visto a outra rapariga,
E tenho pena de afinal nem sequer ter olhado para esta.

Que grande vantagem trazer a alma virada do avesso!
Ao menos escrevem-se versos.
Escrevem-se versos, passa-se por doido, e depois por gênio, se calhar,
Se calhar, ou até sem calhar,
Maravilha das celebridades!

Ia eu dizendo que ao menos escrevem-se versos...
Mas isto era a respeito de uma rapariga,
De uma rapariga loira,
Mas qual delas?
Havia uma que vi há muito tempo numa outra cidade,
Numa outra espécie de rua;
E houve esta que vi há muito tempo numa outra cidade
Numa outra espécie de rua;
Por que todas as recordações são a mesma recordação,
Tudo que foi é a mesma morte,
Ontem, hoje, quem sabe se até amanhã?

Um transeunte olha para mim com uma estranheza ocasional.
Estaria eu a fazer versos em gestos e caretas?
Pode ser... A rapariga loira?
É a mesma afinal...
Tudo é o mesmo afinal ...

Só eu, de qualquer modo, não sou o mesmo, e isto é o mesmo também afinal.