domingo, 9 de setembro de 2018

Roberto Freire: Desestabilizadores

Segue, do lado do lulopetismo, a desobediência civil às determinações da Justiça Eleitoral.

Continua a cantilena da candidatura de Lula, um perseguido das elites e de todo o sistema porque um dia teria tornado o Brasil um país das maravilhas.

Havia escola, saúde, trabalho, comida e sonhos para todos, que eram felizes, como nunca.

Demônios apearam Dilma do poder e tentam impedir o profeta dos bons tempos de outrora de continuar a sua obra divina.

Vão mais adiante. Todas as mazelas da crise, atual e pregressa, foram causadas pelo satanás-mor, Michel Temer, tão medonho que, em meros dois anos, fez areia dos castelos de ouro das eras de Lula e Dilma.

O boneco de ventríloquo, Haddad, dá eco as essas estultices, nos programas de TV e do rádio. Aproveita para atacar os tribunais dos ricos e dos malvados, o TSE, o STJ e o Supremo.

Segue o processo de canonização do sr. Luís Inácio. Há até um séquito de fanáticos acampados perto da carceragem da PF, em Curitiba, cuja missão diária é dar “bom dia” e “boa noite”, em uníssono e tom elevado, ao líder supremo, para que ele não se sinta solitário.

Os inúmeros recursos protelatórios à Justiça estão no limiar do esgotamento.

Os ministros Fachin e Celso de Mello acabam de sepultar os dois últimos recursos da defesa de Lula, no Supremo, que pediam, no âmago, a revogação da lei da ficha-limpa, com uma canetada.

Ainda resta um último recurso, ao próprio TSE, para que esse Tribunal não dê curso à decisão que ele próprio tomou na madrugada do último sábado.

Nas fileiras lulopetistas não há ninguém com algum nível de formação e informação que acredite que o TSE, por decisão liminar da Ministra Rosa Weber, venha a dar cabimento a uma demanda que, no mérito, já foi rejeitada pelo próprio Tribunal, por 6 x 1, inclusive com o voto da própria Ministra-Presidente.

A Lula restará um dilema: acatar ou não a decisão do TSE, que determinou sua impugnação e a substituição, até o dia 11, terça-feira, da candidatura presidencial.

Se acatar, a chicana jurídica cessará, mas não a agressão à inteligência dos brasileiros e brasileiras. Os lulopetistas terão de, em quatro semanas, ganhar seu eleitorado potencial para o “fato” de que Haddad não é Haddad e, sim, nada mais, nada menos, do que o próprio Lula, prisioneiro da Justiça “dos poderosos”, em Curitiba, um perseguido pelos céus, terras, mares e oceanos.

Se não acatar, além das diversas comissões da ONU, ainda restam ao lulopetismo o Vaticano e outras instâncias e personalidades religiosas e talvez alguns artistas e intelectuais dispostos a assinar manifestos que defendam qualquer causa de qualquer rebelde de ex-colônias.

O lulopetismo tem se revelado como um projeto que passa ao largo da continuidade do processo democrático, republicano e necessariamente pluralista, tão arduamente consagrado na Constituição Cidadã de 1988 e em todas as conquistas subsequentes, que nos legaram o maior período de vigência plena das liberdades democráticas em nossa história.

A ultradireita e o lulopetismo estão de mãos dadas, objetivamente, um alimenta-se do outro, na desestabilização da democracia e nas tentativas e narrativas que buscam deslegitimar o processo eleitoral, dentro e fora do país, cada um a seu modo.

Derrotá-los é possível, necessário e desejável. Depende de nós.
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Roberto Freire é presidente do PPS e candidato a deputado federal por São Paulo(2323)

Eliane Cantanhêde: Todos por um

- O Estado de S.Paulo

Se Lula pode fazer campanha da prisão, por que Bolsonaro não poderia fazer do hospital?

A foto que circula por toda parte de Jair Bolsonaro na sala de cirurgia, de peito nu, anestesiado e ligado a aparelhos, é a confirmação contundente de que sua campanha continua, e continua ainda mais forte. Se Lula faz campanha da prisão, por que ele não pode fazer do hospital? Todos os demais candidatos estão imobilizados, Bolsonaro é o único que está realmente em campanha.

Na base de “todos por um”, Marina Silva, Ciro Gomes, Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles, Guilherme Boulos, todos enfim capricharam no discurso pela democracia e na emocionada solidariedade ao adversário. E estão sem estratégia, de mãos atadas. Têm de confrontar o líder nas pesquisas, mas não podem confrontar a vítima de um ataque feroz.

Que estratégia política haveria diante de uma facada para valer, com graves consequências, exigindo duas cirurgias? Qualquer coisa soando como estratégia seria, além de profundo mau gosto, um tiro pela culatra. A opinião pública, que adora tragédias e mártires, ficaria imediatamente indignada, talvez enojada.

O PSDB, aliás, deu azar. Não teve tempo de mudar suas peças publicitárias da sexta e do sábado e elas são carregadas de críticas a Bolsonaro. Contra o candidato do PSL seria legítimo, talvez até necessário, mas à vítima de um ataque brutal e covarde, no meio da multidão, gravado e espalhado aos quatro ventos?

Vera Magalhães: Pouso por instrumentos

- O Estado de S.Paulo

Parâmetros a menos de um mês das eleições são inéditos e não permitem previsões

A eleição presidencial de 2018 passará à História como aquela que foi ditada, em sua maior parte, de dentro da carceragem da Polícia Federal e, em sua reta final, de um leito hospitalar.

Um mês antes do pleito, o atentado contra a vida de Jair Bolsonaro foi o mais dramático episódio de um processo já eivado de ineditismos – políticos, jurídicos, institucionais, sociológicos, econômicos – e já marcado pela polarização do eleitorado nos dois extremos do espectro ideológico.

O resultado a longo prazo da tentativa de assassinato do líder nas pesquisas, logo depois da interdição do outro pela Justiça Eleitoral, é imprevisível. Como ocorreu num prazo curtíssimo até que os brasileiros tenham de ir às urnas, o que se terá será um pouso eleitoral por instrumentos, dadas as condições climáticas adversas. Dependerá, portanto, da habilidade de cada um dos atores da campanha.

A primeira reação dos opositores diretos de Bolsonaro, os demais candidatos, foi de respeito e cautela. Não houve entre os principais candidatos nenhum que minimizasse a gravidade do atentado, culpasse a vítima ou tentasse obter dividendos eleitorais. O que é bom.

As manifestações que flertaram com o oportunismo político vieram, como tem sido em todo o ciclo político que se iniciou com a Lava Jato, dos extremos.

A ex-presidente Dilma Rousseff fez questão de reavivar a memória dos brasileiros de como pode ser desastrosa e equivocada quando fala. Ao transferir para a vítima a responsabilidade por quase ter morrido apostou no “nós contra eles”, retórica perniciosa que permitiu a Lula criar postes como ela e cindir o País em dois enquanto operava a pilhagem do Estado em conluio com empreiteiras e aliados.

Merval Pereira: Os vices na berlinda

- O Globo

A eleição presidencial deste ano tem uma característica especial: o protagonismo de alguns candidatos a vice

A eleição presidencial deste ano, que já se diferenciava das anteriores pelo clima de radicalização política, tem uma característica especial: os dois primeiros colocados nas pesquisas estão fora da disputa, um definitivamente, outro temporariamente, dando protagonismo a seus vices. Lula por estar condenado em segunda instância por corrupção e lavagem de dinheiro, tornando-se inelegível pela Lei da Ficha Limpa. Jair Bolsonaro por ter sofrido um atentado a faca que quase o matou, não poderá participar da campanha pelo menos até o fim do primeiro turno.

O cargo de vice-presidente que, por uma dessas idiossincrasias de nossa democracia, tornou-se vital numa campanha eleitoral, agora atrai a atenção de todos, a ponto de pela primeira vez seus concorrentes terem sido objeto de sabatinas na GloboNews. Nada menos que oito presidentes foram substituídos por seus vices desde o início da República, por motivos variados, desde a morte do titular até o afastamento por impeachment. Muitos consideram que alguns candidatos atuais a vice são melhores que os titulares. Mas dois deles se destacam justamente pela situação especial de seus líderes na chapa.

Fernando Haddad permanece no limbo, oficialmente candidato a vice de Lula, mas na prática o provável substituto. Nem mesmo Haddad tem certeza, porém, de que será ungido. Na entrevista na GloboNews, negou enfaticamente que aceite ser vice se outro for indicado candidato a presidente em seu lugar. Depois, em conversa fora do ar, comentou irônico: “Tentei sair da política em 2016 e não consegui (referindo-se à derrota no primeiro turno para João Doria na tentativa de reeleição à prefeitura de São Paulo). Quem sabe consigo agora em 2018?”. Essa é uma frase de quem desconfia de que vai ser substituído, e até pode ter sido um recado para quem, no PT, quer tirá-lo. Amanhã o mistério vai ser desvendado, pois é o último prazo para o PT substituir Lula na chapa. Um ingrediente explosivo de qualquer candidatura do PT é a decisão implícita de anistiar o ex-presidente Lula que, mais uma vez afirmou Haddad, está preso injustamente e sem provas de sua culpa.

O general Mourão chama a atenção por declarações polêmicas como a sobre nossa herança cultural de indolência dos índios e malandragem dos negros. Já tentou amenizar o impacto negativo, inclusive registrando-se no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) como indígena. Durante a entrevista na GloboNews, mostrou-se mais preparado que o titular Jair Bolsonaro, mas se prestarmos atenção, defendeu teses polêmicas com sua fala mansa e o espírito de quem deseja a pacificação política. Voltou a admitir intervenção militar mesmo fora da Constituição, falou até em autogolpe. Deixou subentendido que vai aproveitar a fama de durão para negociar com o Congresso a aprovação das reformas, que são necessárias, mas a atitude é perigosa do ponto de vista democrático.

Míriam Leitão: As polêmicas dos vices

- O Globo

Não haverá um vice anódino: candidatos sabem o que querem e alguns admitem que almejam mais do que só substituir o presidente

O general Hamilton Mourão justifica as mortes de adversários políticos ocorridas dentro dos quartéis na ditadura, a senadora Kátia Abreu mantém sua posição contra a divulgação da lista suja do trabalho escravo e a relação de conflito com ambientalistas, a senadora Ana Amélia defende o PL dos agrotóxicos que foi condenado por instituições científicas. O ex-deputado Eduardo Jorge quer a redução do rebanho bovino e o ex-prefeito Fernando Haddad sustenta a política dos campeões nacionais.

Durante a semana, participei, junto com colegas, das entrevistas da Globonews com os candidatos a vice nas cinco principais campanhas e ficou claro que, de uma forma ou de outra, eles são polêmicos. Há duplas mais homogêneas, em que os dois têm os mesmos pensamentos. É o caso de Bolsonaro-Mourão e Marina-Jorge. Há bastante divergência entre Kátia e Ciro. O candidato do PDT se apresenta como de esquerda, e a sua vice é pessoa que se identifica com a direita. No caso de Alckmin e Ana Amélia há harmonia, mas ela o leva a defender a posição atual mais polêmica do agronegócio, que é o PL que amplia o uso de agrotóxicos no país. O candidato em situação mais inusitada é Fernando Haddad, que se prepara para assumir a cabeça de chapa, se vencer as brigas intestinas do PT, mas que no legado petista tem que tentar separar o que defender e o que reconhecer como erro. Uma coisa é certa, não haverá vices anódinos. Eles são, para o bem ou para o mal, pessoas que sabem o que querem e alguns admitem claramente que almejam mais poder do que o de substituir o presidente. Foi o que disse o general Mourão. Ana Amélia quer ser ministra da defesa.

Com voz serena, e depois de pregar a união nacional, o general Mourão disse coisas duríssimas. Não reconhece o erro de ter chamado os índios de indolentes e os negros de malandros. Ele tenta usar “teses sociológicas” e diz que temos que saber quem somos. Mourão admitiu que errou ao defender o golpe numa de suas entrevistas, mas a partir daí ele passou a reafirmar seu pensamento. Disse que as Forças Armadas têm a responsabilidade de intervir quando um dos poderes não está funcionando. Lembrado de que a Constituição só prevê a intervenção das Forças Armadas se os poderes constituídos convocarem, ele defendeu o direito de o comandante interpretar a letra da Constituição. Heraldo Pereira lembrou que quem interpreta é o Supremo Tribunal Federal. Ele insistiu na responsabilidade das Forças Armadas e, diante de uma pergunta de Merval Pereira, admitiu o autogolpe, caso em que um presidente convoca as Forças Armadas. Na pergunta que eu fiz sobre Carlos Alberto Brilhante Ustra, que comandou o Doi-Codi no período em que 47 presos foram mortos, Mourão sustentou que ele é seu herói, e concluiu: “heróis matam.”

Bernardo Mello Franco: Os dividendos do atentado

- O Globo

Passado o susto, o bolsonarismo vive um momento de euforia. O candidato violento se tornou vítima da violência. No cálculo frio da política, o ataque deve ajudá-lo

Madrugada de sexta-feira, entrada da Santa Casa de Juiz de Fora. Cercado de câmeras e microfones, o deputado Flávio Bolsonaro é questionado sobre o estado de saúde do pai. Ele responde em cinco segundos e emenda uma mensagem política: “Vocês acabaram de eleger o presidente. Vai ser no primeiro turno”.

Passado o susto, a campanha do PSL parece viver um momento de euforia. O atentado a Jair Bolsonaro abriu uma nova fase na corrida ao Planalto. No cálculo frio da política, já ficou claro que o ataque renderá dividendos eleitorais ao capitão.

O presidenciável era criticado por abusar de gestos agressivos e declarações irresponsáveis, como “invadiu, é chumbo” e “vamos fuzilar a petralhada”. Agora o candidato que prega a violência virou vítima da violência. Na hipótese mais conservadora, a metamorfose tende a reduzir seu índice de rejeição.

Bolsonaro também ganhou uma trégua dos adversários. Os comerciais que desgastavam sua imagem já sumiram do ar. Os marqueteiros não tiveram escolha. Atacar um candidato hospitalizado significaria desferir uma facada na própria campanha.

Bruno Boghossian: Núcleos e franjas

- Folha de S. Paulo

Quadro terá mudanças nas bordas do eleitorado, mas não necessariamente definitivas

A composição de núcleos cada vez mais concentrados do eleitorado deu forma à corrida presidencial até aqui. Os candidatos ergueram fortalezas e amarraram os votos de seus apoiadores mais dedicados. Agora, a quatro semanas do primeiro turno, o comportamento das chamadas “franjas” de cada campo será o fator determinante da disputa.

O atentado a Jair Bolsonaro (PSL) deve intensificar a movimentação desses eleitores que ainda não estão comprometidos com uma candidatura específica. O ataque ao deputado acirra os ânimos, amplifica as vozes emitidas pelas campanhas e estimula migrações entre os diversos territórios da disputa.

Bolsonaro havia consolidado um núcleo maciço. Seus adversários tentavam estancar sua expansão e roubar uma fatia de apoiadores menos firmes. Nos últimos dias, a rejeição ao candidato começou a subir e as equipes rivais detectavam os primeiros sinais de êxodo naquelas franjas.

O ataque a faca tende a frear esse movimento. Eleitores posicionados em suas bordas darão um passo em direção ao núcleo, parte dos emigrantes retornará, e alguns indecisos podem adentrar seus portões.

A cobertura do atentado na TV terá efeito no curto prazo. Antes do atentado, 21% dos eleitores diziam não conhecer Bolsonaro. A imagem do deputado chegará a muitos deles, embora a exposição não se converta imediatamente em adesões.

A equipe do capitão reformado tentará atrair novos imigrantesdiretamente para o núcleo. O reforço ao discurso antipetista na esteira do ataque serve como ímã. A campanha também tentará blindá-lo ao alegar que as críticas dos rivais fomentaram a violência —embora ele mesmo tenha surfado no radicalismo.

Os deslocamentos iniciais, porém, devem se dar nas pontas do terreno, o que sugere que o quadro terá mudanças logo, mas não necessariamente de forma definitiva. Em algum tempo, a disputa por votos tende a retomar sua dinâmica de competição. O fluxo e refluxo de eleitores nas franjas será determinante.

Hélio Schwartsman: Estado de sítio eleitoral

- Folha de S. Paulo

Legislação restringe para muito além do razoável a palavra e a liberdade de candidatos e cidadãos

Mais do que a legislação, é a própria filosofia eleitoral brasileira que se mostra, a meu ver, equivocada.

As incongruências aparecem já na Constituição. Não faz muito sentido dar ao cidadão o poder de escolher quem vai administrar o país ao mesmo tempo em que o priva do direito de decidir se vai ou não comparecer à urna. O instituto do voto obrigatório é incompatível com o grau de liberdade individual exigido pela própria ideia de democracia.

E não é só a Carta que trata o eleitor como um ser semi-incompetente (ele pode até sê-lo de fato, mas essa é outra questão). As regulamentações eleitorais vão na mesma toada, ao tentar controlar cada detalhe das campanhas, como se precisassem proteger as pessoas de toda e qualquer influência indevida, o que quer que isso signifique. Um exemplo: o tamanho máximo do cartaz de apoio a uma candidatura que você pode afixar na fachada de sua casa é de 0,5 m². Se for de 0,6 m², estará configurado um caso de abuso de poder econômico.

Luiz Carlos Azedo: Nosso herói usou o bisturi

- Correio Braziliense

“Não se pode subestimar é a gravidade do que aconteceu. O episódio poderá influenciar o resultado das eleições. Bolsonaro já posa sentado, simulando uma arma nas mãos, seu gesto de campanha”

O que não falta nas redes sociais são teorias conspiratórias sobre o atentado a faca contra o candidato do PSL, Jair Bolsonaro, que foi gravemente ferido e está internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Albert Einstein, para onde foi transferido depois de ser operado na Santa Casa da Misericórdia de Juiz de Fora. A Polícia Federal levou o autor da tentativa de homicídio, Adelio Bispo de Oliveira, de 40 anos, de Juiz de Fora para um presídio federal em Campo Grande (MS). O agressor foi indiciado por “atentado pessoal por inconformismo político”, com base na lei de Segurança Nacional, o que alimenta especulações. Ele alegou que deu a facada em Bolsonaro “a mando de Deus” e disse que agiu sozinho, sem ajuda de partido político ou empresa. Policiais federais consideraram o depoimento do suspeito como declarações de uma pessoa conturbada. Sua defesa alega insanidade mental.

Essa é a versão oficial. Nas redes sociais, a turma do Bolsonaro acusa o PT de ser mandante da agressão; militantes petistas divulgam que o atentado foi uma conspiração militar para levar o general Hamilton Mourão à presidência de República. Teorias conspiratórias costumam construir versões que partem do pressuposto de que o mandante do crime seria o grande beneficiado pela sua consumação. A partir daí, um arrazoado supostamente comprovatório serve para construir uma narrativa verossímil. No limite, a esquerda pode imputar à CIA o planejamento de tudo; a direita, a agentes cubanos. Num ambiente eleitoral empesteado pelo ódio político e o radicalismo ideológico, não faltam os que acreditam em ideias malucas. Além disso, o passado político da América Latina condena.

Por isso mesmo, é bom que a Polícia Federal investigue todos os passos de Adelio Bispo, suas conexões telefônicas e financeiras, bem como das duas outras pessoas que supostamente estariam com ele durante o atentado. E que esclareça também como um sujeito pobre de marré, marré conseguiu financiar suas viagens e a assistência jurídica de quatro advogados — é comum a nomeação de vários integrantes de um único escritório numa só procuração, isso não quer dizer que todos vão atuar no caso, e mesmo a defesa gratuita. O que não se pode subestimar é a gravidade do que aconteceu. O episódio mudou os rumos da campanha eleitoral e poderá influenciar o resultado das eleições. Menos mal, porque Bolsonaro sobreviveu e já posa sentado, simulando uma arma nas mãos, gesto característico de sua candidatura. Seu assassinato na campanha eleitoral, qualquer que fosse a motivação, poderia ter desdobramentos gravíssimos. Há exemplos na nossa história.

Ascânio Seleme: O grande beneficiado

- O Globo

Jair Bolsonaro, vítima de ataque perpetrado por um lunático que quase lhe tirou a vida, é também o principal beneficiário político do atentado. Desde a tarde de quintafeira, quando foi atingido numa rua de Juiz de Fora, Bolsonaro é o “único” tema da campanha eleitoral nos jornais, nas rádios e nas TVs. A facada garantiu a ele um espaço positivo na mídia que normalmente não teria. As TVs tentam ser milimétricas na concessão de tempo para os candidatos em seus noticiosos, de modo a privilegiar o equilíbrio. E, claro, publicam também pontos negativos da campanha. O atentado subverteu esta ordem.

De vítima, Bolsonaro virou notícia. Notícia boa para ele. Seus poucos segundos no horário eleitoral transformaram-se em dezenas de horas de cobertura. E cobertura noticiosa vale muito mais do que propaganda política. Seus aliados se queixam de que ele terá de suspender a campanha durante a internação. Bobagem. Não existe campanha melhor do que a feita de um leito, especialmente considerando-se as circunstâncias que levaram o candidato para o hospital. Serão de sete a dez dias de intensa campanha eleitoral desde o Albert Einstein.

Com algumas raras exceções, o tema das coberturas é de repúdio à violência, de defesa da democracia, de indignação contra a onda de intolerância que assola o país de maneira crescente. Alguns analistas sugeriram que esta é a hora de união entre todos para que se possa superar a interminável corrente de ódio que divide o Brasil. Nenhuma palavra, ou poucas, para não parecer exagero, contra o discurso de Bolsonaro que defende a ditadura, a tortura e o uso da violência como método. Fica chato atacar o atacado.

Os adversários, surpreendidos pela agressão, se solidarizaram com Bolsonaro, o que é absolutamente razoável em um país civilizado. Repudiaram o ataque, torceram pela pronta recuperação do deputado agredido, mandaram mensagens de apoio à família e pararam de atacar o antagonista. Se até os adversários que acreditam que podem crescer batendo no discurso de trevas de Bolsonaro recuaram, imaginem como poderão se comportar os eleitores quando forem chamados a se manifestar, em outubro.

Ricardo Noblat: O grave erro de Bolsonaro

- Blog do Noblat | Veja

Pediu para ser atacado – e será

Exibir-se como um paciente em veloz estado de recuperação, dando-se inclusive ao luxo de repetir o gesto de quem simula atirar com uma arma, pode ter servido a Jair Bolsonaro para reforçar a imagem de candidato indestrutível e valente, mas pôs fim à trégua que seus adversários haviam lhe concedido.

Quem ousaria criticar o recente alvo de um atentado que quase resultou em tragédia, e que jaz enfermo em um leito de hospital a precisar de urgentes cuidados médicos? Bolsonaro, digamos, ficou bom depressa demais. E, como mostra foto tirada por seu filho Eduardo, voltou a disparar. Pediu para ser baleado em troca.

A demora em sair do hospital e os boletins médicos diários fariam por Bolsonaro o que ele ficara dispensado de fazer. O país permaneceria em suspense enquanto não o visse plenamente bem disposto. Ninguém o acusaria de aproveitar-se do próprio sofrimento para faturar votos a qualquer preço.

Tal comportamento é próprio de políticos comuns, demagógicos, sem caráter, e Bolsonaro decididamente não seria um deles. O senador Magno Malta, candidato à reeleição no Espírito Santo, talvez fosse. Apressou-se a ser filmado em uma roda de orações ao pé da cama de Bolsonaro ainda em Juiz de Fora.

Melhor para os que disputam uma vaga no segundo turno foi o retorno relâmpago de Bolsonaro à caça de votos. Se o imprevisto não aprontar novamente, só haverá uma vaga de fato em jogo a ser preenchida por Marina Silva (REDE), ou Ciro Gomes (PDT) ou Geraldo Alckmin (PSDB). A outra vaga já tem dono.

Eleitorado algum é mais fiel a um candidato do que o de Bolsonaro, conferiu a mais recente pesquisa de intenção de voto do Ibope aplicada antes do atentado de Juiz de Fora. Não tem para ninguém em matéria de voto cristalizado. E ele cresceu depois de ter sido esfaqueado, como atestarão as próximas pesquisas.

Esta será a eleição das vítimas. Uma de verdade: Bolsonaro. A outra falsa vítima de um golpe: Lula, condenado e preso por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Não merecíamos uma eleição melhor?

A eleição dos generais
Quando culpa a mídia pelo atentado a Jair Bolsonaro, o que pretende o general da reserva Augusto Heleno, ex-comandante das tropas brasileiras no Haiti, e conselheiro do candidato?

Intimidar a mídia, jogar a população contra ela, calá-la ou torná-la irrelevante. É o sonho da direita extremada que aqui nunca chegou ao poder pelo voto, mas parece próxima disso.

Quando defende o coronel Brilhante Ulstra, o único militar acusado pela Justiça de torturar presos da ditadura de 64, o que pretende o general da reserva Antonio Mourão, vice de Bolsonaro?

Vinicius Torres Freire: O sangue na eleição, após a facada

- Folha de S. Paulo

Candidatos vão falar em paz por um tempo; depois, decidem se atacam

Os candidatos ora mais relevantes vão passar a próxima semana a falar de pacificação do país, a condenar o ódio político; Jair Bolsonaro será deixado em paz. Por enquanto.

Sim, por enquanto. Cogita-se que a onda de comoção talvez tenha alcance mais restrito do que se supunha nas primeiras especulações. É o que está na cabeça de gente que faz campanha com o coração no freezer.

Essa deve ser a estratégia das turmas de Marina Silva (Rede), no seu caso uma ênfase maior na paz, de Ciro Gomes (PDT) e de Geraldo Alckmin (PSDB).

Mesmo os bolsonaristas têm uma ala mais apaziguadora, comandada pelo coordenador da campanha, Onyx Lorenzoni, e pelo próprio general Hamilton Mourão, vice de Bolsonaro, que serenou um tanto no dia seguinte ao atentado.

Comandada é modo de dizer. Outros bolsonaristas de proa e seus seguidores fazem campanha furibunda contra "comunistas", "marxistas" e mesmo "petistas", acusados de um modo ou outro pelo que aconteceu a Bolsonaro.

Não foi possível descobrir o que fará o PT, se por mais não fosse porque o partido não encontra nem paz interna, pois ainda há tentativas de sabotar Fernando Haddad poucos dias antes do provável lançamento de sua candidatura.

Gente da cúpula das candidaturas mais relevantes faz análises muito parecidas sobre o rumo da política eleitoral nos próximos dias.

Pedro S. Malan*: Sete semanas

- O Estado de S.Paulo

Talvez nunca tenha sido tão importante o voto informado e consciente dos que não acreditam em messianismos salvacionistas, em voluntarismos extremados, tampouco em puros exercícios de “autoridade” como solução para problemas da complexidade dos nossos

“Este é um trabalho muito pouco analítico, mas com ambição exagerada. Pretende convencer intuitivamente o poder incumbente que será eleito em 2010 de que: a) o Estado brasileiro é o mais pesado entre os que têm PIB per capita semelhante; b) essa é uma das causas importantes do nosso baixo crescimento; e c) sem ‘bala de prata’ ou choques duvidosos, existem muitas trilhas viáveis para reduzir o problema e recolocar o Brasil no caminho do desenvolvimento acelerado. Isso dependerá de muita perseverança, de razoável paciência e de alguma inteligência.”

Essa é a abertura de A agenda fiscal, texto do ilustre ex-ministro Delfim Netto publicado em Brasil Pós-crise: Agenda para a Próxima Década, organizado por Fabio Giambiagi e Octavio de Barros (Campus 2009). O trabalho encontrou ouvidos moucos de parte do poder incumbente eleito em outubro de 2010 e - o marqueteiro João Santana fazendo o diabo a quatro - reeleito em outubro de 2014. Afinal, desde 2005 o mote do grupo em questão era o famoso “gasto é vida”.

Novamente às vésperas de eleições, o artigo de Delfim continua atual e relevante. Avançamos na compreensão da magnitude dos desafios, forçados pelas circunstâncias, especialmente após o fracasso da política econômica do governo Dilma, essa que já havia sido figura-chave do governo Lula, definida por este após cinco anos e meio de convivência estreita como “a melhor gerente deste país”. Eleita, Dilma teve mais cinco anos para pôr suas ideias em prática. Deu no que deu.

Delfim Netto é hoje mais sintético, mas não menos mordaz. “Talvez possamos ter sucesso se o eleito tiver condições de eliminar a ‘causa causans’ que nos assalta há três décadas: a despesa primária do governo cresce em torno de 5% ao ano, enquanto o PIB cresce a 2,4%. Todo o resto é chantili!” (Folha de S.Paulo 29/8).

Em exatas quatro semanas mais emergirão das urnas dois candidatos a se tornar o “poder incumbente”. Talvez nunca tenha sido tão importante o voto informado e consciente dos que não acreditam em messianismos salvacionistas, em voluntarismos extremados, tampouco em puros exercícios de “autoridade” como solução para problemas da complexidade dos nossos.

Nunca na nossa História recente o Brasil precisou tanto de um candidato reformista, de centro, aberto ao diálogo, honesto, experiente e que não tenha ou venda ilusões. Ao contrário, que conheça bem a situação das contas públicas do País, o drama secular da educação, a tragédia da corrupção e da violência urbana. Que tenha refletido, cercando-se de pessoas experientes, tecnicamente competentes e que sejam capazes de vislumbrar o País no mundo, e não fechado em seu labirinto. Os eleitores decidirão, espero que tendo presente a diferença entre disputar uma eleição e efetivamente governar, com o Congresso que sairá das urnas, um país complexo como o nosso.

Samuel Pessôa: Mais Brasil e menos Brasília

- Folha de S. Paulo

Transferências da União existem para equalizar recursos e garantir serviços

Um bordão que tem sido comum nesta campanha eleitoral é a necessidade de repensar nosso federalismo: "Mais Brasil e menos Brasília". Ninguém define exatamente do que se trata.

Há três temas.

O primeiro é tributário: como se divide entre União, estados e municípios o bolo tributário e como se opera o princípio da solidariedade federativa na transferência de recursos dos entes ricos aos pobres.

O segundo é a forma como o Congresso Nacional tem recentemente ferido a independência dos entes da Federação ao estabelecer obrigações a estes sem que as Assembleias Estaduais ou as Câmaras Municipais se pronunciem.

Tem sido comum corporações do setor público lutarem no Congresso pelo estabelecimento de pisos de remuneração que se aplicam aos servidores estaduais e municipais.

Surpreendentemente, essas e outras interferências do Legislativo nacional sobre os entes da Federação têm sido pouco tratadas pelos candidatos.
Aparentemente o bordão mencionado no título da coluna remete à ideia de que o dinheiro arrecadado vai para Brasília e, em seguida, retorna aos governos locais. No entanto, os casos em que ocorre a ida e o retorno dos recursos estão associados a programas de apoio aos entes mais pobres da Federação.

Em alguns casos o dinheiro é transferido automaticamente, como nos Fundos de Participação dos Estados (FPE) e dos Municípios (FPM).

Em outros, a União transfere recursos aos entes mais pobres em áreas específicas, como a complementação da União ao Fundeb.

No nível estadual, as transferências da União conseguem reduzir em muito as diferenças de recursos entre os estados.

Rolf Kuntz: Mais que dinheiro, falta critério no país da gastança

- O Estado de S.Paulo

Gastar demais é apenas um dos vícios do governo brasileiro, um dos mais visíveis e mais criticados

Gastar demais é apenas um dos vícios do governo brasileiro, um dos mais visíveis e mais criticados. Esse vício é complementado e agravado por outro. Além de estourar suas contas, afundar em dívidas e pagar juros muito altos para se financiar, o governo gasta escandalosamente mal. A maior parte da enorme despesa anual pouco favorece o crescimento econômico, a criação de empregos, a modernização do País e o aumento do potencial produtivo. A estagnação da indústria, o desemprego de quase 13 milhões de trabalhadores, o despreparo da mão de obra e o analfabetismo funcional de cerca de 38 milhões de pessoas são claros sintomas de um desperdício de proporções amazônicas. 

Dispondo de uma carga tributária de cerca de um terço do produto interno bruto (PIB), o poder público entrega muito menos que as administrações de outras economias emergentes. Nestas outras, a tributação equivale em média a uns 20% da produção anual de bens e serviços. Mas a educação fundamental é frequentemente melhor que a brasileira, as contas públicas são menos desequilibradas e o desempenho econômico foi bem mais satisfatório nos últimos dez anos.

No Brasil, o dinheiro desperdiçado vai para o ralo por várias canaletas. No próximo ano serão consumidos R$ 306,4 bilhões só com os chamados gastos tributários, segundo estimativa divulgada na semana passada pela Receita Federal. São vantagens fiscais concedidas, nem sempre de forma justificável, a regiões, empresas, organizações sem fins lucrativos, grupos diversos e indivíduos às vezes muito bem de vida. Não há uma avaliação clara dos benefícios produzidos pelas várias facilidades incluídas nesse conjunto.

Hoje crítico dos tucanos, Ciro Gomes já foi garoto-propaganda do partido

Nos anos 1990, atual candidato era considerado símbolo de renovação e competência da legenda

Anna Virginia Balloussier | Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - “Governador Alckmin, não me leve a mal, mas nós precisamos esclarecer aí umas diferenças de compreensão do Brasil”, disse Ciro Gomes (PDT) a se adversário tucano no debate da RedeTV!. entre presidenciáveis.

Ciro, não o leve a mal, já foi o orgulho do tucanato. Se hoje não tem o PSDB em alta estima, em 1990 era uma espécie de garoto-propaganda do partido: vingou como único governador que a legenda fundada dois anos antes conseguiu eleger naquele primeiro pleito nacional, e também o mais jovem do país a comandar um estado. Tinha então 33 anos.

Foram durante os anos tucanos que o pindamonhangabense radicado no Ceará estreou na Esplanada, como ministro da Fazenda de Itamar Franco, e nacionalizou sua fama de pavio curto —o rival Orestes Quércia se referia a ele como Odalisca da Catinga.

Eram outros tempos, em que o PSDB ainda se encontrava à centro-esquerda no xadrez ideológico. A guinada à direita viria em 1994, quando FHC escolheu Marco Maciel, um vice do PFL —sigla que hoje chamamos de DEM e anteontem de PDS, que por sua vez sucedeu o Arena, sustentáculo do regime militar, quando o pluripartidarismo voltou a ser permitido no Brasil.

O histórico partidário de Ciro é elástico. Antes de se filiar a uma legenda, ele militava no movimento estudantil de Fortaleza, junto com o Partido Comunista Brasileiro. “Vinculado, nunca tive carteirinha, não. A aproximação era mais com a esquerda católica, um grupo...”, disse em 1991, no programa Roda Viva.

A primeira carteirinha foi justamente a do PDS. Fácil de explicar, afirmou o jovem Ciro na mesma entrevista: começou em 1982 no partido de digital militar para não ficar contra o pai, então prefeito de Sobral (CE) e filiado à sigla porque a alternativa mais palatável na época, o MDB, ainda não existia na cidade.

Já em 1983, eleito deputado estadual, migrou para o emedebismo. Ao longo de sua trajetória política, ainda passaria por outros cinco partidos: PSDB, PPS, PSB, Pros e o atual, PDT de digitais brizolistas.

Em 2017, disse à Folha que sua metamorfose partidária tem nome: coerência. Seus princípios se manteriam firmes, os das siglas que deixou, não. “Para ser coerente, fico ali calado ou criando caso?”

Não se calou quando saiu do PSDB, em 1997, após atritos públicos com Fernando Henrique Cardoso —que o derrotaria na eleição do ano seguinte, a primeira de suas tentativas de chegar ao Planalto.

Candidatos voltam às ruas sem ataques

Nas ruas e na TV presidenciáveis rejeitam violência

Candidatos seguem script de condenar atentado contra Bolsonaro e propor união; Ciro critica agressão, mas diz que não muda campanha

Adriana Ferraz, Pedro Venceslau, Magson Vagner e Amanda Ludwig, Fabio Serapião e Breno Pires | O Estado de S. Paulo

A retomada das agendas de rua ontem pelos principais candidatos à Presidência seguiu o script desenhado pelas campanhas após o atentado contra Jair Bolsonaro (PSL): em vez de ataques, propostas para o País e apelos por um esforço conciliatório. Na TV, só Geraldo Alckmin (PSDB) e Alvaro Dias (Podemos) citaram o atentado, além do próprio deputado, que, nos seus oito segundos, veiculou uma mensagem de um apoiador afirmando que o “povo brasileiro caminha unido e em oração por sua vida”.

Alckmin abordou na TV o ataque contra o parlamentar. Ele abriu seu programa para afirmar que “nada justifica a violência” e que o debate das ideias, por mais divergente que elas sejam, é uma exigência da democracia. “Para resolver divergências partidárias existe a política, que é a única arma aceitável para uma disputa eleitoral”, disse ele. Durante compromisso em Santa Catarina, pela manhã, Alckmin ainda afirmou que o Brasil sempre “avança” quando existe um esforço conciliatório.

Dias teve a mesma iniciativa. Usou seu programa eleitoral para fazer um apelo contra a violência na política. “Com ódio ninguém constrói nada.”

Em São Paulo, Marina Silva (Rede) chegou à Rua 25 de Março, no centro da cidade, para fazer uma “caminhada pela paz”. O ato reuniu cerca de 30 militantes do partido, que se misturaram às pessoas que faziam compras na rua mais popular da capital na hora do almoço.

Marina esteve cercada por quatro seguranças, que chegaram a fazer um cordão de isolamento, mas sem impedir qualquer contato com as pessoas que a acompanhavam. “O que vai nos defender contra a violência não é um arma na mão. É o amor e o respeito, independentemente de cor, raça e ideologia.”

'Violência é o pior caminho para atacar a violência', diz novo programa do PSDB

Tucano afirma que Brasil está 'estarrecido' com ato de violência contra Jair Bolsonaro

O candidato do PSDB à Presidência, Geraldo Alckmin, afirmou que o País precisa “mais do nunca de pacificação” no primeiro programa eleitoral gravado após o atentado contra o candidato Jair Bolsonaro, esfaqueado durante um ato de campanha em Juiz de Fora(MG) na quinta-feira passada. O tucano disse ainda que a violência é “o pior caminho para atacar a violência.”

“O Brasil inteiro está estarrecido com o ato de violência contra o candidato Jair Bolsonaro. É hora de fazermos uma reflexão. A violência é, sempre foi, o pior caminho para atacar a violência. A vítima pode ser qualquer um de nós”, disse. “Mais do que nunca o País precisa de pacificação”.

“O ódio que divide o País cresceu com o PT e fez prosperar radicais de um lado e de outro. Isso não serve para a nenhum brasileiro de bem. Não é na bala, nem na faca, que vamos construir essa nação.”

O atentado a Jair Bolsonaro fez as campanhas mudarem o tom dos programas. Adversários do candidato do PSL, como Alckmin, cancelaram agendas e refizeram programas de TV e rádio.

Solução ‘não é na bala e nem na faca’, diz Alckmin

Candidatos pregam conciliação em agendas e programas de rádio e TV. Em reunião com partidos, diretor-geral da Polícia Federal confirma reforço na escolta de cinco presidenciáveis, que passará a ser feita por até 125 agentes

Dimitrius Dantas, Eduardo Bresciani, Natália Portinari e Sérgio Roxo | O Globo

BRASÍLIA E SÃO PAULO - O ataque ao presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) foi lembrado pelos principais candidatos à Presidência nos programas de rádio e TV e em agendas públicas ontem. Além de prestar solidariedade ao deputado federal, internado na UTI do Hospital Albert Einstein, em São Paulo, os presidenciáveis fizeram apelos contra a violência.

Em vídeo divulgado ontem, o candidato Geraldo Alckmin (PSDB) afirmou que o país precisa de pacificação:

— Não é na bala e nem na faca que vamos construir essa nação —afirmou, aproveitando para criticar o PT — O ódio que divide o país cresceu com o PT e fez prosperar radicais de um lado e de outro. Isso não serve a nenhum brasileiro de bem —disse.

Durante evento de campanha em Criciúma (SC), Alckmin fez um apelo pela “conciliação do país”.

—Toda vez que o Brasil fez um esforço conciliatório, o país avançou.

O candidato Álvaro Dias (Podemos) também fez menção ao atentado em sua propaganda. Desejou que o adversário se recupere rápido e afirmou que “não é na faca e nem na bala que vamos resolver os problemas”. Os outros presidenciáveis não citaram Bolsonaro na propaganda na TV. 

Marina Silva (Rede) classificou o ataque como inaceitável e pregou a paz, durante uma caminhada no centro de São Paulo. A ex-senadora questionou, no entanto, uma das principais bandeiras de Bolsonaro, a liberação do porte de armas.

— Eu fico pensando se, que Deus o livre, aquela pessoa tivesse uma arma de fogo na mão, o que poderia ter acontecido? Temos que acreditar que quem nos defende da violência, do crime, é o amor, o respeito dentro do nosso coração, e não uma arma na mão. 

Também em São Paulo, o candidato a vice do PT, Fernando Haddad, repetiu que deseja que Bolsonaro se recupere após o ataque. Numa carreata no interior do Ceará, Ciro Gomes (PDT) disse que o episódio deve ser repudiado.

Campanhas reveem tática após ataque a Bolsonaro

Adversários suspendem críticas e adotam trégua temporária; agressor é transferido para presídio federal

O ataque contra Jair Bolsonaro (PSL) levou as campanhas de seus adversários a rever suas estratégias. As críticas estão suspensas, ao menos até que o presidenciável se recupere. O autor do atentado, Adélio Bispo de Oliveira, foi transferido para uma prisão federal em Campo Grande (MS).

Pausa nos ataques

Marina, Alckmin, Ciro e Haddad freiam estratégias e fazem cálculos pós-atentado

Fernanda Krakovics, Luís Lima, Catarina Alencastro, Cristiane Jungblut, Maria Lima, Sérgio Roxo e Cleide Carvalho | O Globo

RIO, SÃO PAULO E BRASÍLIA - O atentado contra o candidato do PSL à Presidência e líder nas pesquisas, Jair Bolsonaro, levou seus principais adversários a reverem estratégias de campanha. Em um primeiro momento, as críticas ao deputado serão suspensas e os presidenciáveis pretendem adotar tom de conciliação. Em reunião de emergência após o ataque ao ex-capitão, o comando da campanha do candidato do PSDB à Presidência, Geraldo Alckmin, acertou duas medidas: o tucano não vai mais fazer declarações contra Bolsonaro, a quem chamou de “despreparado” durante a semana, e serão suspensas as críticas diretas a ele na programa de TV. No encontro, que teve a presença de Alckmin, ficou acertado que a campanha adotará um tom de moderação e vai procurar enfatizar o perfil conciliador do tucano. O discurso será o de que o Brasil não pode tomar o caminho da radicalização. —Os programas dos próximos dias serão na linha do diálogo, do respeito e ressaltarão a capacidade de Alckmin para agir nas horas de crise — disse um integrante do núcleo da campanha tucana.

“UNIR SEM RANCOR”
O freio nos ataques dependerá, porém, da evolução do quadro clínico de Bolsonaro. A ideia é retomar a tentativa de desconstrução do candidato do PSL assim que o cenário estiver mais claro. Os tucanos lembram de 2014: após a morte do presidenciável Eduardo Campos (PSB) em um acidente aéreo, houve uma trégua. O cessar fogo, no entanto, foi suspenso assim que a comoção em torno da tragédia passou. Na campanha da candidata da Rede, Marina Silva, também haverá reorientação: seu comando vai apostar na sua imagem de conciliadora. Marina pregará o arrefecimento da radicalização entre os extremos — sejam esses “extremos” Bolsonaro e Fernando Haddad (que deve ser oficializado candidato do PT) ou Bolsonaro e Ciro Gomes (PDT).

O PPS e a coerência democrática: Editorial | PPS

O PPS (Partido Popular Socialista) não é um partido fisiológico. É decente e programático, sempre colocou os interesses nacionais acima dos interesses partidários. Como se pode ler abaixo, sua trajetória é inconfundível.

1- Governo Itamar franco
O PPS participou do governo Itamar Franco. Foi uma administração ética e democrática, de diálogo com a sociedade civil sem instrumentalizações.

O presidente do PPS, Roberto Freire, foi o líder do governo Itamar na Câmara de Deputados e atuou para aprovar o Plano Real, derrubando a inflação e promovendo a retomada do crescimento.
Itamar patrocinou importantes iniciativas na área social, como a regulamentação da Lei Orgânica da Assistência Social e implantou os Conselhos Municipais de Saúde do SUS.

No seu governo foi criado o Conselho Nacional de Segurança Alimentar, com decidido apoio à Campanha de Combate à Fome, promovida por entidades da sociedade civil, entre elas a CNBB e a ONG Ação da Cidadania, esta liderada pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho.

Itamar sofreu a incompreensão de setores da esquerda que o detrataram com palavras de baixo calão (1).

Às vésperas da eleição de 1994, o PPS entregou o cargo de líder do governo na Câmara em carta na qual elogiava a postura progressista do presidente, mas discordava dos encaminhamentos de sua sucessão.

A posição leal e coerente do partido levou a que, anos mais tarde, Itamar se filiasse ao PPS e coroasse a sua vida pública como senador por Minas Gerais, eleito em 2010 em votação consagradora.

2 – Governo Fernando Henrique Cardoso
Por discordar da política econômica, o PPS não participou do governo Fernando Henrique, apesar de ver no presidente uma personalidade progressista e considerar o PSDB um aliado do campo democrático e reformista, cujos líderes, como o senador Mário Covas, foram os principais artífices da Constituição de 1988.

A nova Carta estabeleceu as bases institucionais do Estado democrático de Bem-Estar Social no Brasil. Equivocadamente, setores de esquerda a consideraram “reacionária” e votaram contra ela.

Mesmo na oposição, o PPS estabeleceu diálogo com o presidente e deu apoio às iniciativas como as provas de avaliação do ensino, a criação do Fundo de Apoio ao Ensino Fundamental, o programa de remédios genéricos, o Bolsa-Escola, a Lei de Responsabilidade Fiscal e várias reformas do Estado, necessárias à modernização do país.

O PPS deu apoio a Raul Jungmann, então licenciado do partido para assumir em caráter pessoal o Ministério da Reforma Agrária e responsável por promover o maior programa de assentamentos de famílias sem-terra da história.

A urgência da política: Editorial | O Estado de S. Paulo

Avizinha-se uma tempestade perfeita. Em meio a uma onda de desconfiança em relação aos países emergentes, especialmente Argentina e Turquia, o Brasil irá às urnas daqui a quatro semanas sem ter uma perspectiva clara sobre o que será feito em relação à gravíssima crise fiscal do País, uma bomba armada para explodir no colo do próximo presidente. Pior: alguns dos candidatos mais bem posicionados na disputa até aqui ou não levam muito a sério a urgência de amplas reformas e medidas de austeridade ou então são visceralmente hostis a qualquer iniciativa que vise a interromper a escalada dos gastos públicos.

Já há quem veja na atual conjuntura um quadro de apreensão semelhante ao que antecedeu a vitória de Lula da Silva na campanha presidencial de 2002, quando se imaginava que o petista fosse implementar o projeto histórico de seu partido – que incluía calote na dívida e ampliação acentuada do papel do Estado na economia e nos mercados. Na ocasião, o dólar disparou, como reflexo das incertezas relacionadas ao futuro. Ainda que a situação do País hoje seja diferente do que a daquela época, graças ao grande volume de reservas internacionais e à reversão da política fiscal suicida praticada pelo governo de Dilma Rousseff até seu impeachment, não é desprezível a possibilidade de grandes turbulências se não houver consenso nacional a respeito da premência de enfrentar o problema do rombo nas contas públicas.

Fala-se na necessidade de um ajuste da ordem de 6% do PIB, enquanto, entre 2002 e 2003, já com Lula na Presidência, bastou um aperto de 0,5% para recolocar o País nos trilhos. Ou seja, hoje, mais do que naquela época, não há hipótese de interromper a crise sem uma série de reformas profundas que destravem o crescimento, e isso só será possível se houver um grande entendimento nacional.

Salvação da lavoura: Editorial | Folha de S. Paulo

Conciliar preservação com pujança agrícola implica superar polarização e investir em tecnologia para tornar agropecuária brasileira mais sustentável

A pior praga a afligir o agronegócio brasileiro tem raiz ideológica: a polarização entre ambientalistas e ruralistas. Ela envenena o debate público e enseja que os pontos de vista mais atrasados prevaleçam.

O Brasil ocupa posição única no cenário mundial. É o segundo maior exportador de grãos. Com tecnologia própria, expandiu a produção ao ritmo de 4,1% ao ano, desde a década de 1970, com alta menor da área plantada (1,2% por ano).

O setor agropecuário representa hoje 4,5% do Produto Interno Bruto, mas a cadeia produtiva movimenta cerca de 20% do PIB. E isso com apenas 4,9% de sua receita bruta advindos diretamente de recursos públicos, pouco mais da metade do apoio estatal nos Estados Unidos e menos de um quarto do verificado na União Europeia.

Algumas paisagens do país sofreram e sofrem devastação, é fato, com o avanço da fronteira —como a mata atlântica, dizimada no século 20, e o cerrado, atualmente o bioma mais pressionado.

Poucas nações com tal peso agrícola, no entanto, contam com 68% de vegetação nativa. Ou, então, com 18% do território protegido em unidades de conservação e 13% em terras indígenas.

De uma perspectiva racional, não há motivo para deixar de perseguir a vocação agrícola nem para dilapidar mais o patrimônio de biodiversidade. Sobram argumentos econômicos, ambientais e pragmáticos para conciliar tais objetivos.

Favelização é parte da agenda do governador: Editorial | O Globo

Segurança pública, assunto prioritário no Palácio Guanabara, tem relação direta com o tema
A regulação do uso do solo nas cidades está subordinada à prefeitura. Na verdade, a complexidade da vida urbana, principalmente nos centros de maior porte, rompe regras e critérios da burocracia. Inexorável que haja, portanto, interconexões entre as duas instâncias, prefeitura e governo de estado.

O próximo ocupante do Palácio Guanabara enfrentará dificuldades decorrentes de um ajuste em curso, imposto pela racionalidade, sustentado por um acordo feito com o Executivo federal, que resgata as finanças fluminenses, em troca da revisão da política de gastos e de receitas. Nada fácil em um estado no qual, mais do que em outros, corporações estabelecem alianças com grupos políticos e preservam privilégios.

Há problemas que se eternizam na região metropolitana do Rio, como a favelização, causa de uma série de outras dificuldades. Daí o governador também ter de se envolver no assunto.

O conjunto de gráficos abaixo, feito com base em dados do Instituto Pereira Passos (IPP), indica que o arrefecimento da expansão de favelas estancou em 2015, entrando em nova tendência de alta. Não é por acaso que a curva coincide com a vertiginosa recessão nacional do biênio 2015/ 16, que teve um dos vértices na virtual implosão da Petrobras, causada pelo esquema lulopetista de corrupção montado dentro da empresa, com efeitos robustecidos pelo desabamento da cotação internacional do petróleo. O Rio de Janeiro, maior produtor nacional de hidrocarburetos, beneficiado por vários investimentos correlatos, sede da Petrobras, levou fortes pancadas na crise. A degradação moral dos governos Cabral-Pezão completou o cenário.

Sem as devidas receitas tributárias, políticas públicas naufragaram. Uma delas, a das UPPs, também importante para conter o crescimento das chamadas comunidades. Assim, sem a presença do Estado, a favelização voltou a se expandir e, junto, por inexorável, a criminalidade. De responsabilidade do governador, mas não só, a segurança pública é assunto-chave. Outra dívida grande com a sociedade, o saneamento básico, aguarda o futuro governador. Também relacionado às favelas.

Steven Pinker celebra o progresso da humanidade em 'O Novo Iluminismo'

Psicólogo e linguista se baseia em dados e estatísticas sobre o desenvolvimento humano nos últimos séculos

Paulo Nogueira*, O Estado de S. Paulo / Aliás

O psicólogo e linguista Steven Pinker é um espécime raro de intelectual público. Inúmeros pensadores contemporâneos têm uma prosa na qual, quando finalmente se dignam a concluir a resposta, ninguém mais lembra qual era a maldita pergunta. Já a obra deste professor de Psicologia em Harvard (e até 2003 diretor do Centro de Neurociência do MIT) é de uma limpidez diamantina, sem sacrificar uma vírgula ao rigor acadêmico.

O Novo Iluminismo é um sucedâneo de Os Anjos Bons da Nossa Natureza (memorável, apesar do título meio brega). Agora Pinker postula que a revolução epistemológica do século 18 ajudou a criar um mundo mais saudável, próspero, pacífico e democrático. E receita umas recauchutagens.

Primeiro, uns duros pingos nos is: “Os iluministas foram homens e mulheres de sua época. Alguns eram racistas, machistas, escravistas ou duelistas. Algumas das questões que os preocupavam são quase incompreensíveis para nós, e eles tiveram muitas ideias tolas junto com as brilhantes. 

Nasceram muito cedo para apreciar algumas bases na nossa compreensão moderna da realidade. Não é demérito para os iluministas identificarmos algumas ideias cruciais a respeito da condição humana e da natureza do progresso que conhecemos e eles não. Essas ideias, proponho, são: entropia, evolução e informação.”

Voltaire, talvez a quintessência do Iluminismo, zoou com o otimismo em Cândido, no qual o personagem do doutor Pangloss é uma sátira ao filósofo alemão Leibniz, para quem este era “o melhor mundo possível”. Mas Pinker não usa lentes cor de rosa. Por exemplo, se recusa a permitir que um neandertal o tire do sério: “Neste momento, meu país é governado por pessoas que têm uma opinião sombria sobre o nosso tempo. Mas este livro não trata do 45.º presidente dos EUA. Só mostrarei que essa avaliação do mundo é errada.”

Como realçou Mark Lilla, a ideia de um progresso cumulativo (ainda que com solavancos contingentes) é repulsiva para extremismos reacionários e revolucionários. Os primeiros se embevecem com uma mítica Idade de Ouro no passado, enquanto os segundos salivam por um teleológico porvir radioso. E é aí que Pinker lhes puxa o tapete: “Desde o Iluminismo, a expectativa de vida em todo o mundo aumentou de trinta para 71 anos e, nos países mais afortunados, para 81. 

Quando o Iluminismo começou, um terço das crianças nascidas nas partes mais ricas do mundo morria antes do quinto aniversário; hoje, esse destino está reservado para 6% das crianças das regiões mais pobres. Suas mães também foram libertadas da tragédia: nos países mais ricos, 1% delas não sobrevivia ao parto, uma taxa que é o triplo da dos países mais pobres de hoje, que continua a cair. A proporção da humanidade que vive em extrema pobreza caiu de quase 90% para menos de 10% e, durante o período de vida da maioria dos leitores deste livro, pode aproximar-se de zero.”

Este livro foi alfinetado por gregos e troianos – o que é salutar. Afinal, o pessimismo está tão entranhado no espírito ocidental (sem falar na ignorância crassa) que poucos nos recordamos de quão “pobre, ruim, bruta e curta” (para usar a expressão famosa de Hobbes) foi a vida da esmagadora maioria das pessoas praticamente até ontem. 

À esquerda, John Gray acusou o autor de “utilitarismo tosco”, “neoliberalismo” e “amante da humanidade em abstrato”. Pelo contrário, Pinker apoia intervenções pragmáticas na economia (sobretudo na forma de gastos sociais). Porém, indica que o progresso não foi “apenas” material: atitudes e costumes mudaram muitas vezes para melhor. Por exemplo, no abandono de preconceitos contra mulheres e minorias étnicas: todo o Ocidente proibiu a discriminação e descriminalizou a homossexualidade. Quanto à “abstração”, Pinker insiste que a noção de que nossas existências são individuais (“acima da glória da tribo, raça, nação ou religião”) é a vacina contra as engenharias coletivistas de tantos reis filósofos do século 20, com seus totalitarismos genocidas.

À direita, Pinker levou caneladas por seu ateísmo, seu “cientificismo” e por “negligenciar o papel das paixões”. Todavia, ele não crê que só a ciência possa elucidar a condição humana, decifrando emoções através de processos químicos. “Confunde-se a defesa da razão com a afirmação implausível de que os seres humanos são agentes perfeitamente racionais.”

Murilo Mendes: Manhã

As estátuas sem mim não podem mover os braços
Minhas antigas namoradas sem mim não podem amar sem maridos
Muitos versos sem mim não poderão existir.

É inútil deter as aparições da musa
É difícil não amar a vida
Mesmo explorado pelos outros homens
É absurdo achar mais realidade na lei que nas estrelas
Sou poeta irrevogavelmente.