quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Míriam Leitão: Oportunidade perdida em Davos

- O Globo

Por Alvaro Gribel (A colunista está de férias.)

O discurso de Bolsonaro em Davos foi o que os economistas chamam de “não evento”. Se o objetivo era impressionar a elite financeira internacional, isso não aconteceu. O presidente brasileiro teve o privilégio de abrir o Fórum, mas, nervoso, falou por apenas seis minutos e meio. A reforma da Previdência não foi citada, apesar de ter defendido o equilíbrio fiscal, a abertura da economia e a redução da carga tributária. A pauta liberal esteve presente, mas dividiu espaço com temas que tem importância apenas para a sua militância, como o valor gasto em campanha e a alegação de que foi “injustamente atacado a todo o tempo”. Bolsonaro disse que pela primeira vez na história do Brasil um presidente “montou uma equipe de ministros qualificados” e que “os críticos têm muito a aprender” com ele. Para quem precisa dar um sinal forte para destravar a confiança dos investidores estrangeiros, ficou a sensação de que a oportunidade foi perdida.

Temer foi mais liberal
“Trago-lhes uma mensagem clara: o Brasil está de volta. E o Brasil que está de volta é um país mais próspero, um país mais aberto, um país de mais oportunidades de investimentos, de comércio, de negócios”. As palavras não são de Bolsonaro, mas do ex-presidente Temer, que iniciou dessa forma seu discurso em Davos no ano passado. Ele também defendeu uma agenda liberal na economia, com abertura comercial, e lembrou as reformas aprovadas em seu curto governo. O ex-presidente aproveitou para citar a melhora em vários indicadores, como a queda dos juros ao mais baixo nível histórico, a redução da inflação e o recorde na balança comercial. O final dos quase 20 minutos de discurso foi dedicado à reforma da Previdência.

OMC: Reforma deve avançar
Uma reforma que Bolsonaro citou especificamente foi a da Organização Mundial do Comércio (OMC). Prometeu uma “defesa ativa” da modernização da entidade para “eliminar práticas desleais” e garantir a segurança jurídica em negócios internacionais. Para Roberto Azevêdo, diretor-geral da OMC, há de fato espaço para se modernizar o órgão e esse debate deve avançar. “Na plenária em Davos, o Presidente Bolsonaro deixou claro o compromisso do Brasil em defender ativamente a reforma da OMC. Esse mesmo ponto já foi feito pelo Ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. São indicações muitos positivas. A OMC é muito importante para a economia brasileira e para o relacionamento do país com seus parceiros comerciais”, disse à coluna.

Década de atraso no varejo
As vendas do varejo só voltarão ao nível de 2013 na década que vem, provavelmente em 2021. A previsão é da Confederação Nacional do Comércio (CNC). Na análise ampliada, que leva em conta o segmento automobilístico e de material de construção, o setor recuperou apenas metade da queda sofrida e ainda está 10% abaixo do pico. Um batalhão de 400 mil comerciários perdeu o posto de trabalho durante a recessão. A boa notícia é que 74% dos empresários tem a intenção de contratar nos próximos meses, revela pesquisa que a CNC divulga hoje.

Mais lojas em 2019
A queda foi rápida e a volta está sendo lenta. O varejo perdeu 220 mil lojas na recessão. Em 2018, foram abertos “no máximo” 10 mil estabelecimentos, estima Fabio Bentes, chefe da divisão econômica da CNC. Em 2019, outros 30 mil pontos comerciais serão criados, pela previsão da entidade. É um número modesto perto da mortandade provocada pela crise.

Aperitivo indigesto
A BRF perdeu R$ 1 bilhão em valor de mercado na terça-feira, após a Arábia Saudita suspender a importação de carne de frango de cinco frigoríficos do país. Foi a empresa em bolsa que mais sofreu com a decisão porque é também a mais exposta ao mercado árabe. A BRF vende seis em cada 10 cortes de frango consumidos na região do Golfo. A Arábia Saudita tomou a decisão depois de analisar as condições sanitárias dos exportadores. Mas a queda em bolsa reforçou um outro temor dos investidores e das empresas. Foi uma amostra do que pode acontecer caso a embaixada brasileira em Israel seja transferida para Jerusalém. A indústria teme uma retaliação dos países árabes exatamente no comércio de carnes.

(Com Marcelo Loureiro)

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