quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Marco Aurélio Nogueira: Novidade sem raízes

- O Estado de S. Paulo

Se Huck quer se colocar a serviço de uma causa deveria começar do começo, amassando barro e sujando as mãos.

Não se pode ser contra quem anda insuflando o Huck a sair candidato. Não o conheço, não votaria nele, mas respeito os argumentos de quem o patrocina. Não se deveria vetar iniciativas políticas desse tipo, até por uma questão de princípio. Todos devem ter direito de propor nomes e articular candidaturas, lutando por elas se acaso nelas acreditarem de verdade.

Também não hostilizo o rapaz, que deve ter seus méritos. Acho uma bobagem extrema dizer que ele não pode ser candidato porque não passa de um “funcionário da Globo” e representaria os interesses dessa organização. É uma acusação que só comprova os tempos intolerantes e de retórica autoritária em que vivemos. É ridículo, para dizer o mínimo, medir sua estatura política ou intelectual pelo programa de auditório que ele pilota há anos. Parte da esquerda aprecia essa prática, em nome da necessidade de apreender os nexos explosivos entre a economia e a política. Para ela, a posição no mercado remete imediatamente a uma posição na política. É a reiteração do mesmo dogmatismo que despreza a complexa dialética entre economia e política e que, aos trancos e barrancos, tem ajudado a empurrar o marxismo para a margem.

A ideia de que Huck pode ser o “sangue novo” que falta à política tradicional e que, por isso, poderia representar a alternativa de que carece o “centro democrático” está, porém, desprovida de substância política. Novo de que tipo? Pela esquerda, pelo centro, pela direita, por sobre partidos, a partir de “movimentos cívicos”? Coisas novas, em política, não saem do bolso do colete de alguém dotado de visão superior. Nenhum caso foi assim: Collor em 89, Lula em 2002, Macron na França, todos surgiram a partir ou de uma construção complexa, ou foram a expressão de lideranças que de algum modo estavam na política. Não há um novo “puro”. A ideia é abstrata e precisa ser traduzida. Especialmente quando embalada por articulações e desejos afirmados de cima para baixo, sem a devida maturação, sem aquele processamento indispensável para que se acerte o alvo, ou se chegue perto dele com um mínimo de autenticidade, massa crítica e base operacional.

Nada contra a ação dos bastidores. Em boa medida, todos os nomes nascem de conchavos e negociações que rolam em camarins pouco acessíveis. Mas somente vencem aqueles que, dispondo de bons bastidores, demonstram ter resiliência e competitividade para chegar ao coração do povo e dobrar os adversários. É tudo óbvio, mas não custa lembrar.

A fonte propulsora de uma eventual candidatura de Huck parece ser a preguiça dos políticos democráticos de enfrentar a própria crise, de romper com a inoperância que ameaça corroê-los e inviabilizá-los.

Ninguém sabe o que pensa Huck, além da promessa de “renovar a política”. Seus patrocinadores nem sequer se preocupam em agregar qualidade programática ao nome dele, como se achassem que prestígio televisivo e apoio de algumas lideranças são suficientes para fazer um país. Credibilidade não é extensão natural de popularidade. Dizem que sua plataforma será construída no devido tempo e a partir de itens “autoevidentes”, impostos pela necessidade que o país teria de “renovação”. É mais uma desculpa que uma explicação.

Se Huck quer mesmo se colocar a serviço de uma causa — e não há motivos para que se duvide disso –, há muitos lugares disponíveis para tal empreendimento na política. Deveria começar do começo, amassando barro e sujando as mãos. Despejado sobre a sociedade como descoberta “genial” de alguns morubixabas, poderá até vencer, mas não terá raízes em que se apoiar. Precisará ser tão assessorado e tão protegido que não poderá dar passos à frente sem as muletas daqueles que o descobriram e patrocinaram. Seu poder, assim, não lhe pertencerá. Nem a ele, nem ao povo que o eleger.

Patrocinado por um dos polos do drama nacional nosso de cada dia, ainda terá por efeito encrespar o polo adversário, prolongando a polarização de que precisamos nos livrar.
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Marco Aurélio Nogueira é professor titular de Teoria Política da Unesp

Elio Gaspari: FHC e sua curva de Sartre a Huck

- O Globo

A nova cartada do grão-tucano revela o esgotamento de seu partido, de sua prática política e de sua geração

Quando Fernando Henrique Cardoso se referiu à candidatura de Luciano Huck à Presidência da República, louvou “suas boas intenções” e disse que “para o Brasil seria bom, mas não sei o que ele vai fazer”. FHC sabe o que gostaria que ele fizesse, mas não sabe o que Huck fará, nem antes nem depois de uma eventual candidatura. Sabe apenas que tem “boas intenções”.

Faz tempo que FHC flerta com o “novo”. Em 1989, para um pedaço do tucanato, o “novo” era o ator Lima Duarte, de 59 anos, para ser o candidato a vice na chapa de Mário Covas à Presidência da República. O “novo” chamou-se Fernando Collor e foi eleito. Em 2012 pensou-se pela primeira vez em Huck, recrutando-o para uma candidatura ao Senado em 2016.

Estranho “novo” esse, vem sempre da telinha. Isso num partido que perdeu quatro eleições presidenciais e tem em Geraldo Alckmin seu provável candidato. Assim, o PSDB terá oferecido ao eleitorado dois repetecos, com José Serra e Alckmin, mais um “novo” com Aécio Neves.

FHC buscou o “novo” na telinha por diversos motivos, mas acima de todos está o desejo de ganhar a eleição. Se ele conhece virtudes além das “boas intenções” de Huck, não as revelou. Nem ele nem o “novo”, que, em um ano de breves enunciados, repetiu platitudes capazes de humilhar campeões do óbvio como Michel Temer e Geraldo Alckmin.

Em 1960, aos 29 anos, Fernando Henrique Cardoso fez-se notar na academia paulista coordenando uma palestra do escritor francês Jean-Paul Sartre. Passou-se mais de meio século, ele governou o país por oito anos e recuperou a credibilidade econômica do Brasil. Fez isso com jovens audaciosos como Pedro Malan e Gustavo Franco mas, por artes de Asmodeu, o PSDB nada produziu além de Geraldo Alckmin e Aécio Neves, um “novo” que descarrilhou. (Vai aqui uma hipótese: Malan e Franco nunca se moveram nos trilhos por onde andou Aécio.)

Não se pode responsabilizar FHC pela ruína do PSDB, mas ele foi parte dela. Quando saiu do PMDB, acompanhando Mário Covas e Franco Montoro para livrar-se das práticas que o haviam contaminado, buscava algo novo e foi bem-sucedido. O tucanato envelheceu, em vários sentidos.

Yeda Crusius: As prévias e o PSDB

- Folha de S. Paulo

Precisamos de serenidade para encontrarmos juntos o candidato que melhor poderá nos representar

As prévias marcadas para 4 de março, que definirão o candidato do PSDB à sucessão presidencial deste ano, podem ser uma oportunidade para que o partido se reencontre com seus princípios e nos aponte um caminho para tirar o Brasil definitivamente da crise econômica e ética na qual se encontra.

Longe de dividir, confrontar ou nos colocar em lados opostos, essas prévias devem mostrar nosso potencial para mudar o que não está bom, como já demonstramos que sabemos fazer em outros momentos.

É certo que enfrentamos dias difíceis ao longo de 2017. Por muito pouco não sucumbimos ao racha que enredou o país na era petista. Foi preciso serenidade para colocar o partido de volta nos trilhos.

O resultado disso foi a eleição consensual do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, à presidência nacional do PSDB. Mais uma vez precisamos dessa serenidade para encontrarmos juntos o candidato que melhor poderá nos representar na eleição presidencial de outubro.

Debater, em vez de discutir. Propor, em vez de impor. Uma disputa interna não pode ser desculpa para voltarmos a nos atacar. Pelo contrário, exige respeito ao adversário e mostra que democracia é algo que se aprende em casa.

Perto de comemorarmos os 20 anos de criação do PSDB-Mulher, podemos dizer que conquistamos nosso espaço, dentro e fora do partido. Aliás, minha meta como presidente nacional do PSDB-Mulher é intensificar esse processo.

Nas últimas eleições municipais ajudamos o PSDB a se consagrar como a legenda que mais cresceu. Fomos responsáveis pela eleição de pelo menos 10% das prefeituras de médio porte conquistadas pelo partido em 2016. Elegemos 80 prefeitas e 706 vereadoras.

Paulo Delgado*: Enquanto agonizo

- O Estado de S.Paulo

O que ‘o líder’ quer é fugir da responsabilidade confinado na condição de perseguido

Ele se amontoa sobre o país. Hiperrealiza seus desejos, usa aliados como escória. Sem álibi, mandou o genro do compadre desqualificar a acusação, e deu errado. Segue trabalhando mal o luto. Um voo tão alto, uma queda tão grande. Revelou-se político de comodidade, tirou vantagem da desonestidade e alega princípios para abafar inconveniências. Chegou ao limite de querer aproveitar da própria decadência.

Um grupo e ele saem do Fórum seguindo na direção do passeio. Embora vários do cortejo sejam mais altos e estejam à frente dele, qualquer pessoa que os observe do outro lado da rua pode ver a cabeça dele ultrapassando por uma cabeça a dos seus apoiadores. Não é perspectiva, é subalternidade. Lembra livro de Willian Faulkner, Enquanto Agonizo, onde um pai brutal impõe a todos um enterro sem fim, não deixando a vida de ninguém fluir sem ter de pensar no seu egoísmo doentio.

A calçada, esturricada pelos pisões do povo e pedras soltas, segue reta como um fio de prumo até o pé do avião emprestado onde ele os deixará, indiferente aos terrenos resvalantes que o levaram a escorregar. Antes de embarcar, mirando o dilúvio, determina: meu reino por minha vitimização, façam ferver o coração, vai ser longa a condolência. Preparem o caixão e, se der certo, enterrem, com a toga preta do Supremo, o princípio da igualdade de todos perante a lei.

Míriam Leitão: Novo ritmo na Lava-Jato

- O Globo

Força-tarefa entrará em ritmo mais forte a partir do fim deste mês e do início de março. A Lava-Jato vai entrar no final de fevereiro ou começo de março num ritmo mais forte. Quem diz é quem acompanha as investigações. Há vários motivos para isso, que vão da maneira como a Polícia Federal distribuiu o trabalho no fim do ano até o amadurecimento de investigações que vinham sendo feitas. As operações, que ficaram escassas nos últimos meses, devem ser retomadas neste pós-carnaval.

A Polícia Federal é polícia judiciária, e quando o Judiciário está em recesso, normalmente a atividade é menor. Além disso, é polícia de imigração e no fim do ano há um aumento de atividade nos aeroportos, e esse trabalho precisa ser reforçado. Passado o carnaval, há uma elevação natural do ritmo em outras atividades. É o que acontecerá a partir das próximas semanas.

O diretor-geral da PF, Fernando Segovia, agora está no meio de uma crise, após as declarações sobre o inquérito do presidente Temer. E isso, de uma forma ou de outra, terá que ser resolvido nos próximos dias. Desde a sua chegada no cargo, no entanto, ele fortaleceu a Lava-Jato, enviando mais quinze funcionários para Curitiba, aumentando em 30 pessoas o efetivo do Rio e dobrando o número de investigadores no GINQ, o Grupo de Inquérito que acompanha os processos que correm no STF. Havia investigações bem adiantadas precisando apenas de peritos, e eles foram enviados para esses três pontos, onde a Lava-Jato tem mais atividade.

Rosângela Bittar: Nem Lula nem Trump

- Valor Econômico

Embora não lhe renda estima, a ação foi presidencial

O presidente Michel Temer interrompeu o descanso de Carnaval na Restinga da Marambaia para enfrentar um problema de sua única competência: o afluxo de refugiados venezuelanos a Roraima, onde já são quase uma população de uma cidade média, cerca de 40 mil novos habitantes de rua.

A situação encaminhava-se para o caos, com a população local começando a reagir à concorrência na disputa por empregos, quando o tirocínio político entrou em ação.

Temer seguiu orientação da diplomacia, dos militares e do Ministério da Justiça, responsáveis pela segurança de fronteira e pelas relações do Brasil com os governos estrangeiros e teve o bom senso de não contrariar a avaliação política e técnica de funcionários dessas áreas, nem perder o senso humanitário.

Evitou o método truculento de Donald Trump, que certamente ergueria logo um muro para conter a migração, e a leniência de Lula nas concessões às imposições de Hugo Chávez, primeiro, e depois de Nicolás Maduro, que fizeram do governo brasileiro nos últimos 13 anos a sua extensão.

Desde fins de novembro o Itamaraty vinha se preparando para uma atuação mais firme na fronteira com a Venezuela e, sobretudo, formulando política mais ampla para suas relações com refugiados e ações consulares de risco.

Assim, foi possível, quando se viu que a situação só piorava e não convinha deixar passar os feriados sem reação, ter um plano mínimo que inclui, entre outras medidas, a criação de uma força-tarefa para tratar da crise migratória dos venezuelanos.

Ranier Bragon: O Carnaval e o monstro

- Folha de S. Paulo

Iria começar esta coluna dizendo que o Brasil produziu mais uma jabuticaba, o incrível caso do prefeito que durante a maior festa de sua cidade se manda para o exterior. Acabo de saber, porém, que tem pé de jabuticaba em outros países, o que me força a, em lamento, admitir que o mundo das metáforas nunca mais será o mesmo.

Marcelo Crivella (PRB) pelo menos deixou de acompanhar de perto os arrastões na zona sul e a malhação da classe política nos desfiles na Marquês de Sapucaí.

Um Michel Temer vampirão na Paraíso do Tuiuti e um Crivella-Judas na Mangueira à parte, ninguém foi mais contundente na crítica a políticos corruptos, às mazelas sociais e a intolerantes de toda ordem do que a Beija-Flor, a última a desfilar.

Um dos carros alegóricos era uma gorda ratazana conduzindo em suas costas o Congresso e a Petrobras, sede do maior escândalo da República.

Até aí nada de mais, visto que o clamor anticorrupção é um discurso tão fácil quanto o da paz mundial.

Vera Magalhães: Pós-Cinzas

- O Estado de S.Paulo

Com o fim do carnaval, Luciano Huck começará, aos poucos, a colocar na rua o bloco da pré-campanha presidencial. O apresentador de TV aproveitou a folia para manter conversas com o estafe com o qual pretende contar quando tornar públicas suas intenções políticas. Por ora, vai construindo um time responsável pela logística financeira, condição essencial para dar a largada em qualquer projeto.

Além do padrasto, Andrea Calabi, Huck conta, nessa seara, com o empresário Eduardo Mufarej, presidente da Somos Educação e sócio do grupo Tarpon Investimentos, além de cabeça do movimento Renova BR, que assumiu a missão de tesoureiro provisório – função que deve replicar caso a campanha seja oficializada. Além dele, engrossa o time organizacional o economista Fuad Noman, que atuou nas equipes de Aécio Neves e Antonio Anastasia, atualmente secretário do prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, e amigo de Calabi.

Huck deve fazer reuniões nos próximos dias com especialistas em marketing político e pesquisas qualitativas. Enquanto perscruta o terreno, adota o discurso público – apresentado, por exemplo, ao Tribunal Superior Eleitoral – de que não é candidato a nada.

Quando colocar a cabeça para fora, o fará com o discurso de que é preciso construir um caminho para o País para além da polarização entre partidários radicais de Lula e de Jair Bolsonaro – não por acaso, Fernando Henrique Cardoso, um de seus principais interlocutores, disse que o Brasil precisa de “construtores”.

Dirá que, caso seja candidato e se eleja, pretende governar com “os melhores” de cada denominação política. Aliados do apresentador dizem que ele tem, inclusive, bom canal com o PT, por intermédio do ex-prefeito paulistano Fernando Haddad – consultado ontem pela coluna, o petista negou contato recente com Huck e disse que a última vez em que estiveram juntos foi em um almoço quando ainda era prefeito.

Também costuma fazer elogios ao projeto de educação do ex-governador do Ceará Cid Gomes, irmão de um possível adversário caso leve adiante a candidatura, o também ex-ministro Ciro Gomes (PDT). No PPS, provável porto do neófito na política, além de Roberto Freire e Raul Jungmann tem sido um ator importante o relator da reforma da Previdência, Arthur Maia, que conversa regularmente com Huck sobre seu projeto presidencial.

Por fim, a Globo já recebeu sinais de que seu empregado pode deixar o time para trilhar novos caminhos, e a família, antes reticente ao projeto, já aceita a ideia com mais naturalidade.

Monica de Bolle: Fragmentação e ajuste

- O Estado de S.Paulo

O interregno Temer afastou por dois anos o espectro do descalabro fiscal, mas nada fez para eliminá-lo

Aqui em Washington começa a despontar algum interesse sobre as eleições brasileiras. Nas últimas semanas foram vários os eventos em que participei pela cidade onde acadêmicos, integrantes do governo americano e membros do setor privado têm se reunido para refletir sobre os cenários e suas implicações. Pouco se estranha que as atenções estejam majoritariamente concentradas em mapear os presidenciáveis e as chances de cada um. Tampouco surpreende que muitos dos participantes desses seminários acreditem que, apesar da imprevisibilidade, há chance de que algum candidato favorável às reformas consiga chegar ao segundo turno, ecoando o otimismo cauteloso que hoje caracteriza muitas análises do Brasil produzidas no Brasil. Mas é quarta-feira de cinzas. Acabou nosso carnaval. Ninguém ouve cantar canções. Portanto, é necessário pensar sobre os custos econômicos crescentes da fragmentação política.

Muito se fala sobre os presidenciáveis, pouco se reflete sobre o Congresso. Como bem sabem os cientistas políticos – brasileiros ou não –, tem o País o poder legislativo mais fragmentado da América Latina. Usando métricas como os índices que medem o número efetivo de partidos, isto é, medidas que ponderam o número de partidos no Congresso por seu peso, seja por número de assentos ou poder de voto, o Brasil é absolutamente fora de padrão. Em 2014, quando das últimas eleições gerais, exibia o País índice de fragmentação política cerca de 4 vezes maior do que a média da região. A tendência da fragmentação política brasileira também assusta: somente entre 2010 e 2014, a fragmentação aumentou ao redor de 30%; entre 2002 e 2014, os índices de fragmentação revelam aumento de quase 50%. Diante da notável polarização do País revelada nas pesquisas de opinião e na boca do povo que hoje ocupa as redes sociais, as chances de que vejamos novo salto na fragmentação legislativa em 2018 são enormes.

Ricardo Noblat: O que faltou no carnaval do protesto

- Blog do Noblat

Perda total

Curioso! No carnaval do protesto, como ficará conhecido o deste ano, faltou o “Fica, Lula”. Ou o “Volta, Dilma”. Ou ainda o “Foi golpe!”.

Por que será que faltou se havia tanta gente disponível nas ruas e se defender Lula e Dilma, e denunciar o golpe do impeachment, seria uma forma legítima de protesto?

Aqui e ali, alguém defendeu Lula, Dilma não. Em Copacabana, cerca de mil pessoas cantaram o Lula-lá. Menos de duzentas fizeram o mesmo em um bloco de Olinda, e ficou mais ou menos por aí.

Sim, em Salvador, Lu Santana cantou “Vai dá PT”. E logo a senadora Gleisi Hofmman, presidente do PT, apressou-se em dizer que a música era uma homenagem à maneira como seu partido governa a Bahia.

Enganou-se. “Vai dar PT” significa: vai dar perda total. E fala de uma moça de 18 anos que bebeu todas.

Lula foi condenado uma vez e faltou gente na rua para defendê-lo. Foi condenado a segunda vez e também faltou. O carnaval passou. A ver o que acontecerá se ele for preso.

Almir Pazzianotto Pinto: Quem é Luciano Huck?

- Diário do Poder

Eu não sei quem é Luciano Huck. O senhor ou a senhora sabem?

A pergunta é pertinente porque, no vácuo de lideranças que atraiam a confiança de milhões de eleitores, abre-se espaço para que surjam nomes improvisados, politicamente desconhecidos, que se julgam preparados para os desafios da presidência. Sei que é animador de auditórios, mas desconheço as aptidões políticas que se lhe procuram atribuir.

Eleger o presidente da República, no sistema presidencialista, é ato de extrema responsabilidade. Ao presidente a Constituição (CR) confere competências privativas excepcionais como nomear e exonerar os Ministros de Estado; exercer a direção superior da administração federal; sancionar, promulgar e fazer publicar as leis; expedir decretos e regulamentos; vetar projetos de lei total ou parcialmente; dispor, mediante decreto, sobre a organização e o funcionamento da administração federal; manter relações diplomáticas com países estrangeiros; decretar o estado de defesa e o estado sítio; conceder indultos e comutar penas; exercer o comando supremo das Forças Armadas; nomear ministros do Tribunal de Contas da União, dos Tribunais Superiores e do Supremo Tribunal Federal; designar o presidente do Banco do Brasil, da Petrobrás, da Caixa Econômica Federal, do Banco Central, dos Correios (Art. 84). Como máximo líder político é responsável pelas articulações com o Poder Legislativo e deve conservar-se atento às decisões e tendências do Poder Judiciário. Não se isolará no palácio cercado de áulicos e de mordomias. Manterá contato direto com a população, para ascultá-la e saber das suas necessidades.

Ao presidente a Constituição concede o direito de enviar ao Congresso proposta de emenda constitucional; de apresentar projeto de lei complementar ou ordinária e, em caso de relevância e urgência, baixar medida provisória. Pertence-lhe a iniciativa da lei sobre o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e os orçamentos anuais. Recai em cima dele o peso de milhões de desempregados, subempregados, pobres, doentes, famintos, e vítimas da violência (CR, arts. 60, 61, 62).

Robinson Borges: Sons de tristeza social

- Valor Econômico

O déficit brasileiro atingiu 6,2 milhões de domicílios

Anton Tchékhov (1860-1904), um dos grandes nomes da literatura russa, era um homem atormentado por dúvidas, mas seus biógrafos revelam que ele tinha pelo menos uma certeza: a aversão a certos privilégios de sua época. O ócio, por exemplo, era considerado pelo escritor um aspecto negativo da Rússia czarista. Em sua visão, significava que para desfrutarem do benefício do "dolce far niente", as pessoas exploravam e oprimiam. Ou seja, para compensar o descanso de uma certa elite, alguém era obrigado a trabalhar muito mais.

No conto "A Noiva", o autor de "O Jardim das Cerejeiras" defende o seu ponto de vista quando um personagem diz a uma moça de nome Nádia o trecho a seguir: "Entenda, você e sua mãe não fazem nada, isso significa que outros trabalham para vocês, que você explora a vida do seu próximo em seu favor, e que isso não seria correto, não é injusto?"

Os clássicos são clássicos pela perenidade de suas ideias, e Tchékhov faz parte da boa bibliografia para lidar com as questões contemporâneas. Ao longo do tempo, o status do ócio mudou e sua boa reputação é devida a Domenico de Masi, que cunhou o termo ócio criativo, uma proposta inovadora de discutir o trabalho. A atualidade do escritor russo, na verdade, está na lógica elementar de que a conta de um benefício é sempre paga por alguém.

No caso da delicada condição fiscal no Brasil, essa questão não é marginal. Os benefícios obtidos com dinheiro público precisam, no quadro de ajuste que se impõe, ser amplamente discutidos pela sociedade. Os números são eloquentes: em 2017, o déficit do governo central ficou em R$ 118,4 bilhões. Diante desse cenário de cobertor curto, o poder público deve decidir os escolhidos e os perdedores, como disse o economista Luiz Guilherme Schymura, diretor do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre-FGV), em entrevista ao Valor.

Defesa corporativista: Editorial/O Globo

Proteção ajuda corruptos, mas há boa proposta no STF à espera do fim de um julgamento

A prerrogativa de autoridades dos três poderes serem julgadas em instâncias especiais — presidente, ministros, deputados e senadores pelo Supremo, por exemplo — tem uma fundamentação. Por ocuparem cargos que envolvem interesses políticos, tirá-los de instâncias inferiores os protegem de ações movidas por má-fé.

À medida, porém, que o enfrentamento da corrupção se ampliou, a começar pelo mensalão do PT e principalmente no petrolão, esmiuçado até hoje pela Lava-Jato, o foro se revelou um dispositivo frágil. Até conveniente para corruptos.

É emblemático que, quando a Lava-Jato começou a cercar o ex-presidente Lula, a presidente Dilma Rousseff tenha sido flagrada acertando a nomeação dele para a Casa Civil, com o objetivo de dar-lhe a proteção do foro especial, a fim de livrálo da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba, parte da Lava-Jato e onde atua Sergio Moro. Lula e tantos outros querem fugir desta jurisdição, devido à tramitação dos processos sem entraves e pelo devido e correto rigor das sentenças. Os desdobramentos desde março de 2014, quando a operação foi lançada, deram razão a Lula e a Dilma.

O desafio da tecnologia: Editorial/O Estado de S. Paulo

Mais da metade dos setores industriais está tão atrasada com relação à adoção de tecnologias digitais – responsáveis por um enorme salto de produtividade e competitividade do setor manufatureiro no resto do mundo – que, se nada fizer para mudar o quadro com presteza, acabará excluída da que vem sendo chamada de quarta revolução industrial. Perderá não apenas o mercado internacional, que sempre lhe foi difícil de conquistar e manter, mas até o doméstico. Sua sobrevivência está condicionada à sua capacidade de ganhar competitividade, por meio de inovação e novas tecnologias, o que exige investimentos e capacidade gerencial.

Este é o quadro sobre o estado de boa parte da indústria brasileira traçado pela própria entidade representativa do setor, a Confederação Nacional da Indústria (CNI), em seu mais recente documento sobre o tema, Oportunidades para Indústria 4.0: aspectos da demanda e oferta no Brasil, cujas principais conclusões foram mostradas em reportagem do Estado. O que vem sendo chamado de Indústria 4.0 é o emprego do conjunto de recursos propiciados por tecnologias de robótica, inteligência artificial e outros, que vem possibilitando grandes ganhos de produtividade e de competitividade em todo o mundo.

Venezuela exporta crise humanitária para vizinhos: Editorial/Valor Econômico

O caos econômico na Venezuela espalha uma migração em massa para os países vizinhos. Em dois anos, 1,2 milhão de cidadãos deixaram o país e muitos mais estão a caminho. A Colômbia tinha 550 mil venezuelanos em seu território no fim de 2017 e 50 mil chegaram este ano. No Brasil, 40 mil deles aguardam autorização para permanecer no Brasil, esparramados em condições mais que precárias em Boa Vista, Roraima. Outros 200 mil fugiram para o Equador. A ruína provocada pelo governo de Nicolás Maduro engendra problemas sociais nos vizinhos, alimenta reações violentas anti-imigração no Brasil e coloca para países que já não garantem sequer bem estar a sua população pobre uma pressão adicional sobre recursos escassos.

Mesmo com as maiores reservas de petróleo do mundo, os chavistas levaram o país a uma ruína inédita. Se confirmadas as previsões do Fundo Monetário para 2018, o PIB venezuelano cairá mais 10%, completando um encolhimento de 48% em cinco anos, uma cifra espantosa para nações que não estão em guerra civil e dificilmente superável até mesmo para os que estão. Uma recessão dessas proporções, pela redução da renda, provocaria queda abissal do consumo. Mas no país de Maduro, que há anos raciona dólares e já não produz quase nada, as importações desabaram.

Ordem e folia: Editorial/Folha de S. Paulo

Sucesso do Carnaval de São Paulo demanda aprendizado

As imagens falam por si mesmas. Apesar de seguida —e previsível— militância nas redes sociais, não prevaleceu a tentativa de agourar um fracasso no Carnaval paulistano, supostamente tributário do viés "antipopular" (leia-se não petista) da prefeitura.

Habitualmente tomada por fileiras quilométricas de automóveis, a avenida 23 de Maio deu lugar a cortejos de milhares de pessoas. Em intensidade que cresce ano a ano, os blocos de rua fazem com que o Carnaval de São Paulo rivalize hoje com os de cidades proverbialmente identificadas com a data, como Rio, Salvador ou Recife.

De alguma forma, é como se a capital paulista se integrasse mais à imagem que, para bem ou para mal, está associada ao Brasil.

Para bem, naturalmente, fica a ideia de uma população descontraída, dionisíaca, fusional. Do lado oposto, parece estar o clássico esquecimento dos próprios problemas, que exigem compenetração e empenho público.

Temer ainda acredita que pode conseguir a reeleição

Por Raymundo Costa | Valor Econômico

BRASÍLIA - Num cenário em que ninguém se destaca quando o nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é retirado das pesquisas, o Palácio do Planalto voltou a jogar suas fichas na reeleição. "Todo mundo é índio", diz um assessor presidencial referindo-se às pesquisas posteriores à condenação de Lula em segunda instância, o que praticamente o retira da disputa eleitoral de 2018. Temer tem apenas 1% das intenções de voto.

Nos arredores do Palácio Jaburu, residência oficial do presidente, ninguém duvida de que Temer seja "candidatíssimo". No governo, afirma-se que Temer foi vítima de uma campanha de destruição moral que lhe atribuiu a pecha de corrupto. Esta seria a razão principal de sua baixíssima popularidade. Ele precisaria, portanto, apagar ou pelo menos atenuar a mancha da corrupção.

Esse é o objetivo da ofensiva desencadeada por Temer, que considera ter um bom portfólio para mostrar na economia. Alguns de seus conselheiros, porém, observam que a queda dos juros e a inflação em baixa não são suficientes para melhorar a popularidade do presidente, porque a questão moral puxa os índices de opinião para baixo.

Além disso, os bons resultados econômicos ainda não foram efetivamente sentidos pelas classes C, D e E. Não foi por acaso que o governo pediu ao Cade que investigue a formação de cartel no varejo da gasolina, diesel e gás de cozinha.

O plano de voo de Temer para tentar a reeleição é conhecido de seu partido, mas o PMDB voltou a ser MDB e manteve hábitos antigos: está na canoa de Temer, mas considera outras opções. No limite, pode até ter um candidato próprio e liberar as seções locais para apoiar quem for mais conveniente para cada diretório. Em 2002, por exemplo, o PMDB fez coligação com o PSDB, mas os favoritos nos Estados acabaram mesmo nos braços de Lula. Inclusive o ex-presidente José Sarney, hoje um dos principais conselheiros do presidente da República.

Para Doria, PSDB pode ficar fora do 2º turno

Por Cristian Klein | Valor Econômico

RIO - O prefeito de São Paulo, João Doria, afirmou que, se a pré-candidatura do governador Geraldo Alckmin não forjar uma ampla aliança na eleição ao Planalto, o PSDB corre o risco de ficar fora do segundo turno, mesmo sem a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na disputa.

Em visita a dois camarotes no Sambódromo, no segundo dia de desfiles de escolas de samba no Rio, Doria disse que a coalizão é "fundamental" e que se "um candidato de centro não for capaz de aglutinar forças partidárias de outras legendas importantes o PSDB e esse candidato não irão para o segundo turno".

Doria alertou que é "preciso respeitar também a força que terá Lula mesmo com o agravamento da pena". O ex-presidente, condenado em segunda instância, poderá ficar fora da eleição por causa da Lei da Ficha Limpa. "O Lula manterá sua candidatura até quando for possível. Quando não for, ele terá um preposto. Vai se vitimizar e dizer que votar naquele preposto é como votar nele. O Lula é muito esperto, muito hábil no uso das palavras. Mente com uma formidável categoria. Ainda que não seja o Lula, o candidato do PT pode [chegar ao segundo turno]. [Com] o Bolsonaro também é preciso ter respeito."

Sem Lula, o nome do PT mais cotado para substituí-lo é o do ex-ministro e ex-governador da Bahia, Jaques Wagner, que tem 2% das preferências segundo a última pesquisa do instituto Datafolha.

Doria minimizou a importância dos levantamentos eleitorais a oito meses da disputa, o desempenho de Alckmin aquém do esperado e a simpatia do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, presidente de honra do PSDB, pelo lançamento da candidatura do apresentador de TV Luciano Huck.

"Não creio que o ex-presidente Fernando Henrique insista no nome do Luciano Huck. Ele manifesta seu carinho pelo Luciano Huck e fala da importância e do desejo de renovação na política. Ninguém está em desacordo com isso, nem o governador Geraldo Alckmin", disse. A aproximação e as declarações de FHC sobre Huck, no entanto, irritaram o entorno de Alckmin, que está com dificuldade de reunir aliados para uma ampla coligação.

Maia fecha porta para Huck

Cotado para o Planalto, presidente da Câmara elogia apresentador, mas diz que ele não faz parte do projeto da legenda

Roberta Pennafort / O Estado de S. Paulo.

RIO - O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, negou ontem a possibilidade de o apresentador Luciano Huck se candidatar à Presidência pelo DEM.

Na Sapucaí, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), negou ontem a possibilidade de o apresentador Luciano Huck sair candidato à Presidência da República por seu partido. Huck já descartou que vá se candidatar, mas estaria mantendo conversas com políticos sobre o processo de 2018 ainda assim.

“O DEM vai ter candidato a presidente, e o pré-candidato vai ser lançado em março. Temos o maior carinho pelo Luciano, mas nesse momento ele não faz parte do projeto do nosso partido. Vamos ter entre dez e 12 candidatos nos Estados e no início de março vai ficar claro que o partido vai seguir seu próprio caminho”, afirmou.

Cotado como possível candidato do DEM, Maia disse na semana passada que a “avenida está aberta” para todos os políticos que pretendem concorrer ao Palácio do Planalto, inclusive para ele. O presidente da Câmara confirmou que encomendou pesquisa para avaliar o cenário.

TSE autoriza candidatos a bancar inteiramente suas campanhas

Resolução, que ainda pode ser alterada, dá vantagem aos mais ricos nas disputas

- O Globo

-BRASÍLIA -Uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), publicada no início deste mês, permite que candidatos nas eleições deste ano financiem suas campanhas inteiramente com recursos próprios, o que favorece os mais ricos. As resoluções do TSE com as regras das eleições de 2018 ainda poderão sofrer ajustes até 5 de março.

O texto diz que “o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o limite de gastos estabelecido para o cargo ao qual concorrer”.

No ano passado, o autofinanciamento criou discordância entre o Congresso e o Palácio do Planalto. A reforma política aprovada em outubro previa um limite de 10% do rendimento bruto auferido pelo doador, no ano anterior à eleição, para as doações de candidatos às suas próprias campanhas. Em outubro, o presidente Michel Temer vetou o trecho. Dois meses depois, o Congresso derrubou a medida. No entanto, a ação dos parlamentares ocorreu fora do prazo de um ano antes das eleições para alterações nas regras da disputa.

Em novembro, antes da derrubada do veto presidencial, a Rede e o PSB questionaram no Supremo Tribunal Federal (STF), em ações diferentes, a falta de limite para o autofinanciamento. Os processos são relatados pelo ministro Dias Toffoli e ainda aguardam julgamento. Enquanto não ocorrem, vale a resolução do TSE publicada no início do mês.

Vinicius de Moraes: Soneto de quarta-feira de cinzas

Por seres quem me foste, grave e pura
Em tão doce surpresa conquistada
Por seres uma branca criatura
De uma brancura de manhã raiada

Por seres de uma rara formosura
Malgrado a vida dura e atormentada
Por seres mais que a simples aventura
E menos que a constante namorada

Porque te vi nascer de mim sozinha
Como a noturna flor desabrochada
A uma fala de amor, talvez perjura

Por não te possuir, tendo-te minha
Por só quereres tudo, e eu dar-te nada
Hei de lembrar-te sempre com ternura.