segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Vinicius Mota: Descentralizar é programa liberal desde sempre

- Folha de S. Paulo

Corrente federalista que, como a gestão Bolsonaro, prega mais autonomia para estados e municípios remonta à Independência

Descentralizar é um mote do novo governo. O ânimo no discurso geral é aumentar a autonomia e os recursos das administrações locais em detrimento da central.

A corrente federalista, associada ao liberalismo, tem tradição no Brasil. Desabrochou na Independência e viveu um breve apogeu a partir de 1831, quando Pedro 1º abdicou.

Parte dos juízes passara a ser eleita e a exercer poder de fato nas localidades. A reforma constitucional de 1834 criou assembleias provinciais, também eleitas, às quais repassou atribuições e capacidade de tributar.

Para criticar a reação centralista, avassaladora após a manobra da maioridade de Pedro 2º em 1840, Aureliano Cândido Tavares Bastos publicou em 1870 "A Província - Estudo sobre a Descentralização no Brasil".

Elevar as prerrogativas regionais, disse o político alagoano, é mitigar a tutela do poder central sobre a liberdade dos indivíduos. Que as províncias —equivalentes no Império aos estados na República— assumam ampla responsabilidade na regulação da vida coletiva, na infraestrutura, no policiamento e na educação.

Tavares Bastos se mostra um visionário no último ponto. Arrola dados comparados de matrícula bruta de estudantes para escancarar o atraso do Brasil diante de nações como os Estados Unidos e a Argentina.

Defende o ensino básico obrigatório, gratuito e não discriminatório para todos, negros e brancos, meninos e meninas. Cobra das províncias sacrifícios tributários para diminuir depressa o prejuízo na educação.

Antevê o desafio da inclusão com o fim da escravidão e, um século antes de capital humano virar lugar-comum, identifica a relação entre instrução e produtividade. "O que reservareis para suster as forças produtoras esmorecidas pela emancipação [dos escravos]? O ensino, esse agente invisível que, centuplicando a energia do braço humano, é a mais poderosa máquina de trabalho."

O livro de Tavares Bastos merece uma edição atualizada e comentada. Os tempos favorecem. Quem topa?

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