Por Rafael Rosas, Cristiane Agostine e Rodrigo Carro | Valor Econômico
RIO E SÃO PAULO - Mais velho dos filhos do presidente Jair Bolsonaro, o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), com 37 anos, viu seu capital político desidratar no primeiro mês do governo e levou para dentro do Palácio do Planalto a primeira crise da gestão. Depois de quatro mandatos na Assembleia Legislativa do Estado do Rio com atuação voltada principalmente para projetos em defesa das forças de segurança e bombeiros militares e um aumento, na última legislatura, de propostas voltadas ao consumidor, Flávio era chamado de "Zero Um" pelo pai e visto como possível candidato à presidência do Senado ou a líder do PSL na Casa. Mas o mais articulado e ponderado dos três filhos políticos de Bolsonaro, que deve deixar a presidência da seção fluminense do partido, foi citado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) em relatório sobre movimentações financeiras atípicas e viu seu nome supostamente envolvido com milícias. Agora, assumirá uma cadeira na Casa sob a ameaça de possível investigação no Conselho de Ética.
Na campanha eleitoral, depois de Bolsonaro levar uma facada e ficar internado no primeiro turno, Flávio tornou-se o "cabeça" de um núcleo político formado por dirigentes do PSL, parlamentares e empresários. Enquanto Carlos e Eduardo comandavam as redes sociais e envolviam-se em polêmicas, Flávio manteve-se na articulação política e buscou criar um grupo próprio no Rio, ao aproximar-se do então candidato Wilson Witzel - eleito governador na onda de sucesso dos Bolsonaro, depois de colar sua imagem à do presidente.
Com Jair Bolsonaro eleito, Flávio participou ao lado de Carlos e Eduardo da escolha de ministros. Entre eles, o chanceler Ernesto Araújo, sabatinado pelos irmãos.
Autor de biografia "Mito ou Verdade", de Jair Bolsonaro, Flávio ingressou na política patrocinado pelo pai e manteve-se durante seus 16 anos de vida parlamentar próximo a Bolsonaro, seguindo os passos dele ao migrar do PP para o PSC e PSL. Antes de disputar sua primeira eleição, trabalhou por quase dois anos, entre dezembro de 2000 e junho de 2002, na Câmara como assessor técnico no PPB (atual PP), partido ao qual o pai estava filiado. No mesmo período, porém, acumulava a faculdade de Direito a mais de mil quilômetros dali, no Rio de Janeiro, cidade onde também fazia um estágio na Defensoria Pública, como divulgou reportagem da BBC. Em Brasília, deveria cumprir carga horária de 40 horas semanais. O mesmo cargo fora ocupado pela então mulher de Bolsonaro, Ana Cristina.
Flávio foi eleito aos 21 anos como deputado estadual pelo PP em 2002, com patrimônio que se resumia a um automóvel Gol de R$ 25,5 mil. A trajetória política ajudou a engordar o patrimônio do parlamentar. Em quatro anos, o valor dos bens declarados pulou para R$ 385 mil. Em 2010, aumentou para R$ 690,9 mil, subindo para R$ 714 mil na eleição de 2014 e dois anos depois o montante declarado mais do que dobrou: R$ 1,45 milhão, em 2016. Na eleição de 2018, registrou na Justiça Eleitoral ter R$ 1,74 milhão em bens.
A votação também cresceu com a onda Bolsonaro de 2018. Foram 4,38 milhões de votos na eleição para o Senado, ante os 424 mil obtidos na disputa pela Prefeitura do Rio, dois anos antes. Na primeira votação, foram 31,2 mil votos. Em 2016, antes do "efeito Bolsonaro" nas urnas, o parlamentar mostrou que seu potencial eleitoral estava crescendo. Ao candidatar-se à Prefeitura do Rio, apesar de aparecer mal nas pesquisas durante a campanha, ficou em quarto lugar, com 14% dos votos válidos.
Na eleição para prefeito, a distribuição de votos já mostrava o peso do apoio dado às causas ligadas aos setores de segurança e militares. Flávio venceu apenas em uma zona eleitoral, a 210ª, que engloba partes dos bairros de Bento Ribeiro, Campo dos Afonsos, Jardim Sulacap e Vila Valqueire, área com forte influência de militares. Na 210ª zona eleitoral, Flávio teve 24,06% dos votos. Em outras seis zonas eleitorais na região, Flávio ficou em segundo, atrás apenas do candidato do PRB, Marcelo Crivella, que acabou eleito. Duas dessas zonas eleitorais, que abrangem o bairro de Campo Grande, ficam onde há atuação de milícias.
A votação em bolsões de forte influência militar é consequência da atuação parlamentar de Flávio, que nos quatro mandatos como deputado estadual no Rio ficou conhecido como aquele dentro do clã Bolsonaro com maior trânsito com a oposição e atuou de forma a atender o interesse de policiais e militares. Em 2007, por exemplo, defendeu em discurso que policiais só fossem presos após trânsito em julgado. "Para mim, até prova em contrário, até uma sentença transitada em julgado, acredito na palavra do policial, que pelo menos deveria valer mais do que a palavra de bandidos, de traficantes".
Em sua última legislatura, manteve propostas de interesse de policiais e militares, como a pontuação adicional em concurso público para a área de segurança para aqueles que tivessem prestado o serviço militar obrigatório e a instituição do Programa de Valorização e Preservação da Memória da História dos Veteranos da FEB, mas propôs projetos voltados ao consumidor. Como exemplo, o projeto de lei 223/2015, que ainda tramita e determina que serviços de instalação por parte de concessionárias e prestadoras de serviços tenham agendamento prévio. No mesmo ano, propôs o PL 1007/2015, que obriga empresas fornecedoras de bens e serviços a reembolsar consumidor em até 5 dias úteis por cobranças efetuadas em duplicidade que tenham sido pagas.
Colegas de parlamento de Flávio o definem como "atuante" mas voltado principalmente para a defesa de ideais conservadores, inclusive pela obstrução de projetos nas áreas de direitos humanos.
O deputado estadual Carlos Osorio (PSDB), que conviveu com Flávio na última legislatura, destaca a participação do filho do presidente na obstrução de projetos voltados à comunidade LGBT e direitos humanos. "É um deputado claramente de bandeiras conservadoras", resume Osorio, acrescentando que Flávio foi um presidente "diligente" da Comissão de Defesa Civil da Assembleia.
"Não é um deputado ausente", diz o deputado federal eleito Paulo Ramos (PDT), que conviveu com Flávio na Alerj por 16 anos. "A atuação dele está mais focada na segurança pública", diz. "Lamento muito que tenha sido implicado no relatório da Coaf. Espero que tudo seja esclarecido", acrescenta ele, que diz guardar "as melhores impressões" de Flávio, apesar das "explícitas e grandes divergências".
Outro parlamentar que prefere não se identificar descreve Flávio como "mais discreto, mais calmo e mais equilibrado" na comparação com o pai e os irmãos. "Ele atacava os projetos [relacionados a direitos humanos] mas de um jeito menos vulgar", acrescenta a fonte.
Já o deputado estadual Flavio Serafini (Psol), que está no campo ideológico oposto ao de Flávio Bolsonaro, é mais incisivo. "Não parece coerente imaginar que um parlamentar com quatro mandatos, que foi presidente de comissão e articulou a chapa do PSL para as eleições vá montar seu gabinete com indicações de um assessor", argumenta.
É como disse Sérgio Buarque de Holanda,nunca houve conservadores no Brasil,o que houve é uma elite atrasada,e continua.
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