sábado, 8 de setembro de 2018

Opinião do dia: Roberto Freire

É lamentável que tenha ocorrido. Isso talvez seja um sinal do nível de agressividade que tanto ele próprio e seus seguidores quanto Lula, com a criação do nós contra eles. Esse clima evidentemente tem que ser superado e temos que repelir todo e qualquer tipo de atentado. Não importa contra quem seja. Isso não ajuda o processo democrático brasileiro. É preciso ficar claro. Esse clima do nós contra eles achando que tem que utilizar a raiva não nos leva a um bom caminho,

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Roberto Freire é presidente nacional do PPS, em 6/9/2018

Marco Aurélio Nogueira: Ferimentos radicais

- O Estado de S. Paulo

Sangue, fúria e ódio mal calibrados espirram na vida coletiva, afetam a todos nós, ferem a democracia.

Pouco importa que o criminoso tenha dito que agiu a mando de Deus e demonstrado indícios claros de perturbação mental. A vida é feita de intenções e efeitos não intencionais, de razões e desdobramentos. Todo ato é uma coisa em si, pode não chegar a ser um ato para si, mas sempre pode repercutir. Em política, isso é ainda mais forte.

A facada foi em Bolsonaro, assim como meses atrás o alvo havia sido Marielle e um ônibus do PT. Sangue, fúria e ódio mal calibrados, que espirram na vida coletiva, afetam a todos nós, ferem a democracia.

Nenhuma disputa política tem chances de ganhar com a eliminação física dos adversários. Especialmente em condições democráticas, onde a “guerra” se faz de outro modo. A política precisa se afirmar não como poder, mas como convite ao diálogo, à moderação, à mediação do que é diverso e plural.

Tudo isso é mais que sabido, mas de tempos em tempos os atores perdem a memória. Numa sociedade em cujo DNA a democracia entrou tardiamente e de forma seletiva, mais como sistema do que como valor, são muitos os que não conseguem entender aquilo que é procedimento obrigatório, exigência, custo, “sacrifício”: ninguém está autorizado a se afirmar pela força, contra a vontade da maioria, por baixo de leis e instituições construídas coletivamente.

Não há nem sequer a possibilidade de que se diga, para justificar o fanatismo, o exagero, a agitação pueril, que leis e instituições foram impostas por oligarquias e classes dominantes, pelo Estado do capital ou qualquer outra baboseira do tipo. A esquerda que assim procede – seja a política, seja a intelectual – parou no tempo, contribui pouquíssimo para que a sociedade assimile os tempos complexos da política e da luta política, os desafios da democracia, entre os quais está a capacidade de tolerar e respeitar os que pensam de forma diferente ou estão em outros campos políticos e ideológicos. A extrema-direita que assim pensa – sim, ela também – nos empurra para trás com suas grosserias e agressões, seu fundamentalismo tosco e retrógrado.

João Domingos: A paz necessária

- O Estado de S.Paulo

A maioria do eleitorado aguarda por ideias que possam representar um mundo melhor

Que o atentado a Jair Bolsonaro (PSL) terá consequências na campanha presidencial e na eleição do próximo presidente, disso não restam dúvidas. Tanto é que todos os candidatos suspenderam suas atividades um dia depois de o deputado federal tomar a facada, em Juiz de Fora, ser internado e socorrido na mesma cidade, e transferido para o Hospital Albert Einstein, em São Paulo, na sexta-feira, quando se comemorou a Independência do País. Mas o que se pergunta, hoje, é: quais consequências, quem perderá votos com o episódio e quem ganhará?

Algumas hipóteses devem ser consideradas. A primeira, é que passada a comoção do ataque que vitimou Bolsonaro, os candidatos aumentem os apelos contrários à violência e à radicalização do processo político, com maior humanização da campanha. Podem, assim, fazer uma tentativa de neutralizar uma das principais bandeiras de Bolsonaro, que é a defesa do porte de armas de fogo. Bandeira essa que tem capturado o voto de uma parcela considerável da população.

É possível também que o atentado fortaleça ainda mais a ideia de uma polarização entre Bolsonaro e o PT. “Bolsonaro poderia se apresentar como o único nome que pode botar ordem no País; o candidato petista, que é o único capaz de retomar a busca do Estado do Bem Estar Social”, diz o analista político Antonio Augusto de Queiroz, diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), que acompanhou a Constituinte, todas as eleições da redemocratização para cá e vive o dia a dia do Congresso e dos partidos políticos.

Merval Pereira: Todos se reposicionarão

- O Globo

É certo que os ataques ao Bolsonaro vítima de um atentado deverão ser amenizados
por seus adversários

Ficou famosa a frase de Lula pouco antes de ser preso: “Se me prenderem, viro herói, se me matarem, viro mártir, se me deixarem solto, viro presidente”. Da mesma forma, um dos filhos de Bolsonaro, o candidato a senador pelo Rio Flávio Bolsonaro, disse logo depois do atentado: “Acabaram de eleger meu pai”.

Lula virou herói, mas dificilmente será presidente da República novamente, pelo menos nesta eleição. Não se sabe se Bolsonaro, preso à cama de um hospital nos próximos dez dias pelo menos, e em repouso forçado até o fim do primeiro turno, se elegerá presidente.

Mas o fato é que a campanha presidencial, que se assemelhava à de 1989 com uma forte polarização entre esquerda e direita e vários candidatos em disputa renhida, transformou-se em caso único no país, com os principais candidatos afastados da campanha, um por estar preso por corrupção e lavagem de dinheiro, outro por estar fora de ação devido a um atentado. É completamente diferente também do que aconteceu em 2014, quando o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, morreu em desastre de avião e foi substituído por sua vice, Marina Silva.

A comoção provocada pelas duas tragédias provavelmente afetará o resultado desta campanha de maneira diferente. Marina Silva, que havia feito uma jogada política inesperada e surpreendente desistindo de sua candidatura a presidente e aderindo a Campos como sua vice, teve um impulso nas pesquisas de opinião ao assumir seu lugar na corrida presidencial, mas trazia consigo uma lembrança eleitoral de quem já tivera 20 milhões de votos na eleição anterior, em 2010.

A substituição do candidato do PSB marcou sua eleição, mas os efeitos políticos da tragédia se refletiram mais localmente em Pernambuco. Já o caso de Bolsonaro é diferente. Ele, para uma grande massa de eleitores, representa a rejeição à política tradicional, embora seja um parlamentar antigo e sem grandes feitos ao longo de seus vários mandatos de deputado federal. Como deputado, era um candidato de nicho de militares, e transformou-se, devido à desesperança de muitos, em candidato nacional e símbolo da solução das graves crises do país.

Míriam Leitão: Eleição líquida e voto volante

- O Globo

Dúvida é se Bolsonaro se apresentará como uma vítima vingadora, ou se haverá mudança de tom para atrair os eleitores mais ao centro

O ambiente é absolutamente fluído, e as consequências do atentado a Jair Bolsonaro podem ter os mais variados desdobramentos. Um mês antes das eleições, o tempo é líquido no Brasil. A situação do candidato do PSL antes de ir para Juiz de Fora era a de quem liderava a eleição sem Lula, mas havia tido um aumento da rejeição e perdia no segundo turno para Ciro, Marina e Alckmin. Agora, tudo dependerá dos próximos movimentos de cada um dos atores desta campanha.

Na segunda-feira, o Datafolha poderá mostrar a reação no eleitorado nas primeiras horas do atentado. A pesquisa é preciosa como um instantâneo. Na terça-feira, o PT anunciará sua chapa. O que o candidato oficial a vice, Fernando Haddad, disse na Globonews, respondendo a Merval Pereira, foi que ele pode ser vice do Lula, mas de nenhum outro. O que ficou implícito é que se for vencedora no PT outra corrente que não a que tem sustentado o ex-prefeito de São Paulo, seja consagrando Gleisi Hoffmann, seja Jaques Wagner, a vice será a ex-deputada Manuela D’ávila, do PCdoB.

A decisão das principais campanhas de suspender as atividades foi importante para evitar qualquer palavra impensada. A um mês das eleições, a dúvida do eleitor é elevada, e foi isso que a pesquisa Ibope mostrou. Num quadro desses, qualquer fator interveniente produz efeitos encadeados e incertos, aumentando ainda mais a imprevisibilidade.

Na pesquisa do Ibope, parte dos eleitores de Lula se dispersou de forma fragmentada, indo para Ciro, Haddad e até Bolsonaro. Os eleitores volantes nunca foram tantos e tão determinantes como nesta eleição. Nas simulações de segundo turno, Jair Bolsonaro perderia para Ciro, Marina e Alckmin, mas o percentual dos que votariam em branco ou nulo e dos que não souberam responder ficou em 23%, na hipótese com Ciro e com Marina, e 27%, quando o oponente de Bolsonaro é Alckmin ou Haddad. O representante do PT é o único que aparece empatado com Bolsonaro, mas ele ainda não é oficialmente o candidato e não teve tempo de exposição oficial.

Pablo Ortellado: Pode consolidar ciclo de violência

- Folha de S. Paulo

O que mais preocupa no atentado contra Jair Bolsonaro é a possibilidade de o episódio consolidar no país um ciclo de violência política. Nos últimos anos, temos visto seguidos episódios de violência ameaçarem o funcionamento regular da democracia brasileira. Esse funcionamento “regular” nunca foi desprovido de violência política, mas ela parecia restrita ao interior do país, ao chamado Brasil profundo.

Em 2007, a jornalista Natália Viana mapeou os assassinatos políticos no livro “Plantados no chão” (Ed. Conrad), que mostrava que o fim da ditadura não tinha posto fim à violência política, sobretudo no campo. Foi também no Brasil profundo onde aconteceu a maior parte dos assassinatos de jornalistas compilados nos relatórios anuais da ONG “Repórteres sem fronteiras”. Pois é esse padrão de violência política circunscrita a regiões afastadas que parece ter mudado.

Desde o início do processo de polarização, vimos suceder casos de violência política cada vez mais graves nas grandes cidades: vários atentados a bomba contra sedes do PT em São Paulo e Curitiba, a agressão a um empresário antipetista em frente ao Instituto Lula, os tiros disparados contra a caravana do ex-presidente Lula no Paraná, os tiros disparados contra o acampamento pró-Lula em Curitiba, a agressão a jornalistas no sindicato dos metalúrgicos em São Bernardo e o assassinato de Marielle Franco, crime gravíssimo que ainda não foi esclarecido.

Leandro Narloch: Lunáticos também escrevem a história

- Folha de S. Paulo

A tentação sociológica é irresistível. Tendemos a engendrar uma explicação social para as manchetes do noticiário —uma narrativa segundo a qual um episódio é fruto de um traço ou tendência da sociedade brasileira. Mas a influência social não explica tudo —seu poder é muito menor do que professores de ciências humanas acreditam.

Em muitos casos, a biologia humana ou a medicina explicam mais. O homem que ejaculava em mulheres nos ônibus de São Paulo não é produto do machismo ou da “cultura de estupro”. Segundo a família, ele passou a ter aquele comportamento bizarro depois de sofrer um acidente de carro que danificou seu cérebro.

Da mesma forma, Adelio Bispo de Oliveira não esfaqueou Bolsonaro a mando do PSOL ou porque era de esquerda. É forçar a barra dizer que foi motivado pela descrença na democracia, pela tensão das redes sociais ou pela intolerância de socialistas mais raivosos.

O agressor de Bolsonaro é um lunático. Como o homem que atirou em Ronald Reagan em 1981 para ficar famoso, ou o fã que um ano antes matou John Lennon. Oliveira disse ter esfaqueado Bolsonaro a mando de Deus; lutava contra uma suposta conspiração da maçonaria. Segundo um parente, passava o dia sozinho num barracão da família.

Demétrio Magnoli: Existem três teses sobre legitimidade da eleição sem Lula

- Folha de S. Paulo

O veto legal à candidatura de Lula distingue a eleição de todas as anteriores

O veto legal à candidatura de Lula singulariza a eleição em curso, distinguindo-a de todas as anteriores, desde a redemocratização. Daí, emerge um debate sobre legitimidade, que se espraia ao longo de três teses. A primeira diz que a eleição é legal e legítima; a segunda, que é ilegítima; a terceira, e mais interessante, faz a legitimidade da eleição depender de seus resultados.

A visão convencional, adotada pela maioria dos partidos, não enxerga nenhum problema de legitimidade.

A Lei da Ficha Limpa, fonte do veto à candidatura de Lula, nasceu de um projeto de iniciativa popular e, depois de amplamente aprovada no Congresso, foi sancionada sem vetos pelo próprio Lula. É instrumento legal de validade geral, que cancelou as mais diversas candidaturas desde 2014, não uma ferramenta destinada a cassar os direitos de Lula ou do PT.

A eleição é legítima. O debate sobre o tema é que não é, derivando de um desejo de colocar Lula acima da lei ou de uma pervertida estratégia de campanha.

O segundo ponto de vista, adotado por correntes de extrema esquerda abrigadas no interior do PSOL ou em surpreendente aliança com o PT (caso do PCO), pode ser qualificado, com alguma ironia, de revolucionário. O veto a Lula é o prosseguimento do “golpe parlamentar” do impeachment e tem a finalidade de ladrilhar o caminho das “reformas neoliberais”. O Judiciário participa do “golpe”, conduzindo a perseguição legal ao ex-presidente. Os mensageiros desta tese repetem, letra por letra, a narrativa desenvolvida pelo PT desde 2016, mas com finalidades muito diferentes.

Ricardo Noblat: Como vai Lula

- Blog do Noblat | Veja

Vai mal
Desde que foi preso, apesar de os seus visitantes dizerem o contrário para efeito de propaganda, Lula convivia com três sentimentos: a raiva, o inconformismo e a esperança na libertação rápida e na candidatura a presidente.

A esperança se foi, embora ele saiba que o ministro Dias Toffoli, tão logo assuma a presidência do Supremo Tribunal Federal, tentará dar um jeito para soltá-lo a partir do início do próximo ano. Ou antes, se for possível.

Acentuou-se a inconformidade de Lula. Ele não cansa de repetir que venceria a eleição presidencial direto no primeiro turno.

Continua com raiva, muita raiva. Nem o PT escapa dela. Quase nada escapa.

Bolsonaro cresce
Efeito atentado
Sondagem eleitoral por telefone feita nas últimas 24 horas sob a encomenda de uma importante instituição do mercado financeiro trouxe duas boas notícias para o deputado Jair Bolsonaro (PSL).

A rejeição ao nome dele, a maior de um candidato a presidente da República segundo a mais recente pesquisa do Ibope, parou de crescer. A intenção de voto em Bolsonaro cresceu cinco pontos.

Geraldo Alckmin, candidato do PSDB, está onde sempre esteve. E Fernando Haddad (PT), que por enquanto Lula e o PT evitam chamar de seu, está na casa dos 8%.

É de vitória o clima que se respira na suíte do quinto andar do Hospital Albert Einstein, em São Paulo, onde Bolsonaro se recupera do atentado sofrido em Juiz de Fora.

Bolsonaro torce para enfrentar Haddad no segundo turno. Haddad torce para enfrentar Bolsonaro. Um dos dois está errado.

Carlos Melo*: Disputa pela Presidência ficará ainda mais emocional

- O Estado de S.Paulo

O episódio é deplorável e não há meio termo. A sociedade deve repudiar atos de violência; países democráticos não os concebem nem os aprovam. A política foi inventada para evitá-los e o Estado para puni-los. Contudo, discute-se seu impacto na campanha eleitoral.

O primeiro aspecto será a tensão quanto às ruas. Hoje, os grupos políticos se consideram inimigos, ao invés de adversários. Radicais e provocadores não faltam e fragilizam a paz. Até o dia da eleição, haverá expectativa e torcida para que novos incidentes não ocorram.

De imediato, há a comoção que deve consolidar o patamar de intenção de votos em Jair Bolsonaro que as pesquisas já demonstravam. Possível que até cresça, ainda que dificilmente dispare. O ex-capitão permanecerá um candidato forte. Presume-se que avance ao 2º. turno.

Todavia, manifestações de solidariedade e estimas de restabelecimento não implicam em adesão e declaração de voto. Controverso, Bolsonaro angariou larga rejeição e, com o passar dos dias e a cabeça fria é plausível que a comoção ceda espaço à ponderação.

Passado período protocolar de obsequioso silêncio, o mais provável é que adversários, agora ou no 2º. turno, voltem aos ataques ao candidato e a seu discurso. À vítima não se deve atribuir a culpa, decerto. Mas, a identificação das bandeiras de Bolsonaro com o atentado que o vitimou será inevitável. Ainda mais emocional ficará a campanha. Voltamos à questão inicial: a torcida para que as ruas não saiam do controle.
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* É cientista político e professor do Insper

José Álvaro Moisés*: Emoção rebaixa o debate sobre escolha do novo presidente

- O Estado de S.Paulo

O ponto de partida para qualquer reflexão sobre o atentado contra o candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL) é o repúdio ao ato que pôs em risco sua vida. O segundo ponto importante é que esse ataque é mais um fato que indica a reintrodução da violência na política brasileira. Neste ano, tivemos o assassinato da vereadora do Rio Marielle Franco (PSOL) e os ataques à caravana de Lula no Sul do País – em 2016, candidatos a vereador e a prefeito haviam sido assassinados.

O atentado a Bolsonaro fez com que mais um ator importante na atual disputa seja visto como vítima – e ele o foi de um atentado –, a exemplo de Lula, que se apresentava como perseguido pela Justiça. Isso traz à disputa um novo ingrediente emocional – não pelo lado mais virtuoso –, mas por meio da piedade e de outras emoções que não são boas conselheiras para o eleitor que deve escolher quem governará o País. Isso pode fazê-lo perder a racionalidade de seu voto, que se manifestaria por meio do exame de programas e propostas para verificar quais são os mais adequados para tirar o País desta crise, a mais grave do período republicano.

'Democracia brasileira está em risco permanente', afirma filósofo

Entrevista com Roberto Romano, filósofo e professor da Unicamp

Para Roberto Romano, ataque a Bolsonaro mostra que instituições e sociedade civil não estão funcionando normalmente

Paulo Beraldo | O Estado de S.Paulo

O ataque a faca contra o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) em Juiz de Fora (MG) durante ato de campanha, é um reflexo do atual quadro da democracia brasileira, em que as instituições e a sociedade civil não têm funcionado normalmente. Esta é a avaliação do filósofo Roberto Romano, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “(O incidente) É um resultado da democracia brasileira, que vive em risco permanente. Ela não está consolidada”, afirmou.

Em entrevista ao Estado um dia após o incidente, o pesquisador alerta para a necessidade de os candidatos, os partidos e as autoridades públicas, sobretudo do Judiciário, “assumirem as responsabilidades de suas funções”. “Se não tivermos uma reação saudável e rápida, evidentemente teremos mais fatos graves até as eleições”, disse. “Estamos longe de perceber a gravidade da crise política e social brasileira.”

Abaixo, leia os principais trechos da entrevista.

• O que significa esse episódio?

Isso é um resultado da democracia brasileira, que vive em risco permanentemente. Ela não está consolidada. As instituições de Estado e da sociedade civil não estão agindo normalmente. Com isso, temos a perda radical da autoridade pública. E democracia sem autoridade pública não funciona. Quando não há autoridade, a violência física e a violência verbal se imiscuem em todos os assuntos da sociedade e do poder público. E então temos resultados como esse (o ataque). Se não tivermos uma ação rápida para resolver esses problemas, evidentemente vamos caminhar para um fim trágico. Quando o próprio Jair Bolsonaro, no Acre, usou uma frase no sentido de “metralhar seus adversários”, a Procuradoria-Geral da República não tomou providências. Esse é um ponto. Ela (Raquel Dodge) achou que era um assunto menor e isso mostra o quanto estamos longe de perceber a gravidade da crise social e política brasileira.

• Nos últimos meses, tivemos outros ataques a políticos. São episódios isolados?

Não é isolado, esse é o ponto. Temos um regime civil que, na Constituição, promete ser democrático e, ao mesmo tempo, um Estado de direito. Para essa promessa ser cumprida, é necessário que os três poderes cooperem. No caso brasileiro, há um Executivo desacreditado, já que o presidente tem a avaliação do eleitor mais baixa possível. Tem um Parlamento em que o eleitor também não acredita, com desprestígio absoluto, e a Justiça começa a mostrar sinais de partidarismo, de política e de divisão, inclusive no Supremo Tribunal Federal. Tem vários tribunais abrigados sob a sigla do STF. É isso que eu chamo de a perda da soberania.

Boatos e teorias da conspiração sobre atentado a Bolsonaro se espalham

Candidato do PSL foi atacado com facada no dia 6 de setembro

Débora Sögur Hous | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Teorias conspiratórias, notícias falsas e boatos circulam nas redes sociais desde o atentado que o deputado Jair Bolsonaro (PSL) sofreu na quinta-feira (6).

“A faca saiu sem sangue, a camiseta dele não manchou, na foto no hospital, os médicos estavam sem luvas… Pra mim foi facada de marketing”, diz uma mensagem encaminhada pelo WhatsApp.

“Sem sangue e cara de dor fingida. Reparem que há uma pessoa com distintivo da PF”, diz uma publicação compartilhada no Facebook.

Segundo levantamento da FGV-DAPP (Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas), a maioria das mensagens postadas no Twitter vieram de perfis céticos (40,5% do total).

Pessoas que, apesar das informações vinculadas pela imprensa, pelos boletins médicos e por órgãos oficiais, tendem a desconfiar do que aconteceu e acreditam que o ocorrido é uma armação para criminalizar a esquerda.

Candidatos ao Planalto redefinem estratégias de campanha após atentado

Por Fernando Taquari, Fabio Murakawa, Marcelo Ribeiro e Daniela Chiaretti | Valor Econômico

SÃO PAULO E BRASÍLIA - O ataque contra Jair Bolsonaro (PSL) deu início a uma nova campanha eleitoral para os principais candidatos à Presidência da República. Dirigentes partidários e estrategistas consultados pelo Valor são unânimes em dizer que a eleição ganha novos contornos depois do atentado sofrido pelo ex-capitão do Exército. Entre seus adversários, há o entendimento de que Bolsonaro sai fortalecido e com grandes chances de chegar ao segundo turno, ainda que ainda faltem 30 dias para a eleição. Pesquisas eleitorais que começam a ser publicadas nesta segunda-feira, ajudarão a redefinir as campanhas.

O candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, vai suspender momentaneamente as críticas contra Bolsonaro no horário eleitoral gratuito. Tucanos querem evitar que ele se torne um mártir e desponte como grande favorito. O PSDB fará pesquisas qualitativas para medir o impacto do episódio e assim definir a melhor tática para os últimos 30 dias de campanha. Enquanto isso, Alckmin adotará na semana que vem uma linha mais propositiva ao mesmo tempo em que destacará os riscos de uma radicalização política.

No entorno do candidato Ciro Gomes (PDT) não há previsão de grandes mudanças. Por ora, a ordem é esperar a “poeira baixar”. Bolsonaro, avaliam os pedetistas, tem uma rejeição consolidada e um teto de crescimento. Ciro tende a poupá-lo de críticas. Até porque acredita que o principal prejudicado com o episódio será Geraldo Alckmin (PSDB). O candidato do PDT, conforme aliados, vai seguir com a estratégia de “popularizar” a campanha, sobretudo entre os mais pobres, as mulheres e os eleitores do Nordeste.

O PT também não vê razões para alterar sua estratégia de campanha. Na visão de lideranças petistas, Bolsonaro tem sido e continua sendo neste momento um problema eleitoral para o PSDB, de quem vinha sofrendo os ataques mais incisivos. Há, no entanto, uma preocupação no partido: a de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva perca protagonismo para o rival. Da mesma forma, teme-se que o discurso de vitimização de Lula perca força diante de um Bolsonaro esfaqueado. Mesmo assim, dirigentes da legenda defendem a tática de manter Lula como eixo central da campanha.

Marina Silva (Rede), por sua vez, continuará a fazer o discurso de união contra os extremos. Há um entendimento dentro do comitê de campanha da ex-senadora de que ela se coloca como alternativa ao cenário mais radical e não deve desviar a rota. “Não muda a fala, não muda a proposta”, diz Andrea Gouvêa, coordenadora da campanha de Marina. “Marina se coloca como uma alternância no poder entre PT, PSDB e MDB, que já tiveram a oportunidade de dar a sua contribuição”.

Tucanos repudiam ato de violência contra candidato do PSL

Por Shirley Loiola

O candidato à Presidência da República pelo PSDB, Geraldo Alckmin, repudiou quinta-feira passada o atentado contra o candidato do PSL, Jair Bolsonaro. Alckmin se manifestou por meio de sua conta oficial do Twitter e disse que espera punição exemplar do autor do crime.

“Política se faz com diálogo e convencimento, jamais com ódio. Qualquer ato de violência é deplorável. Esperamos que a investigação sobre o ataque ao deputado Jair Bolsonaro seja rápida, e a punição, exemplar. Esperamos que o candidato se recupere rapidamente”, afirmou o tucano.

Jair Bolsonaro levou uma facada na região da barriga durante um ato de campanha em Juiz de Fora (MG). O suspeito foi detido. Bolsonaro foi levado à Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora. O hospital não informou o estado de saúde do candidato.

Antonio Anastasia, candidato tucano ao governo de Minas Gerais, se solidarizou por meio de nota e afirmou que este tipo de ação coloca em xeque a democracia do país.

“O atentado ocorrido há pouco contra o candidato a presidente da República, Jair Bolsonaro, é condenável e inaceitável.

Independente de qual posição defende, nós não podemos aceitar, jamais, sob nenhum pretexto ou desculpa, uma situação dessa, com o risco de, do contrário, colocarmos em xeque a própria democracia, conquistada por muitos brasileiros a duras penas.”, disse Anastasia.

O tucano João Doria, postulante ao cargo de governador de São Paulo, disse que qualquer ato de violência deve ser condenado.

“Transmito a minha solidariedade ao deputado Jair Bolsonaro e aos seus familiares. Eleição não se faz com agressão. A covardia de um ato que agride um candidato deve ser condenada com veemência.”, afirmou Doria em nota oficial.

O primeiro vice-presidente do Senado Federal, senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), criticou duramente o clima de intolerância que culminou com o violento atentado à Jair Bolsonaro. Depois de falar ao vivo no Facebook, Cássio postou mensagem nas redes sociais. Nela, o senador diz que “não podemos compactuar com o ódio”.

Campanha de Alckmin vai poupar Bolsonaro e centrar fogo em Temer

Por Marcelo Ribeiro | Valor Econômico

BRASÍLIA - A campanha do candidato à Presidência da República do PSDB, Geraldo Alckmin, centrará suas críticas nos próximos programas ao presidente Michel Temer. A estratégia, chamada de “antitemista” por membros da campanha do tucano, substituirá o conteúdo negativo em relação ao deputado Jair Bolsonaro, postulante do PSL ao Planalto.

Após o militar ser esfaqueado durante ato de campanha na tarde de ontem em Juiz de Fora, a equipe de campanha do ex-governador de São Paulo decidiu poupar Bolsonaro nos próximos dias. A percepção, porém, é que o arsenal contra Bolsonaro voltará a ser utilizado “quando a comoção sobre o esfaqueamento diminuir”.

“Temos que dar tempo ao tempo. Sem agonia e sem afobação. Vamos deixar as campanhas contra Bolsonaro em banho-maria. Mas ninguém vai deixar Bolsonaro convalescendo até a eleição”, explicou uma fonte ligada à coordenação da campanha de Alckmin.

Desde ontem, aliados do tucano estão em contato frequente, com o objetivo de alinhar a estratégia para os próximos dias e para identificar o “timing ideal” para voltar a criticar Bolsonaro.

Paralelamente, os tucanos também avaliam quando iniciar as críticas ao PT, para tentar recuperar a bandeira antipetista, que hoje é um dos pontos que sustentam a elevada intenção de voto do Bolsonaro.

Atentado abre disputa por segunda vaga, dizem aliados de Marina

Por Daniela Chiaretti | Valor Econômico

SÃO PAULO - O atentado contra o candidato à Presidência pelo PSL Jair Bolsonaro deve trazer a disputa eleitoral para o centro do espectro político. Dentro da campanha da candidata Marina Silva, da Rede, há duas percepções: a primeira é que Bolsonaro já está no segundo turno. A segunda é que, desde a facada que levou o ex-capitão do Exército a ser internado, é uma nova eleição.

“Zerou o jogo”, diz um observador.

O entendimento é que a disputa se acirra pela segunda vaga, no segundo turno – entre Marina, o candidato do PDT, Ciro Gomes, e o candidato do PT, que deve ser Fernando Haddad.

Trata-se de um instantâneo deste momento, antes que se entenda qual a estratégia que será adotada pelo Partido dos Trabalhadores. A expectativa é que na terça-feira, em ato em Curitiba onde está preso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, deva se consagrar Haddad como candidato à Presidência do PT.

Dentro da campanha do Rede, calcula-se que os eleitores indecisos não migrarão para os extremos e que a campanha de Geraldo Alckmin (PSDB), que vinha mirando Bolsonaro, será muito afetada.

Com Bolsonaro no hospital, as equipes das campanhas políticas dos adversários convergem em um ponto – desistir dos ataques ao candidato do PSL. “Quem vota no PT ou em Bolsonaro já está definido. O que vai haver é uma luta pelos indecisos entre os candidatos mais centristas”.

Após ataque, candidatos adotam tom conciliador

Ataque a Bolsonaro freia agressões na campanha

Disputa presidencial retorna com apelo ao diálogo, conciliação e repúdio à violência; episódio será abordado pelos candidatos no horário eleitoral no rádio e na TV

Gilberto Amendola, Adriana Ferraz, Marianna Holanda, Pedro Venceslau e Ricardo Galhardo | O Estado de S.Paulo

O efeito imediato do atentado contra o candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro, foi frear o clima beligerante que marcava a disputa pelo Palácio do Planalto nas eleições 2018. A campanha presidencial volta às ruas neste sábado, 8, – dois dias após Bolsonaro (PSL) ser esfaqueado durante um ato em Juiz de Fora (MG) – com um novo foco: o apelo ao diálogo e o repúdio à violência. O ataque será abordado pelos presidenciáveis com tom de conciliação em novos programas de TV e rádio, gravados às pressas sob orientação dos marqueteiros. Agendas públicas preveem carreatas e uma caminhada pela paz.

Se em outras eleições a tensão entre os candidatos ia subindo, gradativamente, com a aproximação das semanas decisivas, nesta campanha mais curta e em meio a um cenário político acirrado a fase de ataques já estava em curso. Bolsonaro, que se notabilizou por um discurso antipetista, era alvo constante de adversários. Agora, a ordem geral é evitar qualquer tipo de crítica mais pesada à biografia do candidato do PSL.

A cúpula da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB) se reuniu nesta sexta-feira, 7, e decidiu gravar um programa quase todo dedicado ao atentado em Juiz de Fora e com a mensagem de união e pacificação do País. Haverá falas de Alckmin e da candidata a vice, Ana Amélia (PP). Até a agressão, o tucano era o que mantinha a linha mais agressiva contra Bolsonaro na TV e no rádio, com comerciais que citavam seu histórico agressivo, especialmente contra mulheres. Os ataques foram suspensos, ao menos temporariamente.

Pesquisas qualitativas definirão o rumo dos comerciais veiculados pela campanha de Alckmin a partir da semana que vem. Por ora, o plano prevê uma fase mais propositiva.

Presidenciáveis retomam agendas e pregam paz

Após um dia de paralisação em solidariedade a Bolsonaro, maioria vai hoje às ruas. Alckmin citará atentado em seu programa para defender moderação, e Marina pregará campanha pacífica; Ciro já teve atividade ontem à noite, no Ceará

Cristiane Jungblut, Fernanda Krakovics, Jeferson Ribeiro e Maria Lima | O Globo

RIO, BRASÍLIA E SÃO PAULO - Após o ataque, presidenciáveis voltam à campanha, com caminhada pela paz(MarinaSilva) e apelo à conciliação (GeraldoAlckmin). Após um dia de interrupção nas campanhas em solidariedade a Jair Bolsonaro, os demais candidatos à Presidência retomam hoje suas atividades com discurso de necessidade de paz e diálogo para o resto da campanha. Alguns, como o tucano Geraldo Alckmin, farão referências diretas ao episódio com o candidato do PSL.

O tucano, que vinha sendo o principal autor de ataques a Bolsonaro, decidiu incluir referências ao atentado contra o adversário em seus programas de rádio e TV. Alckmin fez uma reunião de emergência ontem com o comando de campanha para rever a estratégia de comunicação, e decidiu gravar novo programa eleitoral para hoje. Segundo participantes da reunião, o programa citará o caso em tom didático para, em seguida, mostrar a capacidade de “diálogo” de Alckmin e a necessidade de moderação neste momento do país.

Na reunião, com a presença de Alckmin e da vice na chapa, senadora Ana Amélia (PP-RS), ficou acertado que o caso de Bolsonaro será mostrado para enfatizar que o país não pode tomar o caminho da radicalização e da violência. Além disso, será explorada a capacidade de Alckmin, como governador, de agir em momentos de crise e de violência.

Ana Amélia foi chamada a São Paulo para gravar uma participação, depois que a campanha gostou de uma mensagem sua nas redes sociais sobre o Sete de Setembro, e a necessidade de diálogo neste momento do país. A presença de Ana Amélia será reforçada nos programas eleitorais pela resposta positiva à sua estreia na quinta-feira e pela sua facilidade na comunicação dos fatos, por ser jornalista.

Nas ruas, Alckmin fará campanha em Santa Catarina, visitando Criciúma e Florianópolis.

O atentado contra Bolsonaro: Editorial | O Estado de S. Paulo

O atentado contra o candidato a presidente Jair Bolsonaro (PSL) foi um crime gravíssimo sob todos os aspectos. Tem consequências pessoais e políticas óbvias, pois muda o destino das pessoas diretamente envolvidas no incidente e altera profundamente o quadro da sucessão presidencial, vale dizer, da vida nacional. Felizmente, a intenção assassina do autor do crime não se concretizou e parece comprovado que ele é um desequilibrado que agiu de forma isolada. Sua ação, no entanto, feriu não apenas Jair Bolsonaro, mas todo o arcabouço da convivência política civilizada, que rejeita a solução dos dissídios por meio da violência, seja individual, seja coletiva.

O repúdio ao atentado foi unânime e imediato, como registram as manifestações dos outros candidatos à Presidência, que, sem titubeios nem adversativas, expressaram solidariedade a Bolsonaro e enfatizaram sua fé na democracia. A maioria suspendeu temporariamente sua campanha eleitoral.

Todos devem estar refletindo sobre os rumos que imprimiram à disputa política e que não podem ser desvinculados dos acontecimentos de Juiz de Fora, qualquer que seja o grau do desvario que acometeu o autor do atentado. Pois ele nada mais foi do que a mão que obedeceu não à voz de Deus, como alegou, mas ao eco de uma longa e ensurdecedora pregação de ódio e de fuga da razão.

Manipulação eleitoral pela web é visível: Editorial | O Globo

Caso do candidato ao Senado pelo PT mineiro, Miguel Corrêa, e da venda de ‘likes’ é esclarecedor

Todos os fatos relatados sobre a manipulação das eleições americanas de 2016 por meio das redes, em favor de Trump, e acerca de interferências semelhantes em pleitos na Europa, inclusive no plebiscito sobre a saída britânica da UE (Brexit), levaram a Justiça Eleitoral brasileira a se mobilizar diante do pleito deste ano.

Não faltam mesmo motivos para preocupações. A inexorável expansão da internet, para o bem e o mal, criou incontáveis possibilidades de propaganda de candidatos e também de análises. Em si, algo positivo. Mas nem sempre, a depender de cuidados. Em 2014, já houve atenção para o assunto. Sites de políticos com grandes índices de visita passaram a levantar suspeitas do uso de robôs que simulam a ação humana na rede. Mas o avanço tecnológico não para e permite o desenvolvimento constante de novos “negócios” a serem oferecidos a candidatos para elevar artificialmente sua popularidade na internet, aumentando o seu trânsito na rede.

O GLOBO revelou a história emblemática do deputado petista Miguel Corrêa (MG), responsável pela criação de uma malha de influenciadores digitais, para promover ideias e candidatos da esquerda. Ele próprio um deles, aspirante ao Senado.

Crepúsculo de Temer: Editorial | Folha de S. Paulo

Perto de deixar o posto, presidente tenta interferir na disputa eleitoral

Ao chegar ao Palácio do Planalto, depois do impeachment da petista Dilma Rousseff, Michel Temer (MDB) via se descortinar a perspectiva de um futuro favorável.

Se tudo ocorresse segundo o previsto, ao final de dois anos seu governo teria posto ordem na casa, a economia apresentaria crescimento convincente e a sensação de alívio, na sequência de um período de recessão aguda, poderia levá-lo a nutrir ambições eleitorais.

Não foi esse, entretanto, o roteiro que lhe reservou a realidade. Em que pesem medidas e reformas relevantes, capazes de sustar a crise herdada de Dilma, o presidente, como se sabe, tropeçou numa série de obstáculos.

Foi por duas vezes denunciado por corrupção e viu seu capital político esvair-se nas tentativas de conter uma decisão desfavorável da Câmara dos Deputados.

No plano econômico, a recuperação da renda e do emprego se mostra mais fraca e morosa do que se previa, sonegando-lhe o benefício que uma impressão generalizada de melhoria poderia propiciar.

Com índices de desaprovação elevadíssimos nas pesquisas, Temer vai chegando ao fim de seu breve mandato em posição bastante distinta daquela desenhada por suas melhores expectativas. Tentou, ainda, uma última cartada com a intervenção federal na segurança pública do Rio, mas a providência se revelou pouco efetiva.

Agora, quando as campanhas eleitorais estão em curso, o presidente procura interferir no processo de maneira curiosa.

Num vídeo, demonstrando irritação e usando de ironia, atacou o postulante do PSDB, Geraldo Alckmin, que fez críticas ao governo federal em sua propaganda. Temer o acusou de dizer falsidades, de ser injusto com siglas aliadas e procurou vincular o partido do ex-governador de São Paulo a sua gestão.

Chama a atenção que a tentativa do mandatário de aproximar o tucano de sua administração se mostra, na realidade, uma maneira de prejudicar o candidato —já que prevalece, na disputa, o entendimento de que quanto mais distante do emedebista melhor.

O sambista que colocava música até em bula de remédio

Compositor de ‘Senhora liberdade’ e ‘Deixa clarear’ morreu quinta-feira de complicações causadas por câncer de próstata

Marcelo Moutinho | O Globo

Fã dos duelos de pipa e dos balões que cruzavam o céu da Zona Oeste, o garoto Amendoim diariamente saía da Rua Mesquita para defender uns trocados na ponte de Realengo. O produto comercializado lhe rendera o primeiro apelido, assim como a vivência no bairro com feições ainda rurais viria a plasmar os desenhos melódicos do futuro compositor.

Em 81 anos, Wilson Moreira criou pequenas maravilhas como “Meu apelo”, “Senhora liberdade” e “Deixa clarear” (as duas últimas, parcerias com Nei Lopes), iluminando a música brasileira e aqueles que o conheceram. Nascido em 1936, Moreira foi entregador de marmita, guia de cegos, bombeiro hidráulico, carcereiro. A veia artística se manifestaria cedo.

Ainda adolescente começou a tocar tamborim na Unidos da Água Branca, escola mais tarde incorporada pela Mocidade Independente de Padre Miguel. Na Mocidade, tocou surdo e ajudou a fundar a Ala dos Compositores, tendo assinado dois sambas-enredo, em 1962 e 1963. Cinco anos depois, iria para a Portela. A essa altura, Leny Andrade já havia gravado um samba seu (“Antes assim”, em 1956).

Graziela Melo: O homem que passa

O homem que passa
carrega na alma
a maior dor
do mundo!

Eu peço
respeito
pelo homem
que passa!!!

Seu cabelo
está grizalho
sua alma
está grisalha,

de carregar
tanta dor
pelo mundo!

O mundo não
entende
a dor
desse homem
que passa.

O mundo
está alheio
ao mundo
de sofrimento
que ele
carrega
na alma!

Alguém pode
ajudar
esse homem
que passa?

Olhem só
o seu rosto,
sua fronte enrugada
seus olhos tristes
sua boca crispada!!!

Por favor
minha gente
respeitem a dor
desse homem
que passa!!!

Há tanta agonia
em seu peito
tanto pavor
em seu rosto!

Olhem só
suas mãos
que pendem
abandonadas,

São mãos
que foram
acariciadas...

Agora se cruzam
às suas costas
soltas...
desgarradas!

Por favor
vocês
a quem nada
lhes passa,

amenizem
a dor
desse homem
que passa.

Pode ser
que assim
um milagre
se faça

e se abrande
a dor
deste homem
que passa!

A quem
sorrir com
a vida
e não conhece
a desgraça,

sorriam um pouco
para o homem
que passa