- Folha de S. Paulo
Carta tem orientado o país em momentos difíceis
O cenário político brasileiro tem se transformado muito nos últimos anos. Por um lado, valores como a transparência e a probidade foram fortalecidos por meio de regras inovadoras, como são as leis da Ficha Limpa e de Acesso à Informação e a proibição de doações ocultas e empresariais para partidos e candidatos. Por outro lado, o aumento da tensão entre as forças políticas antagônicas culminou em crimes violentos, episódios de intolerância e de desrespeito a valores da democracia.
É preciso comemorar o fato de a Constituição já ter completado 30 anos. Vivemos o mais longevo período democrático da história nacional.
Reconhecida internacionalmente como referência em proteção dos direitos e garantias individuais, a Carta de 1988 orientou diferentes governos na superação de crises. Neste momento, não é diferente.
A continuidade do progresso brasileiro e a superação da distância que nos separa das nações mais desenvolvidas dependem, essencialmente, do respeito ao texto constitucional.
Podemos dizer que o país alcançou, enfim, a maturidade institucional. Agora, o desafio maior é defender a preservação do Estado de Direito, conquistado por meio do trabalho dedicado de tantos brasileiros e brasileiras. A busca por esse objetivo demanda, de todos os atores envolvidos no debate nacional, serenidade e equilíbrio.
É indiscutível que o Brasil precisa modernizar diversas legislações que, hoje, prejudicam o dia a dia dos trabalhadores, das empresas e até mesmo do poder público, muitas vezes engessado por excessiva burocracia e cultura de litigância judicial.
Outras leis perpetuam privilégios herdados da mentalidade imperial, como é o caso do foro privilegiado generalizado para milhares de agentes públicos, e não condizem com o novo momento da sociedade.
A solução para esse quadro, no entanto, está e deve ser buscada dentro dos limites definidos pela Constituição, que dá aos três Poderes todos os instrumentos para lidarem com os desafios da democracia.
As forças políticas envolvidas no processo eleitoral, já encerrado, devem assumir abertamente o compromisso de trabalhar em favor do Brasil, seja nos governos ou nas oposições. Aos militantes cabe compreender que os direitos e garantias só são sustentados graças à imposição constitucional de limites --o direito à livre manifestação, por exemplo, não comporta atos de violência ou de vandalismo.
Aos ocupantes do poder cabe atuar dentro do sistema de freios e contrapesos, que assegura a coibição de eventuais abusos.
Propostas que visem a enfraquecer ou a extinguir pilares típicos de sociedades livres, como o habeas corpus, a liberdade de imprensa e o direito de defesa, jamais serão aceitas pela Ordem dos Advogados do Brasil, incumbida pela Constituição de proteger os direitos individuais e de representar a classe, que hoje é formada por mais de 1,1 milhão de profissionais indispensáveis à realização da Justiça.
São inaceitáveis por exemplo, propostas e atitudes que visem a violar as comunicações entre advogados e clientes --asseguradas para que todo e qualquer cidadão possa ter uma defesa qualificada em face aos agentes do Estado-- e a quebra do sigilo das conversas entre jornalistas e fontes --garantido para que a sociedade possa ter acesso a informações isentas e qualificadas.
O Brasil precisa, neste momento, de bons exemplos de legalidade e ética, de mais encontro e menos confronto ideológico.
A OAB seguirá ativa no debate nacional e pronta a atuar em defesa dos interesses da sociedade civil. A aposta no diálogo, no respeito ao sistema eleitoral e à vontade popular saída das urnas é parte fundamental da superação, pacífica e democrática, deste momento sensível. Uma superação que, certamente, só poderá ocorrer por meio de instrumentos cabíveis nos marcos de nossa Constituição Federal.
*Claudio Lamachia é presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
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